Discurso durante a 138ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Denúncias do Sr. Rogério Buratti ao Ministério Público de São Paulo, envolvendo o Ministro Antonio Palocci. Considerações sobre a corrupção no Governo Lula.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Denúncias do Sr. Rogério Buratti ao Ministério Público de São Paulo, envolvendo o Ministro Antonio Palocci. Considerações sobre a corrupção no Governo Lula.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 20/08/2005 - Página 28508
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), DENUNCIA, RECEBIMENTO, PROPINA, PERIODO, ATUAÇÃO, PREFEITO, MUNICIPIO, RIBEIRÃO PRETO (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • ANALISE, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ACUSAÇÃO, CRIME ORGANIZADO, DEFESA, CONHECIMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, IRREGULARIDADE, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, DESVIO, FUNDOS PUBLICOS, DEFESA, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, BENEFICIO, SOCIEDADE, ECONOMIA NACIONAL.
  • COMENTARIO, AUSENCIA, AUTORIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DIREÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ESCLARECIMENTOS, RESPONSABILIDADE, OPINIÃO PUBLICA, PEDIDO, IMPEACHMENT.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sexta-feira é o dia adequado para o balanço nesta fase de investigação, que tem por objetivo promover no mundo político brasileiro uma assepsia geral.

Nesta sexta-feira, um fato novo surpreende: as denúncias do Sr. Buratti ao Ministério Público, no Estado de São Paulo, na cidade de Ribeirão Preto, denúncias que atingem de forma frontal o Ministro Palocci. E o depoimento do Sr. Buratti se deu através de negociação com vistas ao benefício da delação premiada. Todos nós sabemos que a lei impõe resultados para que uma contribuição positiva possa ensejar a concessão dos benefícios. É evidente que, se a exigência é resultado, só pode ser reconhecida como válida para adoção dos procedimentos que atenuam eventuais penas.

Dessa forma, o Sr. Buratti deve ter provas ao denunciar o Ministro Palocci de receber R$50 mil por mês, quando Prefeito de Ribeirão Preto, da empresa Leão e Leão, como propina capaz de assegurar a manutenção do contrato. Esses recursos seriam, segundo Buratti, repassados ao tesoureiro nacional do PT, Sr. Delúbio Soares.

Se existem provas - e certamente o Sr. Buratti não faria um depoimento sem provas para obter os benefícios da legislação em face da delação premiada -, obviamente fica insustentável a situação do Ministro Palocci no Governo. Deixa o Governo prostrado, na condição de pato baleado, cambaleante, conforme a expressão inglesa lame duck. Creio que essa expressão desenha bem a situação atual do Governo brasileiro e, especialmente, a do Presidente Lula.

O que se configura é da maior gravidade. Esse modelo de corrupção não é novo. Houve um aprendizado anterior: Ribeirão Preto, Santo André. Os promotores públicos de São Paulo já denunciaram que o modelo de Santo André foi transportado para Brasília. Imagino, Senadora Heloísa Helena, que houve aqui, na Capital, o aprimoramento desse modelo de corrupção, a sua modernização para a implantação dessa rede sistêmica e organizada de corrupção no Governo Federal. Sem dúvida, estamos diante do maior escândalo de corrupção da história do nosso País.

E eu vejo, Senador Mão Santa, alguns teimarem em isentar aqueles que, a meu ver, são os principais responsáveis; especialmente há uma preocupação em isentar o Presidente da República. Creio que não temos mais esse direito. É claro que se admite alguém declarar: “Não concordo com o impeachment do Presidente Lula, porque o impeachment é traumático, porque não temos uma solução adequada na linha de sucessão”. Mas afirmar que não temos razões, que o Presidente não sabia de nada, não participou de nada?! Ora, isso agride a inteligência, subestima a capacidade de interpretar fatos políticos da população brasileira!

Não há como isentar o Presidente da República de responsabilidades, como neste momento o Ministro Palocci é chamado também à responsabilidade e tem o dever de se apresentar diante da sociedade para esclarecer os fatos a ele imputados, que são da maior gravidade. Não podemos, a pretexto de blindar a economia, poupar quem quer que seja em nome do futuro deste País.

Ora, o que contamina a economia não é a investigação da corrupção, não é o combate implacável a ele, não é o ato de colocar à luz a corrupção para que possa ser denunciada, combatida e condenada. O que contamina a economia é a corrupção, e não o seu combate e a sua investigação. A corrupção, sim, é responsável pelos males econômicos e sociais que atormentam o nosso País há tanto tempo, não a única, mas certamente a principal responsável.

Srª Presidente, Srs. Senadores, já há claramente um desenho desse modelo de corrupção. Tenho a convicção arraigada, sincera, nestes dias de investigação, de depoimentos e análises de documentos, de que o dinheiro público foi utilizado fartamente no abastecimento desse esquema que tinha por objetivo a arquitetura de um projeto de poder de longo prazo, onde o Presidente Lula seria o principal beneficiado.

Não tenho dúvida, Senador Mão Santa - concederei em seguida o aparte a V. Exª -, que os recursos públicos foram subtraídos, sim, dos impostos pagos com tanto sacrifício pelo povo deste País, razão direta da pesadíssima carga tributária adotada no Brasil, uma das maiores do mundo.

Esses recursos foram subtraídos por meio de contratos superfaturados, de aditivos concedidos por interesse político, muitos dos quais excedendo as limitações impostas pela legislação vigente no País. Ainda hoje pela manhã, na TV Bandeirantes, o Sr. Maurício Marinho afirmava que tomou conhecimento de um aditivo no contrato do Sr. Marcos Valério com os Correios da ordem de R$20 milhões - de R$70 milhões para R$90 milhões -, por indicação política, sendo que R$10 milhões destinados a eventos não identificados.

De que natureza seriam esses eventos? Seriam os eventos que estamos revelando na CPI dos Correios, às portas do Banco Rural, com assessores de Parlamentares sacando na boca do caixa recursos supostamente destinados ao pagamento da conta do mensalão? Seriam esses os eventos? Contratos superfaturados, licitações fraudadas, privilégios concedidos a determinada instituição financeira, especialmente o Banco Rural, para empréstimos supostamente concedidos - a meu ver, apenas operações contábeis, portanto, empréstimos fictícios, utópicos -, para justificar o repasse do dinheiro público oriundo desses contratos superfaturados em todas as áreas do Governo? Ou seriam empréstimos garantidos por depósitos de somas extremamente significativas de fundos de pensão, contas do INSS, enfim, contas públicas, de valores vultosos, que justificariam os empréstimos, realizados ou não, conferindo o funding necessário para a concessão de empréstimos, já que o Banco Rural, por exemplo, não teria o funding necessário para a concessão de empréstimos tão vultosos? Recursos públicos repassados através de operações bancárias espúrias, desonestas, decorrentes de uma associação promíscua de agências de publicidade, empresas do Sr. Marcos Valério com o Banco Rural e agentes da política instalados no Governo e fora dele e nos partidos políticos - portanto, uma associação promíscua do Governo, de alguns partidos, alguns políticos e alguns empresários. Operações internas, ou seja, no âmbito do País, e operações internacionais, tendo em vista o repasse de recursos que tinham origem nas empresas do Sr. Marcos Valério, através do Banco Rural, utilizando-se de empresas fantasmas, como a Garanhuns, em São Paulo, que tem matriz em Montevidéu, a Export Trading. É claro, evasão de divisas, crime, por intermédio da Beacon Hill ou MTB Bank, com destino de contas em agências bancárias em vários paraísos fiscais. Um caminho ou um descaminho para o dinheiro público. Um descaminho para a subtração de recursos públicos que são sonegados à saúde, à educação, à geração de empregos, ao desenvolvimento econômico do nosso País. Este é o modelo de corrupção implantado, que teve origem em alguns municípios paulistas, como já se configura em Ribeirão Preto e em Santo André, e que, naturalmente, com o aperfeiçoamento alcançado em Brasília, instalou-se no Governo da República, para escândalo nacional e indignação de todo o povo brasileiro, exigindo responsabilidade pública na apuração dos fatos e, sobretudo, na condenação dos envolvidos.

Concedo ao Senador Mão Santa, com prazer, o aparte.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Estou atentamente ouvindo o seu contundente pronunciamento. É por essa razão que V. Exª ganha todas as pesquisas para Governador e Senador no Estado do Paraná. Eu não sei por que o seu Partido não pensa em seu nome; fica naquela antiga política café com leite e não busca um homem do Paraná como candidato a Presidente. Mas V. Exª, que é muito mais culto que eu, muito mais preparado, já deve ter lido...

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Bondade de V. Exª.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - ...todas as obras de Shakespeare. Eu buscaria aquela que tem até um nome muito oportuno, Senadora Heloísa Helena: Rei Lear. Rei Lear, rei Lula, é assim mesmo. Hamlet diz o seguinte: “Há algo de podre no Reino da Dinamarca.” Vai mais adiante, Senador Paulo Paim, diz que “é melhor ser um mendigo em Nápoles do que rei na Dinamarca”. Eu fico a pensar como faria Shakespeare se fosse descrever o reino de Lula. Mas já que Lula não gosta mesmo de ler, eu lembraria apenas quando o mesmo Shakespeare escreve Júlio César, Senadora Heloísa Helena. É muito oportuno: o povo. O Lula pensou que aquele povo da Esplanada era dele; pensou que ele era dono do povo. Júlio César, no Senado, diz “Até tu, Brutus!” e morre. Brutus é ovacionado porque disse que ia acabar com o imposto. Vem Marco Antonio, faz as exéquias, e de repente o povo que estava com Brutus volta-se contra ele, que sai pelo fundo. Assim é a história. Então, a história se repete. Ó, Lula, ainda há tempo! Não saia pelo fundo, expulso pelo povo brasileiro. Tenha esses instantes de oportunidade e busque a verdade que nos levou a elegê-lo Presidente da República.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Senador Mão Santa, aprendo muito com V. Exª, com a sua simplicidade. Aliás, sabedoria não é sofisticação; a sabedoria está realmente na simplicidade. E as lições da história que V. Exª busca sempre para nos orientar se constituem num aprendizado de cada dia aqui no Congresso Nacional. Agradeço a generosidade de sempre de V. Exª.

Para finalizar este pronunciamento modesto, Sr. Presidente, afirmo que evidentemente tenho que respeitar a convicção pessoal de cada um, mas não posso deixar de, com absoluta sinceridade, expor o que penso: o Presidente da República hoje não tem autoridade moral para conduzir os destinos do País, ele está contaminado pelo escândalo de corrupção de forma definitiva. Isso não nos leva a propor irresponsavelmente o impeachment, porque não nos cabe. Cabe-nos julgar a conveniência do impeachment se ele for requerido pela sociedade brasileira, por meio de suas representações adequadas. Impeachment - é bom insistir sempre - é exigência nacional. Esta é a condição indispensável. Impeachment só se admite quando há clamor popular irrecusável. Portanto, nós não estamos propondo impeachment porque não nos cabe propor. Cabe, sim, à população brasileira. Isso não nos tira o dever de enunciar a nossa opinião sobre a presença do Presidente da República neste episódio. Desde o primeiro momento tenho insistido: é ele sim o maior responsável. Ele foi eleito para saber e diz não saber. Ele não foi eleito para ignorar e diz ignorar. Ele foi eleito para escolher, organizar, comandar, decidir, tomar providências. Não impôs autoridade. Foi conivente, omisso, relapso. Demonstrou despreparo e não pode agora ser isentado de responsabilidade quando estamos exatamente buscando os principais responsáveis...

(Interrupção do som.)

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - ...por tudo o que ocorreu no País nos últimos dois anos e meio.

Sr. Presidente, é lamentável ter que afirmar, com tanta contundência, essa convicção pessoal que se arraigou nos últimos dias em decorrência das investigações que estamos procedendo como integrante da CPMI dos Correios.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/08/2005 - Página 28508