Discurso durante a 156ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem póstuma ao músico Lupicínio Rodrigues.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem póstuma ao músico Lupicínio Rodrigues.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Ideli Salvatti.
Publicação
Publicação no DSF de 13/09/2005 - Página 30566
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, DATA, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, MUSICO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, MUSICA POPULAR, MUSICA BRASILEIRA.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª. Presidente, Senadora Serys Slhessarenko, era minha intenção fazer este discurso no dia 16 de setembro, quando da homenagem ao grande Lupicínio Rodrigues, lembrando os 91 anos de seu falecimento, mas como, no dia 16, Senadora, estarei na Bahia, participando de uma audiência pública sobre a questão racial, a convite do Senador Rodolpho Tourinho, faço hoje a homenagem ao grande Lupicínio Rodrigues, lembrando o seu nascimento que foi em 16 de setembro de 1914.

Como estarei na Bahia, debatendo o Estatuto da Igualdade Social, junto com o Relator, Senador Rodolpho Tourinho, tenho certeza de que Lupicínio Rodrigues, que também tinha origem negra, apoiaria, se estivesse vivo, esse evento.

Aqui lembro, Srª Presidente, que Lupicínio Rodrigues é uma jóia inesquecível e inigualável do nosso samba. Nascido no Rio Grande do Sul, quarto filho de uma família de 21 irmãos, ele dizia sempre, em suas canções, que era fruto da felicidade, do amor de seus pais.

Lamentavelmente, Lupicínio morreu jovem, aos 60 anos. Digo jovem porque, no meu entendimento, a vida começa aos 50 anos.

Lupicínio já dava ares de boêmio aos 14 anos, quando compôs sua primeira música, “Carnaval”, e seu pai, preocupado com isso, resolveu retirá-lo da boemia e inscrevê-lo no Exército.

Não adiantou. Ele insistiu com o samba, e veio o grande sucesso com “Se Acaso Você Chegasse”. E lembra, quando chega no chateau e encontra a mulher que amou nos braços de um outro. Faço um resumo porque não vou cantar toda a musica - a Senadora Ideli Salvatti é que faria isso muito bem -, eu apenas estou resumindo a história dele. Mas trago para este momento.

Quando cito essa história do abandono, do sentimento, da troca da amizade, trago um pouco para este momento. É um momento meio de frustração, de abandono, um pouco de chateação, como o momento político que estamos passando.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Paulo Paim?

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Em seguida, Senador Arthur Virgílio.

Volto a Lupicínio Rodrigues, e deixo a análise política do momento para um outro dia. E gostaria de citar mais alguns fatos antes de conceder os apartes.

Quando perguntado, em entrevista ao Pasquim, sobre o fato de ser o maior compositor popular brasileiro e sempre ter vivido no Rio Grande do Sul, ele responde: “Graças a meu bom Deus, sempre vivi no Rio Grande do Sul. Foram os marinheiros que visitavam a minha terra, à época, que aprendiam as minhas músicas e a divulgavam pelo País, pelo nosso Brasil.”

O criador da dor-de-cotovelo, como era conhecido nosso grande Lupicínio, disse não saber por que o chamavam dessa forma. Sabia apenas que existia, conforme ele, dois tipos de dor-de-cotovelo: a estadual, que é a da noite em que se encontra um grande amor e depois fica a saudade; e a federal, dizia ele, é aquela que não se esquece nunca. É aquela que se guarda para o resto da vida.

Senador Arthur Virgílio, concedo um aparte a V. Exª.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Senador Paulo Paim, V. Exª, como poucos, consegue sair do formalismo frio da atividade parlamentar, para entrar nos detalhes da vida de seu povo. Eu tenho, desde a Câmara, acompanhado a sua preocupação com o negro. Alguém poderia dizer: “Ah, o Senador Paulo Paim se sente negro.” Mas V. Exª se preocupa com a mulher; preocupa-se com as minorias. Em outras palavras, faz uma atuação que é bastante moderna e próxima do pulsar das ruas. A respeito de Lupicínio, gostaria apenas de lembrar também uma música que foi repopularizada pelo Deputado Roberto Jefferson, nosso colega congressista da outra Casa, que é “Nervos de Aço”.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Eu a cito aqui.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Cita?

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Vou citá-la.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Paulo Paim?

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Pois não, nobre Senadora Ideli Salvatti.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Senador Paulo Paim, em primeiro lugar, não vou cantar. Já tive a oportunidade de cantar inclusive um trecho do querido “Lupi”, quando fiz uma homenagem ao Dia Nacional do Samba. Fiz referência aos sotaques regionais dessa grande manifestação cultural do povo brasileiro, que é o samba, e que veio e se firmou como uma das principais contribuições da cultura africana em nosso País. E relembro que, quando cantei o trecho do Lupicínio, eu disse que, por incrível que pudesse parecer, vinha exatamente do sotaque regional gaúcho um dos trechos de samba menos machista que eu conheço, como quando ele coloca: “Se acaso você chegasse, no meu chateau encontrasse...” Ou seja, vir exatamente de um compositor gaúcho a manifestação de deixar de lado, porque o sentimento é algo que aflora, é algo que vem, não pede licença quando chega. Parabéns por trazer à tribuna do Senado Federal - talvez os tempos de crise me tenham deixado menos suscetível a fazer isso -, a cultura brasileira, as manifestações artísticas de nosso povo, trazer nossos cantores, nossos compositores, todos os que representam a alma do povo brasileiro, que é sempre tão importante quanto trazer qualquer outro assunto. Gostaria de parabenizá-lo por estar homenageando a grande figura do cancioneiro popular brasileiro: nosso querido Lupi.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Muito obrigado, Senadora Ideli Salvatti. Presenciei V. Exª cantando as músicas de Lupicínio e me senti contemplado com a forma como V. Exª descreveu, aqui, a caminhada do grande Lupicínio, mas cantando. Estou apenas lendo aqui um pouco da história dele. Mas eu mesmo trago para o viés político esse debate.

Quando ele fala em estadual, falando do amor estadual, eu trago para o Rio Grande, e digo que estou muito sensibilizado pela forma carinhosa com que meu Estado tem nos tratado neste momento de crise política por que passa o País. Quando ele fala em federal, também nos preocupa muito a situação nacional. Está doendo muito, com certeza, em todo o povo brasileiro, a crise política por que passa o País.

Lembro aqui, Senador Arthur Virgílio, a música “Nervos de Aço”. Aliás, é preciso, efetivamente, no meio dessa crise, ter nervos de aço. Ela foi inspirada na mulata Iná, sua primeira namorada, que o deixou por pressão familiar, porque ele era boêmio. Ele quase morreu de dor de cotovelo quando a viu de braços dados com o marido. Eu diria que é um pouco esse o nosso sentimento ao ver hoje bandeiras históricas por nós sempre embaladas nos braços de outros.

Podemos citar músicas como “Vingança”, que conta a história, até hoje mal contada, de um bilhete que ele recebeu e que sua amada, uma moça chamada Carioca, teria escrito para outro. Depois, ela tentou em vão reconquistar Lupicínio. Mas a traição não ficou provada, e, por isso - trago de novo o viés político -, tenho preocupação com prejulgamentos, hoje e sempre.

Outro sucesso de Lupi foi “Maria Rosa”:

Vocês estão vendo aquela mulher de cabelos brancos,

Vestindo farrapos, calçando tamancos, pedindo nas portas pedaços de pão?

A conheci quando moça, era um anjo de formosa, Seu nome é Maria Rosa.

Essa é uma composição feita por Lupicínio que fala da pobreza da nossa gente, mas também de um dos grandes amores da sua vida.

Eu, que falo tanto dos excluídos, não poderia deixar de lembrar de Maria Rosa, simbolizando a situação do nosso povo tão sofrido.

E ainda há aquela outra música, Senador Tião Viana, “Esses Moços”, uma belíssima composição:

Esses moços, pobres moços,

Ah se soubessem o que eu sei.

Não amavam, não passavam aquilo que eu já passei

Por meus olhos, por meu sangue, tudo enfim,

É que eu peço a esses moços que acreditem em mim.

Se eles julgam que há um lindo futuro, só o amor nesta vida conduz.

Eu a achei tão bonita e, por isso, eu a li. Aqui Lupi falava aos moços, e tomo a liberdade de falar aos estudantes, aos jovens: peço que acreditem que é possível ser otimista, apesar do pessimismo que existe hoje.

As músicas de Lupicínio estão imortalizadas por intérpretes de diferentes gerações: Jamelão, que foi grande intérprete das músicas de Lupicínio e que levou ao Rio de Janeiro o samba gaúcho; Elza Soares; Caetano Veloso; Paulinho da Viola; Maria Bethânia; Adriana Calcanhoto; Arnaldo Antunes. Por aí segue a lista de grandes estrelas que emprestaram suas vozes às composições da estrela maior.

Um amante da boemia, um amante do amor, um gênio da música, uma estrela ímpar, esse foi Lupicínio Rodrigues. Será sempre ele o mestre das composições!

Entendo que Lupicínio Rodrigues conseguiu com a frase com que vou terminar o meu pronunciamento falar da igualdade, da liberdade e da justiça, no sentido de desmontar as desigualdades de classe. Enfim, ele diz que todos nós somos seres humanos e devemos ter o amor em primeiro lugar:

Em todo lugar que eu chego eu sou o mesmo Lupicínio.

Todo mundo fala comigo, todo mundo bebe, canta comigo, todo mundo convive comigo.

Gente de toda a classe, de todas as categorias.

Para mim, o mundo tem o mesmo tamanho e todos os homens têm o mesmo valor.

Lupicínio, fiz essa homenagem pelo seu aniversário, pois para mim você é eterno. Se possível, quero ainda cantar “Parabéns a você” daqui a nove anos, quando você completaria 100 anos.

Lupicínio Rodrigues é Brasil, ontem, hoje e sempre, orgulho nacional!

Muito obrigado, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/09/2005 - Página 30566