Discurso durante a 181ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Debate sobre o referendo da comercialização de armas no Brasil.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Debate sobre o referendo da comercialização de armas no Brasil.
Aparteantes
Heloísa Helena, Leonel Pavan, Sérgio Zambiasi.
Publicação
Publicação no DSF de 18/10/2005 - Página 35180
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, REFERENDO, QUESTIONAMENTO, INEXATIDÃO, ESCLARECIMENTOS, CAMPANHA, DESARMAMENTO, SOCIEDADE CIVIL, DEBATE, FALTA, ATUAÇÃO, ESTADO, SEGURANÇA PUBLICA, IMPUNIDADE, CRIME ORGANIZADO.
  • QUESTIONAMENTO, PREVISÃO, PRIVATIZAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA.
  • IMPORTANCIA, ESTADO, GARANTIA, SEGURANÇA PUBLICA, DECLARAÇÃO DE VOTO, ORADOR, OPOSIÇÃO, DESARMAMENTO, CRITICA, ENCAMINHAMENTO, MATERIA.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Parlamentares, sempre fui dos que lutaram, desde o início da minha vida parlamentar, para que o País tivesse no plebiscito e no referendo uma das suas formas mais legítimas de governar.

Há emendas minhas, inclusive, determinando que até os ministros poderiam ser submetidos a referendo. Acho que a forma mais bonita de governar, a mais democrática, é auscultar-se a opinião pública. A melhor forma também de educar um povo, de politizar um povo é permitindo-lhe opinar sobre como vai ser a vida do seu País.

Por isso acho muito importante o referendo que vem aí. Embora, com todo o respeito, alguma coisa me diga que algo está faltando. Eu não sei. Eu concordo que o Senador Renan trabalhou, esforçou-se, fez um trabalho democrático, mas, vendo a imprensa, a televisão e a opinião pública, parece-me que há uma indefinição, há uma interrogação, há uma dúvida! Diria, a rigor, que não se está devidamente preparado para votar quando não se sabe em que se vai votar no próximo domingo! A favor da paz, todos somos! A favor da vida, todos somos! A favor de um mundo sem armas, todos somos! Contra a violência, ainda mais num País como o Brasil, onde a violência aumenta, agride, ofende toda a sociedade, todos somos!

Mas o que há nesse projeto e nesse debate que soa tão estranho? Primeiro, foi quando apareceram na televisão os debates com os artistas da Globo, levando para um lado, como se fosse propaganda de novela, como se fosse a propaganda do Lula para Presidente da República, feita pelo Duda Mendonça! E se deu mal! Inclusive as mudanças que houve no resultado das pesquisas se deve à forma como a propaganda foi feita. Uma coisa é fazer uma propaganda: “beba isso, tome aquilo!”; outra coisa é algo da profundidade, do significado do desarmamento, com uma propaganda chocha como a que foi feita!

Vejo também a posição de ilustres membros da Igreja Católica e entendo! Claro que entendo! Como é que nós, cristãos, vamos ser contra a defesa da vida? Como é que nós, cristãos, vamos ser a favor do armamento? Como é que nós, cidadãos - e não precisa ser cristão -, que temos civismo, sentimento, princípio de seriedade, de respeito à coisa pública, que amamos o nosso semelhante como filho de Deus, com direitos inalienáveis à vida em primeiro lugar, como vamos aceitar assim, sem mais nem menos, o que acontece? Mas, não sei.

O que sei é que, primeiro, o Brasil é o País da impunidade. Pode ser o criminoso mais violento ou o ladrão mais extremado, para a cadeia, só vai ladrão de galinha. Agora, o coitadinho do Maluf está lá preso, porque falou em galinha há dois meses. Está preso, 30 anos depois, quando ele já devia estar solto depois de cumprir 30 anos de cadeia. E dizem que está preso porque o Governo precisa colocar o Maluf na cadeia, porque o Governo precisa interferir na loja grã-fina e botar na cadeia os empresários de São Paulo, a empresária de São Paulo, porque o Governo precisa rever as contas do PSDB lá de não sei quando, para que o PT não fique só na vitrine. Vamos misturar isso aí. Vamos colocar mais gente. Esse banco precisa ter mais gente. Mas eu vos digo: começar desarmando um pobre coitado que, é certo, talvez não saiba usar direito sua arma, mas começar desarmando exatamente aqueles que nenhum perigo oferecem à sociedade, quando sabemos que hoje as gangues se organizam e nos fazem lembrar o crime organizado na Itália, nos Estados Unidos, em Chicago. No Brasil, elas estão se organizando e são bem mais armadas que o próprio Exército e a própria Brigada. A imprensa publica que, em várias apreensões de armamentos em poder de criminosos, são encontradas armas que o Exército e a Polícia Civil não têm. Mas vamos desarmar a sociedade civil.

Engraçado que já vi esse filme, contando que regimes totalitários começaram desarmando a sociedade civil.

Lembro-me de quando Brizola criou a legalidade na luta contra a ditadura que viria a se instalar, mas que ali não se instalou. O Brizola distribuiu armas e apelou à sociedade civil, que veio em defesa e organizou algo - não sei direito qual era aquela força. Eu participei do movimento pela legalidade; mas, na verdade, a sociedade civil se organizou. Então essa de desarmar a sociedade sem o Governo ter uma garantia de uma medida que ele tomou até agora...

O Serginho Beira-Mar, não é?

O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. PMDB - RN) - Fernandinho.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Fernandinho - é que Fernando é um nome que não gosto, assim, de vulgarizar.

Pois bem, está lá no Rio Grande do Sul o Governador de Santa Catarina, apavorado. “Pois é, quando eu vi, Fernandinho Beira-Mar estava lá. Nem tiveram a gentileza de me comunicar. Foi a Polícia de Santa Catarina que me avisou: “Olha, chegou aí um tal de Fernandinho Beira-Mar, que não tem onde deixar”.

E o Governo vai começar desarmando a sociedade civil?

Com relação à fábrica de armamento Taurus, ouvi aqui outro dia um Senador dizendo que recebeu dela verba para sua campanha. Eu nunca recebi, não conheço, não tenho nenhuma ligação com seus proprietários - é importante dizer isso -, não os conheço nem com eles nunca conversei. Mas sei que 80% a 90% da produção dessa fábrica é para exportação, é destinada a exportação. E o que menos a prejudicaria seria essa questão.

E também se fala - Deus me perdoe, mas se fala - que há um plano envolvendo gente muito importante - até na imprensa -; que se formaria uma imensa empresa de defesa particular que seria, como o é hoje, um plano de seguro de vida. O cidadão paga e tem a segurança particular assegurada. Isso que hoje existe representado pela elite dos grandes condomínios - que é qualquer coisa de espetacular. Outro dia, por acaso, entrei num condomínio desses em São Paulo. É qualquer coisa de espetacular! Realmente, parece ficção! E foi ali, conversando, que eu fiquei sabendo de que há um projeto da maior importância de se criar um serviço de segurança pessoal, a preços como são hoje os seguros de vida. É verdade? Não sei. É mentira? Não sei. Mas a mim me angustia.

Podem até me dizer: “Ah, a senhora está lá na vila, em seu barraco, o que vai adiantar um revolverzinho que ela nem sabe manejar direito?”. É... Mas eu vejo a sensibilidade e o cérebro dessa pessoa. Ela está lá na favela, fechada em seu barraco, dormindo. Qual é a defesa dela? Não sei. Qual é a garantia dela? Não sei. Mas tendo embaixo do travesseiro um revólver, ela sabe que, se alguém entrar, ela poderá fazer alguma coisa. E quem entrar sabe que poderá acontecer alguma coisa. Hoje, na favela, os bandidos correm à solta, muitas vezes não se sabe se é o ladrão, o assassino ou o homem da polícia que está infiltrado. Não se sabe. Qual é a garantia dela, na favela, dormindo, se de repente arrombam a porta, entram, e ela não pode fazer nada? Com um revólver, ela também não faria nada, mas ao menos dorme descansada sabendo que tem, ao seu lado, uma tranqüilidade que o Estado não lhe pode dar. “E a garantia de segurança do Estado? Quando o Estado fornece segurança, todos estão garantidos. Quando o cidadão quiser fazer sua segurança não a terá. Só haverá segurança quando o Estado oferecer-lhe segurança.” Nota 10. É o que penso também. E quando o Estado não oferece segurança nenhuma? E quando o Estado não oferece segurança a quem quer que seja?

O Prefeito do PT foi assassinado em São Paulo. Já morreu a sétima pessoa envolvida no caso. E a Polícia ainda acha que é crime comum. Esse último suicidou-se. Cidadão na flor da idade; tudo bem, suicidou-se. E a família do ex-prefeito pede por amor de Deus proteção porque senão, dizem eles, daqui a uns dias eles serão “suicidados”; vai aparecer no jornal a noítica do suicídio deles.

            Por isso, Sr. Presidente, com todo o respeito - acho que sou o Senador mais antigo, sou o mais culpado: o mal que temos no Congresso Nacional é votar correndo ou não votar. Projetos da maior importância ficam na gaveta e ficam na gaveta, e passam-se os anos, e ficam na gaveta, e não fazemos nada. De repente vem aí um projeto da floresta amazônica, e o nosso Governo manda urgência especial. Ora, mas permitir a comercialização da floresta amazônica em regime de urgência especial? Onde estamos? Foi o caso desse projeto. De repente votamos, votamos e eu sou um dos culpados. Mas quero dizer, para meu drama de consciência, que prefiro votar contra...

(Interrupção do som.)

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Foi o Renan que mandou cortar. O Renan é fogo!

Votando contra o desarmamento, eu não estou encerrando a questão. Acho que devemos voltar ao debate e apresentar, sim, um plano objetivo, concreto de desarmamento e de combate à insegurança, em que o Estado apareça dizendo o que pretende fazer, porque até agora não fez nada.

Essa história de desarmar para ver como é que fica... Desarmar para ver como é que fica? No meu apartamento de Senador, tenho uma boa segurança. No meu apartamento em Petrópolis, as minhas irmãs, que têm uma loja embaixo, têm segurança. Não tenho problema, mas a minha empregada, que, em Porto Alegre, sai às oito e meia da noite e vai para a sua favela, onde chega às 22h30min e, depois de descer do ônibus, ainda caminha mais 500 metros, sinceramente não sei...

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Senador Pedro Simon, V. Exª me concede um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Darei o aparte a V. Exª e também à nossa Senadora, futura Presidente, que já não me trata muito bem como antigamente. Senão, S. Exª vai ficar magoada.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Também quero um aparte. Eu já não ia pedir para não atrapalhar.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É impressionante como estamos sentindo a repercussão da candidatura da Senadora Heloísa Helena.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Senador Garibaldi Alves Filho, dê mais um tempo ao Senador Pedro Simon.

O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. PMDB - RN) - Senadora Heloísa Helena, pode ficar à vontade.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - É só para aumentar um pouco o tempo de S. Exª, já que o Senador Leonel Pavan também quer usar da palavra. Eu não ia pedir o aparte para não atrapalhar o Senador Pedro Simon.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - V. Exª nunca atrapalha. O PT é que não entendeu que V. Exª nunca atrapalha, e aí cometeu o erro que cometeu.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - É generosidade de V. Exª. Senador Pedro Simon, V. Exª sabe da admiração que tenho por V. Exª. Um dos momentos mais emocionantes que vivenciei nessa tribuna foi quando V. Exª disse que eu talvez pudesse ser sua filha. Eu fiquei muito emocionada, até porque não tive pai - ele morreu quando eu era bebê, tinha três meses. Às vezes fico me perguntando: se tivesse tido pai, eu teria sofrido tanto assim? Não que minha mãe não tenha sido uma mulher maravilhosa, uma guerreira, que foi pai e mãe em todos os sentidos de nossa vida.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Se V. Exª tivesse sido minha filha, eu seria muito melhor, tenho certeza absoluta,

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Se qualquer outra pessoa nesta Casa estivesse fazendo esse discurso, ele poderia soar de outra forma, mas V. Exª, ao fazê-lo, traz um rigor ético muito importante, porque ninguém aqui pode falar de falta de solidariedade humana em relação a V. Exª, que é um franciscano, um cristão exemplar. V. Exª é uma pessoa por quem todos nós temos a maior admiração, justamente por aquilo que V. Exª encarna: a ética, a solidariedade, os princípios mais belos que os cristãos trazem em suas almas, em seus corações. É por isso que, ao trazer esse debate, eu me senti à vontade para fazer um aparte. Eu não consigo acompanhar muito a televisão.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - V. Exª não perde muito.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Nesse fim de semana, no sábado, após o resultado da pesquisa, acompanhei aquelas inserções, para saber o que a campanha publicitária do referendo estava, de alguma forma, dizendo ao povo, o que podia esclarecer ou não, até porque, como sou da área de Estatística, trabalhei com muito rigor nessa área na universidade, em planejamento de serviços públicos, e sei exatamente como se manobra uma estatística. Há pessoas terríveis que conseguem manobrar a estatística em vários setores. Por exemplo, quando falam em crimes e dizem que 2% dos homicídios são por motivos fúteis, pegam 2% dos crimes identificados e, como desses 2% mais de 70% ocorreram por motivo fútil, passam a dizer: 70% dos homicídios são por motivo fútil.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Setenta por cento de dois.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Sim. Depois, em relação às armas: “As armas foram apreendidas de cidadãos de bem”. Todo mundo sabe que as armas AR-15 e Uzi nenhum cidadão de bem pode comprar numa loja, mas, sim, pelo crime organizado, por meio do tráfico.

(Interrupção do som.)

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Desculpe, Sr. Presidente, Senador Garibaldi Alves Filho. Acabei-me encorajando a fazer este aparte, em razão dos argumentos do Senador Pedro Simon. Depois começa o debate desqualificado de uma frente contra a outra. Uma diz assim: “A Frente que vota ‘não’ é a da bala, pois recebeu dinheiro da indústria da bala”. Quem vota “não”, por sua vez, diz que vota “sim” a turma da bola, formada pelos que recebem propina das empresas de segurança e que, portanto, estão lá. Às vezes, um fica entre o fascistóide e o demagógico. Você fica até com dificuldade, porque um lado fica explorando a dor de quem perdeu um filho, vítima de arma de fogo - e ninguém queira me ensinar o que significa essa dor, porque eu perdi meu irmão mais velho assassinado com um balaço de 12, e, como era filho de pobre, ninguém pôde descobrir quem o matou. Do mesmo jeito que eu posso ter pavor em relação a isso, eu encontro uma mãe que diz assim: “É, Heloísa, se eu tivesse uma arma em casa, eu não ia atirar em ninguém, porque eu não ia querer matar ninguém, mas eu dava um tiro para cima, talvez o socorro chegasse mais perto, e a minha filhinha pequena não tivesse sido estuprada, e o meu filho não tivesse sido assassinado, porque correu para socorrê-la.” Então, é um debate que está sendo feito de forma muito esquisita. É desrespeitoso, desqualificado, oscilando entre o fascistóide e o demagógico e, de fato, não diz o que está acontecendo, porque já é proibido o porte de arma que levaria ao crime fútil no trânsito e outros mais. Do mesmo jeito, aí V. Exª diz assim: “Não, não tem uma política de segurança.” E também não adianta fazer uma propaganda esta semana dizendo que o Governo vai aprovar um Fundo Constitucional de Segurança Pública, que vai ser aprovado pelos Senadores da bancada do “sim”, que vão aprovar o fundo de segurança e resolver o problema. Na última semana! Não façam uma coisa dessas, porque é um desrespeito para com todas as pessoas. É desrespeito à dor de todas as pessoas que vivenciaram uma experiência extremamente difícil. No meu Estado, Alagoas... Eu fico pensando, Senador Pedro Simon, eu não quero ter arma em casa, primeiro porque isso não dá certo. Eu não quero ter arma em casa. Mas eu também fico pensando... Por exemplo, estou tentando fazer uma casa para eu morar. Ninguém acredita nisso, porque a maioria dos políticos são ladrões. Eu vou ter de morar em um bairro mais afastado, que não vai ter a firma de vigilância na porta, não vai ter a polícia militar, como nós temos.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - No Palácio da Alvorada, conforme o caso.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Mas a probabilidade é de eu voltar para Alagoas. Então, veja só: mais de 90% dos políticos de Alagoas andam armados até os dentes. Eu não agüento essa conversa. Mais de 90% dos políticos de Alagoas, independentemente de Estatuto do Desarmamento, de qualquer coisa, andam armados até os dentes, com Uzi, com metralhadora, com AR-15. Debocham de qualquer um, andando para cima e para baixo armados até os dentes. Eu fico imaginando: já pensou em mim, em uma casa meio isolada? O cabra vai saber que eu não tenho nada em casa, nem uma faquinha velha, nem teria coragem de fazer uma coisa como essa. Então, esses são pontos que o debate, oscilando entre o fascistóide e o demagógico, acaba fazendo com que fiquemos o tempo todo repensando. É por isso que parte importante da população está dizendo “não”. Eu nunca imaginei isso, porque há uma propaganda tão grande e tão furiosa pelo “sim” que eu tinha certeza absoluta de que o “sim” ia ganhar. E no P-SOL há pessoas que votam “sim” e são pessoas maravilhosas, honestas e de bom coração, do mesmo jeito que há pessoas maravilhosas, honestas e de bom coração que votam “não”. E não tenho certeza de que há pessoas corruptas, honestas, cínicas, dissimuladas e mentirosas na frente do “sim” e do “não”. É óbvio que há dos dois lados também. Então, a nossa posição é esta: respeitamos os nossos militantes, parlamentares ou dirigentes que votam “sim” e os que votam “não”, porque sabemos que, por mais que os argumentos sejam antagônicos, vemos que são marcados pela honestidade e por um coração cheio de solidariedade, tanto dos que votam “não” como dos que votam “sim”. Mas, não poderia deixar de parabenizar V. Exª por trazer o debate, com a autoridade moral e cristã de quem pode fazê-lo. Do pouco que vi nesses dias - meu Deus! -, isso não está educando nada. Ora é a exploração da dor, ora é a exploração da violência; ora é a concepção de que se tem que matar todo mundo, ora a concepção de que o que resolve é desarmar, quando não é. Então, acabamos perdendo a oportunidade de fazer um grande debate sobre a área de segurança pública. Existe a necessidade de mudanças estruturais profundas, para que a criança seja acolhida e, aos cinco, seis anos de idade, não vá ser olheira do narcotráfico e, portanto, vá para a marginalidade como último refúgio. Então, todo este debate acabou se perdendo numa disputa que nada de inocente tem. Absolutamente, nada de inocente! Ora uns dizem que os outros são da turma da bala, outros que é da turma da bola, e que é propina para um lado e para o outro, o facistóide e o demagógico, e acaba não se esclarecendo a população como se deveria. Portanto, quero saudar a forma como V. Exª traz este debate à Casa, com toda a autoridade moral e cristã de quem, de fato, pode fazê-lo. Porque existem muitas pessoas que lutam pela paz, pela vida vivida em plenitude, em toda a sua dignidade, que podem, sim, votar “não” e que podem, sim, votar “sim”, inspiradas pelas convicções mais belas e honestas do que o cinismo e a dissimulação de, muitas vezes, pessoas que pregam alguma coisa e efetivamente não fazem.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço muito a V. Exª e agradeço ao Presidente a gentileza de ter permitido que o aparte se alongasse, pela importância e pelo significado do mesmo. V. Exª foi muito feliz quando fez essa análise. Eu concordo com V. Exª que não podemos dizer que quem está comigo, quem defende o “não” é o que está correto e quem está do outro lado está errado. Também conheço muita gente, a começar por irmãos meus do comando da Igreja, que estão se manifestando, gente que defende a posição de que se deve apoiar o desarmamento. Eu respeito, porque os fundamentos estão corretos, o conteúdo está correto, a fórmula de apresentar está correta. A única coisa equivocada que vejo é a maneira com que esta questão foi posta perante a Nação.

Tenho o maior respeito e carinho pelo Senador Renan Calheiros. A culpa não é dele, a culpa é de nós todos, que deixamos que a coisa fluísse. Nós não tivemos a competência e a capacidade de dar a esta matéria o conteúdo e a seriedade que ela merecia.

Vamos ser sinceros: a população vai se manifestar, sem saber, com condições profundas, a maneira de votar, porque a forma como está sendo apresentada é muito estranha! Alguns dizem, por exemplo: “Não precisa votar, você vai continuar com direito a ter a sua arma, você vai ficar com a sua arma em casa. Estão dizendo que você vai perder a arma? Não vai perder”. Então, está havendo uma confusão, as pessoas não estão se entendendo.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Diz que é para desarmar, depois diz que é para ficar com a sua arma...

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Na verdade, é para desarmar, mas você pode continuar com a sua arma. Ninguém vai tirar sua arma.

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Senador Pedro Simon, acho que ninguém mais do que nós aqui queremos a paz. Nós somos contra a violência. E V. Exª, como cristão, tem sempre orientado para a paz, contra a violência. Eu não tenho me manifestado até agora sobre “sim” ou “não”, mas vou responder aqui a uma pergunta que há pouco alguém me fez por telefone. Esta pergunta é uma dúvida de milhares de brasileiros. Muitos acham que se passar o “não”, vai ser permitido usar armas de fogo em táxi, nos caminhões... Muitos pensam isso. O Estatuto do Desarmamento é rigoroso. Se passar o “não”, não vai ser permitido usar arma. Apenas vai se permitir ter arma, com o documento de porte, em casa. E mais: na própria casa, se for sua; não alugada. O porte de arma no nome de fulano de tal tem que ser o nome do dono da casa também. O Estatuto é rigoroso: tem que ter acima de 25 anos, uma folha corrida decente. Então, o “não” não libera a arma à vontade. Estou respondendo aqui porque esta campanha não está bem clara, está confusa, não tem cores partidárias. Um tenta confundir o outro, “direito de resposta”, não sei o quê. Isso é uma vergonha! A campanha precisava dizer o que o Estatuto prevê, o que rege o Estatuto. Isso precisaria ser esclarecido à população brasileira. Este tema é importante e é bom que haja uma discussão mais ampla. A campanha vai acabar nos próximos dias. Acabada a campanha, ainda vão continuar as dúvidas na opinião pública. Ainda. O “sim” tem uma motivação: é desarmar todos, menos os bandidos; o “não” não libera a arma também. Não vai se permitir usar arma na rua, não, o Estatuto não permite. Nós já fizemos aqui uma reforma. O Estatuto do Desarmamento prevê isso. Então é só para deixar bem claro: nem “não” nem “sim” vai permitir que armas sejam usadas nas ruas. Agora, se for o “sim”, acho que os bandidos vão ter, aí sim, um direito maior do que as pessoas civilizadas deste País têm.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu agradeço a gentileza do aparte e a tolerância de V. Exª, Sr. Presidente.

Estou dizendo que só estou falando hoje. Meu amigo, o Senador Zambiasi, lembra que o jornal Zero Hora publicou, na semana passada, uma pesquisa feita com a bancada. E eu fui praticamente o único dos Senadores que disse que estava indeciso. Eu não estava indeciso. Eu não queria falar. Eu não queria falar, dar um palpite assim sem mais nem menos. Mas cheguei à conclusão de que o pior que eu poderia fazer era deixar uma matéria destas ser votada. Depois, procurariam nos Anais a minha participação: e o Pedro Simon, o que fez? E eu não falar nada?

Eu acho que a obrigação que eu tinha era de falar, e é o que estou fazendo. Lamento que não possa fazer melhor, lamento que não possa esclarecer melhor, que não possa orientar melhor. Mas eu tinha a obrigação de dizer o que estou dizendo aqui.

Eu concordo com a Senadora Heloísa Helena quando diz: “As pessoas pensariam que o Simon, pelo que é, pelo seu estilo, seria do voto contra o desarmamento; e, no entanto, vem se posicionar contrário”. Quero repetir que, realmente, sou contra o desarmamento. Tenho defendido que temos de lutar na ONU. Quando o Brasil quer entrar para o Conselho de Segurança, eu digo: nós devíamos extinguir o Conselho de Segurança e extinguir todo armamento atômico. Temos de fazer o movimento no sentido de que, anualmente, nos próximos quinze anos, um percentual do que é gasto em armas pelas nações mais ricas seja gasto em produção de alimentos com as nações mais pobres.

Eu sou a favor de tudo que signifique pacificação. Eu também sou a favor deste plano, deste projeto de desarmamento, desta tese. Só que estou vendo que está começando pelo outro lado, está começando pelo coitado, que é o que apanha e não tem nada a oferecer. Num país onde cada um tem a sua vantagem - o policial tem, o ladrão tem, o assassino tem, nós temos -, daquele que não tem nada, de repente, lhe tiram o próprio nada.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Senador Pedro Simon, V. Exª me concede um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Concedo um aparte ao Senador Sérgio Zambiasi.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Senador Pedro Simon, eu não poderia deixar de cumprimentar V. Exª pelo seu pronunciamento e tomar apenas mais um minuto neste debate que, pelo que vejo, está sendo feito à luz do bom senso, sem emocionalismo. Este é um dos grandes problemas, ao se trazer uma questão desta envergadura para uma decisão no próximo domingo. Eu me pronunciei há poucos dias e entendia que o referendo talvez fosse precipitado neste momento. Temos uma das leis mais rigorosas do mundo, o Estatuto do Desarmamento, que votamos aqui. E ele já é um processo de desarmamento com resultados realmente impressionantes. Informações da Secretaria de Segurança do Rio Grande do Sul nos revelam que no ano passado foram recolhidas 3,5 mil armas exatamente a partir da utilização dos instrumentos do Estatuto do Desarmamento. Há poucos dias, na condição de Presidente da Comissão do Mercosul, estive em Buenos Aires, Senador Simon. Sempre que há oportunidade de discutir questões de interesse do Mercosul, colocamos esses temas de relevância que envolvem pelo menos os quatro países-membros, então abordei a questão do desarmamento. Como a Argentina vê essa questão? Como o Paraguai vê essa questão? Como o Uruguai vê essa questão? Nos três países, a venda é absolutamente livre para cidadãos residentes. Temos centenas de quilômetros de fronteira seca lá no Estado, e o Zero Hora de hoje mostra, em reportagem, a facilidade de aquisição de uma arma ali do outro lado da fronteira. Então, repito o que disse em pronunciamento há poucos dias: para um projeto desse ter sucesso, ele não pode ser apenas brasileiro, tem que ser no mínimo sul-americano. Por esses milhares de quilômetros de fronteira desguarnecida que temos entra de tudo, até febre aftosa, imagine arma. Precisamos trabalhar um processo de comunicação que nos leve a fazer com que todos os países do Cone Sul estejam comprometidos com essa mesma proposta. Por isso, não digo que amanhã não se aprove o desarmamento, porém, há que se criar um processo de conscientização para que a população receba mais informações sobre o Estatuto, que, se bem utilizado, bem aplicado, já produz resultados extremamente positivos. Encerro e agradeço a generosidade do nosso Presidente, Senador Garibaldi Alves Filho, e a oportunidade de fazer este aparte neste momento precioso desta tarde ao Senador Pedro Simon.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço à Senadora Heloísa Helena a elegância e a categoria com que mostrou as divergências pequenas que temos. S. Exª realmente é aquilo que digo quando as pessoas me perguntam: ela é brava mesmo? Eu digo: Não, ela é fantástica no convívio diário.

Agradeço ao Senador Sérgio Zambiasi porque apresentou algo importante do qual não me dei conta: como ficará a metade sul do Rio Grande do Sul e a zona da fronteira? E do Paraná? E de Santa Catarina? E de Mato Grosso? Como será a convivência em Santana do Livramento, que são dois países e uma cidade só? É algo que não foi discutido nem analisado. É algo a mais que deve ser feito.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/10/2005 - Página 35180