Discurso durante a 182ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Leitura e comentários ao artigo publicado na revista Veja desta semana, intitulado "Pizzas no Caminho", do articulista André Petry.

Autor
Almeida Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SE)
Nome completo: José Almeida Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA.:
  • Leitura e comentários ao artigo publicado na revista Veja desta semana, intitulado "Pizzas no Caminho", do articulista André Petry.
Publicação
Publicação no DSF de 19/10/2005 - Página 35348
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA.
Indexação
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), IMPUNIDADE, ACUSAÇÃO, CORRUPÇÃO, MESADA, DEPUTADO FEDERAL, AUSENCIA, ESCLARECIMENTOS, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), EX PREFEITO, EMPRESA, FILHO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PUBLICITARIO, CAMPANHA ELEITORAL, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
  • DENUNCIA, PERIODICO, COLABORAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), PARTIDO DA FRENTE LIBERAL (PFL), IMPUNIDADE, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, INTERESSE, CONTINUAÇÃO, SISTEMA, CORRUPÇÃO.
  • PROTESTO, INSUFICIENCIA, PROVIDENCIA, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, ACUSADO, DEFESA, IMPEACHMENT, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, NEGLIGENCIA, COMBATE, CORRUPÇÃO.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, faço questão de, na tribuna, fazer a leitura de um artigo publicado na revista Veja desta semana. Sob o título “Pizzas no Caminho”, o artigo assinado pelo articulista André Petry traz o seguinte:

Quem não quiser fazer papel de bobo deve parar de perguntar se o escândalo do mensalão vai ou não acabar em pizza. É uma indagação despropositada porque o escândalo do mensalão já está cheio de pizzas pelo caminho. Os casos mais graves envolvem os atores mais poderosos da cena - o presidente Lula e o ministro Palocci. Por exemplo:

O ministro da Fazenda foi acusado de receber propina de 50 mil reais de uma empresa de recolhimento de lixo quando era prefeito, no interior de São Paulo. Mais tarde, descobriu-se que a contabilidade da empresa registrava saques mensais que corroboravam a acusação. E o que aconteceu? Nada. O ministro não foi sequer chamado para prestar explicações. Não foi à CPI nem à polícia. Pizza.

Uma empresinha do filho do presidente da República recebeu, de bandeja, um investimento de 5 milhões de reais de uma gigante do ramo de telefonia, a Telemar. O investimento é cinqüenta vezes maior que o capital da empresinha. Foi notório favorecimento ao filho do presidente? Não se sabe. Nada aconteceu. Nem o filho do presidente nem seus sócios na empresinha foram chamados para explicar-se.

O marqueteiro do presidente recebeu 10,5 milhões de reais em dinheiro ilegal, pagos num paraíso fiscal. Quanto a isso, não há dúvidas. Há provas e confissões. E isso quer dizer que a campanha do presidente foi financiada com dinheiro ilegal, dinheiro clandestino. E o que aconteceu? Nada. O presidente acha que tudo não passa de urucubaca e seus súditos saem por aí dizendo que dinheiro clandestino em campanha é coisa normal, corriqueira, desprezível.

O presidente contraiu uma dívida de 29 mil reais junto ao PT e a dívida acabou sendo saldada. Por quem? Como? Bem, um amigo do presidente diz que pagou, não avisou o presidente de que pagou e não tem comprovante de que pagou. Será que a dívida, na verdade, foi paga pelos butins de Marcos Valério? Não se sabe. Ninguém foi convocado a se explicar. Nem o amigo secretamente generoso de Lula.

Que nome se deve dar à decisão de esconder debaixo do tapete o mensalão de Palocci? O que significa deixar por isso mesmo o estrondoso sucesso financeiro do filho do presidente? E a dívida do presidente, misteriosamente paga? E a campanha do presidente, notoriamente financiada com recursos ilegais? O pior é que a pizza não resulta apenas da ação de governistas, petistas e suspeitos em geral. É também obra da oposição, de tucanos e pefelistas que não têm interesse em promover uma verdadeira faxina no país, até também porque seriam carregados na varrição. Nem querem uma sólida mudança política e institucional do país porque é na bagunça atual que cresceram e é nela que sabem viver. Para a oposição, o ideal é um adversário fraco em 2006, um Lula sangrando, mas vivo, para garantir o teatro.

Só mesmo o vasto histórico brasileiro de impunidade explica a satisfação geral com que se recebe a notícia de que meia dúzia de deputados será cassada e outra meia dúzia vai renunciar... É pouco. É pouquíssimo. É quase nada diante da corrupção que se desvendou ao país.

À exceção da expressão “até porque também seriam carregados na varrição”, referência ao PSDB e ao PFL, todo o texto eu corroboro e assino. Faço essa exceção porque não tenho nenhuma prova em relação a nenhum desses partidos e muito menos a nenhum de seus parlamentares. Não poderia eu, aqui da tribuna, corroborar aquilo que não tenho condições de fazer prova. Mas é como diz o articulista, ele fala exatamente: acham tudo isso normal, corriqueiro.

Um novo léxico, um novo glossário, um novo dicionário pode ser criado por escolas literárias, escolas científicas, com expressões próprias daquela ciência ou daquela escola literária. No Brasil, não. Quem cria novo glossário, novo léxico, novo dicionário, é a escola da corrupção.

Recordo-me, Presidente, que “equívoco administrativo” é uma expressão criada pelo Prefeito de Aracaju, Marcelo Deda. Após fazer capinação em área pavimentada a asfalto ou a paralelepípedo ou em área cimentada - ele capinou em área cimentada! -, ele chegou à conclusão de que havia ocorrido um “equívoco administrativo”. Caixa 2 é “dinheiro não-contabilizado”. E “erro de companheiro” é corrupção na expressão do Presidente Lula. É, de fato, um glossário, um léxico novo, só que não foi criado por uma escola literária ou uma nova escola científica; foi criado pela escola da corrupção. Pizzas no caminho.

Recordo-me que, no final do mês de agosto próximo passado, fiz aqui um pronunciamento mostrando que tudo já estava devidamente comprovado e que o processo de impeachment era legítimo, legal, e que poderia ter início na Câmara dos Deputados. Não devo ter sido levado muito em consideração, sobretudo quando afirmei que o Presidente tinha conhecimento - como tem conhecimento - de todos os fatos. Disse: se alguém neste Plenário se arvorar num aparte e me disser que ele não tinha conhecimento, aí então eu vou querer justificar o impeachment do Presidente pela falta de conhecimento, porque é da obrigação do Presidente, ao gerir um país, ao administrar um país, ao administrar e gerir os interesses do povo, ter a responsabilidade na escolha e ter a responsabilidade na fiscalização. Lá no Direito Privado isso se chama culpa in eligendo e culpa in vigilando. Há culpa ao escolher mal com quem andar e por quem deve ser auxiliado e há culpa em não fiscalizar aqueles que o auxiliam.

Nessa mesma edição da revista Veja, para minha satisfação, as páginas amarelas trazem uma entrevista com o advogado alemão Peter Eigen, ex-diretor do Banco Mundial que fundou há doze anos a Transparência Internacional, a principal organização não-governamental de combate à corrupção no mundo.

E vejam qual é a frase dita pelo entrevistado que a revista Veja traz em destaque: “Obrigação de saber”. Exatamente a conclusão a que cheguei em pronunciamento nesta Casa, mostrando que, se o Presidente não tinha conhecimento, ele tinha a obrigação de saber e, por isso, deveria sofrer o processo de impedimento.

A primeira pergunta da Veja é a seguinte:

O senhor rastreia a corrupção de governos pelo mundo há muitos anos. Já deparou antes com um caso como o brasileiro, em que um presidente é cercado de corruptos no partido, no alto escalão do governo e até na família, mas ele não sabe de nada?

A resposta que ele deu:

Muitas vezes, os dirigentes não querem tomar conhecimento das sujeiras ao seu redor. Assim, imaginam escapar da culpa. O abuso desse escudo da impunidade levou o sistema judicial americano a evoluir para a noção da “obrigação de saber”. O chefe é responsável pela ação dos seus subordinados. Ponto.

É essa a resposta dada pelo alemão, dirigente, criador e fundador da ONG Transparência Internacional, o Advogado Peter Eigen.

Nós estamos com pizzas no caminho, e o Presidente da República, em viagens, arvora-se ao direito, mais uma vez, da dissimulação, da desfaçatez, ao dizer que nenhum Governo, neste País, conseguiu sobreviver diante de três CPIs e que Sua Excelência quer que se apurem os fatos com toda a profundidade. Quanta enganação! Todos os brasileiros somos testemunhas de que em 2004 o Presidente impediu a instalação da CPI dos Bingos nesta Casa. Houve a necessidade de que Senadores interpusessem e impetrassem mandados de segurança junto à Suprema Corte. A decisão saiu este ano, e a CPI pôde, enfim, ser instalada. E vem Sua Excelência, o Presidente, dizer que está defendendo a apuração! Vez por outra, vejo petistas e Parlamentares da Base Aliada do Governo falarem o mesmo. Querem fazer o povo brasileiro de bobo? Será que é essa a intenção? Eu não sei, tenho até dúvida, não apenas se esse é o desejo, mas perdoem-me agora os brasileiros que pensam como eu penso. Perdoem-me os brasileiros que pensam como eu penso, mas se as pesquisas que estão apresentando forem verdadeiras, o Brasil e os brasileiros merecem exatamente um Governo como este que estamos vivenciando hoje.

Perdoem-me os brasileiros que pensam como eu penso, mas aqueles que pensam diferente, de fato, diante do que estamos vendo publicado em pesquisas em relação à figura do Presidente e do seu Governo, merecem o Governo que temos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/10/2005 - Página 35348