Discurso durante a 173ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre o referendo acerca da comercialização de arma de fogo e munição no Brasil, a realizar-se no próximo dia 23 de outubro.

Autor
Sérgio Zambiasi (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Sérgio Pedro Zambiasi
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Reflexão sobre o referendo acerca da comercialização de arma de fogo e munição no Brasil, a realizar-se no próximo dia 23 de outubro.
Publicação
Publicação no DSF de 06/10/2005 - Página 34068
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, VOTO FAVORAVEL, ORADOR, ESTATUTO, DESARMAMENTO.
  • APREENSÃO, POSSIBILIDADE, IMPEDIMENTO, COMERCIALIZAÇÃO, ARMA DE FOGO, PROIBIÇÃO, AQUISIÇÃO, CIDADÃO, AUMENTO, CONTRABANDO, ILEGALIDADE, SEGURANÇA.
  • DEFESA, AVALIAÇÃO, EXIGENCIA, ESTATUTO, DESARMAMENTO, CONTINUAÇÃO, CAMPANHA, CONSCIENTIZAÇÃO, RECOLHIMENTO, ARMA DE FOGO.
  • COMENTARIO, OPINIÃO, CIDADÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), VITIMA, ASSALTO, DEFESA, DIREITO PESSOAL, AQUISIÇÃO, ARMA DE FOGO.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente, Senador Antero Paes de Barros.

            Srªs e Srs. Senadores, não pertenço à chamada Bancada das Armas. Fiz muitas campanhas de desarmamento e votei a favor do Estatuto. Mas confesso que, com a aproximação do dia 23 de outubro, quando votaremos o referendo das armas, muitas dúvidas tomam conta de mim. Temo especialmente que, ao desarmar o cidadão, este fique totalmente à mercê dos bandidos, especialmente em casa, com sua família, ou em sítios, propriedades em locais mais isolados. O rigor em excesso pode beneficiar apenas um lado, o fora da lei.

            Venho de um Estado onde vive uma das populações mais armadas do Brasil, que é o Rio Grande do Sul. E, às vésperas do plebiscito, o site do jornalista Políbio Braga informa que lá a venda de armas saltou de 201 unidades/mês para 800, conforme dados da Polícia Federal. E a quota mensal de 50 cartuchos por consumidor vem sendo totalmente preenchida. Isso demonstra o grau de preocupação dos cidadãos diante da possibilidade de proibição da venda de armas e munições, inclusive não levando em conta o perigo que representa um estoque de balas em casa e cuja validade é limitada.

            Vale destacar também a reportagem da revista Veja desta semana informando que, apesar de haver uma arma registrada para cada dez gaúchos, o Estado possui uma das menores taxas de homicídio do Brasil, ou seja, 12 para cada 100 mil habitantes.

            Já em São Paulo, onde o índice oficial é uma arma de 74 habitantes, a taxa de homicídio é de 28 por grupo de 100 mil pessoas.

            Tenho outras preocupações em relação ao referendo, Senador Antero Paes de Barros. O Brasil tem cerca de 12 mil quilômetros de fronteiras praticamente desguarnecidas. Todos os demais países da América do Sul vendem armas livremente. Será que não vamos virar o “paraíso dos contrabandistas”?

Em pronunciamento desta tribuna, no dia 17 de junho do ano passado, chamei a atenção para o livro intitulado “País Bandido”, escrito pelo jornalista gaúcho Carlos Wagner. Tive inclusive o cuidado de encaminhar a todos os gabinetes desta Casa um exemplar da publicação. O livro fala de máfias e da articulação de quadrilheiros com importantes ligações na Tríplice Fronteira, formada pelo Brasil, Argentina e Paraguai.

O repórter, que passou semanas na região recolhendo informações, afirma que 70% da maconha e 60% da cocaína consumidas pelos brasileiros, além de mais de 55% das armas em mãos de traficantes do eixo Rio-São Paulo, transitam pela Tríplice Fronteira.

Não é demais, portanto, afirmar que algumas das causas da violência, especialmente nas periferias das grandes cidades, está instalada nesse país que não existe oficialmente, esse pedaço de terra muitas vezes esquecido entre o Brasil, Argentina e Paraguai, exigindo ações imediatas das autoridades brasileiras na proteção de nossas fronteiras.

Sr. Presidente, Senador Antero Paes de Barros, Srªs e Srs. Senadores, não tenho nenhuma simpatia pelas armas mas, sinceramente, ainda não estou convencido dos resultados que a proibição de vendas pode trazer. O cidadão ficará proibido de adquiri-las legalmente, mas o contrabando e a ilegalidade seguramente crescerão muito.

Por isso, volto a bater numa tecla que já bati. É muito difícil imaginar a nova lei, se referendada, funcionando, quando nossos vizinhos comercializam armamentos livremente.

Apenas como exemplo, cito o caso do Uruguai, com centenas de quilômetros de fronteira seca com o Brasil. Hoje, pela manhã, informações recolhidas em Rivera, separada por uma rua da cidade de Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul, uma pistola húngara 14 tiros era vendida por US$800. Uma escopeta lunar calibre 12, automática, oito tiros, estava em exposição nas vitrines das armerias e era comercializada por US$1.500, com exigências mínimas para o comprador. Inclusive, segundo informações de lá, com propostas de entrega em domicílio.

Na cidade uruguaia de Trinta e Três, a 112 quilômetros da fronteira, armerias vendiam revólveres e pistolas sem registro e sem restrições. Lojas de armas em Rio Branco, separada apenas por uma ponte da cidade gaúcha de Jaguarão, ofereciam, nesta manhã, também sem qualquer restrição, munição de diversos calibres a partir de R$1,5 a unidade.

Esses são apenas alguns gargalos que abastecem o mercado ilegal de armas. O mesmo Brasil que decidirá dia 23 sobre a proibição do comércio de armas de fogo tem assinado um mecanismo conjunto para comercializar armas, munições e explosivos dentro do Mercosul, conforme chama atenção o jornalista Cláudio Dantas, em matéria sobre o Mercosul no jornal Correio Braziliense.

Pela relevância do tema, a simples proibição das armas no Brasil pode produzir resultados totalmente inversos dos esperados. No meu entender, o Brasil já tem uma das leis mais restritivas do mundo, que é o Estatuto do Desarmamento, que permite o porte de armas a algumas poucas categorias. Acredito que o ideal seria avaliar com rigor as exigências do Estatuto e continuar com as campanhas de conscientização e recolhimento de armas.

O trânsito e as bebidas alcoólicas também são fatores de alto risco para a segurança e motivo de milhares de mortos, mutilados e seqüelados. Para esses casos, pelo menos, continuamos acreditando que educar e conscientizar podem dar os melhores resultados. E por que não com as armas?

Afinal, maconha, cocaína e outras drogas também são proibidas, mas o tráfico continuar cada vez mais ameaçador.

Por todas essas razões e muitas outras, fico com a opinião do carioca Michel Kyrillos, citado também na reportagem da Veja e que votará “não” à proibição da venda de armas. Ele foi assaltado cinco vezes e, na última vez, ficou paraplégico. Ele disse que não sairia na rua com uma arma, mas que essa é uma escolha pessoal, um direito de cada cidadão.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/10/2005 - Página 34068