Discurso durante a 135ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários ao pronunciamento do Senador José Sarney sobre a crise política no país.

Autor
Tasso Jereissati (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Tasso Ribeiro Jereissati
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários ao pronunciamento do Senador José Sarney sobre a crise política no país.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães, Arthur Virgílio, Leonel Pavan, Mão Santa, Sergio Guerra.
Publicação
Publicação no DSF de 17/08/2005 - Página 27789
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • ELOGIO, PARTE, DISCURSO, JOSE SARNEY, SENADOR, NECESSIDADE, REFORMA POLITICA, DISCORDANCIA, ALEGAÇÕES, SOLUÇÃO, GRAVIDADE, CRISE, CORRUPÇÃO, COMPARAÇÃO, HISTORIA, PAIS, RESPONSABILIDADE, DIRIGENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • PROTESTO, ALEGAÇÕES, JOSE SARNEY, SENADOR, IMPUTAÇÃO, BANCADA, OPOSIÇÃO, RESPONSABILIDADE, TENTATIVA, IMPEDIMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ESCLARECIMENTOS, AUTORIA, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, MEMBROS, APOIO, GOVERNO FEDERAL.
  • DEFESA, ATUAÇÃO, BANCADA, OPOSIÇÃO, RESPONSABILIDADE, DEMOCRACIA, COMPARAÇÃO, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, GOVERNO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ABUSO, FALTA, ETICA, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL.

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acabamos de ouvir no plenário desta Casa um belíssimo discurso, o que, aliás, vindo do Presidente José Sarney, não é surpresa. Com a erudição que lhe é peculiar, brindou-nos com uma aula sobre a evolução da democracia, da República, do Congresso, e discorreu sobre diversos incidentes institucionais que aconteceram em nossa história, permitindo-nos, com essas lições, entender um pouco os momentos que vivemos hoje.

No final de seu discurso, apresentou-nos uma proposta de reforma política em profundidade, que em alguns pontos pode ser polêmica, em outros, consensual, mas que hoje é uma imperiosa necessidade das instituições democráticas. A reforma política e a reforma eleitoral impõem-se neste momento para diminuir as possibilidades e as brechas para que haja desvios e malfeitos, tanto na política quanto no próprio sistema eleitoral.

No entanto, gostaria aqui de me permitir algo pretensioso: discordar do que o Presidente José Sarney colocou entre a primeira e a terceira parte de seu discurso. Para não ir de encontro a uma das mais ilustres figuras da República, que é o Presidente Sarney, gostaria de dizer que seu discurso foi, na minha opinião, na minha modestíssima opinião, um discurso dois a um. Duas partes foram excelentes, muito boas; porém, com uma parte, a do meio, eu não posso concordar de maneira alguma.

As instituições políticas e o processo eleitoral precisam de uma reforma profunda sim, quanto a isso não há dúvida, e todos concordamos. Contudo, não serão as reformas que vão coibir ou eliminar de vez os malfeitos, as distorções, a corrupção e a má-fé no processo político. O sistema que está aí é imperfeito, mas ele se tornou muito mais imperfeito quando assumiu o poder um grupo de pessoas... E volto a dizer que, nesse grupo de pessoas, por enquanto, ainda não coloco, no nível de má-fé, o próprio Presidente da República, mas já o coloco no nível daquele que teve conhecimento, sim, desses malfeitos.

Quando essas pessoas de má-fé assumiram o poder, assumiram o controle e a direção deste País, difundiram, em nível jamais visto em nossa história - seja no Império, ao qual o Presidente Sarney se referiu aqui, seja na República Velha, à qual ele também se referiu, seja no período anterior ou posterior à década de 30 -, um sistema de corrupção sistemático e o espalharam por todo o País. Ele foi socializado - alguém usou aqui essa expressão muito bem, Senador Motta.

Com certeza, essas mesmas instituições, que já foram até mais imperfeitas no passado, com gente de boa-fé, não gerou tanta corrupção. E agora, melhoradas, mas com gente de má-fé, alcançaram o nível de corrupção que se tornou conhecido por todos. Quero ressaltar que, quando me refiro a gente de má-fé, não me refiro ao PT como um todo; o PT tem gente ilustríssima, que orgulharia qualquer agremiação política de qualquer parte do mundo e que orgulha esta Casa, orgulha o Congresso e orgulha o Governo. O mesmo digo em relação ao Governo. Esse sistema de corrupção foi implantado a partir do núcleo mais alto do PT, a partir de seus dirigentes mais elevados, pessoas que dirigiam o partido; esse sistema foi incrustado no Governo Federal em seu núcleo mais alto, não necessariamente na Presidência da República, mas, com certeza, como já está comprovado, na própria Casa Civil. Estabeleceu-se uma relação promíscua entre Governo, partido, empresa privada, interesses públicos, interesses privados e até interesses individuais.

Essa relação, com seus desdobramentos metastáticos, é inédita na história da República. Por coincidência, aconteceu em um momento histórico fantástico do País, sem dúvida. Eu mesmo fui um dos primeiros, em meu primeiro discurso nesta Casa, a ressaltar que momento bonito vivia a democracia brasileira, quando um homem de Esquerda, emigrante nordestino, sindicalista, trabalhador metalúrgico, assumiu a Presidência da República. Foi o meu primeiro discurso nesta Casa, Senador Sérgio Guerra. Mas nenhuma história bonita justifica a corrupção, a má-fé e, muito menos, a desilusão que se espalhou por este País ao serem depositadas, justamente por causa dessa história bonita, sobre essa linda história, tantas esperanças. E sobre essas tantas esperanças vieram tantas desilusões.

Infelizmente, a História não dá impunidade a ninguém, o passado não dá impunidade a ninguém, até porque o passado foi sempre feito na Oposição e nunca no poder. E o presente desse Partido de Esquerda que está no poder é altamente condenável. Mas poderia ser de Centro, poderia ser qualquer um, porque a questão não é ideológica. O presente desses homens e desse Partido que está no poder é talvez um dos episódios mais profundos e lamentáveis que já aconteceram neste País.

O SR PRESIDENTE (Sérgio Cabral. PMDB - RJ) - Senador Tasso Jereissati, a Presidência, interrompendo rapidamente V. Exª, prorroga a sessão por mais 30 minutos.

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE) - Obrigado, Sr Presidente.

E querer impor à Oposição o ônus de fazer com que este momento se torne uma tentativa de banir a Esquerda ou de afastar o Presidente Lula - lamento dizer, lamento discordar desse homem por quem todos sabem tenho profunda admiração - é de uma injustiça tremenda.

Quem primeiro denunciou esses desmandos foi o Sr. Roberto Jefferson, um dos maiores aliados do Governo. S. Exª nunca foi de Oposição. Quem deu o ápice desse momento, no final da semana passada, foi o Sr. Duda Mendonça, exatamente o maior aliado e construtor da imagem do Presidente da República e construtor da imagem pública do PT de hoje, que nunca, tão cedo, passou pela Oposição.

Quem deu uma entrevista à revista Época no final de semana passado foi outro dos aliados do Senhor Presidente da República, contando detalhes, eu diria, deprimentes, sórdidos, de como se faziam as negociações dentro do Governo e do PT. Jamais foi a Oposição.

Dizer que esta Oposição deseja banir o PT, quando o próprio Presidente interino do PT, hoje, Presidente Tarso Genro, faz profundas e severas acusações ao que foi feito ao PT, justificando que aquilo não é do PT, é da administração anterior, e culpa os que fizeram a administração anterior do PT por esse verdadeiro descaso com a opinião pública.

E iria mais longe, se me permitir, Sr. Presidente, e o mais breve possível. Mais do que isso, o que tivemos nesse Partido de Esquerda, que não queremos banir... Pode ser até esse Partido de Esquerda, porque, quem sabe, pelo tamanho dos seus erros, ele mereça se não for banido, ser ao menos diminuído. Mas nunca a Esquerda, nunca o pensamento da Esquerda, nunca o pensamento da Direita.

Nós aqui, da Oposição, defendemos a liberdade de opção ideológica, para qualquer, para todas as correntes do País e temos assim nos portado. Até porque se não fôssemos nós a Oposição, se a Oposição fosse esse Partido que está aí no poder, e estivesse aparecendo tudo isso no nosso Governo, com certeza eles já estariam pelas ruas pedindo impedimento, gritando “fora”, agredindo, quebrando as ruas, quebrando vidraças, fazendo manifestações com violência.

            Quero lembrar que o Presidente Fernando Henrique Cardoso, em nenhum momento, teve alguma acusação tão grave de envolvimento profundo em qualquer coisa semelhante a essa, e não foram poucas as vezes que os Senadores Teotonio Vilela, Mão Santa, Sérgio Guerra, enfim, todos os Senadores que aqui estão passaram por uma faixa, durante o seu comício, que dizia: “Fora FHC”. “Fora FHC” era uma coisa generalizada, bastava a assinatura de um acordo com o FMI, por exemplo, que a Esquerda já repetiu tantas vezes, para que viesse: “Fora FHC”.

O presidente atual do Partido dos Trabalhadores, Tarso Genro, escreveu um artigo que foi publicado na página mais importante da Folha de S.Paulo pedindo o impeachment imediato do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Mas nós, não. Ao contrário, ontem, segunda-feira, fizemos uma reunião dizendo que impeachment é muito grave e que precisa de maior amadurecimento.

Dizer que estamos querendo banir a Esquerda da História do Brasil não nos faz justiça, meu queridíssimo amigo, Presidente Sarney. Até porque a nossa história é oposta. Eu não vivi o momento Vargas; eu não vivi a revolução de 64, mas, com certeza, se eu os tivesse vivido estaria do lado dos que queriam que Vargas ficasse até o fim, que Jango ficasse até o fim. Com certeza, eu estaria desse lado, com certeza esta Oposição que está aqui estaria desse lado, nunca do lado dos que queriam banir, como foi banido, da vida brasileira, João Goulart. Não discuto seus méritos, mas quero lembrar que Jango, João Goulart, foi o único Presidente brasileiro a morrer fora da sua casa, sem poder retornar à sua Pátria.

Em um discurso importante, como foi o do Presidente José Sarney, é fundamental que a verdade histórica seja restabelecida. E a verdade histórica é esta: a Esquerda brasileira decepcionou por meio de um Partido; ou talvez mais corretamente, a Esquerda brasileira está profundamente decepcionada com o Partido, com o Governo que não a representou como merecia. A Esquerda brasileira tem uma grande história, mas esse Partido e este Governo desmerecem a história do Partido Comunista, dos partidos de Esquerda, dos partidos socialistas, que tiveram tantos momentos de grandeza na História deste País. E mais do que desmerecer a história de todos esses movimentos de Esquerda, desmerecem até a história da própria democracia brasileira.

E não se preocupe, Presidente Sarney, com certeza, se o PT for banido, a Esquerda não será banida. Se o Presidente Lula, por acaso, em algum momento, for impedido, não será banida a democracia. Mas, mais do que isso, se alguma dessas duas coisas vier acontecer, não será por nós. Não será a oposição democrática e legítima que se faz nesta Casa; será, sim, pela força da opinião pública brasileira diante de fatos absolutamente incontornáveis, em nome da ética e dessa mesma democracia.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Permite-me um aparte, Senador Tasso Jereissati?

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE) - Permito um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Tasso Jereissati, atentamente o estou ouvindo e também o País. V. Exª, por três vezes, foi o Poder Executivo exemplar no Ceará e, hoje, esse Senador. Mas quero dizer que aprendi muito com o Presidente Sarney, mas todos estamos aqui porque estudamos. E na História do Brasil, em 505 anos, nunca houve tanta corrupção. Podem reestudar as Capitanias Hereditárias, os Governos Gerais, o Rei Pedro I, Pedro II, a Princesa, os primeiros republicanos, o ditador Vargas, que foi citado. Atentai bem, Senador Tasso Jereissati, 15 anos! Ele era um homem tão austero que saiu pela conjuntura nacional, pois fomos defender os países democráticos contra Hitler e Mussolini. Mas deixou o seu Ministro, Dutra, e voltou.

Quando Getúlio saiu, foi para a sua fazenda - para esse PT que rouba descaradamente, vergonhosamente, contra a lei de Deus que diz “não roubarás” -, em São Borja, e não tinha uma geladeira Eletrolux, aquela de querosene. V. Exª não a conhece, porque é novo. O meu avô, que era empresário, como o seu pai foi, tinha três: uma na firma, uma na casa e outra na praia. Getúlio não tinha uma geladeira, em quinze anos de Governo! E, com essa canalhada do PT, é dinheiro que não sei escrever, porque sou médico, e médico sabe pouco dos números. Sou igual ao Palocci. Nós não entendemos. São bilhões! Collor? Não, não se compara. Vamos ser justos! Bem-aventurados os que são justos. Atentai bem! Sobre o Collor também estudei. O apelido do PC era Paulo Gasolina. Ele foi seminarista, trabalhava numa rádio da Diocese. O Bispo desconfiou que os programas eram repetitivos, pois ele deixava o gravador e ia vender e trocar carro. O PC foi coerente, ele queria ser rico. Enquanto nosso livro de cabeceira é a Bíblia, o dele era o de Onassis, o grego, o rico, porque ele queria ser rico. Então, Collor teve a sua carreira política, foi Prefeito biônico, mas nunca o nomeou secretário. Foi Governador? Não. Ele usava o nome. Começou a vender telefone, depois trator. Era tráfico de influência. E, depois, Collor foi Presidente da República, mas nunca o nomeou; PC nunca esteve no Governo. Essa condição, não! A corrupção é uma doença de caráter, da sociedade, e se alastrou do Governo ao Parlamento e ao Poder Judiciário. Essa é a vergonha. Sou cirurgião e acho que isso é um câncer e que temos de usar todos os mecanismos: operação, cobalto, radioterapia. Esta, sim, é uma urgência, uma emergência: punir os maus. É isso o que queremos; é disso que não poderemos abrir mão. Não podemos abrir mão da democracia que construímos. O PT não tem nada a ver com democracia, como tem o meu Partido, o PMDB, que a fez renascer. Não podemos abrir mão da alternância no poder. Aqui foi dito que não se sabia quem seria o próximo Presidente da República, mas o País já sabe: não será do PT!

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

Concedo o aparte ao Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Senador Tasso Jereissati, era indispensável que disséssemos uma palavra para recompor o que foi dito aqui pelo ex-Presidente José Sarney. Melhor seria se tivéssemos dito na mesma hora em que falou o Senador, com esta sala cheia, com este Plenário ocupado, para que não fosse avaliada apenas uma versão, mas duas. Ninguém mais que o Senador Tasso pode, deve e tem autoridade para falar hoje, porque é um democrata, porque bem conhece o ex-Presidente José Sarney e dele é amigo e porque é homem de notável equilíbrio. E equilíbrio é algo que, neste momento, deve ser valorizado. Quanto mais equilibrados formos, quanto mais tranqüilidade tivermos e quanto mais sensatez desenvolvermos, mais chances teremos de contribuir com o País. O discurso do ex-Presidente Sarney poderia ter contribuído com o Brasil. Não contribuiu. Não contribui com o Brasil nenhum discurso que não tenha a sinceridade - é uma questão de sinceridade - de reconhecer que é obra do PT a desconstrução da Esquerda e a desconstrução do PT. Nenhuma outra força externa - muito menos o Sr. Roberto Jefferson e de maneira nenhuma a Oposição - está desconstruindo o PT ou a Esquerda. A obra de desconstrução do PT e da Esquerda é obra do PT e do seu núcleo dominante, é obra do Ministro José Dirceu, que mandava no Governo do Presidente Lula e que continua a inibir o Presidente, porque, quando o Presidente Lula faz um discurso...

(Interrupção do som.)

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - ...como fez semana passada, o País inteiro...

O SR. PRESIDENTE (Sérgio Cabral. PMDB - RJ) - Solicito ao sistema de som que reponha o som para o Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Quando o Presidente Lula fez o discurso na semana passada - em que omitiu, olhou para baixo, olhou para cima, mas não olhou para o povo -, Sua Excelência o fez porque não tem coragem política de se confrontar com o Ministro José Dirceu, que é o núcleo executivo-operativo do seu Partido, ao qual estão subordinados todos esses atores que comprometem a vida nacional. Não nos interessam as sublegendas, os pequenos partidos manipulados por esse sistema corrupto de poder, com um braço de corrupção que o Brasil não conhece, com uma desfaçatez que nunca ninguém viu, com um alcance nunca previsto. Confundir isso com a Esquerda é não respeitar a Esquerda, tantos que morreram na luta popular. Evidentemente, na Esquerda, não se inclui o Senador José Sarney - nunca se incluiu e nem jamais se incluirá. Os da Esquerda de verdade, os que de fato sentem neste momento a grande desconstrução de um trabalho político relevante para o País, que é o trabalho da Esquerda do PT, esses devem estar pensando não como o ex-Presidente Sarney, que não entende disso, devem estar pensando na grande traição feita - não me refiro àquela que o Presidente Lula afirmou, porque não é sincera - ao que o PT disse a vida inteira, na traição aos milhões e milhares que acreditaram nele, que pensavam que o PT vinha para mudar o Brasil, reformar as instituições, instituir novas formas de convivência, valorizar o serviço público e seus funcionários. A luta popular não fez nada disso, entregou-se a um bando. Esses que estão vindo aqui depor não são políticos, são um bando de criminosos. Não têm sequer cara de políticos; têm cara de bandidos. A sociedade está vendo isso todo dia. É gente que não fala nada, que se esconde, que não dá uma palavra. São criminosos de fato. São esses que estão desconstruindo o PT por dentro do Partido e não por fora dele. Por que falar na Oposição? Não inventamos essa crise e nem a alimentamos. Ninguém quer o mandato do Presidente Lula. Que Sua Excelência o tenha, mas que o honre e que faça dele o uso de Presidente e não uso de candidato ou de populista. Esses são os fatos. O ex-Presidente Sarney, com a responsabilidade e a estima que tem entre nós, devia contribuir com uma palavra sincera, direta, contundente, denunciando um fato que compromete não apenas a Esquerda, mas a democracia no Brasil, e que nos leva a um impasse. Estamos todos - a sociedade, as instituições, os Partidos - num impasse, por conta de certo grupo de dentro do PT, que utilizou o Governo da forma mais absurda, mais comprometida, mais corrompida, que nunca ninguém foi capaz de imaginar neste País. Então, temos de dar notícia da nossa indignação. Vamos fazer reforma política. Vamos fazê-la mesmo. Não há o que discutir sobre isso. A apreciação histórica sobre a construção democrática do Brasil é conveniente, mas este momento da vida brasileira não se confunde com a Esquerda, em respeito à Esquerda; não se confunde com o povo, em respeito ao povo; não se confunde sequer com o PT, em respeito ao PT daqueles que se sacrificaram e não ao PT dos que se locupletaram, desses que querem montar um sistema de utilização do poder para levar vantagem própria, porque ninguém sabe onde começa a política e termina o patrimônio ou onde começa o patrimônio e termina a política. Transformar isso numa questão eleitoral de financiamento de campanha é uma fraude insincera. Todo mundo sabe que não é apenas financiamento de campanha. É muito mais: é uma máquina de corrupção, de degradação do sistema político brasileiro, sob a liderança dos que se faziam parecer esquerdistas e petistas, mas que são, na verdade, traidores não do PT, mas da democracia no Brasil. Então, a palavra de V. Exª é muito importante. Ninguém mais do que o Senador Tasso Jereissati para afirmá-la aqui, porque tem uma história de democracia que vai manter, pois tenho a certeza de que é um compromisso coerente que S. Exª não troca por pequenas vantagens.

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE) - Agradeço a V. Exª por sua palavra forte, Senador Sérgio Guerra.

Senador Leonel Pavan, primeiro vou conceder o aparte ao Senador Antonio Carlos Magalhães, que já me havia solicitado, e, em seguida, eu a concederei a V. Exª, para respeitar a ordem de solicitação.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Senador Tasso Jereissati, apesar do meu dever de amizade de mais de 50 anos com o Presidente José Sarney, de quem fui Ministro, posso testemunhar o quanto a Esquerda quis derrubá-lo, coisa que ele passou por cima no seu discurso. Quiseram, inclusive, cortar o seu mandato, coisa de que ele não tratou. Mas é do meu dever dizer que o Presidente Sarney começou muito bem o seu discurso, mas, do meio para o fim, falhou com o Brasil e falhou com ele próprio. O que eu acho grave. Falhou com ele próprio na medida em que não soube contar a verdade sobre os acontecimentos que se desenrolam no Brasil de hoje, em que o Presidente Lula é o responsável, de quem ele tirou toda a responsabilidade, fazendo de Lula, talvez, o grande Presidente do País, coisa que ele nunca pensou, nem pensa. Ele não foi, no caso, sincero. Lamento muito ter que dizer isso a V. Exª, mas entre o meu dever e a minha consciência e agradar ao Presidente Sarney - a quem devo gentilezas muitas e ele me deve muito mais -, posso então falar com essa autoridade com que estou falando, de quem o apoiou por cinco anos, nas suas dificuldades, inclusive levando-me até a um infarto do miocárdio. Portanto, quero dizer a V. Exª que o Presidente Sarney não honrou o seu passado de estadista. O que ele fez de bem na transição para o Presidente Collor, sofrendo tudo, não foi honrado hoje e por circunstâncias que nós sabemos políticas, porque ele não pensa assim, porque, se pensasse assim, não seria o homem respeitado por nós como tem sido até hoje. É nosso amigo, mas nem por isso eu deixaria de dizer que ele falhou com o Brasil hoje dizendo inverdades a respeito do Governo Lula, fazendo crer que é um Governo sério, quando é um Governo desonesto, fazendo crer que Lula não tem responsabilidade, quando ele é o principal responsável. Ele sabe tudo isso e mais alguma coisa, porque temos trocado idéias sobre o momento nacional e ele nunca me falou da maneira como falou hoje desta tribuna, tentando enganar não apenas a nós, mas ao povo brasileiro. Quero aplaudir V. Exª por ter tido a coragem de ir à tribuna, coisa que eu faria, mas, depois de V. Exª, não o faço por desnecessário, mas salientando, mais uma vez, que o procedimento do Presidente Sarney decepcionou aqueles que, como eu, continuam a ter por ele amizade e respeito. 

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Antonio Carlos Magalhães.

Senador Leonel Pavan.

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Senador Tasso Jereissati, ouvimos, hoje, por quase uma hora, o pronunciamento do ex-Presidente Sarney, uma pessoa por nós respeitada, sem que ninguém fizesse aparte. Nós o respeitamos tanto que ninguém fez apartes.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Mas ele não concedeu também.

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Apenas o ouvimos educadamente e com respeito. Quero agradecer ao Senador Sérgio Cabral que preside esta sessão por também nos conceder um tempo mais amplo para podermos contestar algumas das palavras do ex-Presidente José Sarney. Nós o respeitamos, mas queria dizer aos companheiros que a Esquerda não é culpada pelo que está aí hoje. Nós respeitamos a Esquerda, aqueles que tombaram em defesa da democracia. Nós respeitamos aqueles homens e mulheres de luta, de história. Agora, esses que estão cometendo erros não são de Direita nem de Esquerda, são bandidos, são pessoas que não merecem o respeito deste Congresso, não merecem que uma figura como Sarney assuma a tribuna para fazer a defesa desse Governo, que não merece o nosso respeito. Poderíamos aqui recordar algumas palavras de alguns integrantes do núcleo duro e até do próprio Presidente Lula a respeito dele, como, por exemplo, quando disse que não havia homens ou mulheres que pudessem lhe dar lição de ética. Quem é pai da ética, quem ensina ética não precisa pedir desculpas a ninguém. Só pede desculpas quem comete erro. E, se ele pediu desculpas, é porque algum erro ele e o seu Governo cometeram. Não basta apenas pedir ao PT que peça desculpas, porque há muitos filiados do PT que nós respeitamos e que são pessoas sérias e honradas. Não é o PT o culpado, são alguns integrantes do PT e a maioria do núcleo duro do seu Governo. Respeitamos os movimentos populares, e assim tem que ser. Mas quem traiu os movimentos populares foi justamente Lula, o atual Governo. Foi integrante do núcleo duro, Senador Tasso Jereissati, que disse que o PT não rouba e não deixa roubar e depois diz que o PT tem que pedir desculpa ao povo brasileiro. Não fomos nós, da Oposição, não foi V. Exª, Senador Tasso Jereissati, que hoje vem defender aqueles que querem respeito pela Nação, aqueles que condenam a corrupção. Não fomos nós que denunciamos, foram eles, foi a Base do Governo que denunciou a corrupção que aí está e nós apenas...

O SR. PRESIDENTE (Sérgio Cabral. PMDB - RJ) - Senador Leonel Pavan, apenas quero registrar que faltam três minutos para encerrarmos a sessão.

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Infelizmente não usaram esse mesmo...

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª poderia prorrogar a sessão por apenas mais dez minutos.

 O SR. PRESIDENTE (Sérgio Cabral. PMDB - RJ) - A Presidência submete ao Plenário a solicitação verbal do Senador Antonio Carlos Magalhães. (Pausa)

Creio que o Plenário está de acordo.

Está prorrogada a sessão por mais dez minutos.

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Vou concluir até para que os demais possam também usar a palavra e que o próprio Senador Tasso possa encerrar, dizendo que nós, da Oposição, não estamos jogando no “quanto pior, melhor.” Eu me recordo que, no Rio de Janeiro, quando Sarney era Presidente, ele foi apedrejado por esses que estão hoje no poder. Foi apedrejado. E nós não estávamos lá. Nós não, mas esses estavam lá. Apenas quero aqui dizer que nós vamos continuar com a imprensa, que está denunciando, com o Ministério Público, que está denunciando, com a Polícia Federal, que está investigando, e com as CPIs. Se tudo aquilo que foi dito aqui pelo ex-Presidente Sarney for verdade, então que se encerrem as CPIs, parem as investigações e todos nós aqui somos errados. Quem estará certo será o Delúbio, o José Dirceu, o Genoino, o Sílvio Pereira, o Duda Mendonça, o Marcos Valério. Eles estão com a razão. Nós estamos todos errados.

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE) - Muito obrigado.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª só faltou completar dizendo que quem deve hoje desculpas à Nação é o Presidente Sarney.

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE) - Senador Arthur Virgílio.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Senador Tasso, eu sempre visualizei o Presidente Sarney como alguém que poderia dar uma contribuição de enorme qualidade ao Congresso. Eu não via no Presidente Sarney alguém que tivesse que falar todo dia, alguém que tivesse que exercitar, por exemplo, essa faina que tem sido minha, tem sido do Senador José Agripino, de diariamente expor o pensamento médio das nossas Bancadas. Eu sempre imaginei a figura do ex-Presidente pairando acima, além e vindo com a ponderação, com a solução para as crises. Sempre imaginei isso. E confesso a V. Exª que fiquei decepcionado, sim, com o discurso; fiquei decepcionado porque o discurso veio vago, quase que dando uma satisfação ao Presidente Lula do tipo “já que somos aliados, eu preciso dizer alguma coisa.” Não foi convincente, haja vista a figura de nenhum apoio e as figuras de muitas críticas à formulação de S. Exª. E V. Exª, que sempre foi amigo pessoal do Presidente Sarney - e o mesmo se aplica ao Senador Antonio Carlos Magalhães - avulta em razão e avulta em generosidade para com o País quando supera esses detalhes e assume a sua posição política. A primeira coisa, se alguém quer propor algum acordo sério na direção da Nação, na direção das Oposições, a primeira coisa a fazer é reconhecer que se trata de um Governo corrupto. A segunda coisa a fazer é exigir a apuração até o final, de cabo a rabo, da corrupção, que se revela sistêmica nesse Governo. Não é um punguista aqui, um ladrãozinho acolá, um batedor de carteira. Não. É algo sistêmico, e o Presidente Lula teria de ter tido a coragem de admitir que caiu nisso, porque, cada vez que ele finge que não é isso, mais ele cria a figura da suspeição em torno da figura dele, Presidente da República. Ou seja, ele entra num terreno que é suicida ou que já é pré-suicida, com a arrogância que se mistura com o despreparo, que é gigantesco - a arrogância é gigantesca e o despreparo é gigantesco. O Presidente Sarney não tem falado. Quando resolve falar, pensamos: “Puxa vida, agora vem a luz; agora vem o ex-Presidente da República”! Isso me frustra. V. Exª sabe como já apanhei da imprensa! Já li críticas de colegas, artigos de jornal, defendendo a figura do senador vitalício. Sempre imaginei que os ex-Presidentes mereciam lugar na Casa, sem direito a voto - com direito à voz -, precisamente para, nesses momentos de crise extrema, fazerem aqui dentro aquilo que imaginamos que deveria fazer lá fora o tal Conselho da República. Não há redução da estima que tenho pelo Presidente Sarney, mas S. Exª é um colega como os demais, é um Senador sujeito a críticas, como sou sujeito a críticas - aliás, eu as recebo diariamente, milhares delas por ano. S. Exª não está, portanto, acima do bem e do mal. Não colaborou, não ajudou, não resolveu, não avançou, não progrediu, não fez o Brasil avançar, não fez o Brasil progredir com esse discurso. Eu estava ouvindo V. Exª com atenção e, assim que me desvencilhei do encontro que eu estava mantendo, corri para me solidarizar com o discurso de V. Exª, dizendo que esse é o discurso do Líder sereno e esse é o discurso do Líder intransigente em relação aos seus princípios. É preciso mais aparelhamento para enfrentar essa crise. Mais. Desse jeito, não enfrentam. É preciso mais sinceridade por parte de todos aqueles que se perfilam ainda com o Presidente Lula. É preciso mais, muito mais, porque senão não enfrentam e não vencem essa crise, que é de uma voracidade pantagruélica; essa crise é voraz, essa crise é terrível. Vencemos mais um dia, que foi marcado, lá fora, pela presença dos velhinhos da UNE. Aprendemos que o Barbosa Lima Sobrinho poderia ser jovem aos 102 anos e vimos os velhinhos. Outro dia, receberam R$700 mil de dotação, e essas manifestações chapa branca significam aquilo que a jornalista Miriam Leitão, brilhante como sempre, disse: “uma coisa inédita na vida dos protestos: o protesto a favor”! Nunca vi isso. Já vi protesto anárquico, protesto organizado, protesto que deu em confusão, protesto que não deu, mas protesto a favor? “Protesto contra a corrupção, mas Lula, não”! Sabemos que a corrupção é o cerne do Governo que aí está. Pergunto: que capacidade de mobilização demonstraram? É essa a resposta dessa gente para a crise? É essa a resposta? Estão querendo o quê? Que as Oposições se precipitem e marquem um grande ato na Praça da Sé e outro na Cinelândia contra a corrupção para ver onde haverá mais pessoas? Estamos nos recusando a fazer isso, estamos nos recusando a agir desse jeito, porque entendemos que impeachment não é brincadeira, não é uma ida à sorveteria; o impeachment tem de vir da sociedade para o Congresso e não do Congresso para a sociedade. E não basta o meu convencimento de que o Presidente sabe disso, é preciso um fato jurídico incontrastável, que me mostre que o Presidente sabe disso. Aí, sim, fica inevitável o casamento do fato jurídico com a sociedade, e o Congresso é chamado a intervir na direção do impeachment. Fica inevitável, Senador Tasso Jereissati, mas, antes disso, não. Somos - repito pela milésima vez - a mais democrática Oposição que já se fez a um Presidente da República desde 1946. Portanto, só quero parabenizar V. Exª pela atitude que mais me chama a atenção: o fato de V. Exª ter feito um discurso acima da enorme amizade pessoal que tem pelo Presidente Sarney, um discurso pelo País, um discurso de advertência clara. O Presidente Sarney tem muito com que contribuir para a crise acabar, mas é preciso, por exemplo, reformular o discurso; vir com um discurso mais forte, mais sincero, um discurso mais generoso em relação à Nação, um discurso que viria em cima do que V. Exª diz hoje, porque o primeiro não deu certo, o primeiro não convenceu, o primeiro foi uma satisfação para o Planalto. Não deu certo, não convenceu. O de V. Exª é convincente, como foram convincentes os apartes que foram aqui dados e que demonstraram muito claramente que o Congresso está vigilante e, de jeito algum, está engolindo gato por lebre. Parabéns a V. Exª, muito obrigado pelo longo aparte que me concedeu.

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE) - Senador Arthur Virgílio, muito obrigado pelo aparte. Agradeço também ao Presidente Sérgio Cabral pela generosidade do tempo que nos deu para que pudéssemos debater o discurso do Presidente Sarney.

Apenas duas palavrinhas ao encerrar. Quero dizer que, em nenhum momento, estamos aqui diminuindo o imenso afeto, respeito e admiração que temos pelo Presidente Sarney, que continua o mesmo. Mas lembramos ao querido amigo Presidente Sarney, como disse o Senador Arthur Virgílio, que a sorte do Brasil de hoje, da crise de hoje não é ter um Presidente como o Lula, mas ter uma Oposição democrática como a nossa.

Na verdade, lembro ainda que, dentro da reforma política, existe uma outra que vai ser a mais difícil de ser feita, se relembrarmos, Senador César Borges, que toda a campanha do Presidente Lula e do PT foi uma grande mentira pregada à Nação. Se lembrarmos as bandeiras econômicas do PT, verificaremos que elas não têm nada a ver com o Governo do PT; se lembrarmos as bandeiras do PT em relação ao funcionário público, verificaremos que elas não têm nada a ver com o Governo do PT; se lembrarmos as promessas eternas do PT em relação ao salário mínimo, verificaremos que elas não têm nada a ver com o Governo do PT. E o mais triste é lembrarmos a bandeira da ética: este é o Governo que mais abusou da falta de ética na história deste País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/08/2005 - Página 27789