Pronunciamento de Eduardo Azeredo em 18/08/2005
Discurso durante a 137ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Reflexão sobre fato relevante ocorrido no último dia 29, que foi a entrega do Anteprojeto de Reforma Universitária ao Presidente da República.
- Autor
- Eduardo Azeredo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
- Nome completo: Eduardo Brandão de Azeredo
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
EDUCAÇÃO.:
- Reflexão sobre fato relevante ocorrido no último dia 29, que foi a entrega do Anteprojeto de Reforma Universitária ao Presidente da República.
- Aparteantes
- Mão Santa.
- Publicação
- Publicação no DSF de 19/08/2005 - Página 28348
- Assunto
- Outros > EDUCAÇÃO.
- Indexação
-
- IMPORTANCIA, ENCAMINHAMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ANTEPROJETO, REFORMA UNIVERSITARIA, AUTORIA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC).
- CRITICA, DEMORA, GOVERNO FEDERAL, ELABORAÇÃO, REFORMA UNIVERSITARIA, NECESSIDADE, CONGRESSISTA, DISCUSSÃO, APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, ANTEPROJETO, ANTERIORIDADE, TRAMITAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBJETIVO, AGILIZAÇÃO, DECISÃO, EXECUTIVO, REMESSA, MATERIA, APRECIAÇÃO, LEGISLATIVO.
- ELOGIO, CONDUTA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), ACEITAÇÃO, DIVERSIDADE, SUGESTÃO, REFORMA UNIVERSITARIA.
- CRITICA, DESEQUILIBRIO, ANTEPROJETO, PRIORIDADE, ENSINO SUPERIOR, DESTINAÇÃO, MAIORIA, VERBA, ORÇAMENTO, EDUCAÇÃO, INVESTIMENTO, ENSINO PUBLICO, NIVEL SUPERIOR, PREJUIZO, ENSINO FUNDAMENTAL, ENSINO SECUNDARIO.
- IMPORTANCIA, INSTITUIÇÃO PARTICULAR, ENSINO SUPERIOR, CONTRIBUIÇÃO, EXPANSÃO, SISTEMA DE ENSINO, NIVEL SUPERIOR.
- NECESSIDADE, VALORIZAÇÃO, EDUCAÇÃO BASICA.
O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no última dia 29, ocorreu um fato relevante que não pode permanecer despercebido em meio às turbulências da atual crise política. Refiro-me à entrega do anteprojeto da reforma universitária ao Presidente da República, feita pelo então Ministro da Educação às vésperas de sair do cargo para assumir a presidência nacional do Partido dos Trabalhadores.
Trata-se ainda, obviamente, apenas de um esboço de proposição que o Executivo enviará no futuro ao Congresso Nacional. Mas exatamente por essa razão é que desejo trazer o assunto à reflexão desta Casa.
Meu objetivo não é o de, a priori, levantar objeções e criar resistências à reforma concebida pelo Governo. Mas, sim, o de alertar para o fato de que matéria dessa natureza, importância e implicação precisa logo ser avaliada por todos nós congressistas.
Uma vez que já existe um anteprojeto e, portanto, uma base concreta para discussão preliminar, considero que é chegado o instante de fazê-la, mesmo porque este é o momento adequado para fazermos sugestões básicas de mérito que possam ser eventualmente incorporadas a tempo na futura proposição de lei que o Governo irá formular. Assim, estaremos evitando novos atrasos no envio da matéria pelo Executivo e na sua apreciação pelo Congresso.
Aliás, o primeiro ponto para o qual chamo a atenção dos nobres Senadores é precisamente o da lentidão do Governo em concluir sua formulação sobre a reforma. É natural que as discussões, por se referirem a assunto tão complexo, sejam demoradas. Mas já passou tempo mais que suficiente para encerrá-las no âmbito do Executivo.
Quem avalia assim são muitos dos especialistas e representantes de entidades universitárias que, em fases anteriores, debateram a matéria. Agora está na hora é de o Governo ouvir as últimas sugestões e recomendações, bater o martelo e remeter a proposição para apreciação do Congresso.
Se o Governo permanece paralisado e não faz logo isso que precisa fazer - como parece ser o caso - ele está apenas demonstrando mais uma vez sua crônica dificuldade em decidir! Ou então perdeu o norte da questão, ao perceber, durante o próprio debate preliminar sobre o assunto, as sérias resistências que, com toda justiça, se levantaram contra a reforma que o Ministério da Educação e o Planalto planejavam realizar.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o fato foi que o propósito inicial do Governo na reforma universitária era o de praticamente engessar o sistema de ensino superior brasileiro e o livre exercício da inteligência nas formas pré-fabricadas de muitos dos conceitos ultrapassados sobre o Estado e a sociedade. Em vez da autêntica autonomia, pretendia-se impor à universidade brasileira os parâmetros de organização e funcionamento típicos do centralismo autoritário.
De outro lado, ao arremeter-se, preconceituosa e duramente, contra o ensino superior de instituições universitárias, comunitárias e privadas, a reforma preconizada no início igualmente não só restringia liberdades garantidas pela Constituição, mas também ignorava dogmaticamente a realidade atual da educação universitária no Brasil.
Em nome de supostos princípios de democracia social e de independência e soberania nacionais, o que o Governo chegou a pretender foi transformar o ensino universitário em matriz de reprodução de dogmas e valores ideológicos e partidários, ou seja, em usina de formação de quadros que pensassem com os mesmos clichês do pensamento oficial, que então tinha hegemonia no próprio Palácio do Planalto.
Contra esse propósito essencialmente ideológico, fez muito bem ao futuro do País a forte resistência que opuseram a tais concepções de reforma diversas lideranças sobejamente experientes nas lidas universitárias. Elas rejeitaram a perda de autonomia, o populismo das facilidades de acesso à universidade pública e o preconceito contra a participação da iniciativa privada no ensino superior.
Verdade e justiça sejam feitas, o então Ministro da Educação, mesmo contrariado em suas concepções próprias, recuou em pontos cruciais e não bateu o pé nas idéias que o Governo tinha para reformar a universidade.
Com isso, aqueles que se opunham a elas também puderam dar sua contribuição, e dela resultou o anteprojeto entregue ao Presidente da República no dia 29 de julho: uma formulação, sem dúvida alguma, muito superior às anteriores, mas que ainda peca por certos equívocos básicos.
Dentre eles, o mais grave é o que envolve a distorção da realidade da educação no Brasil. A reforma universitária fez uma opção quase radical pela priorização do ensino superior. Destina-lhe - vejam só! - o mínimo de 75% da receita constitucional federal vinculada à área da educação pública, que por sua vez representa 18% do Orçamento Geral da União, já deduzido o percentual da DRU.
Ora, em que pese a boa intenção de se promover ensino universitário gratuito e de qualidade para todos os brasileiros que concluem o ensino de segundo grau, trata-se de uma dotação orçamentária que beira o delírio.
Seria maravilhoso que a realidade do País fosse outra e que pudéssemos contar com esse “mínimo” de recursos somente para a universidade pública. Infelizmente, não é assim, pois 75% dos 18% da educação é muito. No caso, além de ser algo delirante, a destinação ao ensino superior de “pelo menos” 75% da receita orçamentária federal efetua, na prática, uma inversão de prioridade no sistema educacional brasileiro.
A base, que é o ensino de primeiro e segundo graus, vai contar com que recursos financeiros para atender os milhões de crianças e jovens que demandam a escola fundamental e a secundária?
Como projetar uma universidade criativa e dinâmica, geradora e produtora de conhecimentos acadêmicos, científicos e tecnológicos, se não se assegurar, antes, que a ela cheguem estudantes bem preparados e talentosos?
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é o óbvio ululante que a boa universidade é resultado também de uma boa e anterior escola fundamental e secundária, em que a formação lança alicerces não só da instrução formal, mas também de ensinamentos basilares para o desenvolvimento da personalidade do estudante.
Negar esse pressuposto significa colocar o carro na frente dos bois. Entretanto, há quem o faça até oficialmente, pois o próprio Ministério da Educação explicita que “algumas instituições internacionais” é que defendem ser a educação básica “uma preocupação exclusiva”.
Essa afirmação nos parece ser, na verdade, uma contrafação que visa politizar, de forma ideológica primária, a abordagem da questão do ensino no nosso País.
Muito dificilmente existirá - se é que existe - qualquer “instituição internacional”, mesmo supostamente mal intencionada em relação ao Brasil, que sustente a priorização exclusiva do ensino de primeiro e segundo graus.
Por outro lado, ninguém de bom senso neste País pode ignorar que o ensino superior deva receber aportes cada vez maiores de recursos para se desenvolver cada vez mais e alcançar níveis capazes de agregar valor ao esforço nacional pelo crescimento auto-sustentado.
Não se trata, pois, nem de oito nem de oitenta.
Num país ainda carente do atendimento de necessidades básicas como o nosso, o ensino fundamental e secundário têm tanta prioridade quanto o ensino universitário.
Logo, o desafio é alocar os recursos públicos, que são limitados, nas duas pontas do processo, para que tenham a melhor relação possível de custo/benefício e façam desenvolver todo o sistema educacional brasileiro.
Em suma, a prioridade não deve ser em favor de um nível de ensino em detrimento de outro. A prioridade deve ser na educação como conjunto e processo. Se, a exemplo do que fez a Coréia do Sul, o Brasil efetivamente também priorizar o ensino como um todo, logicamente teremos, aí sim, uma Nação fortalecida e com grande futuro.
Falo, Srªs e Srs. Senadores, com muita credibilidade nesta questão, porque, como Governador de Minas Gerais, fiz investimento recorde na educação, chegando a 45% do orçamento do Estado.
O anteprojeto da reforma universitária contém avanços resultantes da contribuição daqueles que viram a tempo suas distorções de ordem conceitual e ideológica.
Entre os pontos em que se progrediu, pode-se citar, por exemplo, a adoção de mecanismos regulatórios que permitam à União padronizar e articular melhor a avaliação e o credenciamento de escolas e cursos universitários. Tais dispositivos certamente levarão à crescente melhoria da qualidade do ensino, principalmente em escolas privadas.
Porém, antes mesmo que a discutamos quando chegar ao Congresso, temos o dever de advertir que a boa reforma não pode ser descontextualizada da realidade e da limitação de recursos orçamentários da União e dos Estados. Tampouco pode permitir que persistam traços de preconceito contra o concurso da escola privada na expansão e desenvolvimento do ensino superior, de que participa com o expressivo percentual de mais de 70% das matrículas.
Claro que esse é um percentual elevado, e a universidade pública precisa contrabalançá-lo, não por voluntarismo ou passe de mágica, mas por uma estratégia de longo prazo e de disponibilidade efetiva de recursos.
Recentemente pudemos aprovar no Senado algumas novas universidades, como as do Vale do Jequitinhonha e do Vale do Mucuri, na cidade de Diamantina, a universidade do sul de Minas, em Alfenas. Houve também a aprovação, na Comissão, da Universidade do Vale do Rio Doce, na cidade de Governador Valadares, além da Universidade de Uberaba, que sucede a Faculdade de Medicina.
Na base das demandas educacionais brasileiras, conforme demonstra a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio de 2002, 97% das crianças e jovens entre 7 e 14 anos estão matriculados no ensino fundamental. Contudo, quase 12% de brasileiros com 16 anos ou mais ainda não sabem ler ou escrever. Dez anos atrás, o contingente de analfabetos nessa faixa etária era 30% maior. Isso evidencia o grande salto ocorrido na educação básica brasileira - não há como negar esse fato - e, ao mesmo tempo, ressalta que temos de continuar avançando na educação básica não apenas em termos quantitativos, mas também em qualitativos.
Ora, a própria instituição do Fundo de Educação Básica, o Fundeb, já constitui um desafio enorme, sobre o qual também alertei em pronunciamento que fiz desta tribuna no dia 11 de maio último.
O propósito do Fundeb é estabelecer parâmetros obrigatórios de dotação de verbas federais e, ao longo de dez anos, aplicar no sistema nacional de educação pública mais de R$32 bilhões - quase US$13 bilhões.
Na ocasião, destaquei as dúvidas que o novo Fundo provocou pelo fato de o Ministro Antonio Palocci ter apontado que o Governo Federal poderia não vir a dispor de cerca de R$4,3 bilhões ao ano para repassar a Estados e municípios com o objetivo de custear o ensino pré-escolar, o fundamental e o médio - todos incluídos agora no Fundeb.
O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Eduardo Azeredo, concede-me V. Exª um aparte?
O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG) - Com muita honra, concedo o aparte ao nobre Senador Mão Santa, já me encaminhando para o fim, Sr. Presidente.
O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Azeredo, o pronunciamento de V. Exª é muito oportuno, mas vejo perspectiva muito sombria na educação, principalmente na universitária. Lembro-me, quando eu era prefeitinho no Piauí, de ter sido convidado a ir à Alemanha por uma multinacional, a Merck Darmstadt. Quem me acompanhava era um diretor químico. Em todo lugar que ele entrava, para facilitar as coisas, o trânsito, restaurante, teatro, chamava-se Professor Basedol. Indaguei: “Mas o senhor não é diretor químico de uma das maiores potências, a Merck Darmstadt”? Ele disse: “É, mas professor é o título mais importante na Alemanha, mais honrado. Então, prefiro usá-lo. Eu sei que sou diretor químico, tenho muito dinheiro, mas, antes de ser diretor da Merck, eu era professor em Heidelberg. Para poder continuar usando o título, eu dou uma aula por semana, gratuitamente”. Olha a desgraça que ocorre no Brasil: o Poder Judiciário conseguiu amarrar o seu aumento salarial para R$27 mil, para o ano. Um professor universitário em Minas, no Piauí, ganha R$1 mil. Então, as melhores inteligências não vão se dedicar à educação e à pesquisa; vão buscar as vantagens salariais que somente o Poder Judiciário está tendo, neste momento de injustiça que sofremos no Governo do PT.
O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG) - Obrigado, Senador Mão Santa.
O meu pronunciamento é exatamente no sentido da importância da educação em todos os seus níveis: primário, básico, segundo grau e universitário.
Considero pertinente, portanto, que esta Casa faça uma análise da reforma universitária em vista das limitações dos recursos públicos.
Sonhar sempre é bom, mas, quando o sonho vira devaneio e quimera, pode-se jogar por terra tudo de bom que foi legado no sistema educacional brasileiro por governos anteriores, inclusive o do meu Partido, o PSDB.
Ou seja, em vez de termos uma ótima universidade no futuro, corremos o risco, por inadequação com o princípio de realidade, de não contarmos mais nem com o que ainda há de bom no conjunto do sistema educacional.
Esse é o alerta que quero registrar hoje, enfatizando mais uma vez que o meu Partido e a Oposição não se eximirão de discutir com isenção e grandeza um assunto de tamanha importância para o Brasil e, especialmente, para as futuras gerações. A educação precisa sempre da nossa atenção.
Muito obrigado, Sr. Presidente.