Discurso durante a 183ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao Presidente Lula por tentar desmoralizar os trabalhos das CPIs. Elogio ao relatório do Deputado Júlio Delgado, favorável à cassação do Deputado José Dirceu, por quebra de decoro parlamentar.

Autor
César Borges (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: César Augusto Rabello Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Críticas ao Presidente Lula por tentar desmoralizar os trabalhos das CPIs. Elogio ao relatório do Deputado Júlio Delgado, favorável à cassação do Deputado José Dirceu, por quebra de decoro parlamentar.
Aparteantes
Jefferson Peres, Sibá Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 20/10/2005 - Página 35459
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, TESOUREIRO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DESRESPEITO, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), REGISTRO, APURAÇÃO, LAVAGEM DE DINHEIRO, SONEGAÇÃO FISCAL, CRIME ELEITORAL, ILEGALIDADE, REMESSA, RECURSOS, EXTERIOR, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CONGRESSO NACIONAL.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEPUTADO FEDERAL, NEGAÇÃO, EXISTENCIA, CRIME, AUSENCIA, CONTABILIZAÇÃO, RECURSOS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PAGAMENTO, PROPINA, CONGRESSISTA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, ELOGIO, RELATORIO, DEPUTADO FEDERAL, JUSTIFICAÇÃO, APOIO, CASSAÇÃO, JOSE DIRCEU, EX MINISTRO DE ESTADO, FUNDAMENTAÇÃO, ACUSAÇÃO, QUEBRA, DECORO PARLAMENTAR.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, RESPONSABILIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, IRREGULARIDADE, GOVERNO FEDERAL.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Senadora Serys Slhessarenko, que preside a sessão neste momento, Senadora Heloísa Helena, Srs. Senadores, nesta tarde, quero fazer uso desta tribuna para trazer a minha preocupação com relação às declarações do Senhor Presidente da República, de que estamos tomando conhecimento e que dizem respeito ao grave momento por que passa a Nação brasileira. No momento em que três CPIs estão funcionando no Congresso Nacional - Bingos, Correios e Mensalão -, o Presidente, em visita à Rússia, declara que, por enquanto, vivemos no País uma situação muito engraçada. Realmente, é lamentável que o Presidente possa analisar a cena brasileira de hoje e dizer que vivemos “uma situação engraçada”.

Segundo Sua Excelência, joga-se suspeição sobre todo mundo, mas se prova muita coisa. Haverá um tempo em que terá um veredicto final. Com certeza. Essa é a expectativa da opinião pública. E parece que o Presidente deve ter combinado com Delúbio Soares essa declaração, porque Sua Excelência disse ontem que a situação é muito engraçada e, anteontem, Delúbio dizia que em três ou quatro anos tudo será esquecido e acabará virando piada de salão. Então, da piada de salão o Presidente já está sabendo, pois considera muito engraçada a situação brasileira.

De certa forma, Srª Presidente, o que desejam o Presidente da República e o Sr. Delúbio Soares é a impunidade. Aquela impunidade que tanto combatemos em todos os segmentos da sociedade brasileira, inclusive nos crimes, na cultura da violência que, infelizmente, hoje está grassando em todo País, nas metrópoles. É a impunidade. Que não se apure. E aí, Senadores, até tentar desmoralizar o trabalho do Congresso Nacional e o esforço que se faz nas CPIs, para se esclarecer todo esse imbróglio que alguns chamam de lambança, que acontece na cena política e na cena administrativa brasileira.

Se as CPIs têm pecados, se o trabalho talvez não tenha o ritmo desejado, se alguns talvez não se empenham como deveriam, se alguns partidos vão para lá se colocar politicamente com o fim de impedir, às vezes, as investigações, tudo isto faz parte do jogo político, mas, sem sombra de dúvida, as CPIs trabalham procurando trazer a verdade, procurando identificar os culpados e, eventualmente, inocentar aqueles que são inocentes.

Ontem, o jornal O Globo publicou o que já foi alcançado pelos trabalhos das CPIs e disse que as investigações já apuraram, com toda a verdade, remessas ilegais de recursos feitos para o exterior - lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, crime eleitoral. Um crime eleitoral como o caixa dois que o Governo - o próprio Presidente da República e o seu Partido, o PT - insiste em dizer que não é crime, que isso é natural, como se estivesse querendo permissividade completa. Ele pode até ter o direito de acusar outros, embora ele esteja no banco dos réus e se sinta mais confortável em se colocar com seus companheiros no banco de réus; e ele não deixará de sair do banco dos réus. No entanto, ele não pode é dizer que não houve um crime. Crime eleitoral é crime. Não há outra definição. Mas o PT e o próprio Presidente recém-eleito declaram que os companheiros que o praticaram não são corruptos. O próprio Presidente, no Palácio do Planalto, convidou os Deputados que renunciaram ou aqueles que deverão ou não ser cassados - depende da decisão soberana da Câmara - para dizer que eles cometeram erros, equívocos, mas que não são corruptos. Em cima disto, o Deputado José Dirceu, por exemplo, insiste em dizer que não fez nada de errado, que ele não é corrupto. Corrupção, para ele, significa unicamente valer-se de recursos, principalmente públicos, para o enriquecimento pessoal. Como se captar recursos de forma ilícita para o Partido, para que esse Partido compre consciências de Deputados, influencie e altere resultados do interesse do Governo, dentro da Câmara dos Deputados, não se constitua crime gritante contra a democracia brasileira!!!

E aí, Sr. Presidente, quero louvar a atitude de um Parlamentar. Não o conheço, não tenho intimidade com ele, mas tenho de, daqui da tribuna, parabenizar o Deputado Júlio Delgado pelo relatório que fez - o Deputado, inclusive, faz parte da base do Governo. Vou me basear um pouco no artigo da Dora Kramer, essa festejada jornalista que escreve de forma esplendorosa e que fez uma análise muito precisa sobre o relatório do Deputado Júlio Delgado, hoje do PSB - mudou de Partido para continuar apoiando o Governo, porque o Partido anterior, o PPS, foi para a Oposição.

Dora Kramer disse que “o Deputado Júlio Delgado foi irretorquível na fundamentação de seu voto a favor da cassação do mandato”. E qual a motivação principal desse relato? A quebra do decoro parlamentar. E para a quebra do decoro parlamentar, ninguém diga que não há provas. Está mais do que provada, pelos depoimentos a que assistimos na CPMI dos Correios, a influência do Ministro José Dirceu recebendo o Sr. Marcos Valério. Isso está sobejamente demonstrado pelos fatos e no relato do Deputado Júlio Delgado.

Diz a jornalista:

Na visão de Júlio Delgado, não está em julgamento a comprovação ou não do ato de corrupção, mas a conduta imprópria, por ação ou omissão, de um ocupante de função pública da magnitude da exercida por José Dirceu seja na coordenação política e administrativa do Governo, seja na linha de orientação do PT.

Queremos fazer coro com ela e - acho - com a Nação brasileira, que aplaudem a coragem do Deputado Júlio Delgado. Disse S. Exª, em seu relato:

“Quanto maior o cargo ocupado, maior a cobrança”. E, por conseqüência [diz a jornalista], a responsabilidade, atestou o relator abrindo, ainda que involuntariamente, espaço para o uso de argumentação semelhante em relação ao papel do Presidente Luiz Inácio da Silva na montagem e execução do sistema de relações entre o Executivo e o Legislativo.

Aqui no relato, não foi feita uma acusação direta ao Presidente, mas foi defendida a tese de que quem tem responsabilidade, quem ocupa um cargo de responsabilidade, não pode descuidar dos seus auxiliares. Ou pensa que não tem responsabilidade alguma sobre o ato de seus auxiliares e pode afirmar que “não tem nada com isso”? A Veja trata este tema numa bela entrevista nas páginas amarelas, em que é declarado que hoje a responsabilidade não é apenas da sua função. O superior tem a responsabilidade de conhecer o que os seus auxiliares estão praticando naquele momento.

Concedo um aparte, até para proporcionar o debate, ao Senador Sibá Machado, para, em seguida, concluir o meu pronunciamento.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Agradeço a V. Exª, Senador César Borges, um dos brilhantes Parlamentares desta Casa, muito atuante nas CPIs. Pedi este aparte simplesmente para fazer algumas considerações sobre o este ponto que o Relator apresenta em seu relatório: a cassação do Deputado José Dirceu. Dentro da CPMI, há pontos de vista diferentes. Mas, entre maiores e menores evidências, o pedido de cassação está sendo levado a cabo por causa de uma visão política. Acho que o maior argumento é a visão política. No caso de Roberto Jefferson, a acusação contra ele era a de ter montado uma rede de extorsão dentro dos Correios para canalizar em benefício próprio cerca de R$400 mil. Isso foi o que acompanhei na origem deste problema. Mas o que de fato o julgou e o condenou, cassando-lhe o mandato, foi uma posição política. O que José Dirceu está argumentando neste momento é que, havendo ou não maior ou menor participação dele em qualquer ato ilícito, este ocorreu no momento em que ele não era Parlamentar. Ele é acusado de tais coisas e está dizendo que, mesmo que as tenha praticado, não as praticou enquanto era Deputado, mas enquanto estava afastado para o exercício do cargo de Ministro. Então, neste caso, até considero que a cassação dele pode vir - seja de que relator for - pela ótica política. Quanto ao Presidente Lula, posso afirmar com toda segurança que Sua Excelência confiou nas pessoas que estavam ao seu lado até o último instante. É muito assim que nós trabalhamos: confiamos muito nas pessoas que estão ao nosso lado. O que o Presidente tinha de fazer era demitir, e demitiu, pôs para fora; daí, então, cabe às instituições levar a cabo as investigações. Agora, sempre considero - já disse isto em outros momentos - que José Dirceu e os demais que ficaram receberão cassação. Aqueles que estão na lista do Marcos Valério têm ali um indicador claro e objetivo: pegaram o dinheiro do empresário. Os que não estão, por enquanto, estão incluídos no debate político e eles poderão pagar essas contas por uma visão também política. Mas valem as preocupações de V. Exª e comungo com muitas delas.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Senador Sibá, será que o capitão do time está colocado no relatório? Aquele que foi o coordenador de tudo e de todos? Será que ele estava alheio a tudo e a todos? Será que estava alheio o Ministro José Dirceu quando contratou Waldomiro Diniz para ser o seu representante no Congresso e fazer articulações com os Parlamentares, com todo o passado do Sr. Waldomiro Diniz? Será que estava alheio a tudo o Sr. José Dirceu quando exercia influência sobre a Câmara dos Deputados, fazendo benesses financeiras a partidos, a presidentes de partidos? Ou ele não sabia o que fazia o Sr. Delúbio Soares, que sempre estava despachando na Casa Civil? É inverossímil, inteiramente, esse tipo de argumento.

Agora, mais inverossímil ainda é achar que o que o José Dirceu dizia ontem, que não fazia nada que o Presidente Lula não tivesse conhecimento, não tem validade agora. Há muito pouco tempo, ele disse que só fazia aquilo de que o Presidente Lula tinha conhecimento. Agora, já não vale o que o José Dirceu dizia?

Por essas contradições, a Nação brasileira está exigindo de todos nós responsabilidade nessa apuração. Não pode o Presidente da República sair com esse tipo de declaração de que está achando tudo muito engraçado.

Sr. Presidente, conceda-me um pouco mais de tempo, para que eu possa ouvir o Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador César Borges, dissentindo muito do Senador Sibá Machado e corroborando o seu discurso, penso que, em relação a Dirceu e a Lula, há um precedente muito grave. Num depoimento à revista Veja, um petista histórico, Hélio Bicudo, jurista, homem com 82 anos - petista, continua petista -, disse simplesmente que, quando Paulo de Tarso Venceslau, outro petista, denunciou que o compadre do Lula, o Teixeira, estava achacando prefeituras do interior, o PT teve de abrir uma sindicância, que foi dirigida por Hélio Bicudo. A sindicância verificou que havia indícios de que era verdadeira a acusação. Hélio Bicudo diz, com todas as letras, que foi chamado por Lula e por Dirceu, que pediram que ele esquecesse o assunto.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Agradeço-lhe o aparte, Senador Jefferson Péres. Essa é uma realidade.

Bicudo disse mais: que conhecia Lula de perto - aliás, como a Senadora Heloísa Helena também já teve oportunidade de dizer aqui para nós - e que sabe que a personalidade dele é centralizadora; é de participar e de saber dessas decisões. Portanto, não venha agora o Sr. Lula, com piadas de salão, dizer que a situação é muito engraçada.

            Encerro, Sr. Presidente, com a própria colunista Dora Kramer, que diz que José Dirceu, na condição de executor das malfeitorias, atinge em cheio o Governo, em nome e a favor de quem o então Chefe da Casa Civil fez o que Relator na Comissão de Ética, Júlio Delgado, tem certeza de que foi feito.

(Interrupção do som.)

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Vou encerrar, Sr. Presidente.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Presidente da República precisa ter um respeito maior à opinião brasileira, a esta Casa, aos Srs. Parlamentares e ao trabalho das CPIs. Estamos cumprindo a nossa obrigação. Sei que o Presidente gostaria que nada disso estivesse sendo apurado. Essa sempre foi a sua postura, desde o início. Foi contra a CPI dos Bingos, quando aqui foi proposta, num primeiro momento, que era a CPI do Waldomiro Diniz; foi contra a CPMI dos Correios; quando foi a favor da CPMI do mensalão, foi para atrapalhar os trabalhos de investigação.

No entanto, vamos continuar cumprindo com o nosso papel, com o nosso dever. E ao Presidente solicitamos mais respeito à opinião pública e ao Congresso Nacional.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/10/2005 - Página 35459