Pronunciamento de Mozarildo Cavalcanti em 20/09/2005
Discurso durante a 162ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Preocupação com a tramitação em regime de urgência do projeto sobre gestão de florestas públicas, da criação do Serviço Florestal Brasileiro e do Fundo de Desenvolvimento Florestal.
- Autor
- Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
- Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
- Preocupação com a tramitação em regime de urgência do projeto sobre gestão de florestas públicas, da criação do Serviço Florestal Brasileiro e do Fundo de Desenvolvimento Florestal.
- Aparteantes
- Geraldo Mesquita Júnior, Jefferson Peres, Valdir Raupp.
- Publicação
- Publicação no DSF de 21/09/2005 - Página 31398
- Assunto
- Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
- Indexação
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- QUALIDADE, RELATOR, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, PROJETO, GESTÃO, FLORESTA, SETOR PUBLICO, CRIAÇÃO, SERVIÇO FLORESTAL, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, APREENSÃO, REGIME DE URGENCIA, MOTIVO, NECESSIDADE, APERFEIÇOAMENTO, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA.
- COMENTARIO, REDUÇÃO, DESMATAMENTO, FLORESTA AMAZONICA, APREENSÃO, FALTA, PREVISÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, SERVIÇO FLORESTAL, CONFLITO DE COMPETENCIA, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), AUMENTO, BUROCRACIA, SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, LIDER, GOVERNO, SENADO, RETIRADA, REGIME DE URGENCIA, PROJETO DE LEI.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs. Senadoras, tramita no Senado Federal projeto da maior importância para o País e para a Amazônia. Refiro-me ao Projeto que trata da gestão das florestas públicas, da criação do Serviço Florestal Brasileiro e do Fundo de Desenvolvimento Florestal.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com certeza, é louvável o projeto e o seu objetivo. Realmente, não se pode admitir que nada seja feito pela Amazônia no sentido de autorizar que ali se produza, que ali se faça, que a região se desenvolva, porque, até aqui, os mecanismos utilizados pelo Governo Federal sempre foram para dizer que, na Amazônia, nada se pode fazer. Por outro lado, está-se tapando o sol com a peneira, na medida em que se proíbe que se faça legalmente o desenvolvimento da Amazônia, pois se incentiva que seja praticada a ilegalidade naquela região, com ações muitas vezes nefastas para o próprio desenvolvimento.
Sr. Presidente, sou Relator deste projeto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e sobre ele tenho me debruçado, com a ajuda da Consultoria Legislativa do Senado Federal que elaborou Nota Técnica, além de já ter elaborado um pré-parecer. Hoje este projeto foi discutido na Comissão do Meio Ambiente e dele pedi vista, inclusive para apresentar, se for o caso, voto em separado, e estou preocupado com este projeto, que tramita em regime de urgência, solicitada pelo Presidente da República.
Ora, Sr. Presidente, a Amazônia, há 505 anos, é do Brasil. Durante todo esse período não se mexeu, na Amazônia, sequer em 12% de sua área. No entanto, faz-se terrorismo com certas palavras como devastação, estado caótico, e a Amazônia é sempre vista como se lá só morassem vilões e bandidos, que lá estão para saquear nossas riquezas.
O certo é que um projeto tão importante como este tem muitas brechas que atentam contra a soberania nacional, contra a defesa do País. Este projeto deveria, sim, já ter sido enviado para o Congresso; foi para a Câmara, lá também tramitando em regime de urgência, e, posteriormente, nesta Casa, temos de votá-lo em 45 dias. Sr. Presidente, com essa urgência, praticamente não se vai conseguir aperfeiçoá-lo em nada, pois, como disse, o projeto tem um bom objetivo, mas muitas brechas têm de ser eliminadas. Caso contrário, abriremos a maior área, na verdade fala-se em florestas nacionais, portanto onde houver, em qualquer Estado, mas a maior quantidade de floresta do Brasil está na Amazônia, que representa 60% do território nacional.
Hoje, o próprio Presidente do Ibama disse que o desmatamento, na Amazônia, caiu 80%. Ora, se o desmatamento caiu, então, por que a urgência para a aprovação deste projeto, se o desmatamento, em alguns Estados, praticamente não ocorreu na Amazônia?
Mais grave ainda: conforme o Senador Gilberto Mestrinho nos advertiu hoje, não há, no Orçamento para o ano que vem, nenhuma previsão para financiar esse serviço florestal brasileiro que está sendo criado. Trata-se de um órgão a mais, quando deveria ser uma atribuição a mais do Ibama, que já existe. Mas, não; os próprios funcionários do Ibama não foram ouvidos. Hoje, na audiência dos funcionários do Ibama, estava o representante protestando contra a criação de mais esse órgão público que, com certeza, terá vários cargos comissionados e que será mais um órgão, digamos assim, para complicar a burocracia deste já tão burocrático Estado brasileiro.
Sr. Presidente, quero aqui dizer que não sou contra o projeto; sou contra, sim, a forma como o projeto está sendo encaminhado. Sou contra a negativa que se dá ao Senado em poder aperfeiçoar o projeto, como se os técnicos dos Ministérios, principalmente os do Meio Ambiente, fossem os mais iluminados deste País. Como a Câmara dos Deputados pôde mexer no projeto e nós não? Então, o que estamos fazendo aqui? Não somos a Casa Legislativa Revisora? Não somos, portanto, a Casa responsável pela palavra final na aprovação de um projeto oriundo do Poder Executivo?
Sr. Presidente, como amazônida, como brasileiro, estou realmente preocupado com a maneira pela qual o Governo Federal está encaminhando este projeto com tanta urgência.
Quero, desta tribuna, fazer um apelo ao Presidente da República e ao Líder do Governo no Senado para que essa urgência seja retirada a fim de que possamos discuti-lo mais profundamente, e, assim, possamos aprimorá-lo. Até porque não tem dinheiro para implementá-lo no ano que vem. Então, não há razão para a urgência, pois, não há crescimento em áreas desmatadas, tampouco há recursos para se implantar o Serviço Florestal Brasileiro, e sequer há recursos para serem aplicados no Ibama. Aliás, hoje, o Correio Braziliense traz que o Ibama está falido, e nós, aqui, querendo aprovar um projeto que, na verdade, estatiza as florestas da Amazônia para, depois, concedê-las, por um prazo de até 40 anos, para quem? Será, Senador Geraldo Mesquita Júnior, que será para os pequenos lá da Região Amazônica? Será que vai ser para alguma empresa pequena da Região Amazônica?
Ouço V. Exª, com muito prazer.
O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (P-SOL - AC) - Senador Mozarildo, que felicidade o pronunciamento de V. Exª. Que alívio ouvir um Parlamentar amazônida sustentando teses como as que V. Exª está sustentando. Realmente, para que essa correria? O histórico, o precedente em exploração das riquezas deste País, principalmente as da Amazônia, Senador, não nos autoriza a sermos precipitados. O histórico - V. Exª talvez conheça fatos com maior profundidade do que eu - dos Ludwig da vida, a exploração de manganês na Amazônia, a exploração de cassiterita, em Rondônia, portanto, a exploração de riquezas na Amazônia tem um histórico triste de degradação, de depredação, de empobrecimento, inclusive das populações que viveram em torno de alguns desses projetos. Neste projeto de gestão de florestas públicas, alio-me ao que V. Exª diz. Ninguém, previamente, é contra o projeto. O que não passa pela nossa cabeça, e não podemos admitir, de fato, é esse açodamento em se aprovar um projeto que terá grande repercussão em uma região como aquela, dessa forma, nessa correria. Precisamos de tempo para discuti-lo, Senador Mozarildo Cavalcanti, ao tempo em que organismos como o próprio Ibama, que V. Exª cita - o presidente do Ibama, hoje, nosso querido amigo, Marcos Barros, declarou publicamente que teve medo de inclusive aceitar o convite da Ministra Marina Silva para assumir o Ibama, tal era a desproporção entre os seus objetivos e a estrutura que o organismo oferecia para quem se atrevesse a ser gestor dele. Então, o próprio Presidente do Ibama está reconhecendo que não tem condições técnicas, materiais e estruturais para dar conta das tarefas e atribuições de elevada importância daquele organismo. Por que, então, não reforçarmos o Ibama? Por que não oferecermos ao Presidente do Ibama e aos seus servidores dedicados a estrutura de que necessitam para agir desde logo? Não existe essa história de que precisamos aprovar esse projeto na correria porque tem muita grilagem na Amazônia e por causa da questão da titularidade. Senador Mozarildo Cavalcanti, existem outros mecanismos com que se pode operar essa questão. Que se coloque o Exército Brasileiro, inclusive, em apoio a organismos que atuam naquela região, a fim de conter a sanha dos especuladores, a gana das pessoas que lidam com madeira e que, de fato, estão ocupando ilegitimamente terras na Amazônia e devastando a nossa região. Parabenizo V. Exª pela prudência, pela inteligência com que se pronuncia hoje nesta Casa, chamando à nossa reflexão, à reflexão desta Casa que não podemos ser imprudentes, Senador Mozarildo Cavalcanti, com uma questão tão importante para os amazônidas, para as populações tradicionais, que, como V. Exª afirmou agora, verão as coisas acontecerem como as pessoas vêem os Boeing passando por cima de suas cabeças. Ficarão, mais uma vez, alheios a tudo aquilo que acontecerá naquela região. Entrarão nessa relação, mais uma vez, como sempre entraram, como trabalho escravo. A exploração de borracha, notadamente no meu Estado, envolveu a população numa relação de trabalho escravo. Não podemos admitir que isso se repita em nosso Estado, nem na nossa querida região Amazônica. Então, parabenizo V. Exª, solidarizando-me com o seu discurso, um dos pronunciamentos mais importantes que já presenciei nesta Casa.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Muito obrigado, Senador Geraldo Mesquita, pela gentileza das palavras.
Quero ter a oportunidade de ouvir também o Senador Valdir Raupp, que é do nosso querido Estado de Rondônia.
O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Nobre Senador Mozarildo Cavalcanti, V. Exª tem absoluta razão ao demonstrar sua preocupação com esse projeto da nova Lei de Florestas. Em alguns aspectos, acredito que, na regulamentação do projeto, têm de ser definidas - e até onde devemos confiar nisso - a quantidade de áreas, se serão 10, 20, 50, 100 mil ou se não haverá limite para as empresas explorarem. É claro que não pode se admitir empresas estrangeiras, mas elas podem fazer parcerias com empresas nacionais e começar a entrar nessas áreas. Seria uma internacionalização da Amazônia em parcelas. Essa é uma preocupação. Por outro lado, preocupam-me as nossas madeireiras. As indústrias madeireiras estão sufocadas. O Ibama não concede licença, planos de manejo para que possam trabalhar legalmente. E o que está acontecendo? Elas entram para a clandestinidade e madeireiros são presos. Pessoas ligadas ao Ibama, por falta de critério na fiscalização, também são presas. Então, alguma coisa tem de acontecer. E V. Exª tem razão em se preocupar com isso. O que nos conforta e nos dá segurança é que temos como Relator na Comissão de Assuntos Econômicos o nobre Senador Jefferson Péres, do Estado do Amazonas, que é uma pessoa séria, que ama a Amazônia, assim como nós que moramos lá. Por isso, tenho confiança nesse relatório do Senador Jefferson Péres, que não vai deixar essas brechas, como V. Exª está-se referindo, que trazem insegurança a esse projeto. Parabéns pelo pronunciamento de V. Exª.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Valdir Raupp.
A Senadora Ana Júlia Carepa produziu um relatório. E S. Exª disse que gostaria de ter apresentado emendas para aperfeiçoar o projeto, mas não o fez atendendo ao apelo da Ministra Marina Silva e confiando que a lei será aperfeiçoada e regulamentada depois. O único ponto frontal de que discordo é essa urgência, essa correria, quando estamos aqui debatendo um projeto da maior significância para o País e para a Amazônia, principalmente. Ao mesmo tempo em que três CPIs estão funcionando, não há previsão orçamentária para a implantação do Serviço Florestal Brasileiro. Por que, então, essa correria?
Ouço, com muito prazer, o Senador Jefferson Péres, que é o Relator desse projeto na Comissão de Assuntos Econômicos.
O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador Mozarildo Cavalcanti, V. Exª tem razão: o projeto não deveria ter vindo para cá com urgência constitucional. Afinal de contas, não é tão urgente assim e, quando aprovado, não trará efeitos imediatos. Não se venha dizer que há o problema do desmatamento e dos incêndios, porque não haverá efeito pronto do projeto. Levará algum tempo até começar a ser implantado o serviço florestal a ser criado e as concessões a serem feitas. De forma que o Governo errou mais uma vez. Aliás, não é deste Governo não; é mal dos Governos - não é, Senador Mozarildo Cavalcanti? Ou baixa medida provisória, ou manda sob urgência constitucional, tirando ao Congresso o direito de debater com muita tranqüilidade um projeto dessa magnitude. Não gosto dos que demonizam o projeto nem dos que o santificam. O projeto pode e deve ser aperfeiçoado. V. Exª tem toda razão. No entanto, creio que o pior dos mundos, Senador Mozarildo, é não se fazer nada; é ficar como está. A Amazônia não pode ficar sem um disciplinamento legal...
(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)
O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Sr. Presidente, terminou?
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Não, o tempo foi prorrogado.
O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Não há disciplinamento legal, mas eu sou autodisciplinado. Senador, parabéns pelo seu pronunciamento.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Agradeço o aparte de V. Exª e peço um minuto só para terminar.
É pena que um projeto dessa magnitude, dessa importância para o País, não tenha tido oportunidade de ser discutido mais profundamente aqui, no plenário, nas Comissões, inclusive as audiências foram feitas uma em cima da outra, sem tempo para que pudéssemos assimilar o que cada um pôde dizer. Mas espero que, ainda assim, possamos aperfeiçoar este projeto, seja por meio de emenda, e ele voltará para a Câmara, porque não há, como disse o Senador Jefferson Péres, nenhuma emergência nisso, porque o próprio Presidente do Ibama disse que o desmatamento caiu na Amazônia. O Senador Gilberto Mestrinho, da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização, disse que não há previsão orçamentária para a implantação do serviço florestal brasileiro. Portanto, não há urgência. Podemos perfeitamente discuti-lo melhor.
Quero aqui terminar, fazendo um apelo ao Presidente da República e ao Líder do Governo nesta Casa para que retirem essa urgência e possamos discutir seriamente este problema.