Discurso durante a 161ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o projeto de lei que dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a exploração sustentável.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Considerações sobre o projeto de lei que dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a exploração sustentável.
Publicação
Publicação no DSF de 20/09/2005 - Página 31350
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • REGISTRO, APROVAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, TRAMITAÇÃO, SENADO, PROJETO DE LEI, INICIATIVA, EXECUTIVO, GESTÃO, FLORESTA, SETOR PUBLICO, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, CRIAÇÃO, SERVIÇO FLORESTAL, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, BUSCA, CONTENÇÃO, DESTRUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, DADOS, DESMATAMENTO, INEFICACIA, FISCALIZAÇÃO, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), REGIÃO AMAZONICA.
  • ANALISE, OPINIÃO, CIENTISTA, IMPOSSIBILIDADE, RECUPERAÇÃO, FLORESTA, INEFICACIA, PROGRAMA, MANEJO ECOLOGICO, EXPLORAÇÃO, PRODUTO FLORESTAL.
  • OPOSIÇÃO, PROJETO DE LEI, GESTÃO, FLORESTA, AMEAÇA, SOBERANIA NACIONAL, CONCESSÃO, EXPLORAÇÃO, EMPRESA ESTRANGEIRA, COMENTARIO, ESTUDO, MAÇONARIA, NECESSIDADE, REFORÇO, FORÇAS ARMADAS, REGIÃO AMAZONICA, IMPORTANCIA, DEBATE, SENADO.
  • GRAVIDADE, ILEGALIDADE, EXPLORAÇÃO, MADEIRA, FLORESTA AMAZONICA, COMENTARIO, LEGISLAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, PROIBIÇÃO, EXTRAÇÃO, IMPORTAÇÃO, PRODUTO, BRASIL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GRAVIDADE, DESTRUIÇÃO, RECURSOS NATURAIS, PLANETA TERRA.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, está sob nossa apreciação, primeiro na Comissão de Assuntos Econômicos e depois em plenário, o projeto do Executivo, já apreciado pela Câmara dos Deputados, que dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável e institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro.

A proposição cria ainda o Fundo Nacional de Desenvolvimento. Procura-se mais uma vez uma solução para a defesa do nosso notável patrimônio florestal, que se apresenta como o segundo maior do mundo e o primeiro em biodiversidade de espécies e ecossistemas. No entanto, um quinto da Amazônia brasileira já desapareceu neste último século. São riquezas incalculáveis que se vão deteriorando ano a ano não pela natureza que as criou e abrigou, mas pela incúria na falta de prevenção e na escandalosa ausência de fiscalização.

Eu que já fiz vários pronunciamentos sobre a floresta amazônica, acho sempre oportuno repetir o episódio vinculado a requerimentos de informação que encaminhei ao Poder Executivo, em 1996 e 1997, cujas respostas foram as seguintes: o Incra informou que não sabia se houvera ou não compra de terras por empresas estrangeiras. O Ibama, respondendo a um dos requerimentos, alegou que não tinha competência legal para avaliar e impedir a exploração ilegal das florestas brasileiras.

Vejam V. Exªs que os dois órgãos incumbidos das florestas nada sabem sobre as florestas brasileiras. Vejam o absurdo contra-senso de tais respostas.

Não foi de surpreender, portanto, a descoberta dos recentes escândalos que envolveram o Ibama.

Quanto ao Ibama, convém recordar que, no Governo José Sarney, quando foi criado, o seu então administrador, Fernando César Mesquita, conseguiu que o desmatamento de 17.770 quilômetros quadrados, registrado em 1988, caísse para 13 mil quilômetros quadrados, no período de 1989 a 1990, e para apenas 11 mil quilômetros quadrados, em 1990/1991.

Agora, no período 2004/2005, a devastação agravou-se ainda mais e chegou a 26 mil quilômetros quadrados. Salta aos olhos a obviedade de que alguma coisa ou muita coisa se fez ou se deixou de fazer para impedir as ameaças à integridade amazônica.

Parece também óbvio que os vigentes projetos de manejo, tanto os praticados no Brasil como em algumas outras nações, não têm logrado preservar as florestas. No que toca ao Brasil, além da realidade estatística, basta sobrevoarmos o País para visualizar os enormes claros denunciadores da destruição de matas jamais renovadas.

Muitos são os técnicos e cientistas que não acreditam nas políticas de manejo até aqui praticadas em florestas tropicais. Edward Wilson*, professor de Harvard* premiado por suas obras, considera inviável a recomposição artificial das florestas tropicais. Para ele, as matas tropicais estão sendo danificadas de forma tão indecente que mesmo as mais modernas tecnologias de reflorestamento não poderão trazê-las de volta à vida.

Sua opinião é de que a mata pudesse ser economicamente utilizada só depois de mapeada, polegada por polegada, em que cada árvore de valor científico e ambiental fosse devidamente identificada. A atividade madeireira só poderia ser exercida nas bordas da cobertura vegetal de modo que não houvesse impacto imediato muito grande, para que, em longo prazo, a mata pudesse ser recomposta naturalmente.

Nossa prezada Ministra Marina Silva, ao que penso, tem opinião muito parecida com a do citado cientista. Aparteando um dos meus discursos de antanho, Marina Silva, no exercício da Senatoria, argumentou que algumas árvores da Amazônia têm vida de até 700 anos. Disse a Senadora: “Ora, se uma árvore precisa de 700 anos para atingir seu porte, como provaremos cientificamente que um plano de manejo pode dar certo? Os estudos que temos podem, no máximo, ter 30 anos de experiência e, se estudar espécies com um período de vida de 70 ou 100 anos já era complicado, imaginem o caso daquelas com longevidade muito maior”.

Disse mais no seu brilhante aparte:

Os planos de manejo ainda são experiências para as quais os nossos cientistas e pesquisadores com muito empenho tentam dar respostas. Mas precisamos ter cautela. Não podemos nos fechar a elas, claro, mas também não podemos ser irresponsáveis e achar que essas experiências, de maneira generalizada, responderão às nossas expectativas. Esses planos ainda não estão comprovados na realidade. São apenas especulação ou um desejo nosso de que dêem certo.

Srªs e Srs. Senadores, em discurso que proferi desta tribuna em 8 de julho passado, que mereceu substancioso aparte do Senador Mozarildo Cavalcanti, disse francamente que o Projeto de Lei nº 4.776, de 2005, é uma ameaça à nossa soberania. Abre largas portas para o loteamento da floresta amazônica ser aproveitado por empresas nacionais ou estrangeiras.

Essa proposição agride o interesse nacional, cedendo às suspeitas pressões de países, que, não tendo sabido conservar as suas florestas, querem agora nos ensinar a fazê-lo.

Como disse Mozarildo Cavalcanti, ao longo da nossa história temos sabido conservar a Amazônia, apesar dos que tentam desfigurá-la. Portanto, sabemos como agir, ao contrário de nações como a dos nossos irmãos do Norte, que agora se recusam sequer a assinar o Protocolo de Kyoto, a solução mundial para a preservação do meio ambiente.

Muito da minha convicção contrária ao referido projeto baseia-se em estudos efetuados por organizações maçônicas brasileiras. Tais estudos, inclusive, assinalam que não se tem dado às Forças Armadas a relevância que se faz urgente nas análises e decisões em torno da Amazônia.

A favor do citado projeto ressalta-se naturalmente a responsabilidade que sobre o mesmo assume a nossa Ministra Senadora Marina da Silva. Sob tal patrocínio sempre restam esperanças. Talvez não exista ainda uma figura pública que tanto conheça a realidade amazônica como Marina da Silva: nascida em meio a seringais, criada a sombra de árvores gigantescas da nossa hiléia, estudiosa do assunto e possuidora de talento e espírito público que tem aprimorado em sua atuação parlamentar.

O SR. PRESIDENTE (Roberto Saturnino. Bloco/PT - RJ ) - Senador Edison Lobão, peço permissão a V. Exª para prorrogar a sessão por cinco minutos, a fim de que V. Exª conclua o seu pronunciamento.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Tem a gratidão desse seu humilde colega.

Sr. Presidente, credite-se à Marina seriedade e competência ao debater a melhor solução para a defesa das nossas florestas.

No entanto, o inimigo número um de uma política de manejo técnica e inteligente não está somente nos terríveis incêndios a que, periodicamente, assistimos pela televisão, como se transcorressem num filme de terror. Vejo-o na busca desenfreada pelas madeiras nobres. Por uma única árvore de valor econômico apreciável, depredam-se as que a circundam. Nisso há um comprometimento irreversível da biodiversidade que alcança o paroxismo pela crescente demanda mundial por madeiras e por sua polpa.

A China oferece um importante dado em relação ao que se passa nesse setor. Seus governos sabem preservar com rigor as florestas: lei chinesa em fins dos anos 90 baniu a extração de madeira em várias regiões, do que resultou, nos dias presentes, um aumento de 17,5% na sua cobertura florestal. No entanto, a China ocupa o primeiro lugar no ranking dos que compram madeiras extraídas de forma legal ou ilegal pelo mundo afora. Ela está consumindo, atualmente, 135 milhões de metros cúbicos de madeira por ano, estimando-se que consumirá o dobro em 2010. Aquele país utiliza polpa de madeira num volume anual de 12,8 milhões de metros cúbicos, com estimativa de 29 milhões de metros cúbicos em 2015. O Brasil está em 2º lugar nas importações de polpa feitas pelos chineses.

Repito, Sr. Presidente: a China proibiu a devastação de suas florestas, a derrubada de árvores, mas é hoje a maior importadora mundial de árvores do mundo inteiro, e o Brasil é o segundo maior fornecedor da China. É um escândalo isso.

Informe-se ainda que, segundo dados de técnicos do Inmetro, a maior parte dos móveis importados nos Estados Unidos é proveniente da China, que processa a matéria-prima importada de países como o Brasil, e reexporta o produto acabado para os Estados Unidos.

A revista Veja, na sua edição de 7 do corrente mês, publicou a reportagem: “A Cegueira da Civilização”, comentando o recente livro de Jared Diamond, geógrafo de grande sucesso da Universidade da Califórnia, conhecido e respeitado pelas análises a propósito da irracionalidade com que se incorre na devastação dos recursos naturais. Esse e outros cientistas citados na publicação argumentam que a defesa do meio ambiente não significa o abandono do conforto ou de outras modernas conquistas da humanidade que aprimoram a qualidade de vida do ser humano. Bastaria que prevalecessem o bom senso, o corte dos desperdícios e a preocupação pelo legado que se vai deixar às futuras gerações para que se conseguisse o equilíbrio que evitaria piores catástrofes. Recorda-se a civilização maia, a mais brilhante das pré-colombianas, que devastou as matas pela necessidade de alimentar uma população crescente. Com isso, tornou as terras erodidas, suas colheitas fracassaram e a fome dizimou a população. Os polinésios da Ilha de Páscoa, na febre do desmatamento, não pararam até arrancar a última árvore. No século XVII, suas fontes de alimentos estavam esgotadas, em meio a guerras civis, com os sobreviventes alimentando-se de ratos e recorrendo ao canibalismo.

O modelo oposto é o do Japão. Não obstante sua enorme densidade populacional, mantém atualmente 70% de sua área coberta por florestas. Contudo, no Século XVII, um período de prosperidade elevou o crescimento da população e da demanda de madeira para construção de casas e para lenha, ocasionando o desmatamento e a conseqüente escassez de madeira. Graças aos xoguns (chefes militares com poderes não raro superiores aos do imperador até meados do Século XIX), o carvão substituiu a lenha nas casas domésticas, estabeleceram-se normas para dificultar a extração de madeira e foram criados programas de reflorestamento.

Sr. Presidente, na hipótese de aprovação definitiva do projeto dispondo sobre a gestão de florestas públicas para produção sustentável, será que podemos confiar na eficiência da nossa fiscalização e na nova política de gestão de florestas públicas para a produção sustentável?

Até hoje não conseguimos impedir os incêndios intencionais das matas; não se conseguiu impedir a grilagem nem a devastação de grandes extensões florestais; órgãos como o Ibama e o Incra dizem ignorar ou não ter competência para determinadas ações decisivas em defesa das florestas, como já historiei no início deste discurso.

São fundadas, pois, as minhas reações às normas traçadas pela proposição, em que pesem a autoridade e o prestígio de quem a patrocina, a Ministra Marina Silva.

            O Senado vem realizando sucessivas audiências públicas em torno do assunto, e estou convencido de que é possível, com o talento dos nossos legisladores, o que tantas vezes ocorreu com outros projetos. Isto é, aprimorar as normas que se propõem, de modo a que correspondam aos reais interesses brasileiros, e não aos dos que ambicionam gerir e aproveitar o que a natureza um dia concedeu a nós, no Brasil.

Sr. Presidente, muito obrigado pela tolerância de V. Exª e dos Srs. Senadores.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/09/2005 - Página 31350