Discurso durante a 158ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à política econômica do governo federal.

Autor
Roberto Saturnino (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • Críticas à política econômica do governo federal.
Aparteantes
Geraldo Mesquita Júnior, Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 15/09/2005 - Página 30948
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, ACUSAÇÃO, INEFICACIA, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, CONTINUAÇÃO, POLITICA, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, AUMENTO, INDICE, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL, SEMELHANÇA, AMERICA DO SUL.
  • COMENTARIO, INFERIORIDADE, EXPERIENCIA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), PREJUIZO, ECONOMIA NACIONAL.
  • COMENTARIO, RECURSOS, DESTINAÇÃO, PROGRAMA, GOVERNO FEDERAL, ASSISTENCIA SOCIAL, INFERIORIDADE, TRANSFERENCIA, RENDA, POPULAÇÃO, POSSUIDOR, TITULO DA DIVIDA PUBLICA, PROVOCAÇÃO, INJUSTIÇA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, BRASIL.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Partido dos Trabalhadores e o próprio Governo, assediados ambos por todas as denúncias de corrupção que são objeto de apuração por três CPIs no Congresso Nacional, têm procurado apresentar os resultados da política econômica como sendo a dimensão altamente mais positiva do Governo, uma dimensão tão positiva que pudesse contrabalançar de alguma forma toda a carga negativa que está caindo sobre o PT e sobre o Governo neste momento. E quero discordar desta apresentação; quero discordar como tenho discordado aqui ao curso desses três anos de Governo. Tenho sempre discordado de uma forma que não é radical, mas é firme, porque traduz convicções muito profundas que tenho. E acho que tenho um dever em relação à população, à opinião pública, tenho um dever em relação à Nação brasileira maior do que todos. Tenho um dever também em relação ao Partido e ao próprio Governo, porque acho que ajudo o Governo com essa crítica, mostrando que efetivamente os resultados exibidos, como grandes feitos do Governo, na verdade, são resultados medíocres, Sr. Presidente. O próprio Presidente Lula tem-se referido a eles mostrando que a política econômica está dando certo por isso e por aquilo, porque a taxa de crescimento está alta, porque a inflação está baixa, porque o saldo da balança de pagamento é muito grande.

Sr. Presidente, esses resultados são francamente provenientes de toda a política que vem desde a adoção do câmbio flexível, desde a metade do segundo governo Fernando Henrique e são absolutamente insatisfatórios para as necessidades, e os anseios, e as aspirações do povo e da Nação brasileira. Quer dizer, crescimento de 3,5%, quando toda a América do Sul e a América Latina estão crescendo bem mais que isso, quando todo o mundo em desenvolvimento está crescendo muito mais, quando as condições da economia mundial são extremamente propícias, francamente, esse é um resultado medíocre. Isso não vai nunca possibilitar a solução ou pelo menos o encaminhamento da solução do problema social brasileiro, que sempre foi a grande bandeira do PT e a bandeira do próprio Presidente Lula, do próprio Governo Lula.

Ingressei no PT, Sr. Presidente, para fazer a campanha do candidato Lula, porque acreditava que ele trazia no bojo dos seus compromissos um projeto nacional de mudanças profundas, que poderia caminhar de uma forma gradual, sim. Em nenhum momento, esperei que se operasse uma revolução. Não houve uma revolução. Houve a vitória de uma eleição com alianças de forças políticas muito mais ao centro e à direita do que o PT. Assim, a minha expectativa não era de nenhuma revolução. Mas esperava - e acho que toda a população do Brasil, a opinião pública, também esperava - que houvesse, não uma subserviência total ao mercado, aos ditames, aos interesses do mercado, às fórmulas econômicas do mercado, como fez o Governo anterior durante todo o seu mandato.

Deveria haver uma confrontação dialética de avanços e recuos com o mercado, explorando as margens possíveis de avanço que existem e estão sendo ignoradas completamente sob o aplauso de toda a mídia, que defende os interesses conservadores do grande capital, em detrimento daquela projeção que se colocava sobre o PT e o Governo Lula e que era, enfim, o encaminhamento, a transição para uma mudança profunda do quadro econômico e social do Brasil.

Nunca defendi uma mudança de 180º na política econômica. Sei que isso não é viável, que produz desestabilização. Nunca propus nem uma mudança de 90º, mas uma ligeira inflexão de 10º ou 15º que, ao longo do tempo, produzisse resultados, a fim de mostrar que é possível, sim, um Brasil diferente, assim como o fórum mundial assegura que é possível um mundo diferente. Mostraríamos que é possível um Brasil diferente, mais justo, com uma distribuição um pouco mais eqüitativa da riqueza que, afinal de contas, é gerada pelo trabalho de todos os brasileiros.

O Governo Lula não enfrentou a questão com o vigor e a sabedoria necessários, com a sabedoria de quem conhece os truques da política econômica, da economia em geral e do próprio mercado. Para mim, está claro que o Ministro Antônio Palocci, que é elogiado em prosa e verso por toda a mídia brasileira, não tem a vivência necessária, é um novato, digamos assim, nas lides com as questões econômicas e não conhece que há uma certa margem de flexibilidade que é possível.

Não adianta querer seguir por dez anos a receita do Fundo Monetário e do Banco Mundial para que o Brasil atinja um investment grade, que parece que é tudo que ele quer, mas não é por aí que vamos encontrar o desenvolvimento. O desenvolvimento do Brasil será encontrado na medida em que a Nação e o Estado brasileiro confrontem-se com o mercado dentro das margens de viabilidade que são possíveis, para que se obtenham taxas de crescimento um pouco mais elevadas do que essa média medíocre que o País está tendo, um pouco mais próxima da média dos países em desenvolvimento, da própria América Latina, e que o Brasil não está conseguindo exatamente porque insiste. E o Presidente Lula faz questão de repetir isso e de fazer um verdadeiro cavalo-de-batalha nessa questão da política econômica, como se fosse um resultado fantástico, sob o ponto de vista econômico e social. Os programas sociais existem, sim. Não vou reduzir a importância do Bolsa Família, do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, do Microcrédito. Essas coisas são importantes, só que a sua importância é inteiramente anulada pela brutal transferência de renda: 120 a 130 bilhões, todo ano, do contribuinte brasileiro para 0,1% dos brasileiros que detêm os Títulos da Dívida Pública Federal, que são os mais bem remunerados do mundo.

Isso é uma brutal transferência no sentido concentrador que acaba anulando todo o resultado dos programas sociais, que não negamos, mas acho que o Brasil vai perdendo sua melhor oportunidade de realizar avanços sociais com um crescimento maior do que esse medíocre que está sendo aí tão louvado e, por causa das condições internacionais extremamente favoráveis, está perdendo pela teimosia, pela insistência, pela bisonhice, pela falta de vivência das autoridades da política econômica...

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (P-SOL - AC) - Senador Roberto Saturnino, V. Exª me permite um aparte?

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Com prazer, Senador Geraldo Mesquita Júnior.

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (P-SOL - AC) - Antes de mais nada, louvo o pronunciamento de V. Exª neste momento. E, com o intuito de ilustrar o pronunciamento de V. Exª, trago a manifestação de um brasileiro que é uma opinião própria, posso crer, da maioria do povo brasileiro. Ele se chama Durval Quindere. O assunto do e-mail é: “...É bom pra quem... cara pálida???” Ele diz:

Cai a farsa.

Qual a melhoria que o bom momento econômico, sempre presente nos discursos do Presidente Lula, traz para os excluídos, para os pobres e miseráveis que são a grande maioria do povo brasileiro?

O bom momento econômico é bom para os grandes empresários, para os exportadores, os banqueiros e a elite, de um modo geral. Para os mais de 50 milhões de eleitores do Presidente nada mudou, continuam ocupando a mesma 63ª posição no ranking de Desenvolvimento Humano que ocupavam antes do Presidente ter sido eleito.

O Governo trata os pobres de uma forma que fará com que não só a mãe do Presidente seja analfabeta, mas milhares de outras mães brasileiras também permanecerão sem acesso à educação e à cultura, conforme reportagens abaixo.

            Ele cita reportagens da Agência Brasil e de outros veículos de comunicação. Portanto, eu trago aqui não apenas a opinião dele; aliás, a minha opinião é exatamente esta também: política econômica que beneficia poucos neste País.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Claro.

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (P-SOL - AC) - E o brasileiro aqui manifesta exatamente isso com clareza impressionante. Para ilustrar o discurso de V. Exª. Muito obrigado.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Obrigado.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Roberto Saturnino, V. Exª me concede um aparte?

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Darei o aparte, logo em seguida. Quero apenas fazer um comentário sobre o aparte do Senador Geraldo Mesquita Júnior, que é exatamente...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - É preciso que o Presidente...

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PMDB - AP) - Senador...

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - ...,o Governo e o Ministro Antônio Palocci - já terminarei, Sr. Presidente - prestem um pouco de atenção, disponham-se a dar uma atenção, a ter a humildade, o gesto humilde... Olha, acho que o PT, definitivamente, perdeu aquela arrogância de ser o exclusivista na bandeira da ética, mas é preciso assumir também uma postura mais humilde no tocante à questão econômica, não ficar afirmando como se fosse grande feito, porque não é um grande feito. É um feito que está satisfazendo enormemente aos banqueiros, aos aplicadores e aos rentistas, mas não está trazendo à Nação e ao povo os benefícios que foram prometidos.

Ouço com muito interesse o aparte do Senador Paulo Paim e já encerro, Sr. Presidente.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Roberto Saturnino, quero cumprimentar V. Exª por dois motivos: primeiro, pela transparência. E aproveito para comunicar à Casa que a Bancada do PT, hoje pela manhã, por unanimidade, indicou o nome de V. Exª para ser nosso candidato - que virá a ser votado - à Presidência da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. E V. Exª, antes da indicação, deixou muito clara sua posição em relação à política econômica: a de que manteria exatamente o ponto de vista que V. Exª está mantendo, neste momento, na tribuna e que merece os nossos elogios pelo conteúdo e pela coerência. Por isso, eu me sinto muito feliz de ter votado hoje de manhã - todos que estavam na sala votaram - em seu nome para Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Parabéns!

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Obrigado, Senador Paim. Eu recebo com muita satisfação, alegria e força o aparte de V. Exª, que ressalta a questão da coerência, que é também um atributo de V. Exª reconhecido por esta Casa e por toda a Nação. É a coerência em relação aos seus pontos de vista e às suas opiniões.

Ao receber o apoio e a indicação da Bancada, fiz questão de hoje mesmo vir à tribuna fazer este pronunciamento para mostrar que pertenço ao Governo e estou aceitando uma missão dada pelo Partido. Agora, vou manter a minha posição crítica em relação a essa política econômica que, penso, não está certa. E é preciso que haja um pouco mais de humildade para discutir esses pontos de vista com a Bancada e as bases do nosso Partido.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente, agradecendo a tolerância de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/09/2005 - Página 30948