Discurso durante a 130ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade de se garantir o direito de defesa aos parlamentares acusados por Comissões Parlamentares de Inquérito.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA.:
  • Necessidade de se garantir o direito de defesa aos parlamentares acusados por Comissões Parlamentares de Inquérito.
Aparteantes
Cristovam Buarque, José Agripino, Mão Santa, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 10/08/2005 - Página 26967
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, PROVIDENCIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), APURAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PUNIÇÃO, MEMBROS, VINCULAÇÃO, IRREGULARIDADE.
  • ANALISE, IMPORTANCIA, DIREITO DE DEFESA, CIDADÃO, DEFESA, APLICAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, SEMELHANÇA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORÇAMENTO, BENEFICIO, JUSTIÇA, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO.
  • APOIO, EXPULSÃO, TESOUREIRO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ESCLARECIMENTOS, PROCEDIMENTO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO DE ETICA, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos estamos assistindo, com sentimento profundo de indignação - alguns como eu, além da indignação, têm um sentimento de frustração e de mágoa -, depois de 25 anos de história, como é o caso do nosso Partido e da minha militância no PT, a um contexto em que alguns dirigentes traem os princípios fundamentais do Partido, tomam decisões sem consulta às instâncias partidárias, violam princípios indispensáveis à ética na política e a um partido que tem compromisso com o Estado de direito, com a legalidade, e a opinião pública cobra atitudes, com toda razão. Os nossos 820 mil filiados esperam respostas, e a mesma firmeza que o PT teve no passado terá de ter nesse episódio com os dirigentes envolvidos.

Esse desafio não é apenas do PT, é um desafio dos demais partidos, porque praticamente todos os médios e grandes partidos do País estão envolvidos nesse episódio: alguns, lá atrás, em 1998; outros, agora, porque receberam recursos. Mas o PT tem uma responsabilidade maior, porque claramente alguns dirigentes partidários patrocinaram esse processo nesses últimos anos, induziram a esse procedimento. Essa responsabilidade está sendo apurada e será identificada, e o Partido tomará todas as providências.

Esse é um desafio não só para o PT, mas também para o Congresso Nacional. As CPIs são instrumentos importantes de investigação para o Parlamento, junto com a Polícia Federal, com o Ministério Público, com a Corregedoria. Em poucos momentos da história, houve tanto empenho em apurar e identificar. Estão aí os depoimentos, as provas documentais, os depósitos bancários, os sigilos fiscais. Toda essa identificação vai montando a rede de responsabilidades.

É muito grave a situação em que se encontram muitos Parlamentares. Não sei exatamente qual é o número, mas, provavelmente, mais de duas dezenas ou cerca de duas dezenas de Parlamentares estão envolvidos - há provas documentais e testemunhais -, receberam diretamente recursos. Eu diria que a ampla maioria deles não conseguiu explicar para a opinião pública o que foi feito.

O sentimento popular e o sentimento na Casa são de que o decoro parlamentar foi violado. Há outras informações que geram maior indignação ainda, como, por exemplo, o fato de que, provavelmente, houve, nesta cidade, festas patrocinadas pelo esquema do Sr. Marcos Valério, com Parlamentares e meninas de programa em hotéis. A vida pessoal é um problema da privacidade de cada um, mas, se esse é um ato coletivo patrocinado por esse esquema de corrupção, isso é muito grave. Não é um problema da privacidade, é problema do elo, do vínculo, da intimidade, da promiscuidade que envolve esse sentimento de impunidade que, seguramente, está presente nesse comportamento.

A CPI está apurando os fatos, que estão vindo a público. E eu, seguramente, estarei entre aqueles que vão exigir desta Casa e da Câmara dos Deputados as providências indispensáveis para que o Poder se preserve, que é a punição exemplar dos envolvidos. E a pena mais importante, nesta Casa, é cassar o mandato, o que, eu diria, é a agressão mais profunda que um homem público pode ter, porque o voto popular, que o consagrou, que o trouxe e que lhe deu mandato, é revogado.

Mas, ao mesmo tempo em que esse sentimento positivo de investigação, de apuração e de fim da impunidade no País prospera - e isso é parte da construção da cidadania -, há uma outra dimensão da Justiça e do Estado de direito de que sei, talvez, eu seja uma voz isolada. Mas não deixarei de dizer o que penso, mesmo sob o risco de ser mal entendido.

O Estado de direito, desde a Carta Magna de 1215, na Inglaterra, estabeleceu alguns princípios fundamentais, que é o amplo direito de defesa, o contraditório e o devido processo legal. Esses princípios é que fazem a justiça. Esses princípios foram reafirmados no Iluminismo e retornaram depois da experiência da Revolução Francesa, que foi fundamental na definição do que seria um Estado republicano, e a construção daquele processo foi feita à guilhotina. Os Robespierres que alavancavam os sans-culotte no processo da insurreição popular da Revolução Francesa foram decapitando as lideranças. E havia, naquele processo, figuras como Danton, que logo foi para a guilhotina. Mas a História tem muito mais de Danton do que de Robespierre, porque inclusive a experiência da Revolução Francesa recolocou os direitos humanos, as garantias e os direitos individuais como os princípios fundamentais da construção de uma sociedade democrática.

Depois de vinte anos de ditadura militar, dos tribunais de exceção, da revogação dos processos legais, do direito amplo de defesa, do Estado de exceção, a Constituição de 1988 recolocou, no art. 5º, o devido processo legal, o amplo direito de defesa e do contraditório e a vedação completa de tribunais de exceção. Tudo isso está constituído no art. 5º da Constituição.

Por que digo isso? Digo isso porque li na imprensa, em vários jornais, nesse final de semana, manchetes que chamam a atenção e porque há necessidade deste debate: “CPI vai sugerir à Câmara cassação de até 18 deputados”, “CPI tenta acelerar cassações”, “Relatório sobre 18 acusados será mandado em dez dias à Mesa da Câmara”. E isso foi publicado em todos os grandes jornais.

Eu diria o seguinte: há provas que possam induzir à cassação de mandatos? É inegável que há. Há indícios que colocam em cheque o decoro parlamentar? Seguramente, há. Mas há o devido processo que permite à CPI formalizar o pedido de cassação? Não, não há, não há. Por que não há?

Trabalhei num período da história muito semelhante a este, a CPI do Orçamento. As provas documentais eram abundantes: os cheques, as emendas e todo um esquema organizado de fraude e de corrupção no seio do processo orçamentário da República. Naquela ocasião, as provas eram irrefutáveis contra, por exemplo, o Deputado João Alves, mas ele teve o direito de defesa, pôde sentar na CPI e se defender. Não conseguiu fazê-lo, mas teve a oportunidade, e o direito lhe foi assegurado. Todos tiveram a oportunidade de defender os seus mandatos. E foi no contraditório, no processo de argüição, que fizemos o relatório final. Alguns poucos conseguiram preservar o mandato em seu depoimento, em sua defesa. Lembro-me de poucos, que foram brilhantes na defesa, irrefutáveis na argumentação, nas provas que apresentaram, e a CPI retirou o pedido de cassação. É verdade que, com relação a alguns, as provas eram muito consistentes, e o Relator leu o pedido de cassação, que depois foi retirado no plenário, por um acordo político espúrio, que não deveria ter ocorrido. Mas uma parte da imprensa cobra, 12 anos depois, do Congresso Nacional que injustiças foram praticadas. Ou algumas revistas, livros e matérias não disseram que o Deputado Ibsen Pinheiro não deveria ter sido cassado? Ou não houve um debate público sobre existir um sentimento de injustiça ou sobre vários Parlamentares terem dito que Ibsen Pinheiro não deveria ter sido cassado? Mas o foi. Lembro novamente: naquela oportunidade, ele teve o direito de defesa, e, ainda assim, o Relator pediu a sua cassação, a Comissão a aprovou, e o Plenário votou favoravelmente a ela.

Essa experiência foi rica o suficiente, pelo menos na minha história de vida. Não tenho a convicção de que ele não deveria ter sido cassado. Não a tenho, mas não acredito que isso seja mais objeto de debate. O que me interessa neste momento é que erros não sejam cometidos; que cada Parlamentar trabalhe com a convicção de buscar a verdade, seja ela qual for, que “despartidarize” o processo, mas que nesse procedimento assegure o direito de defesa.

Elogio a CPI hoje - ontem a critiquei -, porque fui informado pela assessoria e pela imprensa de que o Relator e os outros Parlamentares disseram que esse princípio será assegurado. Se a preocupação é evitar a renúncia, que se encaminhe uma formalização, um requerimento, simplesmente para se abrir o processo, mas não se encaminhe o pedido de cassação, sem que o réu seja ouvido. Isso vai transformar essa CPI ou qualquer outra num tribunal de exceção. Como alguém pode ser condenado, sem ter o direito de se defender? E o que me impressiona é o silêncio; é a conveniência e a oportunidade política do silêncio nesses momentos.

Não há justiça sem o contraditório. Não há justiça sem processo. Não há justiça sem o direito de defesa. Se eu fosse votar hoje, seguramente optaria pela cassação da ampla maioria dos casos, mesmo porque não vi sequer uma defesa consistente. Mas não posso admitir a possibilidade de concluir o relatório, um processo de votação, sem que as pessoas se tenham defendido.

Se abdicarmos do processo, se renunciarmos ao direito de defesa, estaremos violando o que Montesquieu apresentou como a razão mais sublime e importante do Parlamento, que é a defesa das prerrogativas dos direitos individuais.

Tocqueville, no iluminismo, disse que a sociedade não se faz pela virtude dos homens, mas pela solidez e pela consistência das instituições. É isso que estamos discutindo. Não se preservam as virtudes, se as instituições não têm procedimentos e não asseguram os direitos e garantias individuais.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mercadante, V. Exª me permite um aparte?

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Eu pedi primeiro.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Primeiro, o Líder dos autênticos do PMDB.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Deixe-me passar a palavra ao Líder Ney Suassuna, que foi o primeiro a solicitá-la. Depois passarei a palavra aos outros.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PI) - Solidarizo-me com V. Exª, dizendo que o PMDB quer que tudo seja apurado com a maior transparência e rapidez possível, mas que não abre mão também do direito de defesa. Não se pode condenar, sem se dar o direito de defesa.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Ouço o Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Senador Aloizio Mercadante, também quero que V. Exª me tenha como um dos que subscrevem sua preocupação. Nisso V. Exª absolutamente não está só. Penso que é uma obrigação que lutemos pelo direito de defesa; é por meio desse processo que poderemos vir a saber outros detalhes de tudo isso. Então, fique certo de que muitos de nós estão de acordo com sua defesa pelo direito que tem qualquer pessoa de se defender de qualquer acusação.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Senador Cristovam Buarque.

Senador José Agripino, ouço o aparte de V. Exª.

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Senador Aloizio Mercadante, aliviam-me muito as palavras de V. Exª, porque o tenho em altíssima conta, como um sujeito aguerrido. Nós temos notórias divergências, mas respeito V. Exª como um talento e como uma pessoa que guarda probidade. É o conceito que guardo de V. Exª, honesta e sinceramente. Digo isso num momento difícil, com toda a franqueza. E vi com preocupação notícia na imprensa de que V. Exª se teria entendido com o ex-Ministro José Dirceu sobre um esquema de procrastinação de punição ou de esclarecimento de fatos de Deputados do seu Partido. Mas V. Exª deixa esse assunto claro aqui, na minha opinião. V. Exª considera, como eu, que aqueles que estão claramente identificados como passíveis de punição devem ser encaminhados - e, não sei se este é o pensamento de V. Exª, diretamente para a Comissão de Ética da Câmara, que é o foro próprio. A CPI do Mensalão vai acrescentar outros nomes que não estão ainda identificados. Os que estão identificados como passíveis de culpa têm de ir direto para a Comissão de Ética, que é o foro próprio, dada a eles a oportunidade de por escrito fazer uma defesa prévia. Mas que vão para o Conselho de Ética, onde terão, aí sim, a ampla oportunidade de se defenderem, estabelecerem o contraditório, apresentarem provas e contraprovas e colocarem seu mandato e vida pública em jogo definitivamente. Nós estamos inteiramente de acordo. Louvo V. Exª pelo esclarecimento, que faz com que eu volte a ter o conceito que tinha de V. Exª. Não posso imaginar que V. Exª queira, no seu Partido, o Partido dos Trabalhadores, estabelecer o processo confuso de esconder a culpa de pessoas, para fazer sobreviver o Partido.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador José Agripino, são dois movimentos, mas eles estão de alguma forma associados. Quando o tesoureiro do Partido pede afastamento por prazo indeterminado, porque há um processo disciplinar em andamento numa comissão de ética, concluído esse relatório, o Partido vota. Eu votarei pela expulsão do tesoureiro Delúbio - disse isso no diretório e para a imprensa e o digo aqui -, mas uma vez concluído o processo e o direito de defesa dele, porque os Partidos também não podem transformar-se em tribunais de exceção.

Vi, por exemplo, o PFL expulsar o Deputado que estava num avião, transportando dinheiro da Igreja Universal. A igreja assumiu que aqueles recursos eram dela - não sei se essa é a melhor forma, se esse deve ser o procedimento; acho que há outros instrumentos para fazer o transporte de numerários. Em seguida, apareceu o Deputado Roberto Brant, por quem tenho um apreço muito grande; considero S. Exª um grande homem público. Claramente, era esta a configuração: S. Exª teria recebido recursos do Sr. Marcos Valério, e o PFL sustentou a posição do Deputado, deu apoio.

Esses dois exemplos demonstram, primeiro, que o Partido não pode ter um procedimento prévio e, muito menos, sem a devida apuração. Esse é o meu sentimento. Nenhum Partido, até o momento, tomou qualquer medida disciplinar em relação àqueles que foram citados, por terem recebido recursos de Marcos Valério por qualquer razão, alguns em situações muito mais graves que outros. Penso que todos estão atentos, aguardando o processo de investigação. O nosso Partido exigiu que todos os Parlamentares prestassem contas à Executiva Nacional, dissessem por que receberam recursos, justificassem formalmente por que estão naquela lista. E essa justificativa dará no procedimento de instalação de uma comissão de ética.

Segundo o estatuto do PT, a comissão de ética se faz por escrito, por uma motivação pessoal contra o filiado, circunstanciada, com os indícios, provas e testemunhas. E esse procedimento diz respeito à discussão que estamos fazendo na CPI e à que se travou em algum momento da história, especialmente na II Guerra, quando o stalinismo...

(Interrupção do som.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - ...o fascismo e o nazismo se transformaram em processos sumários de execução e de justiça. E, na história da Esquerda, o stalinismo é o que há de pior na cultura. Os processos de expurgo, os campos de concentração na Sibéria e tudo mais que a história demonstrou mais tarde destruíram os sonhos de transformação da sociedade e criaram - eu diria - um lado absolutamente intolerável de autoritarismo e de destruição das prerrogativas e garantias individuais. Não há nada mais triste na história do que a coerência militante de um Ramón Mercader, que pega uma picareta e enterra na cabeça de outro, em nome de uma ideologia. É a isso que levam as ideologias totalitárias e os processos de expurgo sem o devido processo legal, sem o contraditório e sem o direito de defesa. E isso vale para o Partido e para a CPI.

Antes de conceder um aparte ao Senador Mão Santa - e dialogo com a imprensa também -, quero citar um exemplo recente da imprensa brasileira que eu acho que vale como aprendizado para o que estamos discutindo - e nada disso significa não cassar, nada disso significa protelar, nada disso significa não investigar. Tenho certeza de que, com o acompanhamento da imprensa, a pressão da opinião pública e a exigência do pluralismo partidário que nos constitui, os Parlamentares serão cassados, todos os que não conseguirem responder pelo que fizeram. Mas eles não podem passar por isso sem ter o direito de defesa, e a CPI não pode concluir a sua investigação e não pode fazer uma lista de cassação sem que o direito de defesa esteja assegurado.

Vou lembrar um episódio recente da Escola Base. Seis pessoas foram acusadas de abuso sexual de crianças.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Havia fonte na Polícia, havia laudos médicos e havia até algumas testemunhas que diziam que as crianças eram abusadas numa escola da Aclimação em São Paulo. A vida desses profissionais e dessa instituição foi destruída e liquidada, sem qualquer oportunidade de recuperação. Mas a investigação provou posteriormente que as pessoas eram inocentes. O Diário Popular foi acusado, na época, de estar com o “rabo preso” porque queria ocultar informações do público. Em compensação, o “Aqui agora”, que era um programa televisivo, pediu a pena de morte para os envolvidos.

Então esse processo pedagógico de construção da democracia, da justiça, do Estado de Direito no Brasil, que é uma conquista recente da nossa história, exige o contraditório, exige o direito de defesa, exige o devido processo legal. Evidente que a responsabilidade desse episódio são as fontes precárias em que a imprensa se fundou. É evidente que é isso. Mas a presunção da inocência é um valor fundamental que deve acompanhar todo o processo. Só se conclui uma investigação quando o réu, em última instância, se defende. Ele tem o direito à última palavra. É aí que se conclui o processo de investigação. Ainda que ele não tenha nada a dizer e muito menos argumentos para se defender.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI ) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Concedo o aparte ao Senador Mão Santa, para concluir.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI ) - Senador Aloizio Mercadante, errare humanus est. Eu queria dizer que o PT é um Partido de humanos, dentre eles, V. Exª, que tem muitas virtudes. Quero lembrar, já que sua presença sempre significa debate qualificado, que eu li um livro que fala dos segredos de liderança de Átila, o Rei dos Hunos. Ele dizia que é muito fácil administrar: premiar os bons e punir os maus. V. Exª poderia dizer que é história antiga, de antes de Cristo, e eu buscaria Rui Barbosa, que disse: “Justiça tardia é injustiça qualificada”. Mas ficaria com o livro de Deus, as Sagradas Escrituras, que diz: Justiça nos leva à paz e a paz à alegria. E o povo brasileiro está precisando sair dessa tristeza e entrar na alegria.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Eu concluo com essa citação do Senador Mão Santa porque talvez o caso mais clássico de injustiça praticado na relação entre Estado, sociedade e indivíduo seja exatamente a figura de Cristo, que foi crucificado, julgado e morto. E dois mil anos depois seus valores, tradição e procedimentos são absolutamente inquestionáveis. Essa experiência histórica construída ao longo dos séculos foi formando as instituições.

E aí eu reivindico, para concluir, Tocqueville, não construímos uma sociedade democrática na virtude dos homens apenas, mas na consistência das instituições. Então as instituições precisam preservar valores e procedimentos.

É possível acelerar as investigações? É. Basta, por exemplo, neste caso, começar imediatamente o depoimento dos Deputados. Eles imediatamente podem depor, defender-se ou não. Aqueles que não tiverem argumentos na defesa - e acho que a maioria não terá porque as provas são muito consistentes -, seguramente o sentimento da Casa e do povo - e esta Casa, como diria Ulysses Guimarães, sempre foi sensível ao sentimento do povo - caminhará para a cassação dos mandatos. Mas sem o devido processo, sem o contraditório, sem o direito de defesa, não há justiça. Não há...

(Interrupção do Som)

            O SR ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) -...para concluir, portanto, sem o contraditório, sem o direito de defesa, sem o devido processo legal, não há justiça, não há Estado de Direito e não há democracia.

O Parlamento veio para elaborar as leis, e a Casa que faz as leis deve cumpri-las. O Parlamento veio para preservar direitos e garantias individuais. Isso vale sobretudo para o cidadão comum, aquele mais pobre e despossuído, mas também vale para os que têm mandato.

São esses valores que temos de preservar nesta investigação que tem de ser rigorosa, profunda e que não pode postergar, abafar ou criar qualquer sentimento de que vai haver uma pizza no Congresso Nacional porque não vai ter, a opinião pública não vai permitir e nós estaremos aqui para fiscalizar. Mas isso tem que ser feito com responsabilidade, assegurando os procedimentos legais, que são inegociáveis e cláusulas pétreas da Constituição brasileira.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/08/2005 - Página 26967