Discurso durante a 158ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre os temas abordados no Fórum de Avaliação do Anteprojeto da Lei da Reforma da Educação Superior, realizada pela Confederação Nacional da Indústria.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR.:
  • Reflexões sobre os temas abordados no Fórum de Avaliação do Anteprojeto da Lei da Reforma da Educação Superior, realizada pela Confederação Nacional da Indústria.
Publicação
Publicação no DSF de 15/09/2005 - Página 31015
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, CONGRESSO, CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDUSTRIA (CNI), AVALIAÇÃO, ANTEPROJETO, REFORMULAÇÃO, ENSINO SUPERIOR, ANALISE, IMPORTANCIA, REALIZAÇÃO, REFORMA UNIVERSITARIA, ELOGIO, INICIATIVA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), APRESENTAÇÃO, DETALHAMENTO, PROJETO.

O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago para o conhecimento de todos alguns dos aspectos abordados por mim no dia 31 de agosto próximo passado, no Fórum de Avaliação do Anteprojeto de Lei da Reforma da Educação Superior, realizado pela Confederação Nacional da Indústria, e aproveito agora para fazer algumas reflexões sobre o tema, de inegável importância para o Brasil.

Naquela oportunidade lembrei que a última reforma universitária ocorrida no Brasil data de 1968. Passados longos 37 anos, a Lei nº 5.540, em que pesem suas virtudes e defeitos, continua a reger a educação superior no País. Não é difícil constatar que um enorme descompasso se deu entre o regramento legal e a dinâmica da vida universitária hodierna.

No cenário contemporâneo, em que os sinais de crise econômica não se arrefeceram por completo, e os efeitos da globalização dos mercados ainda se projetam internacionalmente, é preciso dizer que a educação readquiriu importância crucial nas políticas governamentais. Assim, há razões de importância verdadeiramente estratégica para que se supere o mencionado descompasso, reformando a legislação concernente à educação superior.

Com efeito, as mudanças nos padrões tecnológicos e organizacionais passaram a exigir dos governos, dos empresários e dos trabalhadores, resposta para um dos grandes desafios de nossos dias: a inserção no mundo globalizado. Em tal contexto, é vital produzir conhecimento, que passou a ser visto como motor do desenvolvimento econômico e social. No Brasil, segundo tendência mundial dos países capitalistas, a educação passou a refletir em larga medida um conjunto de preocupações de ordem particularmente econômica. Dito de outra maneira, a educação tem sido apontada como possível resposta estratégica aos desafios da competição internacional.

Compreende-se, portanto, o imperativo da Reforma Universitária que ora debatemos. O papel exercido pela Universidade é central, pois ela é a responsável pela formação do capital humano - bem maior de um País e pilar de seu desenvolvimento. Além disso, produz a maior parte da pesquisa nacional, gerando, de um lado, o conhecimento que se traduz em inovação tecnológica e maior produtividade, e, de outro, uma ampla gama de benefícios sociais.

Porém, não são poucos os problemas com que se depara a educação superior. Em termos quantitativos, a despeito da rápida e desordenada expansão havida na segunda metade dos anos 90, ainda é baixo o patamar de jovens na faixa entre 18 e 24 anos regularmente matriculados em instituições de ensino superior - IES. O Plano Nacional de Educação prevê uma meta de 30% até o final da década, e ainda patinamos em percentual que não ultrapassa os 10%, um dos mais baixos da América Latina.

Existem hoje 2.306 instituições de ensino superior no Brasil, das quais 44% têm menos de 500 estudantes. Trata-se de um universo atomizado, além de hegemonicamente privado: segundo dados do Censo da Educação Superior de 2004, 88,9% das IES são particulares, e respondem por 70,8% das matrículas, o que equivale a cerca de 2 milhões e oitocentos mil alunos. A velocidade de expansão das particulares diminuiu, mas ainda avança em ritmo duas vezes superior às da rede pública.

De um ponto de vista qualitativo, os dados não são menos dramáticos. Apenas 8,7% das IES são, de acordo com os critérios atuais, Universidades, a máxima parte de natureza pública. No outro pólo, é enorme o contingente de faculdades isoladas e centros universitários: 91,3%. Cabe ainda ressaltar que a distribuição geográfica das IES é tremendamente desigual, o que demonstra a falta de organicidade do sistema. Enquanto a região Sudeste concentra 49% do total de matrículas do País, a região Nordeste tem apenas 16%, em contraste com os 28% de sua população global. Também, como reflexo da falta de planejamento, há predominância expressiva dos cursos das áreas de ciências sociais aplicadas e de humanidades, em detrimento dos cursos tecnológicos.

Quanto à inclusão social, vivenciamos um quadro repleto de iniqüidades. As minorias permanecem ao largo da educação superior, pois não há correspondência entre os números do IBGE e a representação de negros, pardos e índios nas IES, sejam públicas, sejam privadas. Ainda, há, nas nossas universidades públicas, uma carência muito grande de vagas nos cursos noturnos, que sabidamente abrigam estudantes provindos das classes sociais menos favorecidas. De 1995 a 2002, por exemplo, só 31% das novas vagas criadas nas IES públicas se deram em cursos noturnos. Como a oferta de vagas públicas nos cursos diurnos aumentou em ritmo superior aos noturnos, a proporção de vagas noturnas oferecidas pelas instituições públicas, ao invés de aumentar, caiu. É preciso não esquecer dos dilemas do financiamento, que tem diminuído ano a ano. Em 1989, correspondia a 0,95% do PIB; em 2000, não passava de 0,63%.

Eis, em grandes linhas, a áspera realidade que se pretende reformar. Esta é a missão sobre a qual nos debruçamos agora! É louvável, portanto, a iniciativa do Ministério da Educação de empreender a reforma, e não de maneira autoritária, mas democrática e conscienciosa, ouvidas todas as partes interessadas - e não foram poucas, pois cerca de 200 instituições participaram dos debates ao longo de mais de um ano!

O Senado Federal tem cumprido sua parte. Antecipando-nos à agenda do MEC, promovemos, na Comissão de Educação, à época presidida pelo Senador Osmar Dias, a primeira audiência pública sobre o tema. Depois, mais três audiências trataram de aprofundar os debates, com participação de autoridades do Poder Executivo, de renomados especialistas, de entidades representativas das instituições privadas e das públicas, dos estudantes, e de setores da sociedade civil.

Penso que a terceira versão do Anteprojeto de Lei da Reforma da Educação Superior avançou em alguns pontos considerados mais sensíveis, ao incorporar diversas demandas importantes, incluindo nesse rol o valioso trabalho da Confederação Nacional da Indústria. Gostaria de destacar 6 pontos, entre tantos que mereceriam aplauso:

- a reserva de 50% das vagas de todos os cursos para alunos da rede pública, em paralelo ao alargamento dos prazos para implementação da política de cotas;

- o aumento de 5% para 9% nas bolsas de estudo, moradia e alimentação concedidas a alunos cotistas nas IES públicas, aliado à obrigatoriedade de as IES privadas divulgarem com antecedência de dois meses o valor dos reajustes para o semestre seguinte;

- os reparos à função dos Conselhos Sociais, dotando-os de caráter eminentemente consultivo;

- as alterações visando a reverter a banalização do conceito de universidade, instituindo critérios claros para que as instituições atinjam o status de universidade, com prazo razoável para adaptação;

- integração do sistema, com interiorização das IES e conseqüente aproximação com o setor produtivo e o mercado;

- obrigatoriedade de elaboração de um Plano Nacional de Pós-graduação, gerido pela CAPES, com duas prioridades: estudos em áreas que atendam às demandas de política industrial e comércio exterior; estudos que contemplem as regiões com índices sócio-econômicos abaixo da média nacional.

É preciso deixar claro que o trabalho não findou. Caberá, agora, ao Congresso Nacional a análise criteriosa da Reforma, contribuindo para seu aprimoramento.

Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria, por fim, de frisar que a educação superior deve ser entendida - e parece que caminhamos nessa direção - como uma política de Estado e um bem público de inestimável valor, ferramenta imprescindível para a superação dos grandes impasses com que o Brasil se depara, rumo a um processo de desenvolvimento duradouro, equilibrado, sustentável e equânime.

Agradeço a todos pela atenção!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/09/2005 - Página 31015