Discurso durante a 178ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise das mudanças a serem feitas no sistema partidário e eleitoral do país.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • Análise das mudanças a serem feitas no sistema partidário e eleitoral do país.
Aparteantes
Demóstenes Torres, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 12/10/2005 - Página 34902
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, POLITICA NACIONAL, AUMENTO, INTERESSE, POPULAÇÃO, CRITICA, CORRUPÇÃO, CLASSE POLITICA.
  • DEMORA, DEBATE, TRAMITAÇÃO, REFORMA POLITICA, FAVORECIMENTO, CORRUPÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, RELACIONAMENTO, SISTEMA ELEITORAL, SISTEMA DE GOVERNO, DEFESA, PRIORIDADE, DISCUSSÃO, APERFEIÇOAMENTO, DEMOCRACIA, REFORÇO, PARTIDO POLITICO, FIDELIDADE PARTIDARIA, ETICA, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, REDUÇÃO, DESPESA.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, depois de ter ficado aqui no plenário durante algum tempo ouvindo considerações do Senador Mão Santa que são verdadeiras aulas sobre política, eu gostaria de, neste meu pronunciamento, abordar um tema que não está apenas aqui neste papel, neste discurso que eu lerei logo adiante, está na cabeça das pessoas.

Eu tenho percebido, Senador Mão Santa, Srªs. e Srs. Senadores, que a sociedade brasileira, hoje, forma uma consciência em relação à política, em relação a este momento que estamos vivendo, em que, por meio não apenas da TV Senado, mas dos noticiários nos diários locais e nacionais, as pessoas acompanham pari passu o que está acontecendo nesta República.

O que se destaca como extremamente positivo em todos esses lamentáveis acontecimentos, que revelaram a profundidade da ganância e da corrupção no País, é o evidente interesse da sociedade para com os acontecimentos políticos, para com as atitudes e posições dos governantes.

A conseqüência de toda essa frenética agitação é a enxurrada de críticas que o sistema político brasileiro tem sofrido; e nós, políticos, nos sentimos logicamente constrangidos diante desse momento. E, com isso, a febril discussão que se trava a respeito das mudanças a se fazer no sistema partidário e eleitoral vigente no País.

Foi exatamente no dia 19 de abril de 1995 que se aprovou a Comissão Temporária Interna para tratar da reforma política brasileira. Dez anos e três legislaturas depois, Srª Presidente, e absolutamente nada de prático foi votado. E a ausência de reformas estruturais em nossas instituições públicas acabou funcionando como um ingrediente a mais que favorece essa teia de subornos, mensalinhos, mensalões e outras práticas nefastas, que mancham, mas mancham mesmo a imagem do Congresso Nacional.

Como se não bastassem esses desvios, o sistema eleitoral relaciona-se com o sistema de governo, no qual o Presidente da República, para sobreviver, necessita constituir a maioria no Congresso Nacional, o que é algo complexo pela diversidade do quadro partidário. Essa dramática necessidade de formar a chamada base de sustentação é uma das matrizes que gera essa rede de favorecimentos e de vícios que contamina a vida nacional.

Assim, Srªs e Srs. Senadores, a reforma ampla das instituições brasileiras se impõe como imperativo histórico absolutamente imprescindível. E ela deve ser profunda, tendo como objetivo principal contribuir para o aprofundamento do regime político democrático, único caminho para resolver os nossos problemas sociais.

Para a concepção de tal objetivo, a reforma deve enfocar o reforço da governabilidade, fortalecendo os Partidos políticos e a fidelidade partidária, Senador Mão Santa. Nós somos, como a grande maioria do PMDB, autênticos peemedebistas. Podemos pregar, portanto, a fidelidade partidária. Eu estou no PMDB há 41 anos, sempre no PMDB.

Deve essa reforma, sobretudo, estabelecer a afirmação, Senador Demóstenes Torres, da moralidade pública, da ética na vida política, mediante procedimentos transparentes para o financiamento das campanhas eleitorais.

Mesmo que seja uma tradição no Brasil, é preciso repensar o voto personalizado. Cada candidato é um centro de arrecadação e gastos de campanha. Para potencializar suas possibilidades de vitória, deve concorrer com seus companheiros de Partido e diferenciar sua proposta daquelas por eles apresentadas. Uma vez eleito, tende a perceber a vitória como obra sua, pessoal, e a desconhecer a importância dos votos dados à legenda e a seus companheiros não eleitos, de chapa. Nos Legislativos, sentem-se livres para mudar de sigla, sempre que necessário. E não se preocupam em dar satisfações ao Partido que o elegeu. É aí que nasce o perigoso individualismo, outra fonte cruel de desmandos e desvios.

A fidelidade partidária, portanto, não deve ser encarada como um dispositivo autoritário ou limitador da atividade pública, mas como imperativo para o fortalecimento do verdadeiro sentido da democracia.

Senador Demóstenes Torres, certamente, devo ter, com o meu pronunciamento, provocado algum sentimento em V. Exª, que gostaria de ouvir, com o maior prazer.

O Sr. Demóstenes Torres (PFL - GO) - Senadora Iris de Araújo, V. Exª faz um pronunciamento que, como sempre, reflete bastante a sua capacidade intelectual, ética. Acredito que uma reforma política, efetivamente, deva passar por esses pontos que V. Exª elencou. Uma reforma política que não coíba gastos de campanha, que não valorize o lado ético do candidato, que não valorize o preparo, não tem qualquer sentido. Então, há diversos pontos dessa reforma política aqui que, efetivamente, merecem ser bem discutidos. Se vai haver financiamento público ou financiamento privado; se vamos ter o voto distrital; a fidelidade partidária que é essencial, que V. Exª tanto cultiva ao longo da sua vida, tendo sido até candidata à Vice-Presidente da República. Então, tudo isso penso que deve estar presente. Parabenizo V. Exª por esse discurso correto, tranqüilo, magistral e essa defesa que faz em favor da ética na política. Parabéns!

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Agradeço as palavras de V. Exª, que engrandecem e enriquecem o meu pronunciamento.

Nossas eleições são caras, conforme parâmetros internacionais. Senador Mão Santa, para se ter uma idéia desse custo, em 1994, os gastos totais declarados à Justiça Eleitoral situaram-se entre US$3,5 bilhões e US$4,5 bilhões. Nas eleições norte-americanas de 1996, o gasto declarado foi de US$3 bilhões!

Assim, um mecanismo que fixe as campanhas em torno dos partidos, Srª Presidente, e não de candidatos, implicará a redução da despesa. Com eleições mais baratas, deixaria de haver incentivo...

(Interrupção do som.)

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - V. Exª me permite?

A SRª PRESIDENTE (Serys Slhessarenko. Bloco/PT - MT) - Mais dois minutos, Senadora.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Com eleições mais baratas, deixaria de haver incentivo à prática do financiamento privado clandestino e às contribuições feitas “por baixo do pano”.

Fica, portanto, claro que a mudança do sistema eleitoral é o problema fundamental da reforma política no Brasil. As diversas opções existentes exigem discussão aprofundada e, provavelmente, experimentação e aperfeiçoamento. Seja, como disse o Senador Demóstenes Torres, o sistema eleitoral proporcional de lista fechada, seja o distrital puro ou, ainda, o sistema distrital misto, qualquer deles exige madura reflexão e sólida regulamentação para que funcione no Brasil.

Estou convencida da necessidade urgente de se colocar um paradeiro às sucessivas crises políticas do País, provocadas, majoritariamente, pelo sistema partidário-eleitoral vigente. Há que se fazer uma reforma, digna desse nome, que seja duradoura no tempo, provoque o amadurecimento de nossas instituições e saneie nossos hábitos políticos.

Eu teria ainda algo a dizer, mas entendo que existem outros oradores que aguardam para falar. Portanto, dou como lido o discurso e ofereço a mim mesma a oportunidade de ouvir o Senador Mão Santa neste momento.

 O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senadora Iris, quero dizer que sou testemunha da fidelidade partidária de V. Exª. Em um momento difícil do PMDB, V. Exª ofereceu o seu belo nome, e o PMDB, naquele momento, com V. Exª imolando-se, sacrificando-se, elegeu nove Governadores. E cinco deles estão aqui. Sou agradecido, porque, se cheguei a esta Casa, foi por causa da sua candidatura, que fortaleceu o Partido. O Raupp, o Garibaldi, o José Maranhão, o Maguito e o Mão Santa são frutos dessa circunstância. Agora, só discordo e não entendo - atentai bem, Presidente Serys! - o porquê de V. Exª ter dito que tem 41 anos de fidelidade ao Partido. Naquela campanha, eu achava que a senhora tinha 18, 20 anos; agora, acho que V. Exª simboliza o livro de Balzac: A Mulher de Trinta Anos. Não sei como V. Exª tem 41 anos de fidelidade, porque a senhora transmite muita juventude.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Obrigada, Senador.

Logicamente, fui traída pelos números e acabei praticamente contando a idade. Mulher nenhuma quer contar a idade, mas V. Exª me auxiliou, e vamos fazer de conta que o cálculo é esse, Senador Mão Santa!

Era o que eu tinha a dizer, Srª Presidente.

Muito obrigada.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DA SRª SENADORA IRIS DE ARAÚJO.

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A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que se destaca como extremamente positivo em todos estes lamentáveis acontecimentos que revelaram a profundidade da ganância e da corrupção no País é o evidente interesse da sociedade para com os acontecimentos políticos, para com as atitudes e posições de governantes.

A conseqüência de toda essa frenética agitação é a enxurrada de críticas que o sistema político brasileiro tem sofrido. E, com isso, a febril discussão que se trava a respeito das mudanças a se fazer no sistema partidário e eleitoral vigente no País.

            Foi exatamente no dia 19 de abril de 1995 que se aprovou a Comissão Temporária Interna para tratar da Reforma Política brasileira. Dez anos e três legislaturas depois, Sr. Presidente, e absolutamente nada de prático foi votado. E a ausência de reformas estruturais em nossas instituições públicas acabou funcionando como um ingrediente a mais que favorece esta teia de subornos, mensalinhos, mensalões e outras práticas nefastas que mancham a imagem do Congresso Nacional.

Como se não bastassem estes desvios, o sistema eleitoral relaciona-se com um sistema de governo no qual o Presidente da República, para sobreviver, necessita constituir maioria no Congresso, o que é algo complexo pela diversidade do quadro partidário. Esta dramática necessidade de formar a chamada base de sustentação é uma das matrizes que gera esta rede de favorecimentos e de vícios que contamina a vida pública nacional.

Assim, Srªs e Srs. Senadores, a reforma ampla das instituições brasileiras se impõe como um imperativo histórico e absolutamente imprescindível. E ela deve ser profunda, tendo como objetivo principal / contribuir para o aprofundamento do regime político democrático, único caminho para resolver os nossos problemas sociais.

Para a consecução de tal objetivo, a reforma deve enfocar o reforço da governabilidade, fortalecendo os partidos políticos e a fidelidade partidária. E, sobretudo, deve estabelecer a afirmação da moralidade pública, da ética na vida política, mediante procedimentos transparentes para o financiamento das campanhas eleitorais.

Mesmo que seja uma tradição no Brasil, é preciso repensar o voto personalizado. Cada candidato é um centro de arrecadação e gastos de campanha. Para potencializar suas possibilidades de vitória, deve concorrer com seus companheiros de partido e diferenciar sua proposta daquelas por eles apresentadas. Uma vez eleito, tende a perceber a vitória como obra sua e a desconhecer a importância dos votos dados à legenda e a seus companheiros, não eleitos, de chapa. Nos legislativos, sentem-se livres para mudar de sigla, sempre que necessário. E não se preocupam em dar satisfações ao partido que o elegeu. É aí que nasce o perigoso individualismo, outra fonte cruel de desmandos e desvios.

A fidelidade partidária, portanto, não deve ser encarada enquanto um dispositivo autoritário ou limitador da atividade pública, mas como um imperativo para o fortalecimento do verdadeiro sentido de democracia.

Dentre as regras a serem revistas, no mesmo sentido está o financiamento de campanhas, que guarda uma relação de funcionalidade estreita com os sistemas eleitorais.

Nossas eleições são caras, conforme parâmetros internacionais. Para se ter uma idéia desse custo, em 1994 os gastos totais declarados à Justiça Eleitoral situaram-se entre 3,5 e 4,5 bilhões de dólares. Nas eleições norte-americanas de 1996, o gasto declarado foi de 3 bilhões de dólares!

Assim, um mecanismo que fixe as campanhas em torno dos partidos, e não de candidatos, implicará na redução da despesa. Com eleições mais baratas, deixaria de haver incentivo à prática do financiamento privado clandestino e às contribuições feitas “por baixo do pano”.

Fica, portanto, claro que a mudança do sistema eleitoral é o problema fundamental da reforma política no Brasil. As diversas opções existentes exigem discussão aprofundada e, provavelmente, experimentação e aperfeiçoamento. Seja o sistema eleitoral proporcional de lista fechada, ou o distrital puro, ou, ainda, o sistema distrital misto, qualquer deles exige madura reflexão e sólida regulamentação para que funcione no Brasil.

Srªs e Srs. Senadores, estou convencida da necessidade urgente de se colocar um paradeiro às sucessivas crises políticas do País, provocadas, majoritariamente, pelo sistema partidário-eleitoral vigente. Há que se fazer uma reforma digna desse nome, que seja duradoura no tempo, provoque o amadurecimento de nossas instituições e saneie nossos hábitos políticos.

Almejo, sinceramente, que, passada a atual crise política, o Parlamento consiga aprovar regras sólidas e duradouras, que possam vigorar para as eleições municipais de 2008. O engajamento da sociedade, pressionando os Congressistas e o Poder Executivo, só ajudará à concretização desse importante passo no amadurecimento das instituições políticas do Brasil.

Mas, que fique claro, Sr. Presidente: podemos no futuro estabelecer a reforma institucional que seja próxima de nossos ideais, mas o que de fato se necessita é transformar de maneira radical a prática política no País.

De nada adianta termos modelos novos de regras eleitorais se permanecerem as práticas antigas, típicas dos aproveitadores que procuram a atividade política apenas para obter dividendos econômicos, corroendo o sistema e disseminando o vírus da corrupção.

O que se precisa é reformar a política por dentro, através de um profundo exame de consciência para detectar se realmente os representantes do povo estão sendo dignos desta alta responsabilidade delegada pelo voto popular.

Ao final do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, muito provavelmente o País perceberá que passou a metade deste período envolvido no atoleiro que tenta desvendar a origem dos desmandos e da corrupção.

Precisamos mais e mais de uma geração de políticos que seja expressão de um sentido puro de encarar a atividade pública, fazendo dela instrumento verdadeiro para transformar, não a sua conta bancária, mas a vida de milhares de brasileiros que continuam à margem da história, à margem da vida.

A reforma política há 10 anos espera pacientemente para nascer. É preciso cuidar para que não nasça velha, embotada pelos “costumes” e pelos “jeitinhos” que acabam se tornando cultura. Na verdade, são um culto a um passado que não quer se despregar do presente e que acha que pode perdurar no futuro. Assim, não adianta colocar remendo de pano novo em vestes velhas, porque a rotura será maior, como diz a Bíblia. Precisamos de leis novas, mas executadas por mentes igualmente renovadas, que refaçam os caminhos da história brasileira, que inicie um ciclo virtuoso, baseado em conquistas positivas para nossa gente. Precisamos de novas instituições que sejam o ancoradouro para mudanças essenciais na economia, que sepulte a supremacia do capital financeiro para abrir espaços vigorosos para a produção. Novas instituições que façam o milagre da justiça social, modificando de maneira profunda o perfil da distribuição da renda para que, finalmente, a felicidade possa sorrir nos lares de nossas famílias.

É esta reforma radical que o País precisa. O Brasil tem sede e fome de justiça!

            Era o que eu tinha a dizer.

            Muito obrigada.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/10/2005 - Página 34902