Discurso durante a 166ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Citando Afonso Arinos de Melo Franco, apresenta críticas às declarações do Presidente Lula sobre a crise política no país.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).:
  • Citando Afonso Arinos de Melo Franco, apresenta críticas às declarações do Presidente Lula sobre a crise política no país.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 27/09/2005 - Página 33029
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).
Indexação
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESVALORIZAÇÃO, DIMENSÃO, CRISE, NATUREZA POLITICA, GOVERNO FEDERAL.
  • ACUSAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), CORRUPÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, OBJETIVO, EXECUÇÃO, PROJETO, OBTENÇÃO, PODER.
  • DEFESA, EFETIVAÇÃO, CONTRATAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), AUDITORIA, COMPROVAÇÃO, ORIGEM, RECURSOS, UTILIZAÇÃO, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • ESCLARECIMENTOS, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RELAÇÃO, IRREGULARIDADE, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PAGAMENTO, PROPINA, DEPUTADO FEDERAL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores: “O homem deixa de ser quem é para transformar-se naquilo de que os outros homens precisam.” (Afonso Arinos de Melo Franco, 1905.)

Infelizmente, a grandeza dessa metamorfose nem sempre se opera. Não acontece agora, lamentavelmente, com o Presidente da República deste País, que, no último final de semana, afirmou que a crise política é só barulho. Olha, realmente, tem razão o Presidente Lula. E que barulho é essa crise política! Tentar desqualificar esse escândalo de corrupção, o maior da nossa história, é certamente uma tarefa das mais difíceis para o Presidente Lula.

Aliás, o desencanto com o Presidente extrapola as fronteiras do nosso País e atinge, por exemplo, o escritor nicaragüense Sérgio Ramirez*, vice-presidente daquele país durante a Revolução Sandinista, que se disse desencantado com Lula. Ao lançar o seu último livro em Bogotá, esse escritor nicaragüense declarou: “Para aqueles que acreditam, como eu, que a Esquerda poderia levantar novas bandeiras, entre elas a da transparência, saber que há evidências no Brasil, sob um Governo de Esquerda, de atos vergonhosos cometidos, depõe contra a Esquerda e enfraquece a imagem que os cidadãos deveriam ter dela.”

Portanto, Sr. Presidente, Srs. Senadores, não é a indignação da Oposição que pode alterar a realidade dos fatos. Há uma repercussão internacional, talvez sem precedentes, relativamente à crise política que atinge o Brasil. E o Presidente da República menosprezar a dimensão dessa crise é temerário.

Sr. Presidente, as investigações de várias CPIs nos levam a concluir que existiu, realmente, um projeto de poder de longo prazo, arquitetado por alguns líderes do Partido dos Trabalhadores, fazendo com que o fim justificasse os meios e que se procedesse de forma a corromper a administração pública da maneira visível e escrachada mesmo, como se viu durante as investigações. Um projeto de poder que admitiu essa captação de recursos da forma mais escabrosa possível e imaginável. É evidente que são recursos públicos utilizados de maneira significativa, oriundos dos mais diversos setores da administração pública.

Há aqueles que haverão de indagar: “Onde estão as provas?” Provas existem, há réus confessos nessa história e aqueles que, comprovadamente, já participaram dessa rede organizada de corrupção - é bom repetir sempre -, que estabeleceu um relacionamento promíscuo entre o Poder Executivo, parte do Legislativo, partidos políticos e políticos, obviamente, ensejando esse momento de julgamento político em fase de execução na Câmara dos Deputados, inicialmente pelo Conselho de Ética, cumprindo prazos regimentais, oferecendo ampla oportunidade de defesa a todos os denunciados pela CPI dos Correios e do Mensalão.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, é bom destacar que uma rede organizada, complexa e sofisticada de corrupção, se idealizou, se implantou e se operacionalizou durante algum tempo, até que o escândalo explodisse em função daquela conhecida gravação que apanhou em flagrante o Sr. Maurício Marinho recebendo R$3 mil.

Eu gostaria de, mais uma vez, destacar que é convicção pessoal, que nos leva, inclusive, a insistir junto aos membros da CPMI, especialmente ao Presidente Delcídio Amaral e o Relator, Deputado Osmar Serraglio, para que se efetive, realmente, a contratação de auditorias independentes e autorizadas, para comprovar tecnicamente a origem dos recursos utilizados nesse esquema de corrupção. E os procedimentos administrativos estão sendo adotados para a contratação dessas auditorias, porque, ao final, se isso não ocorrer e se não buscarmos contar com o laudo técnico que comprove a origem dos recursos, haverão de discutir sempre a interpretação dos fatos. Alguns afirmando: “Há origem de recursos públicos comprovadamente”; e outros afirmarão: “Não temos provas materiais para afirmar, de forma cabal, que os recursos são de natureza pública.”

Por isso a insistência com a qualificação técnica da investigação por meio de auditorias competentes, autorizadas, que possam conferir laudo técnico, que tenha valor de prova junto ao Poder Judiciário, inclusive.

As duas vertentes fundamentais nesse esquema de corrupção: a vertente eleitoral, com o patrocínio de campanhas eleitorais, de políticos e Partidos da Base aliada, especialmente nas eleições municipais de 2004, com origem nas eleições de 2002, do Presidente Lula, já que as denúncias, sobretudo na CPI dos Bingos, dão conta de que há financiamento da campanha do Presidente Lula com recursos oriundos da área de jogos em São Paulo e no Rio de Janeiro. Há a confissão de Duda Mendonça de que parte dos débitos contraídos com ele e sua agência de publicidade, pela candidatura do Presidente Lula, foram saldados depois da posse do Presidente em conta bancária na Flórida ou em conta bancária em paraíso fiscal, com recursos certamente escusos, porque movimentados de forma ilegal, consubstanciando evasão de divisas e crimes contra a ordem tributária nacional e o sistema financeiro no nosso País.

Portanto, no princípio, o abastecimento do Caixa Dois da campanha do Presidente da República. Quanto a isso, há confissão e provas, basta que se investigue a movimentação dos recursos no Exterior, passando por várias contas bancárias identificadas e apresentadas à CPI espontaneamente pelo publicitário Duda Mendonça.

As providências já adotadas levarão tempo, porque percorrem os caminhos burocráticos, envolvendo um acordo bilateral entre o Brasil e os Estados Unidos, acordo de cooperação recíproca, que permite a investigação de movimentação financeira supostamente ilícita, partindo, evidentemente, da provocação da autoridade competente responsável. É por essa razão que os procedimentos adotados foram aqueles possibilitados pela legislação, mas é preciso, preliminarmente, adiantar que o resultado desse tipo de investigação leva tempo. Concluiremos os trabalhos da CPI antes que se chegue ao término dessas investigações no exterior.

Portanto, Senador Mão Santa, essa Comissão Parlamentar de Inquérito não terá condições de oferecer solução ao final dos seus trabalhos para a elucidação dessa movimentação financeira, significativa em valores, efetuada no exterior, com passagem por várias agências bancárias na Flórida, em Nova Iorque e em paraísos fiscais.

Posteriormente, durante a campanha eleitoral de 2004, envolvendo as prefeituras municipais, também houve prática confessada de corrupção. O Tesoureiro do PT, Sr. Delúbio Soares, confessou ao Ministério Público, à Polícia Federal e às CPIs do Congresso Nacional que repassou recursos ao PT e a partidos aliados durante a referida campanha. E o Presidente Lula afirma que é só barulho! Que não existe prova de nada, que ninguém pode ser indiciado, que ninguém pode ser responsabilizado civil e criminalmente. Imaginem as senhoras e os senhores se existissem provas! É uma vertente apenas.

A outra vertente diz respeito à corrupção na Câmara dos Deputados. Até aqui, felizmente, não há apontamento de que isso ocorreu no Senado Federal, mas já há comprovação - e é por essa razão que 18 Parlamentares foram denunciados por duas CPMIs - do pagamento de propina para a obtenção de apoio na Câmara dos Deputados.

Não há como negar a evidência desses fatos e não há como admitir um Presidente da República afirmar tratar-se apenas de barulho. Mesmo que o pronunciamento do Presidente da República se dê em palanque eleitoral, armado na periferia do País, não é justo admitir que quem exerce o cargo mais importante do País possa descer a esse patamar para fazer afirmativas estapafúrdias como essa.

Sr. Presidente, é evidente que o setor privado participou dessa relação espúria entre o que é o público e o que é privado. A confusão entre o que é privado e o que é público veio desde a campanha eleitoral do Presidente Lula. Especialmente, visualizou-se essa confusão na posse do Presidente, quando as festividades de posse foram organizadas pelo Partido, e não pelo Cerimonial da Presidência da República...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alvaro Dias...

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - ... quando as despesas dessas festividades foram efetuadas por Marcos Valério, por meio do PT, e não do Poder Público. É evidente que, a partir daquele momento, o Sr. Marcos Valério resolvia dificuldades para conseguir facilidades e começava a plantar os seus tentáculos em todas as áreas da administração pública federal, para fazer valer a sua influência nefasta e operar esse esquema de corrupção ora desmontado pelas investigações.

Antes de prosseguir, concedo, com satisfação, um aparte ao Senador Mão Santa. 

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alvaro Dias, primeiramente, queremos cumprimentá-lo pela maneira obstinada com que vem exercendo o seu mandato. V. Exª resgatou, com sua inteligência, naquele tempo em que não se acreditava mais em CPI, a CPI da Terra, que estava sob sua liderança e que era a única que funcionava. Agora, surgiram outras. Entendo que o PT se equivocou. Esse rolo que está aí é o que eles entendem por PPP, Parcerias Público-Privadas. Misturaram o que era de responsabilidade do Governo com o que era de responsabilidade do Partido, e está aí esse rolo todo que a sua CPI está esclarecendo ao Brasil.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

É preciso acreditar, por exemplo, na veracidade de que todos os recursos utilizados nesse esquema de corrupção, com o qual se adquiriram consciências na Câmara dos Deputados e conquistaram o apoio nas campanhas eleitorais, tenham tido origem nos empréstimos efetuados, pelas agências de dois bancos, ao PT e ao Sr. Marcos Valério, que os teria transferido ao Sr. Delúbio Soares, que os teria repassado...

(Interrupção do som.)

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Vou concluir, Sr. Presidente.

...a Lideranças políticas, a partidos políticos, supostamente para alimentar os caixas de campanhas eleitorais. Acreditar nisso seria como acreditar no impossível, na fantasia! São operações - até o próprio Vice-Presidente da República afirmou taxativamente não acreditar na existência desses empréstimos - contábeis, destinadas a promover a lavagem do dinheiro público, subtraído de forma desonesta para alimentar esse projeto de poder de longo prazo, arquitetado por alguns visionários.

Portanto, Sr. Presidente, viemos à tribuna repetir as razões da nossa convicção - não é essa a primeira vez que nos pronunciamos sobre esse modelo de corrupção instalado no Brasil - exatamente em resposta às afirmações do Presidente da República, nessa sua vã tentativa de convencer o País de que o que existe é apenas barulho e invenção dos oposicionistas e das elites, conforme o Presidente se acostumou a afirmar nos seus últimos pronunciamentos.

Na verdade, o que há é um enorme escândalo de corrupção; é uma rede sistêmica e organizada de corrupção, com muita complexidade e sofisticação, que dificulta as investigações, a apuração dos fatos e, sobretudo, a identificação da origem dos recursos utilizados nesse esquema.

É evidente que, mais uma vez, é preciso afirmar ao Presidente Lula:

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Agora, concluindo, Sr. Presidente. O grande corruptor é realmente o Poder Executivo, que, por meio de ilustres integrantes seus, arquitetou esse modelo de corrupção, financiou-a e designou os seus operadores principais, provocando essa grande indignação nacional.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/09/2005 - Página 33029