Discurso durante a 151ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Cobra do governo federal recursos para o programa "Um milhão de cisternas", conduzido pela Asa-Articulação do Semi-Árido Brasileiro.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Cobra do governo federal recursos para o programa "Um milhão de cisternas", conduzido pela Asa-Articulação do Semi-Árido Brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 03/09/2005 - Página 30042
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • ANALISE, ECOSSISTEMA, REGIÃO NORDESTE, PRECARIEDADE, RECURSOS HIDRICOS, REGIÃO SEMI ARIDA, REGISTRO, PROGRAMA, CONSTRUÇÃO, AÇUDE, MELHORIA, RIO, CANALIZAÇÃO, AGUA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), EPOCA, GESTÃO, ORADOR, GOVERNADOR, COMENTARIO, HISTORIA, CONFERENCIA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), ALTERNATIVA, CISTERNA, COMBATE, SECA, APRESENTAÇÃO, DADOS, PROJETO, SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, RECURSOS.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Nobre Presidente Pedro Simon, Srªs e Srs. Senadores, a região Nordeste, que engloba, como se sabe, nove Estados nordestinos, do Maranhão à Bahia, estende-se por 1,2 milhão de quilômetros quadrados, predominando em grande parte dessa vasta área o bioma especificamente brasileiro, a caatinga.

O clima da caatinga, caracterizado pela escassez e má distribuição de chuvas, é o semi-árido, que também atinge algumas áreas vizinhas pertencentes à região Sudeste. Esse conjunto de territórios alcança quase um milhão de quilômetros quadrados, cobrindo aproximadamente 86% do Nordeste, 11% de Minas Gerais e 3% do Espírito Santo, com mais de 22 milhões de habitantes.

No semi-árido, a questão é obviamente a água, um recurso essencial para toda a humanidade. No caso do Nordeste, ele é extremamente importante porque escasso. A região convive com a seca e, mais do que isso, com um processo crescente de desertificação.

A compreensão da exata dimensão desse enunciado orientou a formulação e execução do Projeto Asa Branca, ao tempo em que eu governava Pernambuco, de 1979 a 1982. A designação do programa era uma referência ao pássaro que retorna quando chove e que foi imortalizado nos versos e na melodia da dupla Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.

Considero o Asa Branca o hino do Nordeste, porque chama a atenção para o drama nordestino e contém um forte apelo telúrico que se expressa no amor do homem a sua terra, em que pesem as vicissitudes em que vive.

O Programa Asa Branca, além da construção de açudes, da perenização de rios e da instalação de água canalizada ou de uma simples torneira pública - que no Nordeste chamamos de chafariz -, outras realizações, pequenas-grandes obras, foram espalhadas em todo o sertão e no agreste pernambucanos. Não vou enumerar todas essas ações desenvolvidas em Pernambuco, mas gostaria de dizer que aquilo que fiz como Governador continua sendo uma marca da minha ação como homem público em relação ao Nordeste brasileiro.

Em 15 de novembro de 1999, ocorreu no Recife - volto à questão da água - encontro internacional de grande importância, a Conferência promovida pelas Nações Unidas para discutir ações de combate à desertificação e à seca. Foi talvez o evento sobre o tema mais importante ocorrido no Brasil.

Tive o privilégio de abrir o encontro por encontrar-me, então, no exercício da Presidência da República. Na oportunidade transmiti a mensagem do Governo do Brasil sobre a expectativa de que a Convenção viesse “a se tornar um instrumento eficiente de promoção do desenvolvimento sustentável, que concilie eficiência econômica e proteção ambiental e deixe como legado às futuras gerações o mundo livre do flagelo da desertificação e da seca”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esse evento da ONU é histórico para o Brasil e de alta relevância para a população que vive no semi-árido brasileiro, se bem que a questão da desertificação não seja, infelizmente, hoje apenas um problema do Nordeste brasileiro, porque já há manchas de desertificação em Estados do Sul do País, inclusive o Paraná.

Esse evento vem-me à memória porque, ao lado de grandes empreendimentos necessários para combater as secas, há um, a meu ver, de custo perfeitamente justificável, considerando os benefícios que propicia à população pobre e carente, e que se enquadra nas recomendações da ONU, instituição que promoveu esse congresso a que me reporto.

Trata-se da construção de cisternas, reservatórios para águas pluviais coletadas em calhas, feitas de alvenarias, com tecnologia simples mas efetiva e utilização de materiais de fácil obtenção, ou seja, aqueles que se encontram disponíveis na própria região nordestina. É prática antiga mas que se tornou de uso mais intenso a partir da realização do Congresso da ONU, a que me referi, graças a uma entidade criada para a coordenação do encontro internacional e que, por decisão dos seus membros, transformou uma ocupação efêmera numa atividade permanente de apoio à sofrida população da caatinga.

Refiro-me, portanto, à ASA - Articulação no Semi-Árido Brasileiro, instituição sem personalidade jurídica e estruturada sob a forma de um fórum de organizações da sociedade civil, congregando atualmente aproximadamente 700 instituições, tais como entidades religiosas - nomeadamente a CNBB - além de organizações não-governamentais, associações rurais e urbanas, sindicatos e federações trabalhistas, entidades de classe - como a Febraban, poderosa, inclusive sob o ponto de vista financeiro -, movimentos sociais e organismos de cooperação internacional, públicos e privados.

A ASA foi fundada em julho de 1999 e hoje se encontra em plena atuação com uma série de programas, entre os quais a criação de cisternas, a que gostaria de me referir. Devo dizer que me aproximei dessa entidade durante o encontro internacional, mas, posteriormente, tive ocasião de conviver mais com os problemas tratados pela ASA, em função de um telefonema que recebi de Dom Mauro Morelli - à época, bispo de Duque de Caxias* -, que, em nome da CNBB, coordenava o referido programa.

Tivemos a oportunidade, além de reuniões que mantivemos com ele e com membros da instituição, de promover também um encontro com o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Desse encontro surgiram novas idéias, como a de buscar aporte de recursos financeiros, inclusive de recursos internacionais a fundo perdido, por intermédio de instituições de grande significação como o Banco Mundial, o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird).

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Vou concluir, Sr. Presidente.

A ASA está sediada no Recife e desenvolve um trabalho de alto valor social, econômico e cultural voltado para a economia familiar e das pequenas comunidades, na periferia dos grandes centros e localidades do semi-árido, de modo geral, vale dizer no Nordeste, em parte do Sudeste, em Minas Gerais e no Espírito Santo.

São muitos os programas que a ASA desenvolve: combate à desnutrição infantil, alfabetização, parcerias com comunidades e Municípios e outros, para o desenvolvimento de políticas que assegurem o desenvolvimento regional sustentável.

Quero, no entanto, salientar um único programa da ASA, pela extraordinária importância humana que tem. Trata-se do programa Um Milhão de Cisternas (P1MC), apresentado ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, por volta do ano 2000 ou 2001, que se sensibilizou com a idéia e incentivou o seu desenvolvimento.

Esse é, talvez, o principal projeto da ASA, no meu julgamento. É voltado para a construção, no semi-árido brasileiro, de um milhão de cisternas de um modelo desenvolvido após cuidadosa pesquisa. São feitas pelo método do mutirão artesanal, com a capacidade de até 16 mil litros de água, portanto, 16m3, volume que tem demonstrado ser suficiente para garantir o abastecimento de água potável para uma família de cinco membros, por cerca de oito meses de estiagem. O custo unitário médio de cada cisterna é de R$1.470,00, ou seja, com esse valor, faz-se uma cisterna e assegura-se aos nordestinos acesso ao bem essencial, sem o qual não se consegue sobreviver, que é a água.

A seguir, Sr. Presidente, enumero dados sobre o projeto:

- Coordenação geral: Associação Programa Um Milhão de Cisternas para o Semi-Árido - AP1MC, entidade administrativa e operacional da ASA, com personalidade jurídica. Operacionalização: Unidade Gestora central, no Recife, e mais 55 Unidades Gestoras Microregionais, distribuídas nos estados do Nordeste, Espírito Santo e Minas Gerais. Comissões Executoras: Municipais e Comunitárias.

- Meta: um milhão de cisternas em cinco anos (a partir de junho de 2003), distribuídas nos 11 estados citados, sendo 146 mil em Pernambuco. Considerando uma cisterna por família, o programa visa o atendimento de cerca de cinco milhões de pessoas com água potável para consumo doméstico (beber e cozinhar).

- Orçamento: aproximadamente 1,5 bilhão de reais.

- Situação do Projeto: passados cerca de dois anos (40% do prazo total), foram construídas em torno de 100.000 cisternas, portando 10% da meta para os cinco anos.

Ao encerrar, Sr. Presidente, eu gostaria de fazer, por intermédio de V. Exª, um apelo ao Governo Federal para que dê prioridade ao referido programa, de grande significação humana e social. Ele é feito pela própria família que se beneficia da cisterna, não recorre a nenhum equipamento importado, é feito pelas mãos do homem do sertão, do semi-árido, da caatinga e assegura-lhe e a sua famílias sobreviver no instante da estiagem.

Infelizmente, Sr. Presidente, a estiagem no Nordeste não é exceção, é a regra. Muitas vezes, o semi-árido sofre seca durante oito ou dez anos consecutivos. Posso até dar um simples depoimento.

(Interrupção do som.)

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Certa vez, como Governador, fiz um açude em um Município do semi-árido. Dez anos depois, o Prefeito me telefonou para dizer: “Tenho uma boa notícia: choveu e juntou água”. Ele esperou dez anos, após a construção do açude, para que pudesse se beneficiar dele. Isso significa dizer, mais uma vez, que a seca é a regra; a chuva é exceção. E, quando chove, chove irregularmente, ou seja, chove muito em um determinado mês, depois as chuvas cessam, condenando o homem naturalmente à frustração de sua safra, à perda do rebanho e, por que não dizer, a ficar sem condições sequer de utilização de água para a ablução humana.

Portanto, Sr. Presidente, eu apelo, por intermédio de V. Exª, ao Governo Federal para que aloque mais recursos para a continuação desse programa, que está com sua continuidade defasada em função da meta, que era de fazer um milhão de cisternas. Espero que, com a alocação de recursos, possamos passar para uma meta ainda mais ousada, a de construirmos dois milhões de cisternas, o que fará com que obviamente se multiplique a possibilidade de assegurar o acesso do homem à água.

(Interrupção do som.)

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - E, mais do que isso, criar condições para que o homem pobre, aquele que muitas vezes não tem advogado para vocalizar suas teses, que não tem grandes defensores, para que esse homem pobre que vive nas caatingas, no semi-árido, possa ter uma vida menos dura, uma vida que pelo menos lhe assegure acesso à água.

Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente, e espero que o apelo que ora faço sensibilize o Governo Federal, alocando recursos para a continuidade desse programa.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/09/2005 - Página 30042