Discurso durante a 160ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Situação da saúde pública do Brasil. Importância do Programa Saúde da Família.

Autor
José Maranhão (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: José Targino Maranhão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Situação da saúde pública do Brasil. Importância do Programa Saúde da Família.
Aparteantes
Alberto Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 16/09/2005 - Página 31138
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, EVOLUÇÃO, SAUDE PUBLICA, BRASIL, PRIORIDADE, PREVENÇÃO, DOENÇA, AUMENTO, ATUAÇÃO, AGENTE DE SAUDE PUBLICA, AMBITO, FAMILIA, COMUNIDADE, DETALHAMENTO, PROGRAMA, MINISTERIO DA SAUDE (MS), REGISTRO, DADOS, ASSISTENCIA, POPULAÇÃO, MUNICIPIOS, REDUÇÃO, MORTALIDADE INFANTIL.
  • COMENTARIO, PROGRAMA, SAUDE, FAMILIA, MINISTERIO DA SAUDE (MS), DIFICULDADE, IMPLEMENTAÇÃO, MUNICIPIOS, SUPERIORIDADE, POPULAÇÃO, DEFESA, AMPLIAÇÃO, GRUPO, AGENTE DE SAUDE PUBLICA, CONTRATAÇÃO, DENTISTA, PSICOLOGO.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quem acompanhou a evolução da saúde pública brasileira nos últimos quinze anos pôde observar avanços muito significativos no setor, tanto em termos de operacionalização quanto em termos da própria concepção do que seja a saúde pública.

De um lado, pudemos observar a reestruturação operacional do atendimento à população, com o advento do Sistema Único de Saúde, o SUS, que atua de acordo com os princípios constitucionais básicos que balizam a política de saúde pública no País: a descentralização, a universalidade do atendimento e a participação da comunidade.

Essa nova abordagem traduziu-se, na prática, na descentralização político-administrativa do setor e, paralelamente, na implantação de uma forma moderna de atendimento à população.

Sr. Presidente, nos últimos quinze anos, as autoridades de saúde pública do nosso País passaram a operar dentro de uma concepção filosófica praticamente oposta à que vinha sendo historicamente adotada no Brasil. No passado, a ênfase era dada à doença. A abordagem da saúde pública era meramente curativa. Em outras palavras: o Estado só considerava um indivíduo como usuário do sistema de saúde pública a partir do momento em que ele ficasse doente e desse o ar de sua graça em um hospital.

A nova concepção vigente na saúde pública brasileira é diametralmente oposta à abordagem meramente curativa. O foco não é mais na doença, é na saúde. A prevenção ganhou relevância similar ou mesmo maior que a cura das doenças. As unidades básicas de saúde, marcadas no passado por um comportamento fundamentalmente passivo, vem ganhando caráter cada vez mais ativo. Ou seja, os agentes de saúde, ao invés de esperarem a doença nos hospitais, passaram a levar a saúde às comunidades.

Nesse novo contexto, o Ministério da Saúde resolveu dar ênfase e prioridade absoluta à saúde básica, mais especificamente ao Programa de Saúde da Família, justamente o tema sobre o qual pretendo discorrer neste pronunciamento.

Srªs e Srs. Senadores, em março de 1994, aconteceu o lançamento do Programa Saúde da Família - PSF, com a finalidade de promover uma verdadeira revolução no modelo assistencial de então. A nova concepção de saúde adotada pelo Estado brasileiro, sobre a qual discorri anteriormente, encontrou no PSF um veículo privilegiado para a realização de seus ideais.

A saúde de uma pessoa é determinada por vários fatores, de ordem física, psicológica, ambiental. Natural, portanto, que a nova abordagem favoreça o trabalho de equipe. Cada equipe do PSF, chamada de Unidade Básica de Saúde da Família, compõe-se de um médico, de um enfermeiro, de um auxiliar de enfermagem e de quatro a seis agentes comunitários de saúde. A Unidade de Saúde trabalha com um território de abrangência definido e realiza o cadastro e o acompanhamento da população vinculada a esse território, sendo recomendável que cada equipe seja responsável por, no máximo, 4,5 mil pessoas.

Sr. Presidente, eu gostaria de fazer uma observação. Quando eu ainda era acadêmico de Direito - e a todos nós, jovens estudantes, empolgavam-nos as idéias socialistas -, fiquei entusiasmado ao ver que a China, que emergia de uma revolução, tendo à frente o grande líder Mao Tse-Tung, havia resolvido implantar os chamados programas de saúde, versão oriental do que o Brasil, a partir de 1994, resolveu fazer. Esse programa na China tinha o nome de “doutores de pés descalços”. Eram paramédicos, enfermeiros, pessoas que tinham rudimentos de saúde pública que adentravam as casas das famílias levando conhecimento sobre como proteger a sua saúde. Era um embrião daquilo que, agora, de forma mais moderna e mais sofisticada, o Brasil quer fazer. Mas é preciso registrar que aquele embrionário programa evoluiu bastante na China e responde por um estado de saúde pública realmente privilegiado no território da China continental.

Chegamos tarde, mas chegamos, Sr. Presidente!

Um balanço da primeira década do Programa de Saúde da Família mostra, de maneira clara e inequívoca, que o programa é um sucesso.

Atualmente, cerca de 22,4 mil equipes do PSF assistem a 72,4 milhões de pessoas em todas as Unidades da Federação, cobrindo quase 4,8 mil Municípios. A meta do Governo Federal é aumentar o número de pessoas assistidas para cem milhões e o número de equipes para trinta mil.

Mas esses não são os números mais importantes, Srªs e Srs. Senadores. Os benefícios do PSF são mais bem traduzidos pelos indicadores de saúde dos últimos anos nos Municípios cobertos pelo programa.

Segundo pesquisa do Ministério da Saúde, os investimentos no Programa Saúde da Família são um dos maiores responsáveis pela redução da mortalidade infantil entre 1990 e 2002. A ampliação em 10% da cobertura do programa resultou em uma queda média de 4,6% da mortalidade infantil. Nesse particular, os investimentos no PSF mostraram-se mais eficazes que outras medidas importantíssimas, como a água tratada e o aumento dos leitos hospitalares.

Acho, no entanto, que há um certo otimismo em causa própria do Ministério da Saúde. Não se pode subestimar o valor fundamental que têm, em questões de saúde pública, o abastecimento da água e o esgotamento sanitário.

Além da mortalidade infantil, outros indicadores também experimentaram melhorias expressivas nas cidades servidas pelo programa. Podemos citar, como exemplos, o aumento do número de consultas pré-natais, a redução do número de mortes decorrentes de complicações no parto, o aumento dos índices de cobertura vacinal, além da ampliação dos atendimentos nas Unidades Básicas de Saúde, que, por sua vez, desafoga os ambulatórios e os pronto-socorros dos hospitais de médio e grande porte.

Sr. Presidente, toda história de sucesso contém capítulos reservados aos obstáculos, e toda iniciativa bem-sucedida tem espaço para aperfeiçoamento e melhorias. Com o Programa de Saúde da Família, não poderia ser diferente.

A implantação do programa nas grandes cidades ainda é problemática. Existe dificuldade para contratar médicos em tempo integral - uma das exigências do PSF. Nos Municípios com mais de 100 mil habitantes, 60% das Unidades Básicas de Saúde não contam com esses profissionais. Há também complicações no que se refere aos incentivos financeiros fornecidos pelo Ministério da Saúde. Para receber os incentivos em nível máximo, o Município precisa comprovar que 70% da população é assistida pelo programa - objetivo relativamente fácil para Municípios pequenos e médios, mas complicado para municípios mais populosos.

Esses entraves, aliados a uma infra-estrutura precária em muitas localidades do País e a um nível ainda precário de desinformação da população, são alguns dos obstáculos com os quais as autoridades de saúde pública ainda terão que lidar nos próximos anos.

Em relação aos possíveis aprimoramentos do programa, vejo alguns pontos em que, muito claramente, o PSF pode ser aperfeiçoado. Um dos mais patentes, a meu ver, refere-se à composição das equipes de saúde. Sou da opinião que cada equipe deveria contar com pelo menos mais dois profissionais, ambos de suma importância para o bem-estar geral do indivíduo: um dentista e um psicólogo. Cada vez mais exigimos da Medicina uma preocupação com o ser humano como um todo. Em outras palavras, cuidar do corpo sem cuidar da mente é inútil, mesmo porque muitos males do corpo têm origem na natureza psicológica. A inclusão de um psicólogo nas equipes de saúde supriria essa importante lacuna e aperfeiçoaria a qualidade do atendimento das Unidades Básicas de Saúde. O mesmo pode ser dito da inclusão de um dentista na equipe, sendo desnecessário discorrer sobre os benefícios do tratamento dentário para a população, principalmente para a população pobre, que não tem meios financeiros para acessar os consultórios odontológicos pagos.

O Sr. Alberto Silva (PMDB - PI) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Concedo, com muita honra, o aparte a V. Exª.

O Sr. Alberto Silva (PMDB - PI) - Senador José Maranhão, V. Exª trata de um problema com muito conhecimento de causa, pois foi um dos grandes Governadores da Paraíba, e V. Exª acaba de detalhar para o País, por meio da TV Senado, a existência de um programa que funciona realmente. Faria apenas uma observação. Também fui Governador por duas vezes, assim como V. Exª, e cheguei à conclusão de que grande parte das pessoas adoecem porque as defesas do organismo dessas pessoas foram enfraquecidas por causa da fome crônica. O desemprego, Senador José Maranhão, é talvez um dos males maiores da comunidade brasileira, a falta de dinheiro para se alimentar. O médico pode até chegar à família, pois é louvável que se elimine, da maneira como V. Exª disse, a mortalidade infantil. Tudo bem! Naturalmente, são questões de natureza técnica que foram adotadas no Programa. V. Exª fala com conhecimento de causa e eu também: é necessário que se cuide dos dentes, porque, se a saúde entra pela boca, quem não tem dente não mastiga. Mas pior ainda é para quem não tem o que mastigar. Esse é o mal maior do País. Acho que devemos trabalhar conjuntamente, nós, aqui do Senado, e o Governo, para tratarmos de conseguir trabalho para a população, porque quem ganha e se alimenta não adoece. Parabéns a V. Exª pelo tema que aborda e pela precisão com que o apresenta!

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Obrigado a V. Exª pelo substancioso aparte, que incorporo ao meu discurso. Diria que, em matéria de experiência gerencial da coisa pública, V. Exª é um mestre, não somente pelo bom gerenciamento, mas, sobretudo, pela criatividade, pela forma como teve capacidade de conceber e implementar programas que responderam a questões do seu Estado, um Estado do semi-árido brasileiro como o meu, a Paraíba.

V. Exª fala de uma questão que foi abordada pela primeira vez no Brasil de forma convincente, não só às autoridades brasileiras, mas às autoridades de saúde e de alimentação do mundo inteiro, há mais de 50 anos, por Josué de Castro, no livro Geografia da Fome, em que ele mostrava que não apenas a fome total, mas a fome específica, sobretudo nas condições nordestinas, eram responsáveis pela geração de anões mentais, pessoas cujo intelecto não se desenvolveu plenamente em virtude da chamada fome específica de elementos básicos, como a proteína, os sais minerais e as vitaminas, que são essenciais à formação física do homem e, sobretudo, à formação cerebral, à formação do seu intelecto.

Portanto, incorporo o aparte de V. Exª ao meu discurso e levo às autoridades do Ministério da Saúde, agora Ministério da Alimentação ou da Fome, como queiram chamar, que estão se propondo a tratar dessa questão, a questão alimentar.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, considero o Programa de Saúde da Família uma das iniciativas mais felizes do Estado brasileiro. Prova de seu caráter de questão de Estado, e não de Governo, é sua adoção pelas sucessivas administrações, desde sua implantação durante o mandato de Itamar Franco.

É também uma exceção e um exemplo edificante, porque esta não é a constante da vida pública brasileira. De um modo geral, abandonam-se projetos importantes, projetos sérios, quando muda o Governo, por questões meramente pessoais ou político-partidárias.

A prioridade absoluta dedicada à saúde básica e ao PSF, pelo Ministério da Saúde, revelou-se uma decisão das mais acertadas, tendo em vista o retorno visível do investimento feito no programa da melhoria de indicadores, como a redução da mortalidade infantil. São previstos, no âmbito da expansão do PSF, investimentos de US$500 milhões até 2008, metades dos quais virá de empréstimos concedidos pelo Banco Mundial.

Aliás, quero aqui fazer um registro de reconhecimento, Sr. Presidente, ao Banco Mundial, que tem amparado, na sua programação para a América Latina, muitos programas que realmente são de grande utilidade pública. Tive oportunidade de administrar, no meu Estado, um projeto que tem o apelido de “Cooperar”. Aliás, apropriado, pois se trata de um projeto para a realização de obras de infra-estrutura, especialmente de eletrificação rural e de recursos hídricos, na zona rural. É um projeto de combate à pobreza rural. Resta, agora, combater os obstáculos que impedem que o programa se desenvolva ainda mais.

Por fim, reitero a minha sugestão ao Ministério da Saúde, para que se incluam dentistas e psicólogos nas equipes básicas de saúde. O sistema de saúde básico melhorará ainda mais com a inclusão desses dois profissionais, que, sem dúvida nenhuma, são de muita utilidade para o PSF.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Agradeço-lhe a tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/09/2005 - Página 31138