Discurso durante a 176ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o projeto de Gestão de Florestas Públicas Brasileiras.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. SOBERANIA NACIONAL.:
  • Considerações sobre o projeto de Gestão de Florestas Públicas Brasileiras.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/2005 - Página 34687
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. SOBERANIA NACIONAL.
Indexação
  • CRITICA, PROJETO DE LEI, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL, GESTÃO, FLORESTA, PAIS, INCONSTITUCIONALIDADE, ARTIGO, AMEAÇA, SOBERANIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA.
  • APRESENTAÇÃO, DECLARAÇÃO, CHEFE DE ESTADO, GOVERNO ESTRANGEIRO, ORGANISMO INTERNACIONAL, DEFESA, IMPORTANCIA, INTERNACIONALIZAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, REGISTRO, AMEAÇA, AMBITO INTERNACIONAL, SOBERANIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA.
  • CRITICA, REGIME DE URGENCIA, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, DEFESA, AMPLIAÇÃO, DEBATE, IMPORTANCIA, OPINIÃO, CONSELHO DE DEFESA NACIONAL.
  • CRITICA, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), OBSTACULO, DESENVOLVIMENTO, ATIVIDADE AGROPECUARIA, EMPRESA, EXPLORAÇÃO, MADEIRA, REGIÃO AMAZONICA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, MELHORIA, PROJETO DE LEI, PRESERVAÇÃO, PATRIMONIO, SOBERANIA NACIONAL, BENEFICIO, POPULAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. MOZARILDO CALVANCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, encontra-se na Ordem do Dia do Senado um projeto que tem o nome charmoso de Gestão das Florestas Públicas Brasileiras. Na verdade, trata-se de um projeto que vai permitir o aluguel das nossas florestas, ao mesmo tempo em que cria mais um órgão público, o Serviço Florestal Brasileiro, e também um Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal que vai arrecadar o dinheiro desses aluguéis e a ele dar uma destinação que só Deus sabe qual vai ser.

Para aprofundar esses debates que venho fazendo desde o momento em que assumi a condição de relator do projeto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, quero chamar a atenção desta Nação e dos Senadores no sentido de que esse projeto não é um projeto inocente, não é um projeto perfeito, sequer é um projeto bem elaborado. É um projeto que tem pelo menos duas inconstitucionalidades e é um projeto que, apesar de excluir as empresas estrangeiras, tem inúmeras brechas que permitem que a Amazônia seja internacionalizada ou explorada por estrangeiros de maneira enviesada - todos nós sabemos como as multinacionais agem aqui: fazendo associação com empresas nacionais e levando o que é nosso de maneira tranqüila.

A propósito, para relembrar, rememorar mesmo, quero citar algumas frases de grandes estadistas internacionais sobre essa questão da Amazônia.

Al Gore, ex-Vice-Presidente dos Estados Unidos, em 1989, afirmou: “Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós”.

Mikhail Gorbachev, então ditador da extinta União Soviética, disse em 1992: “O Brasil deve delegar parte dos seus direitos sobre a Amazônia aos organismos internacionais competentes”.

François Mitterrand, então Presidente da França, também em 1989, disse: “O Brasil precisa aceitar uma soberania relativa sobre a Amazônia.

John Major, então Primeiro-Ministro da Inglaterra, afirmou em 1992: “As nações desenvolvidas devem estender o domínio da lei ao que é comum de todos no mundo. As campanhas ecologistas internacionais que visam à limitação das soberanias nacionais sobre a região amazônica estão deixando a fase propagandística para dar início a uma fase operativa, que pode, definitivamente, ensejar intervenções militares diretas sobre a região”.

Warren Christopher, que em 1995 era Secretário de Defesa dos Estados Unidos, falou: “A liderança dos Estados Unidos exige que apoiemos a diplomacia com a ameaça da força”.

Magareth Tatcher, Primeira-Ministra da Inglaterra, em 1983: “Se os países subdesenvolvidos não conseguem pagar suas dívidas externas, que vendam suas riquezas, seus territórios e suas fábricas”.

Uma entidade chamada Congresso de Ecologistas Alemães, em 1990, publicou uma matéria, dizendo: “A Amazônia deve ser intocável, pois constitui-se no banco de reservas florestais da Humanidade”.

Outra entidade, intitulada Grupo dos Cem, em 1989, numa reunião na Cidade do México, afirmou: “Só a internacionalização pode salvar a Amazônia”.

O Conselho Mundial de Igrejas Cristãs, reunido em Genebra, em 1992, afirmou: “A Amazônia é um patrimônio da humanidade. A posse dessa imensa área pelos países mencionados (Brasil, Venezuela, Colômbia, Peru e Equador) é meramente circunstancial”.

Esse mesmo conselho, nessa mesma reunião de Genebra, disse: “É nosso dever garantir a preservação do território da Amazônia e de seus habitantes aborígines para o desfrute pelas grandes civilizações européias, cujas áreas naturais sejam reduzidas a um limite crítico”.

Mais recentemente, o Sr. Pascal Lamy, que, àquela altura, era candidato a dirigente da Organização Mundial do Comércio e vinha da direção da União Européia afirmou o seguinte: “A Amazônia e as outras florestas tropicais do planeta deveriam ser consideradas ‘bens públicos mundiais’ e submetidas à gestão coletiva - ou seja, gestão da comunidade internacional”. O Sr. Pascal Lamy é hoje dirigente da Organização Mundial de Comércio.

Em 2000, o jornalista Carlos Chagas chamava a atenção para essas afirmações, mostrava claramente os riscos que corríamos ao não fazer para a Amazônia um plano de desenvolvimento racional, inteligente. Essa história de desenvolvimento sustentável não faz sentido, pois desenvolvimento que não é sustentável não é desenvolvimento. “Sustentável” é um jargão para vender melhor esse esquema de propaganda que, no meu entender, é muito nociva para o País.

A revista IstoÉ Dinheiro, em junho de 2005, publicou matéria dizendo: “Amazônia: querem tomar essa riqueza. Por trás da histeria ecológica há interesses econômicos escusos”. A matéria discorre sobre todas as potencialidades da floresta amazônica e sobre o tamanho da nossa floresta, que é de cinco milhões de quilômetros quadrados.

Trezentos e noventa milhões de reais é a verba orçamentária destinada à Amazônia pelo Governo até 2007. Vejam bem: para 60% do território nacional o Governo destina, apenas, R$390 milhões - é o que está no Orçamento do Governo Federal para a Amazônia, onde está todo o nosso capital, o que temos de floresta, de biodiversidade, de riquezas minerais.

Peço, Sr. Presidente, que essas matérias sejam transcritas como parte integrante do meu pronunciamento.

Esse projeto deve ser votado proximamente. Lamentavelmente, o Governo mandou esse projeto para a Câmara e depois para o Senado em regime de urgência constitucional. Significa dizer que não tivemos, em dias úteis, sequer trinta dias para examiná-lo. Alega-se que, como não existe uma legislação que proteja a floresta amazônica, é melhor ter essa legislaçãozinha ruim que estamos aprovando do que não ter nenhuma. Isso é uma falácia, é mais uma mentira. O pior é que quem está sujeitando nossas florestas a essa situação são brasileiros; é por pressão internacional, mas são brasileiros que estão fazendo isso.

Pior: amanhã, nenhum de nós, Senadores e Senadoras, poderá dizer que não votou nesse projeto. Como já disse em outras oportunidades no debate desse projeto, só espero que amanhã não sejamos comparados àqueles macaquinhos da lenda japonesa em que um tem as duas mãos nos olhos, o outro tem as duas mãos nos ouvidos e o terceiro tem as duas mãos na boca. É como se estivéssemos dizendo que não conseguimos ouvir nada de mau sobre esse projeto, que não conseguimos ver nada de mau e que, portanto, não falamos nada de mau a respeito do projeto.

O projeto não é bom. É ruim para o País, muito ruim para Amazônia. Não se pode conceber que se aluguem florestas, que se conceda a exploração de florestas por até quarenta anos sem submeter isso ao exame - refiro-me às florestas que estão nas faixas de fronteira - ao Conselho de Defesa Nacional. Aliás, o que a Constituição exige, mas que os sucessivos governos não têm respeitado. Eles fazem reserva indígena, reserva ecológica, tudo em faixa de fronteira, sem ouvir o Conselho de Defesa Nacional.

Da mesma forma, não pode o Senado se furtar a apreciar uma concessão dessa, concessão que pode conceder milhões de hectares a uma empresa para explorar as nossas florestas sem que nós, que representamos os Estados, sem que nós, que representamos o País, examinemos todos os detalhes dessa concessão. Não se pode admitir que meia dúzia de tecnocratas que eventualmente hoje estão no poder tenham o dom da verdade absoluta e queiram impor à Nação um projeto que é nocivo, um projeto que, como eu disse, tem inconstitucionalidades e tem essas imperfeições de deixar a coisa solta, completamente solta.

Aqui estou falando da Amazônia porque sou um homem da Amazônia, mas esse projeto permite a exploração de todas as florestas nacionais, do Brasil todo: do Pantanal, da Mata Atlântica, onde houver floresta. A Amazônia é onde há mais florestas; 80% das nossas florestas estão na Amazônia atualmente.

Portanto, precisamos efetivamente analisar esse projeto, discuti-lo e, se a maioria que acompanha o pensamento do Governo resolver apoiá-lo, vai aprová-lo sabendo dos riscos que esse projeto tem e o Senado Federal - principalmente - ficará na obrigação de assumir o ônus de ter aprovado um projeto dessa natureza. Este não é um projeto inocente, não é um projeto sobre o qual se possa dizer sequer que não fará mal nenhum ao País. Pelo contrário, ele fará, sim.

Na Amazônia, hoje, segundo dados dos próprios órgãos ligados ao meio ambiente, como Ibama e outros, o desmatamento já caiu e todas as atividades, como agropecuária e madeireiras, estão asfixiadas por causa de portarias e ações do Ibama, do Incra e da Funai. Além disso, agora vem esse projeto, acenando como se fosse salvador da pátria. Na verdade, a partir daqui, nenhum brasileiro mais poderá comprar terras na Amazônia; a partir daqui, qualquer empresa brasileira terá de alugar terras na Amazônia se quiser investir naquela região.

Então, deixo este registro. Vou fazer este debate aqui até o dia da votação desse projeto. Não quero agir como Pôncio Pilatos, lavando as mãos e dizendo que não tenho nada a ver com isso; quero registrar que não concordo, que existem erros e que o projeto será aprovado contra o meu voto, contra a minha posição.

Não entendo por que não podemos fazer um acordo, remendar esse projeto, mandá-lo de volta para a Câmara dos Deputados por dez dias, como manda a Constituição Federal, porque ele está em regime de urgência constitucional, e, depois, votar um projeto que tenha o escopo de ajudar o nosso País e de efetivamente fazer o bem para o nosso País, mantendo a nossa soberania, o nacionalismo e respeitando o nosso patrimônio lá, pois têm tantas pessoas - como eu li aqui - de olho nele.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Requeiro que esse material aqui lido seja constante do meu pronunciamento.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“Candidato a OMC defende gestão global da Amazônia” (Redesenvolvimento - ABDL);

“Ato explícito de pirataria” (Tribuna de Imprensa, 17/10/2000);

“Amazônia: querem tomar essa riqueza” (IstoÉ Dinheiro); e

“O que acontece na floresta” (IstoÉ Dinheiro).


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/2005 - Página 34687