Discurso durante a 137ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o artigo intitulado "Autocorrupção", publicado na revista Saúde em Primeira Página.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA.:
  • Considerações sobre o artigo intitulado "Autocorrupção", publicado na revista Saúde em Primeira Página.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/2005 - Página 28372
Assunto
Outros > IMPRENSA.
Indexação
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, ANALISE, PSICOLOGIA, ORIGEM, CORRUPÇÃO, VIDA HUMANA, CONTESTAÇÃO, CONCEITO, CORRUPÇÃO PASSIVA, EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS, INDUÇÃO, PESSOAS, IRREGULARIDADE, CONDUTA, ESCLARECIMENTOS, RESPONSABILIDADE, CO AUTORIA, TRANSAÇÃO ILICITA, OPINIÃO, ESCOLHA, DECISÃO, CARATER PESSOAL.
  • INFLUENCIA, DESENVOLVIMENTO, SOCIEDADE, CALUNIA, DISCRIMINAÇÃO, AUSENCIA, ETICA, CONDUTA, NECESSIDADE, VALORIZAÇÃO, JUSTIÇA, VERDADE, ATUALIDADE, CRISE, POLITICA NACIONAL.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o momento político que o nosso país vive atualmente, com todas as suas atribulações, reviravoltas e lances cinematográficos, coloca-nos diante da inegável tentação de limitarmos nossa análise e nossos comentários ao campo restrito dos fatos imediatos.

Contudo, é sempre saudável dar um passo para trás e, assim, usufruir uma perspectiva mais larga, buscando conceitualizar o presente num quadro mais amplo e, conseqüentemente, mais instrutivo.

A ocorrência diária e freqüente do termo corrupção e seus derivados, aliada à leitura de um artigo publicado recentemente na revista Saúde Em Primeira Página, levou-me às reflexões que passo a compartilhar com V. Exªs.

Uma frase, em particular, desse artigo chamou minha atenção: “Não há corrupção sem antes haver um processo de autocorrupção”. A corrupção não é um ente impessoal e atemporal: antes de tudo, ela é subjetiva, personalíssima e suas origens podem ser rastreadas no íntimo do ser humano. Poderíamos dizer que não existe corrupção, mas CORRUPTOS.

Prosseguindo na reflexão, inevitavelmente nos perguntamos: o que leva alguém a se corromper, a adotar a mentira como modus operandi, na busca de vantagens pessoais a qualquer custo?

Não existem corruptos de nascença. Eles são forjados pelos valores nocivos com os quais tomam contato ao longo da sua vida - no ambiente familiar, na escola, no trabalho, na mídia, na sociedade em geral.

O mero contato com esses valores, contudo, não é suficiente para que uma pessoa se corrompa. Do contrário, teríamos uma sociedade constituída tão-somente de corruptos, pois, inevitavelmente, em algum momento, seremos expostos a valores questionáveis. Uma combinação complexa de fatores subjetivos e sociais é que determina qual será a escala de valores deste ou daquele indivíduo.

A razão, por sua vez, é uma moeda com dois lados bem distintos. Ao mesmo tempo em que ajudou o homem a produzir idéias e máquinas que elevaram sua capacidade de alterar a natureza em grau espantoso, o pensamento racional, por meio de uma série de distorções, também forneceu ao ser humano pretextos para a prática da mentira, da calúnia, do preconceito.

Essas questões são alvo da reflexão humana desde sempre. Na Grécia Antiga, berço da civilização ocidental, os valores e sua corrupção foram objeto da análise dos maiores filósofos do período, como Sócrates, Platão e Aristóteles. Cada um à sua maneira, eles pensaram exaustivamente sobre questões cruciais como justiça e verdade.

Uma vida pública e um ambiente político em que justiça e verdade não prevaleçam é completamente inviável. A confiança na veracidade do que o outro diz é fundamental para a vida em sociedade, em especial no ambiente da política. Da mesma forma, não pode prosperar uma sociedade em que a justiça não seja eficaz, em que não se punam os infratores, em que as regras sejam a impunidade e a permissividade.

JUSTIÇA E VERDADE: eis os dois valores que gostaria de ver respeitados e exercitados ao longo da presente crise política. Em sua Ética a Nicômaco, Aristóteles, confrontando o seu apreço a Platão com seu respeito à verdade, afirma claramente sua opção: “embora ambos nos sejam caros, o dever moral nos impõe preferir a verdade”. A busca Da verdade deve nortear as ações daqueles que investigam as denúncias de corrupção deste Governo e de qualquer outro. Esse é o valor que diferencia a investigação séria do mero jogo de cena.

Luigi Einaudi, célebre político italiano, dizia que “a justiça não existe onde não há liberdade”. Conquistamos a liberdade política, e a administração da nossa justiça avançou muito nos últimos anos. Apresenta-se perante nossos juízes - e não me refiro aqui apenas aos magistrados do Poder Judiciário, mas também aos Parlamentares que, em circunstâncias especiais, como as que estamos atravessando, também assumem essa função - apresenta-se perante nossos juízes, eu dizia, mais uma oportunidade de fazer avançar o exercício do direito em nosso País. A imagem do Brasil como o país da impunidade, aos poucos, vem deixando de corresponder à realidade. A punição dos culpados e a absolvição dos inocentes...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mozarildo...

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - ...no presente contexto, pelo relevo das partes envolvidas, será uma demonstração clara e inequívoca da maturidade do nosso sistema jurídico.

Concedo a palavra a V. Exª.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador, V. Exª traz um pronunciamento de grande importância para o momento atual, combatendo o grande mal, que é a corrupção, mas é bom relembrar - infeliz do país que não precisa buscar outros pensadores -, aqui mesmo, é bom revivermos Rui Barbosa, quando diz: “a justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Agradeço o aparte de V. Exª, como o qual concordo em grande parte. Realmente, Senador Mão Santa, quando aquele que busca a justiça tem de esperar demasiado por ela, ele realmente se sente injustiçado, mesmo que ainda abrace aquela idéia de que justiça é boa mesmo que tardia.

Este momento, em que debatemos essas questões no Brasil todo, em que o Poder Judiciário está debruçado sobre a apuração de corrupção, bem como o Ministério Público, as CPIs e as CPMIs do Congresso, é um momento muito sério e muito importante. Precisamos chamar a atenção da sociedade para esses valores que, como já disse no início, começam dentro de casa, continuam nas escolas, permeiam o nosso ambiente de trabalho e, portanto, fazem parte da nossa estrutura, do nosso caráter. Não se pode raciocinar com o “se todo mundo faz, nós também podemos fazer”, nem podemos justificar o erro de hoje com o erro do passado.

Quero finalizar dizendo, Sr. Presidente, que um ambiente social justo e indivíduos moralmente corretos são duas instâncias que se favorecem mutuamente. Uma pessoa que viva em uma sociedade na qual a verdade venha à tona e os corruptos sejam punidos será menos estimulada a se autocorromper. Isso, combinado com uma educação adequada e uma justa distribuição de renda e de oportunidades, proporcionará, com certeza, o surgimento de um país de cidadãos e cidadãs justos e honestos.

Que a crise atual represente o início de um período de mais reflexão, mais justiça e mais verdade, e simbolize um golpe forte na corrupção, principalmente na autocorrupção.

Peço, Sr. Presidente, que faça parte do meu pronunciamento a transcrição, na íntegra, deste artigo intitulado “Autocorrupção”, publicado na revista Saúde em Primeira Página.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e o § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria Referida:

“Autocorrupção”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/2005 - Página 28372