Discurso durante a 131ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Repúdio aos comentários que vêm sendo feitos pela imprensa a respeito do Partido dos Trabalhadores. Registro dos 10 anos do massacre de Curumbiara. (como Líder)

Autor
Fátima Cleide (PT - Partido dos Trabalhadores/RO)
Nome completo: Fátima Cleide Rodrigues da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Repúdio aos comentários que vêm sendo feitos pela imprensa a respeito do Partido dos Trabalhadores. Registro dos 10 anos do massacre de Curumbiara. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 11/08/2005 - Página 27069
Assunto
Outros > IMPRENSA. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • PROTESTO, IMPRENSA, CONGRESSISTA, ACUSAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, PROVA, DEFESA, MEMBROS, FILIAÇÃO PARTIDARIA.
  • REGISTRO, ANIVERSARIO, CONFLITO, ARMA, TRABALHADOR RURAL, POLITICA, ESTADO DE RONDONIA (RO), RESULTADO, SUPERIORIDADE, MORTE, MOTIVO, DECISÃO JUDICIAL, REINTEGRAÇÃO DE POSSE, COMENTARIO, ERRO, GOVERNO ESTADUAL, JUSTIÇA.
  • CRITICA, IMPUNIDADE, CRIME, EXECUÇÃO, TRABALHADOR, REGIÃO, ESTADO DE RONDONIA (RO), NECESSIDADE, REVISÃO, CONDENAÇÃO, POLICIAL MILITAR, SUSPEIÇÃO, AUSENCIA, PARTICIPAÇÃO, HOMICIDIO, DEFESA, JUSTIÇA, PUNIÇÃO.

A SRª FÁTIMA CLEIDE (Bloco/PT - RO. Pela Liderança do Bloco/PT. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de fazer algumas observações sobre as acusações que vêm sendo feitas ao Partido dos Trabalhadores, sobre tudo o que tem sido dito pela mídia, e aqui me reporto às palavras do Senador Wellington, que ouvi hoje de manhã pela Rádio Senado quando me dirigia a esta Casa: recém-chegado a esta Casa, S. Exª dizia que, em política, primeiro se julga, primeiro se culpa, e depois se procuram as provas.

Não sou das maiores defensoras do Partido dos Trabalhadores nesta tribuna, nesta Casa, porque a minha personalidade é a de uma pessoa discreta que trabalha silenciosamente, mas devo dizer ao Brasil e a este Plenário que é um acinte as coisas que temos ouvido. Grande parte da população também já pede basta. Respeitem-nos, não nos julguem pelas matérias da imprensa, já que grande parte dela se dedica a atender os interesses dos que sempre estiveram mandando e manipulando as políticas públicas neste Brasil e não os interesses da classe trabalhadora.

Neste momento, diante de tantas injúrias e de tantas calúnias que têm sido feitas ao Partido dos Trabalhadores, venho aqui para dizer que me orgulho de ser petista. A maior parte, grande parte - eu ousaria até dizer que 99,9% dos filiados ao Partido dos Trabalhadores neste Brasil - não tem culpa nos erros cometidos, erros esses que, felizmente, estão sendo desvendados pelas várias Comissões Parlamentares de Inquérito que hoje funcionam neste Congresso Nacional e que demonstram que as práticas nas quais dirigentes do meu Partido incorreram são bem antigas.

Portanto, Sr. Presidente, eu gostaria de pedir a todos aqueles que hoje posam de vestais e de defensores da moral neste País - de última hora, é claro - que, antes de acusar, coloquem a mão na sua consciência e revejam principalmente o seu passado.

Sr. Presidente e Srªs e Srs. Senadores, venho a esta tribuna hoje porque considero de importância inquestionável fazer o registro de trágica e recente história que colocou o meu Estado de Rondônia no cenário internacional, com repercussão até hoje nunca vista. Falo aqui do massacre de Corumbiara, que ontem, dia 9 de agosto, completou dez anos de acontecido. O episódio, semelhante a muitos outros que vitimam Brasil afora trabalhadores rurais que apenas querem terra para plantar e que muitas vezes não encontram respaldo para a sua luta aqui no Congresso Nacional, é cercado de dúvidas, de contradições e, até hoje, de impunidade.

É importante relembrá-lo, para que a história não se repita. Foi um crime que vitimou barbaramente nove trabalhadores, entre eles a pequena Vanessa, de apenas sete anos de idade, atingida por um tiro nas costas enquanto corria de mãos dadas com a mãe de toda aquela violência. Além disso, morreram também dois policiais.

Mais do que um crime, uma verdadeira execução, foi um trágico erro. Foi um erro da ação governamental do Estado e da Justiça. Foi um erro na execução de uma forte operação de guerra, montada com mais de cento e oitenta policiais enviados de madrugada à Fazenda Santa Elina, em obediência a uma reintegração de posse.

Foi um erro cometido por oficiais comandantes da operação, impunes até agora em todo o processo judicial, por oficiais que se omitiram, que passivamente assistiram comandados investirem contra trabalhadores dominados.

Os laudos oficiais das necropsias indicaram que quatro dos nove sem-terra mortos na fazenda (um outro foi encontrado morto boiando sobre as águas de um rio a 70 quilômetros de Santa Elina) foram sumariamente executados. Os médicos de Vilhena que acompanharam os exames testemunharam: os colonos foram atingidos por disparos a curta distância (menos de 30 centímetros) na nuca, nas costas e na cabeça, o que caracteriza a execução.

Todos os oficiais levados a julgamento foram absolvidos. Apenas dois trabalhadores sem-terra e três policiais foram condenados. A prisão dos policiais, especialmente de dois que estão em Vilhena, é um dois pontos obscuros na decisão judicial.

As famílias de Airton Ramos Moraes e de Daniel da Silva Furtado lutam para reverter sua condenação, a do primeiro a 18 anos de prisão e a do segundo a 16 anos.

Os dados do inquérito mostram que, em nenhuma das vítimas, foram encontrados projéteis disparados pela arma de Furtado, e Ramos não teria sequer disparado sua carabina e o revólver que portava.

Acompanhei na época o julgamento, que durou cerca de um mês, e a família de Ramos traduz o sentimento que vigorava então.

Fatores outros que não as provas do inquérito foram levados em conta na condenação. “Foi levado em conta o tempo que os policiais estavam na Corporação, sua patente, condição financeira e (pasmem!) raça”, diz a irmã de Ramos, Cristina Zulmira de Moraes Guimarães, em recente entrevista concedida ao jornal eletrônico Portal Cone Sul. Ramos e Furtado eram os que estavam a menos tempo na PM e são negros.

Faço aqui um apelo, um apelo em nome dos que se sentem injustiçados com tudo o que aconteceu em Corumbiara, episódio marcado para sempre na memória de todos que guardam no corpo a violência praticada por agentes da lei. É preciso rever o processo, é preciso que a Justiça promova o apaziguamento com os que dela se ressentem e promova a punição dos que de fato a merecem.

Esse é o caso da família de Ramos. Seu empenho em reverter a condenação precisa encontrar reciprocidade na Justiça, ela que, nos conflitos fundiários, não pode continuar agindo como se fosse ente superior, acima de responsabilidades com a manutenção de vidas. A Justiça não pode continuar demandando ordens judiciais sem se importar com o duelo diário travado no campo por pistoleiros a mando de latifundiários e sem-terra de alma aguerrida, alma que vicejava nas dezenas de camponeses de Corumbiara, para sempre na história de Rondônia um símbolo de resistência e fé na terra.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/08/2005 - Página 27069