Discurso durante a 175ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa de plebiscito a respeito do projeto de transposição das águas do Rio São Francisco.

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Defesa de plebiscito a respeito do projeto de transposição das águas do Rio São Francisco.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 08/10/2005 - Página 34603
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REITERAÇÃO, DEFESA, REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, DEBATE, POLEMICA, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, AGUA, RIO SÃO FRANCISCO.
  • QUESTIONAMENTO, FALTA, VERDADE, GOVERNO, ALEGAÇÕES, DEFESA, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, EFICACIA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, SECA, BENEFICIO, MAIORIA, POPULAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.
  • EXPECTATIVA, SENADO, APROVAÇÃO, PLEBISCITO.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, como sempre, além dos vazios na alma e no coração, ainda há o vazio do plenário na sexta-feira, como sempre.

Alguns Parlamentares já falaram, tanto o Senador Alvaro Dias como o Senador Efraim Morais, de suas preocupações em relação ao projeto de transposição das águas do São Francisco, em relação à alternativa criada - espero que não de forma mentirosa, cínica, dissimulada - como resposta à greve de fome de Dom Luiz. Já tive, várias vezes, a oportunidade de aqui tratar desse tema, da transposição das águas do rio São Francisco. Já disse também, várias vezes, que para mim seria muito cômodo, prático, sedutor, muito típico do carreirismo e do oportunismo que sempre toca as pessoas no mundo da política, ficar fora do debate sobre a transposição das águas do São Francisco. Muitos militantes do P-Sol no Ceará, na Paraíba, no Rio Grande do Norte, pedem a mim e ao Senador Geraldo Mesquita Júnior que não entremos no debate sobre a transposição. Como é um tema de alta complexidade técnica e move corações no nordeste setentrional, se fôssemos oportunistas, se fôssemos carreiristas, jamais entraríamos num debate como esse porque, de alguma forma, ele acaba dividindo o povo nordestino.

Entro nesse debate, com todo respeito a quem tem posição contrária, porque estou convencida de que a proposta de transposição das águas do rio São Francisco, ou interligação de bacias, ou qualquer nome com que esse projeto venha a ser apresentado, constitui uma farsa técnica e uma fraude política. Isso, já está completamente demonstrado.

Nada me dá mais angústia do que ver o Presidente da República ou qualquer outra pessoa, ou por má-fé, ou por oportunismo político, ou por bom coração, por querer ajudar o seu Estado, dizer que esse projeto vai beneficiar 12 milhões de pessoas no Nordeste setentrional. Isso não é verdade, porque o canal passa a quilômetros de distância das regiões mais secas dos Estados que supostamente seriam beneficiados. O projeto de transposição, na forma como está apresentado pelo Governo, atinge menos de 3% do Semi-árido e menos de 1% da população do Semi-árido; portanto, jamais poderia significar benefício para 12 milhões de pessoas do Nordeste setentrional.

Por isso, estou ainda mais convencida - até para respeitar as pessoas de boa-fé, que defendem o projeto da transposição, não as do Governo, que fazem por demagogia eleitoralista essa farsa política, essa fraude técnica -, de que o bom mesmo é o plebiscito. É aquilo que o Senador Antero Paes de Barros diz: se há plebiscito para a questão das armas, que haja para a água. Isso é essencial. Por quê? Só tem medo da democracia...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senadora Heloísa Helena, V. Exª me permite um aparte?

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Concedo um aparte a V. Exª.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - V. Exª está cheia de razão: isso tem de ser melhor estudado. O Piauí - quis Deus que estivesse aqui um maranhense - tem água do lado do Maranhão, o rio Parnaíba, mas tem também um semi-árido. V. Exª acabou de mencionar 3% da região. Já o Piauí tem 40% de semi-árido: é a região de São Raimundo Nonato, Paulistana e Fronteiras. Esses 40% do Piauí não serão beneficiados. O Piauí, ô Lula, limita-se com o Ceará, com Pernambuco; e essa parte é do Semi-árido. Então, o projeto tem de ser reestudado. Ainda mais: projetos anteriores beneficiavam esses 40% do Piauí.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Eu estava falando que o Semi-árido do Nordeste setentrional é grande - como o é o da Bacia Hidrográfica do São Francisco -, mas o projeto beneficiará apenas 1% da sua gigantesca população. Então, a alternativa mais correta é o plebiscito.

Todas as vezes que o debate se instala no Parlamento ou entre as forças políticas é evidente que cada um passa a fazer o discurso que melhor repercute em seu Estado. Para mim, que estou construindo o Partido nacionalmente, a forma mais cômoda, se oportunista eu fosse, era fazer o discurso no meu Estado: em Penedo, em Piaçabuçu, nas áreas que estão lá na foz de São Francisco, no Baixo São Francisco; depois eu viria para o Congresso Nacional, ficaria caladinha e não criaria problema com os outros Estados - onde estou querendo construir o meu Partido, o P-SOL - que querem o projeto de transposição do São Francisco. Por isso, a melhor forma de resolver o conflito é o debate democrático e qualificado das idéias; essa é a melhor forma de resolvê-lo.

Por que Dom Frei Luiz Cappio acabou indo para a greve de fome? Eu já estava morrendo de medo de que algum outro bispo da região do Nordeste setentrional entrasse em greve de fome, dizendo: “Quero a transposição”. Era só o que faltava, para dividir ainda mais o nosso pobre Nordeste, já tão dividido por esse projeto. Então, o mais importante é o plebiscito.

Sei que o Governo agiu de forma arrogante, intolerante, desrespeitosa à legislação em vigor no País. Já disse aqui várias vezes, mas terei de fazê-lo novamente, porque, infelizmente, o Governo mente e repete várias vezes, como aprendiz de Goebbels, o publicitário de estimação de Hitler, que afirmava que mentira repetida muitas vezes vira verdade. O Governo acabou ludibriando mentes e corações do Nordeste setentrional e do Brasil de uma forma geral, alegando que o projeto é a panacéia que resolverá os males do Nordeste. Mas não é; trata-se de uma farsa técnica, de uma fraude política. Dizer que é para matar a sede dos pobres? Não é. O Governo pode dizer que está fazendo outra opção, não há nenhum problema. Se quer dar dinheiro às construtoras e às empreiteiras, preferiria que o desse, viabilizando trabalho com saneamento básico para 101 Municípios da Bacia Hidrográfica do São Francisco, que jogam seus esgotos in natura, ou nos afluentes ou diretamente no rio. Isso significaria dinamização da economia local, geração de emprego e renda, melhoria das condições de vida das populações ribeirinhas e melhoria significativa para o nosso rio São Francisco.

Tudo bem que o Governo queira dizer algo, só não pode mentir. Não há problema em dizer que esse projeto de transposição é para beneficiar os latifundiários da agricultura de exportação: da soja transgênica, do algodão colorido, da fruticultura de exportação, da carcinicultura. Não há nenhum problema. Agora, tem de assumir isso. O que não se pode fazer é mentir para os pobres. Não pode é dizer que o projeto se destina a matar a sede dos pobres do Nordeste setentrional, porque não é. Nas regiões mais secas, inclusive do Ceará, o canal passa a mais de 120 quilômetros da região mais seca, mais fraca, mais frágil do semi-árido cearense. O Governo só não pode mentir.

A imprensa toda hoje tratou da greve de fome de D. Frei Luiz Cappio, dizendo que pessoalmente lhe haviam falado uma coisa e fora estavam falando outra. Prefiro não acreditar que isso seja verdade. Sei que acontecem coisas com personalidades importantes do PT e da confiança do próprio Presidente Lula; sei que elas são capazes de gestos que nunca imaginei. Já disse várias vezes que talvez a paixão nos tenha cegado a ponto de não nos deixar entender os mistérios sujos da alma de alguns - e cada vez mais fico arrepiada, porque é como se fossem capazes de roubar e de matar. E fico muito triste. Também prefiro acreditar que o Governo deu a sua palavra e não quis enrolar, ludibriar uma pessoa de tão bom coração como D. Frei Luiz Cappio. Prefiro realmente pensar que o projeto está suspenso, que os novos debates serão iniciados, que as novas audiências públicas serão retomadas, já que o Governo desrespeitou todas.

O Governo rasgou a legislação de recursos hídricos do Brasil! Todas as audiências públicas do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, que, conforme manda a lei, era quem teria de decidir sobre o uso da água, todas as decisões, foram rasgadas - friso: rasgadas!

Depois que o Governo agiu de forma intolerante e desrespeitosa em relação à legislação em vigor do País, ludibriando a opinião pública, apresentando o projeto como se fosse a panacéia a resolver os males do Nordeste, dividindo os filhos da pobreza do próprio Nordeste, espero que agora seja tempo novo e que possamos aprovar a proposta de plebiscito. Muitas pessoas dizem: “Heloísa, mas se formos para o plebiscito, poderá ganhar a transposição”; outros que são favoráveis a ela alegam: “Pode ser que ganhe quem é contra a transposição”. Ora, só quem tem uma visão utilitarista da democracia é capaz de ser contra o projeto de plebiscito.

Espero que o Senado tenha a coragem necessária de aprovar o projeto de plebiscito, para que possamos discutir o assunto da forma mais clara e transparente, unindo o povo nordestino; propiciando que os Estados da Bacia Hidrográfica do São Francisco e os que supostamente seriam beneficiados com a transposição possam, da forma mais bela, legítima e democrática, decidir sobre o “sim” ou o “não” ao projeto de transposição do São Francisco.

Mais uma vez, deixo aqui meu apelo: que o Senado tenha a coragem política, que é necessária, de aprovar o projeto de plebiscito, a fim de que todos os irmãos nordestinos, do Nordeste setentrional, que supostamente seriam beneficiados com a transposição, e dos Estados da Bacia Hidrográfica do São Francisco possam, de forma livre, democrática e legítima, discutir a aprovação ou não desse projeto. Fora isso, é demagogia eleitoralista, fraude política e farsa técnica. Quem analisou o projeto sabe que é uma farsa técnica.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/10/2005 - Página 34603