Discurso durante a 172ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a greve de fome de Dom Luiz Flávio Cappio. Posicionamento sobre o projeto de transposição das águas do rio São Francisco.

Autor
Garibaldi Alves Filho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RN)
Nome completo: Garibaldi Alves Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Considerações sobre a greve de fome de Dom Luiz Flávio Cappio. Posicionamento sobre o projeto de transposição das águas do rio São Francisco.
Aparteantes
César Borges.
Publicação
Publicação no DSF de 05/10/2005 - Página 33959
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • CRITICA, BISPO, ESTADO DA BAHIA (BA), GREVE, FOME, PROTESTO, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO.
  • COMENTARIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ANTONIO CARLOS VALADARES, CRIAÇÃO, FUNDOS, REVIGORAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO SEMI ARIDA, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ESTADO DA PARAIBA (PB), ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), ESTADO DO CEARA (CE), MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, empenhado, como disse, nos trabalhos da CPI dos Bingos, não pude ouvir os pronunciamentos dos vários Senadores que se revezaram nesta tribuna. Por isso, S. Exªs vão me perdoar se não vou poder fazer referência aos discursos daqueles que ocuparam a tribuna, como é o caso do Senador César Borges e da Senadora Heloisa Helena. Mas vou direto aos fatos, Sr. Presidente.

A atitude de protesto extremo do Bispo de Barra, no Estado da Bahia, D. Luiz Flávio Cappio, parece transferir o problema da transposição das águas do rio São Francisco para os excessos da intolerância, revelando a carência de argumentos sólidos, que, sem fanatismos, se contraponham à obra.

Não posso deixar de respeitar o Sr. Bispo de Barra, e mesmo compreender que, à falta de outros dados de discussão séria e objetiva, parta o prelado para uma greve de fome, que vai se constituindo em ato isolado e solitário de oposição à transposição.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Garibaldi Alves Filho?

            O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Senador César Borges, V. Exª tenha um pouco de paciência comigo, que já darei o aparte a V. Exª.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Sabe o que é, nobre Senador? É que eu o conheço, sei que é um homem equilibrado, e não gostaria que V. Exª cometesse injustiça em relação ao ato do Frei Luiz Flávio Cappio. Não tem nada de fora de razão - é muito pensado - nem fora de conhecimento de questão, porque ele conhece muito bem as questões. Quem quer fazer o projeto acima de qualquer opinião técnica e de qualquer jeito é o Governo Federal. Portanto, apenas peço a V. Exª que tenha cuidado com as palavras, para não cometer injustiça com esse religioso, que coloca sua vida à disposição. Colocar uma vida à disposição não é bobagem, não; não é para qualquer um nem é uma atitude simplista, nobre Senador. Como sei da sua coerência e do seu bom senso, só lhe pediria isso no início de seu pronunciamento.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Terei esse cuidado. V. Exª pode ficar tranqüilo.

Esse ato isolado, que não pode contar com a adesão dos que não submetem a inteligência a proposições apaixonadas, deixa patente, a meu ver, a fragilidade das teses opostas à transposição de pequena parcela - já foi dito aqui que se trata de uma pequena parcela, de uma ínfima parcela - das águas do rio São Francisco, para atender às justas reivindicações e prementes carências de boa parte do Nordeste.

Não creio que a atitude de Dom Luiz Flávio se justifique. Primeiro, porque deixar alguém de alimentar-se voluntariamente é um grave atentado contra a vida, opondo-se a todos os mais patentes valores evangélicos. Depois, porque os fins, por mais nobres que sejam, não justificam os meios, como os que atentam contra a dignidade da vida humana.

É certo não se poder ocultar justeza no clamor do Bispo de Barra, quando exige um esforço consistente de revitalização do rio São Francisco. É preciso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de fato, protegê-lo, para que renasça no seu esplendor de outrora. E essa é também uma exigência de todos os que conhecemos o Rio da Unidade Nacional.

Esse esforço de revitalização, porém, não implica se poder negar a importância da transposição de suas águas, do encontro das bacias, para atender ao semi-árido de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. São duas coisas distintas que podem e devem ser pensadas concomitantemente.

Existe inclusive um projeto, de autoria do Senador Antonio Carlos Valadares, que até há pouco estava aqui participando dos nossos trabalhos, que cria um fundo para revitalizar o rio São Francisco.

A atitude, portanto, do prelado tem a virtude de voltar a chamar a atenção para a necessidade de tudo ser feito para que o rio São Francisco não perca de vez sua pujança. Mas isso, volto a dizer, não pode ser pretexto para se impedir que grandes massas populacionais do Nordeste também participem dos benefícios que hoje e no futuro o rio lhes pode proporcionar.

Recusando-me, respeitosamente, a aceitar a atitude do Sr. Bispo como consentânea com os valores evangélicos de respeito à vida, à sua nobreza e preservação, penso que dela se pode tirar ainda proveito elevado e digno, na medida em que se assuma, com D. Luiz Flávio e com todos os interessados no problema, o compromisso, Sr. Senador César Borges, de se encetarem todos os esforços para livrar o rio São Francisco, desde a nascente à foz, dos danos que têm levado ao desequilíbrio do regime de suas águas, impossibilitando quase que por completo a navegação, colocando reiteradamente em risco a produção de energia elétrica, e, enfim, negando sentido à transposição de suas águas.

Sr. Presidente, a transposição, esta sim, pode transformar-se na grande alavanca de salvação do rio São Francisco. Sirva para isso o protesto de Dom Luiz Flávio, sirvam para isso as vozes candentes que se têm erguido contra obra: o debate, mesmo aceso e áspero, sempre é fecundo. Por séculos não se cuidou do rio, e aqui não podem fugir da responsabilidade os que hoje combatem a transposição. Agora unamos todo o Nordeste em defesa do rio, não só aqueles Estados por onde passa, como também aqueles outros que receberão suas águas.

Tenhamos convicção, porém, de que a união em torno dessa nova trincheira de luta passa pela transposição, que trará para o mesmo campo da reivindicação todos os Estados nordestinos.

Sirva para propiciar essa união de todos os irmãos nordestinos o ato de Dom Luiz Flávio, que, espero, repense sua atitude e faça do seu sacrifício o altar dessa nova luta.

Sr. Presidente, antes de conceder o aparte ao Senador César Borges, se S. Exª ainda o desejar, gostaria de dizer que, em meu Estado, a Igreja teve um sacerdote conhecido como “O Apóstolo das Águas”, Monsenhor Expedito Medeiros, figura que, durante muitos anos, clamou pelo aproveitamento das águas do Nordeste, inclusive das águas pertencentes ao Estado do Rio Grande do Norte e a outros Estados do Nordeste e também das águas do rio São Francisco.

Monsenhor Expedito não era homem de atos extremos, não era homem de gestos como os de Dom Luis Flávio, mas era um homem firme, e, quando se falava na luta pela água, ele defendia a causa ardorosamente, como defendeu a transposição das águas do rio São Francisco.

Concedo o aparte ao Senador César Borges.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Eu lhe agradeço, Senador Garibaldi Alves. Em primeiro lugar, V. Exª está certo quando diz que, no Nordeste Setentrional, há água e que ela não é utilizada por falta de investimentos governamentais. V. Exª deve ter números indicando que, da água disponível em seu Estado e no Nordeste Setentrional, só 25% é aproveitada e que, se houvesse investimentos para irrigação e para abastecimento humano, essas águas seriam mais bem aproveitadas. Em segundo lugar, quero dizer que aventar hoje uma revitalização do São Francisco para que o povo são-franciscano seja enganado, como esse Governo tem feito - ele não executa sequer o Orçamento-Geral da União; estão previstos recursos de aproximadamente R$600 milhões para a revitalização, mas não foram liberados sequer 10% desses recursos -, é realmente ter muita expectativa em um Governo que não cumpriu seus compromissos com o Nordeste. Então, não queremos, de forma alguma, impor sacrifícios aos irmãos nordestinos, nem ao Frei Luiz Flávio, que fez uma carta aos nordestinos dos Estados do Nordeste Setentrional. No entanto, não queremos que esses irmãos sejam enganados, porque essa água não vai atender a essa população mencionada aqui por V. Exª, mas a uma minoria, pois as obras complementares não serão feitas. Isso é obra para empreiteiro. De um lado, ele não faz a revitalização; de outro, dispõe de R$4,5 bilhões para gastar numa obra em véspera de eleição. É isso que estamos denunciando. Portanto, a suspensão dessa obra de imediato para uma reflexão maior, aí, sim, é uma atitude ponderada. Esperamos que homens de boa-vontade e de boa-fé como V. Exª possam agregar-se a todos nós que lutamos por essa posição.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Senador César Borges, V. Exª sabe que estamos discutindo aqui algo que já foi realizado no mundo todo. No mundo todo foram realizadas transposições de água de lugares onde existe água para outros onde não existe água. Isso é algo corriqueiro.

            Na verdade, o que estou querendo dizer a V. Exª é que a transposição de bacias - inclusive, V. Exª conhece bem o projeto, porque é um homem público, que estuda os problemas nacionais -, como V. Exª sabe, vai permitir que essa água seja uma garantia para aqueles períodos em que as pessoas chegam... Sr. Presidente, não são os animais, mas as pessoas! São vidas humanas que são ameaçadas! Não é só uma vida, como a do Bispo Luiz Flávio, mas milhares de vidas ameaçadas! Sr. Presidente, quantas pessoas já morreram no passado por conta da seca, por conta da falta de realização dessa obra?! Essa não é uma obra do Governo atual. Esse Governo está tendo a coragem de executá-la, mas essa obra já vem de três Governos, discutida secularmente.

[O Sr. Presidente faz soar a campainha.]

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Sr. Presidente, resolvo atendê-lo.

Eu gostaria, Senador César Borges, de continuar com este debate, mas o tempo aqui não é amigo da perfeição.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Sabe V. Exª que a questão da seca do Nordeste não será resolvida com essa transposição.

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. Bloco/PSB - SE) - Só quero chamar a atenção dos senhores oradores para o fato de que o debate realmente é edificante, importante, apaixonante, mas que, às 18 horas e 30 minutos, terminaremos o Expediente e ainda está inscrita a Senadora Heloísa Helena e o Senador Flexa Ribeiro, assim também o Senador Romeu Tuma, que, dentro em pouco, volta à sessão para falar.

Então, eu gostaria que V. Exª abreviasse, dando um aparte de meio minuto ao Senador César Borges...

Concedo mais um minuto a V. Exª. Faço questão que V. Exª fale.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Agradeço a V. Exª e ao Senador Garibaldi Alves. Mas o que eu estava dizendo é que esse projeto não vai resolver o problema da seca do Nordeste, nem dos Estados do Nordeste Setentrional, porque o rio São Francisco tem normalmente um caudal regular de vazão média de 2,5 mil metros cúbicos por segundo. Mas, a dez quilômetros, temos irmãos nordestinos morrendo de sede, porque o Governo não faz as obras necessárias de infra-estrutura. Não é a presença de água em um canal que vai resolver o problema da seca, mas a perenização dos rios, o aproveitamento da água de subsolo, o aproveitamento das águas que estão hoje reservadas no Nordeste, mas que o Dnocs não trabalha, porque não dispõe de recursos para a realização dessas obras. Sabe V. Exª muito bem dessa realidade. Apenas essa obra tem um apelo político grande, eleitoral. Isso talvez seja importante para esses Estados, mas não é importante para o Brasil, nem para o Nordeste como um todo. Muito obrigado, Sr. Presidente.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Senador César Borges...

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. Bloco/PSB - SE) - Senador Garibaldi Alves Filho, V. Exª já está encerrando o discurso?

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Sr. Presidente, já estou encerrando, só peço um pouco mais de tolerância. V. Exª deu um minuto ao Senador César Borges como aparteante. Então, tem que dar três minutos ao orador.

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. Bloco/PSB - SE) - Dou a V. Exª dois minutos.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - V. Exª ouviu o discurso do Senador Ney Suassuna aqui? Para V. Exª ter uma idéia, segundo dados Ministério da Integração Nacional, serão várias as ações de revitalização do rio São Francisco: macrodrenagem, saneamento básico, construção de dez mil cisternas, recuperação de matas ciliares, desassoreamento, recuperação de áreas degradadas pela mineração, macrozoneamento da bacia do rio, cadastro de usuários, revitalização ambiental do perímetro da bacia, construção de diques. Essas obras estão projetadas e serão executadas, Sr. Presidente! Já estão, inclusive, orçadas, beneficiando 589.750 pessoas.

Então, o Senador César Borges, como se diz, “está falando de barriga cheia”. Na verdade, S. Exª está combatendo um projeto que fará justiça a milhares de nordestinos que, no Rio Grande do Norte, na Paraíba, no Ceará, - e Pernambuco também, uma parcela do Estado - estão na expectativa da aprovação desse projeto.

E queria fazer um apelo a V. Exª: já que V. Exª é tão católico, tão voltado para os valores evangélicos, deveria ouvir a opinião dos nossos bispos no Nordeste Setentrional, para que V. Exª soubesse que a igreja de lá tem a exata sensibilidade do que representa o Projeto de Transposição das Águas do Rio São Francisco.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/10/2005 - Página 33959