Discurso durante a 175ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da transposição das águas do Rio São Francisco.

Autor
Efraim Morais (PFL - Partido da Frente Liberal/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Defesa da transposição das águas do Rio São Francisco.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 08/10/2005 - Página 34594
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, GOVERNO, DIVULGAÇÃO, DETALHAMENTO, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, AGUA, RIO SÃO FRANCISCO, COMBATE, FALTA, INFORMAÇÃO, PROVOCAÇÃO, POLEMICA, PROTESTO, POPULAÇÃO.
  • CONTESTAÇÃO, ALEGAÇÕES, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, PREJUIZO, USUARIO, BENEFICIARIO, RIO SÃO FRANCISCO, MOTIVO, AUSENCIA, ALTERAÇÃO, CURSO D'AGUA, INEXISTENCIA, IMPACTO AMBIENTAL, DEFESA, RELEVANCIA, SOLUÇÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, POPULAÇÃO, REGIÃO NORDESTE, VITIMA, SECA, IMPEDIMENTO, PROCESSO, MIGRAÇÃO, TUMULTO, ZONA URBANA, DEFICIT, HABITAÇÃO, DEMANDA, TRANSPORTE, SEGURANÇA, INFRAESTRUTURA, ASSISTENCIA, SAUDE, EDUCAÇÃO.
  • ESCLARECIMENTOS, EFICACIA, PROJETO, ATUALIDADE, COMPLEMENTAÇÃO, REVIGORAÇÃO, BACIA DO SÃO FRANCISCO, BACIA HIDROGRAFICA, CONTINUAÇÃO, PROGRAMA, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA).

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, devo dizer a V. Exªs que nos últimos meses tenho me afastado um pouco desta tribuna em função dos nossos trabalhos como Presidente da CPI dos Bingos. Mas um assunto que é manchete em todos os jornais e em todos os programas de televisão deste País teria que também ter um comentário nosso, pois, como nordestino - graças a Deus - e paraibano, tenho que defender a transposição do São Francisco, defendendo a nossa Paraíba e outros Estados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com o fim, ontem, da greve de fome do Bispo Luiz Flávio Cappio, no Município pernambucano de Cabrobó, encerrou-se mais um capítulo dessa interminável novela em que se transformou a proposta de transposição das águas do São Francisco para abastecer o semi-árido nordestino. Como é do conhecimento geral, Dom Luiz Flávio estava em greve de fome desde o dia 26 do mês passado, em protesto contra o citado projeto, mas retrocedeu em sua determinação após ouvir as ponderações do Ministro Jaques Wagner, enviado do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Com todo respeito que merece o religioso, que, depois de recuperado, será recebido em Brasília pelo Presidente Lula, sua atitude não reflete uma posição oficial da Igreja Católica, eis que o Conselho Regional Nordeste 2 da CNBB ratificou agora sua postura em favor da transposição, anunciada em março de 2001.

Cabe ressaltar, Sr. Presidente, nesse embate, a atitude serena e ponderada do Presidente da República. Sabe V. Exª que sou um dos mais críticos do Presidente Lula, do seu Governo e da sua forma de governar. Tenho que ressaltar a atitude serena e ponderada do Presidente da República, que procurou o diálogo, expôs seus argumentos, dispôs-se a rever eventuais desacertos do projeto e, afinal, demonstrou que a obra em questão tem um cunho social legítimo e inquestionável.

Se nesse aspecto o Governo demonstrou habilidade, em outro as autoridades têm falhado sistematicamente, devendo mesmo extrair desse episódio uma lição. Refiro-me à dificuldade do Governo em tornar mais conhecido, detalhadamente, o projeto de transposição das águas do São Francisco, em combater a desinformação que vem dando margem a tanta celeuma e a tantos protestos.

Dom Luiz Flávio, de forma contrária, com sua greve de fome, deu ao Governo uma aula de marketing, pois seu protesto foi destaque na mídia brasileira e do exterior e fê-lo merecedor de uma carta pessoal do Papa Bento XVI, a qual lhe foi entregue pelo Núncio Apostólico Lorenzo Baldisseri.

Para evitar algum mal entendido, esclareço desde já que não há qualquer insinuação pejorativa em relação à atitude do religioso, mas, unicamente, uma contestação de que ele soube usar com mais eficiência que as autoridades federais uma estratégia de divulgação de suas idéias.

Eu disse, no início, Sr. Presidente, que o fim da greve de fome encerra mais um capítulo dessa longa novela que é a transposição das águas, e me pergunto quantos capítulos mais teremos de enfrentar até que uma pequena parcela das águas do Velho Chico, tão essenciais à sobrevivência e à qualidade de vida de suas populações ribeirinhas, possa ser desviada para acudir a população pobre, desnutrida e sedenta do Semi-árido nordestino.

Neste Parlamento, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como em tribunas as mais diversificadas de todo o território brasileiro, são recorrentes os discursos que acertadamente criticam a concentração de riquezas e combatem as desigualdades sociais e regionais. No momento em que temos oportunidade de mitigar a sede de 12 milhões de pessoas e de promover a sua redenção econômica, muito se esquecem de que a boa distribuição de um recurso essencial como a água é também uma forma de combater as desigualdades.

Novamente, Sr. Presidente, pergunto-me até quando enfrentaremos essa resistência a um projeto que, visando beneficiar milhões de brasileiros, não causará qualquer prejuízo àqueles já beneficiados. Refiro-me aqui aos 12 milhões de brasileiros que vivem na minha Paraíba, no Ceará, no Rio Grande do Norte e em parte de Pernambuco.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda no Império, em1859, já se cogitava de um sistema que transportasse parte da água do rio São Francisco para o rio Jaguaribe, no interior do Ceará. Passados quase 150 anos e formulados muitos projetos com essa finalidade, a população do semi-árido continua desassistida, sob argumentos absolutamente inconvenientes que, em última análise, revelam apenas conformismo, inércia e desprezo em relação às condições de vida de nossos semelhantes.

Os argumentos mais comuns escapam à busca das soluções, revelando, antes, uma postura de desconhecimento ou de acomodação. Diz-se, por exemplo, que o rio São Francisco está morrendo, podendo-se daí deduzir que, moribundo, o rio não deve servir a novos beneficiários, mas apenas àqueles que já gozem de suas dádivas.

A solução neste caso não seria coibir a incorporação de novos beneficiários, mas evitar a agonia do velho Chico. Entretanto, a verdade é que o rio São Francisco não está morrendo. Ameaçado pela poluição dos esgotos, pelas barragens construídas ao longo do seu leito, pelo assoreamento e pela derrubada de mata ciliares, ele requer cuidados, mas não está morrendo: sua bacia hidrográfica recebe, há duas décadas, a mesma quantidade de chuvas, com o que tem garantido o suprimento de energia elétrica de quase todo Nordeste brasileiro.

Quero dizer que nenhuma cidade da Paraíba, do Rio Grande do Norte ou do Ceará derrama esgotos dentro do rio São Francisco. Nenhum paraibano, sequer, derrubou a primeira árvore nas margens do rio São Francisco. Então, não podem culpar aqueles que querem água para matar a sede.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Vou concluir e terei o prazer de ouvi-lo.

Diz-se, Sr. Presidente, que a agricultura irrigada e a navegação poderiam ser comprometidas com uma redução na oferta de recursos hídricos, o que não é absolutamente comprovado pelas análises técnicas, ou que haveria perda na geração de energia. Na realidade, uma perda mínima, que poderia ser compensada com a instalação de usinas termelétricas ou, no médio prazo, com acréscimo na geração de energia em outras regiões, uma vez que o sistema nacional de distribuição é todo interligado.

Alega-se, ainda, que os atuais usuários ou beneficiários do Velho Chico terão prejuízos, o que é igualmente falso, pois o curso do rio não será alterado e as condições ambientais não serão afetadas. A quantidade de água a ser desviada, equivalente em média a 1% do total despejado no mar, é irrisória no que concerne ao volume hídrico, mas é essencial para aliviar a situação dramática e desumana em que vivem milhões de nordestinos. Este, sim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é um argumento consistente, real e contundente: o drama pessoal e familiar vivido por milhões de nordestinos do semi-árido, que sobrevivem duramente aos efeitos da seca. Muitos deles, em geral os mais jovens, os que não sucumbem ou resistem melhor às precárias condições de saneamento, de nutrição e de assistência à saúde, migram para os grandes centros, aonde vão...

(Interrupção do som.)

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Obrigado a V. Exª, Senador Edison Lobão, pelo tempo que me concede.

Aonde os mais jovens vão à procura de emprego e de sobrevivência para si e para os familiares. Vão para as metrópoles com a ilusão de ganhar algum dinheiro e assim melhorar as condições de vida de suas famílias. A dura realidade é conhecida de todos: na maioria dos casos, prevalece o desemprego, a moradia em favelas, a desintegração social, o convívio com a violência. Até que voltam para a dura vida do sertão. Quando voltam...

Sr. Presidente, o processo de migração nesse caso reflete a desigualdade brasileira e expõe o Brasil fraturado que todos queremos consertar. A migração provocada pela seca, além de representar um drama para as famílias nordestinas, ocasiona dificuldades para os governantes dos Estados mais ricos e das grandes metrópoles, agravando o inchaço urbano, o déficit habitacional, a demanda por transporte, por segurança, por infra-estrutura, por assistência à saúde e por ensino.

No entanto, Sr. Presidente, meus caros colegas Senadores, há quase dois séculos convivemos com esse fantasma sem que apresentemos efetiva solução no sentido de fixar o homem na sua terra de origem. Ao longo da nossa história ou de boa parte dela, diversas soluções para o combate à seca, incluindo a transposição de águas, têm sido apresentadas.

No que concerne aos projetos de transposição, alguns deles chegaram a entusiasmar os governantes e segmentos diversos da sociedade brasileira, enquanto outros não foram sequer examinados seriamente. O que se pode constatar, inegavelmente, é que esses projetos mais recentes incorporaram novas soluções, fundamentaram-se no acúmulo de experiências, enriqueceram-se com os debates e assim tornaram-se mais viáveis, não só do ponto de vista técnico, mas também na perspectiva ambiental e política.

Assim, se temos a lamentar que não mitigamos a sede do semi-árido há mais tempo, consola-nos o fato de que hoje as soluções estão mais amadurecidas. Não tenho a menor dúvida em afirmar que hoje, afinal, temos um projeto maduro, bem elaborado e consistente. Os projetos anteriores, mesmo aqueles de anos mais recentes, previam a captação de água para fins de transposição em volume bem superior ao do projeto atual. Além disso, davam maior destaque, no que concerne à utilização final, para a irrigação, em detrimento do consumo humano e animal. Com o decorrer do tempo, os projetos passaram a prever a extensão dos benefícios a um número maior de pessoas e, simultaneamente, eliminaram entraves então detectados.

Creio que, agora, Sr. Presidente, é chegada a hora de darmos um basta à perpetuação desse grave problema nacional. O projeto que temos agora, entre outras virtudes, completa, de forma decidida, as ações da revitalização do São Francisco, conferindo à sua bacia hidrográfica sustentabilidade sócio-ambiental. É preciso destacar, inclusive, que o processo de revitalização da bacia do São Francisco não é uma mera previsão, pois já está acontecendo num programa coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, que tem a participação do Ministério da Integração Nacional e de instituições representativas da comunidade da região. No ano passado, foram investidos R$26 milhões e, até o final desse exercício, deverão ser aplicados outros R$100 milhões. É necessário lembrar, também, que a Chesf, já há alguns anos, repassa parte do seu faturamento bruto para os Estados e Municípios da Bacia do São Francisco.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a transposição de águas não é um bicho-de-sete-cabeças nem uma aventura, mas uma solução técnica que tem sido utilizada desde a Antigüidade. Trata-se de uma experiência que já foi adotada em países os mais diversos, como os Estados Unidos, com a transposição das águas do rio Colorado, ou a Espanha, com a transferência de metade do volume do rio Tejo.

            O projeto está maduro, o meio ambiente estará protegido e as condições tecnológicas garantem o sucesso do empreendimento. Embora estejamos tratando do São Francisco e não do Rubicão, entendo que precisamos transpor de vez esse obstáculo, com a convicção de que só assim, afinal, vamos mudar a sorte de milhões de brasileiros que vivem no semi-árido sem água, sem comida e sem perspectivas.

Ouço o Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Parabenizo V. Exª, que, além de ser Senador da República, é um engenheiro. Queria atestar que isso é velho. Leonardo da Vinci, que foi aquela inteligência privilegiada do Renascimento, não foi apenas o pintor de Monalisa, ele era engenheiro. E foi o primeiro a fazer um tanque militar de guerra. E fez também a transposição do rio Arno. As cidades antigas são cheias de aquedutos. Lembro a V. Exª - agora, de qualquer jeito, é válido, porque está sendo chamado - que, no Nordeste, foram investidos milhares em açudes, que são um verdadeiro Mar Morto porque estão distantes do povoado. Por que não avaliar se não seria mais rápido e objetivo fazermos a adutora de centenas de açudes que existem no Nordeste, que são verdadeiros Mar Morto, porque estão distantes da população.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Agradeço a V. Exª e informo que existem os açudes e as adutoras, que são os caminhos, estão sendo construídas, mas, quando vem a seca, falta água. E o que queremos é exatamente isto: como se essa transposição funcionasse como um grande cano, onde existisse um registro. Na hora em que há sobra de água no São Francisco, essa água vai para os mananciais, que se abastecem; quando estiverem cheios esses mananciais, fecha-se o registro.

O que se precisa mesmo é pensar nos 12 milhões de brasileiros. Vamos ter que revitalizar? Vamos. Vamos ter que consertar o erro cometido por aqueles que vivem ao redor da Bacia do São Francisco? Vamos. Mas o que nós queremos é água, para matar a sede do povo da Paraíba, do Rio Grande do Norte, do Ceará e de parte de Pernambuco.

Confio, acima de tudo, em Deus, e tenho a convicção de que essa vitória pertencerá a todos os nordestinos e a todos os brasileiros. Podemos iniciar; revitalizar e, ao mesmo tempo, transpor.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/10/2005 - Página 34594