Discurso durante a 136ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre entrevista do Deputado Hélio Bicudo concedida à revista Veja, a respeito da crise política no Brasil.

Autor
Efraim Morais (PFL - Partido da Frente Liberal/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Considerações sobre entrevista do Deputado Hélio Bicudo concedida à revista Veja, a respeito da crise política no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 18/08/2005 - Página 28110
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTREVISTA, HELIO BICUDO, EX-DEPUTADO, JURISTA, FUNDADOR, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ANALISE, CRISE, POLITICA NACIONAL, LEITURA, TRECHO, IMPUTAÇÃO, RESPONSABILIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONHECIMENTO, IRREGULARIDADE, NEGLIGENCIA, PROVIDENCIA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, COMISSÃO EXECUTIVA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), IMPUNIDADE, CORRUPÇÃO, MEMBROS.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em tempos agudos de crise, como os de agora, é natural que a exacerbação dos ânimos e o conflito de interesses gerem excessos verbais e dúvidas a respeito da real dimensão dos problemas.

Em situações como essas, os gregos antigos buscavam a orientação dos oráculos. O Oráculo de Delfos - também chamado de Templo de Apolo - tornou-se por séculos uma espécie de santuário dos governantes da antiguidade greco-romana, onde se buscava a orientação dos sábios e sacerdotes, sobretudo em momentos de crise e de grandes controvérsias políticas.

Não temos hoje nada equivalente, mas, na versão contemporânea, nossos oráculos são aqueles homens de bem e de notório saber, cuja coragem e história de vida os colocam acima de qualquer suspeita. Deles se diz que são a “reserva moral da Nação”.

No início de nossa vida republicana, houve nomes como Rui Barbosa e Joaquim Nabuco. Mais recentemente, podemos citar Barbosa Lima Sobrinho e Sobral Pinto, que, já nonagenários, foram recrutados pela cidadania para se fazerem presentes e darem sua chancela moral à campanha das Diretas-Já e à luta pela redemocratização do País.

Barbosa Lima Sobrinho, aos 95 anos, foi o autor do pedido de impeachment do Presidente Collor. Foi sua a primeira assinatura daquele documento histórico, que propiciou a abertura do processo na Câmara dos Deputados e expressou a indignação cívica da sociedade brasileira.

Hoje, felizmente, apesar de todos os pesares, ainda existem figuras desse porte. Não são muitas, mas são igualmente respeitáveis. Cito aqui uma delas - e quero-me deter em declarações que fez esta semana à revista Veja. Refiro-me ao advogado, jurista, professor e militante histórico da causa dos direitos humanos, o cidadão Hélio Bicudo.

            Dispenso-me de apresentá-lo, visto que não creio que haja um só homem público neste País que não o conheça e não o respeite. Em seu louvor, basta lembrar sua corajosa militância contra o esquadrão da morte em São Paulo, na década dos 60 e 70 do século passado.

Foi ainda, fundador do Partido dos Trabalhadores, no qual militou intensamente, sendo um dos responsáveis pela credibilidade que a bandeira da ética ali adquiriu. Hoje, ele expressa melhor que ninguém o desencanto da sociedade civil diante da sucessão de escândalos que assola a vida pública brasileira.

Nada melhor, pois, neste momento em que o PT está na berlinda, desmoronando como Partido e como paradigma de ética na política, que ouvir o oráculo Hélio Bicudo. Foi com esse ânimo que bebi suas palavras na densa e sincera entrevista que prestou à edição desta semana da revista Veja - muito significativamente intitulada “Lula esconde a sujeira”.

Se alguém, por exemplo, tinha alguma dúvida sobre se o Presidente Lula sabia ou não do que se passava a seu redor, das inúmeras ações predatórias ao Erário que seus auxiliares diretos promoviam, deve meditar sobre essas palavras de Hélio Bicudo:

Lula é um homem centralizador. Sempre foi Presidente de fato do Partido. É impossível que ele não soubesse como os fundos estavam sendo angariados e gastos e quem era o responsável. Não é porque o sujeito é candidato a Presidente que não precisa saber de dinheiro. Pelo contrário. É aí que começa a corrupção.

E ainda disse Hélio Bicudo:

Ele é mestre em esconder a sujeira embaixo do tapete. Sempre agiu dessa forma. Seu pronunciamento de sexta-feira confirma. Lula manteve a postura de que não faz parte disso e não abre espaço para uma discussão pública.

            Sr. Presidente, para que a observação não fique apenas no campo dos adjetivos, Hélio Bicudo relata um acontecimento que presenciou há oito anos e que já antecipava esse traço moral da personalidade do Presidente Lula, como homem público omisso e empenhado em proteger amigos e compadres.

Volto a citar trecho da entrevista de Hélio Bicudo à Veja:

Em 1997, presidi uma comissão de sindicância do PT para apurar denúncia contra o empresário Roberto Teixeira, que estava usando o nome de Lula para obter contratos de prefeituras em São Paulo. A responsabilidade dele ficou claríssima. Foi pedida a instalação de uma comissão de ética, e isso foi deixado de lado por determinação de Lula, porque Roberto Teixeira é compadre dele. O único punido foi o Paulo de Tarso Venceslau, autor da denúncia. Ainda que não existisse necessariamente um crime, havia um problema sério, ético, político, que tinha de ter sido discutido e não foi. Essas coisas todas vão se acumulando e, no final, acontece o que se vê hoje.

A entrevista vale por um ensaio sociológico a respeito do PT e de parte da Esquerda brasileira. Bicudo, numa única frase, resume, por exemplo, o perfil político e moral do ex-Ministro José Dirceu.

Diz dele: “É um homem que luta, sem restrição a meios, pelo poder.”

            Vejam bem, Sr. Presidente, sem restrição a meios! Ou seja, vale tudo - roubar, comprar consciências, corromper -, desde que a causa seja, em tese, boa. Só que - e a história humana é rica em exemplos -, ao se recorrer a meios espúrios em busca de fins nobres, os fins se perdem no horizonte e acaba prevalecendo, como agora, apenas a perversão perpetrada em nome do bem.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PI) - Os fins não justificam os meios, porque pelo errado não se chega ao certo. Basta ver em que deu a Revolução Soviética, que levou à prática aquele princípio maquiavélico.

Hélio Bicudo não hesita em atribuir a Lula a responsabilidade política, que embute um crime de lesa-Constituição, pela disfuncionalidade de seu Governo. Disse, ainda, Hélio Bicudo:

         Ele (Lula) dividiu o Governo como se estivéssemos num sistema parlamentarista. É o chefe do Estado, mas não do Governo. Nisso há, aliás, uma clara violação da Constituição, que é presidencialista. A conseqüência foi o aparelhamento do Estado, um Governo sem projeto e essa tática de alcançar resultados pela corrupção do Congresso Nacional.

Na mesma edição da revista Veja, há outra matéria a respeito do PT, intitulada “A Agonia de um Partido”, cuja leitura recomendo e que mostra o perfil centralizador da direção daquela legenda, que permitiu que uma pequena cúpula agisse à revelia da militância.

Diz a matéria, Sr. Presidente, assinada pelo repórter Marcelo Carneiro, que, para os petistas hoje pegos em flagrante litígio com a lisura, a democracia - assim como a ética - jamais foi um fim em si mesmo, mas apenas um meio de chegar ao poder.

É apenas um recurso estratégico. Usa-se a democracia para, a seguir, acabar com ela.

            Essa armadilha, Srs. Senadores - e os fatos estão ai para demonstrá-lo -, já havia sido acionada internamente no Partido. Na seqüência, não tenho dúvidas, seria usada por envolver o próprio País.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PI) - Nada mais ilustrativo do golpe autoritário imposto pela cúpula petista sobre sua militância que o pranto de alguns de seus parlamentares, semana passada, quando ouviram as revelações bombásticas do marqueteiro Duda Mendonça sobre o financiamento eleitoral espúrio da eleição passada.

Um político como o Senador Aloizio Mercadante, por exemplo, viu-se obrigado a manifestar publicamente seu repúdio a tudo aquilo e a desconhecer o seu próprio Partido.

            Outro petista ilustre, o Senador Cristovam Buarque, ameaça se desligar da legenda e, com certeza, o Brasil inteiro, principalmente o Distrito Federal, esperam um posicionamento firme do Senador.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PI) - No entanto, espantosamente, o grande operador de todo esse processo, o tesoureiro Delúbio Soares, não foi expulso do Partido. E o Sr. Sílvio “Land Rover” Pereira afastou-se por vontade própria. Não foi mandado embora.

Isso equivale, Sr Presidente, a uma confissão de culpa da cúpula do Partido. Fica claro que Delúbio Soares detém uma caixa-preta cujos segredos envolvem gente graúda do Partido nas falcatruas já denunciadas.

A revista Veja atribui a José Dirceu responsabilidade direta na preservação de Delúbio Soares, cujo destino foi discutido na reunião do Diretório Nacional do Partido, dia 6 passado. Dirceu teria barganhado a expulsão de Delúbio por uma mera suspensão de sua filiação...

(Interrupção do som.)

O SR EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Vou concluir, Sr Presidente, com mais três minutos.

Dirceu teria barganhado a expulsão de Delúbio por uma mera suspensão de sua filiação.

Por que esse cuidado, esse zelo, Srªs e Srs. Senadores? Por que o mesmo Dirceu foi sumário e implacável com personalidades respeitáveis como a Senadora Heloísa Helena, cujo único delito era cobrar o cumprimento de princípios programáticos do Partido, e, inversamente, tão zeloso com figuras execráveis, delinqüentes, como Delúbio Soares - essa pergunta é feita por todo o País, e não apenas pela classe política.

A verdade, Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, é que a índole da cúpula do PT e do Governo Lula não é boa. Por essa razão, deixaram de lado figuras históricas e respeitáveis do Partido, como Hélio Bicudo, e optaram por personagens como Delúbio e Sílvio Land Rover.

E aqui reporto-me outra vez às palavras de Hélio Bicudo. Ouçam o seu desabafo, Srs. Senadores:

Se Lula quisesse transformar o sonho petista em realidade, poderia ter se cercado de gente que o ajudaria nisso.

Pessoas como Celso Furtado, Maria da Conceição Tavares, Fábio Konder Comparato, Maria Victoria Benevides, Paulo Nogueira Batista Junior trabalharam no programa e foram depois pura e simplesmente deixadas de lado. Foi uma escolha. Que continua. Em vez de buscar as pessoas autênticas, que comungam do ideal que acho que ainda é dele também, Lula se reúne com o Chávez. Para quê?

Bicudo, por modéstia, não cita a si próprio, mas não deixa de registrar que, antes da posse, Lula, sem que ele lhe pedisse coisa alguma, lhe prometera uma posição no Governo. Para sua surpresa, o que lhe ofereceram não era uma missão, mas uma mordomia.

O emissário do Ministro Celso Amorim, segundo seu relato, ofereceu-lhe uma vaga de conselheiro da Unesco, frisando que se tratava de um cargo “formidável”, com direito a três viagens anuais a Paris. Não sabia com quem estava falando. Bicudo, que é de outra estirpe, ficou de fora, observando e acompanhando, dia a dia, o fenecer de um belo sonho.

Vou concluir, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, suas palavras, palavras de Hélio Bicudo refletem o nosso desencanto. Mas, seu exemplo de luta, sua história devem nos animar a reagir e a recuperar a esperança - ou a aprender a lição do Deputado Fernando Gabeira: a de sonhar desta vez o sonho certo.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/08/2005 - Página 28110