Discurso durante a 183ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo pela urgente aprovação da reforma política brasileira.

Autor
Patrícia Saboya (PSB - Partido Socialista Brasileiro/CE)
Nome completo: Patrícia Lúcia Saboya Ferreira Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Apelo pela urgente aprovação da reforma política brasileira.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães, Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 20/10/2005 - Página 35484
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, REFORMA POLITICA, SOLUÇÃO, IRREGULARIDADE, CAMPANHA ELEITORAL.
  • COMENTARIO, AUSENCIA, APROVAÇÃO, REFORMA POLITICA, CAMARA DOS DEPUTADOS, DEFESA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, JORGE BORNHAUSEN, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, OBJETIVO, REDUÇÃO, CUSTO, CAMPANHA ELEITORAL, DETALHAMENTO, PROJETO.
  • REGISTRO, EMENDA, AUTORIA, ORADOR, OBRIGATORIEDADE, COMITE, CANDIDATO, DISPONIBILIDADE, DESPESA, CAMPANHA ELEITORAL, INTERNET.
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, ESTUDO, FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS (FGV), PERDA, RECURSOS, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), EFEITO, CORRUPÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
  • ESCLARECIMENTOS, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), FRUSTRAÇÃO, ORADOR, POLITICA, BRASIL.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (PSB - CE) - Obrigada, Presidente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho a esta tribuna hoje para falar sobre tema urgente para o País que, infelizmente, só costuma ser lembrado às vésperas de eleições e em tempos de crises políticas e ser engavetado quando a maré se acalma. Refiro-me à reforma política, tema que tem sido muito discutido tanto nesta Casa quanto na Câmara há mais de dez anos.

Quando, em maio passado, eclodiu a ainda atual crise envolvendo diversos partidos representados aqui no Congresso, a reforma política, que andava adormecida, reapareceu com força total nos discursos de muitos Parlamentares. Com veemência, disseram considerá-la fundamental para impedir distorções que poderiam estar na raiz da própria corrupção.

Afinal, diziam, com razão, os Parlamentares, o atual sistema político-partidário permite o troca-troca de partidos que faz com que alguns políticos migrem para as legendas da base do Governo em troca de interesses nem sempre legítimos.

Afinal, diziam ainda meus colegas, o atual sistema dá margem à existência do famoso e conhecido por todos nós agora caixa dois. Enfim, o rol de irregularidades e impropriedades relacionadas à fragilidade do nosso sistema político-eleitoral é grande e nocivo.

Srªs e Srs. Senadores, naquela época - e cinco longos e desgastantes meses já se passaram -, eu me lembrei, em um texto que escrevi, de um antigo ensinamento oriental. Ele diz que “toda crise vem acompanhada de uma oportunidade”. Eu acreditava e continuo acreditando que esse ensinamento se aplica perfeitamente à situação por que passa o nosso País.

Ainda há tempo para encararmos esse turbilhão deflagrado por denúncias de corrupção envolvendo o Governo e o Congresso como uma chance para modificarmos, para melhorarmos o nosso sistema político-eleitoral.

Esta é a primeira grande crise política brasileira televisionada 24 horas por dia. As TVs Senado e Câmara e os canais de notícias das televisões por assinatura mostram, para milhões de brasileiros, verdadeiros crimes envolvendo parte da classe política. A corrupção, as bravatas, os acordos ilícitos são expostos todos os dias de maneira nua e crua para que todos possam ver.

Nós, brasileiros, passamos por um sério e profundo processo de reflexão. Estamos percebendo a falência do atual sistema político-eleitoral. E é essa reflexão que fará com que não aceitemos, em 2006, campanhas caríssimas, caracterizadas pela distribuição de benesses em troca de votos e pelos truques de marketing nos programas de TV e rádio, que acabam criando uma imagem muitas vezes artificial do político, como se ele fosse um produto que estivesse à venda.

Devemos aos brasileiros que nos elegeram se não a necessária reforma política profunda, pelo menos a aprovação de medidas urgentes de austeridade, que valham ainda para as eleições gerais do ano que vem.

Já que não houve acordo para que se aprovasse a chamada reforma eleitoral na Câmara, lamentavelmente, será necessário que sigamos um caminho bem mais tortuoso: votar uma mudança na Constituição, por meio de projetos que já tramitam tanto na Câmara quanto aqui no Senado, para permitir que aprovemos modificações nas regras eleitorais após o prazo estabelecido atualmente, de 30 de setembro, que já deixamos passar.

Srªs e Srs. Senadores, aprovamos, em tempo recorde, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, presidida pelo Senador Antonio Carlos Magalhães - que se comprometeu, em uma reunião de Líderes, a colocar em regime de urgência essa matéria, cumpriu o seu compromisso e nos mobilizou a todos, em sua Comissão, para que pudéssemos lá discutir -, a reforma proposta pelo Senador Bornhausen, que teve substitutivo elaborado pelo Senador José Jorge.

Tivemos a coragem, Sr. Presidente, de fazer isso porque sabemos que não é hora para gastos exagerados com as eleições. O Senador Antonio Carlos Magalhães foi um daqueles que mais lutou por isso, sendo Presidente da Comissão. Não é hora para artificialismos publicitários. As denúncias e as suas conseqüências nos ensinaram que talvez seja hora, sim, de dar um passo atrás na tecnologia para dar um passo à frente em transparência e autenticidade.

Sim, porque o projeto aprovado pela CCJ e que, a meu ver, deveria ter sido votado no plenário da Câmara em tempo hábil, reduz os custos da campanha, permite, senhoras e senhores do Maranhão aqui presentes, que os eleitores acompanhem os gastos de seu candidato, dia a dia, pune com mais rigor os políticos que cometerem irregularidades ao longo do processo, e mostra, de maneira mais direta, a cara do candidato, diferentemente dos programas de televisão que costumeiramente vemos, que viram verdadeiras novelas ou produções cinematográficas.

Eu mesma apresentei uma emenda, Sr. Presidente, que terminou contemplada pelo autor do substitutivo, determinando que os comitês dos candidatos disponibilizem, diariamente, na Internet, os valores e também as fontes de recursos de cada um dos gastos da campanha, especificando quais empresas doaram e que recursos disponibilizaram, ou seja, quanto de verba utilizaram.

Considero importante relembrar aqui outros pontos desse projeto tão oportuno. O texto aprovado aumenta a responsabilidade do próprio candidato pela prestação de contas de sua campanha, que, pelo texto original, seria mais do tesoureiro do que do próprio político. Fizemos questão de acabar com a antiga prática da distribuição de camisetas, bonés e outros brindes com o nome e logotipo do candidato.

O substitutivo aprovado barateia ainda a campanha, reduzindo seu tempo em 25 dias, diminuindo em dez dias o horário eleitoral gratuito de rádio e televisão e estabelecendo que esses programas eleitorais terão somente a participação dos próprios candidatos, e não mais a de artistas ou, enfim, de outras pessoas e amigos. Evidentemente, os artistas também têm o direito e até o dever de participar das campanhas políticas, mas não, em alguns casos, de falar pelo próprio candidato. Ficarão vedadas, ainda, as gravações externas, as montagens. Isso fará com que o candidato se apresente ao eleitor mais parecido com o que ele realmente é.

Se o projeto for aprovado pela Câmara, o uso comprovado do caixa dois implicará a nulidade das contas do candidato e, conseqüentemente, a impugnação do registro de sua candidatura. Além disso, a empresa que contribuir com valores acima do permitido não poderá participar de licitação pública e firmar contrato com a administração nos cinco anos seguintes.

Srªs e Srs. Senadores, precisamos ter em mente que nossa classe política passa por uma de suas mais graves crises de credibilidade. Diversas pesquisas de opinião confirmam essa triste realidade. Os eleitores, em sua grande maioria, já não se sentem representados por aqueles que elegeram e não crêem nos partidos e, freqüentemente, na própria democracia para resolver seus problemas imediatos. Historicamente, e não só agora, a corrupção desvia os recursos públicos e faz com que os impostos não atinjam sua real finalidade: a de distribuir a renda em prol dos menos favorecidos.

A balbúrdia política dificulta ainda a implementação de projetos estruturais e inviabiliza a realização das reformas de que o Brasil tanto precisa. Engessa o Executivo, paralisa o Congresso, imobiliza a democracia. Isso sem contar que até os importantes investimentos externos no Brasil dependem da estabilidade política. Precisamos, portanto, fazer correções em nosso sistema político-eleitoral para podermos caminhar com liberdade.

Devemos, Srªs e Srs. Senadores, ser implacáveis com o fisiologismo e a corrupção - inimigos da eficiência econômica -, que dispersam riqueza sem retorno social algum. Os especialistas são unânimes em apontá-los como algumas das maiores chagas em todo o mundo.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (PSB - CE) - Já vou concluir, Sr. Presidente.

Um estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas estima que o Brasil, Senador Antonio Carlos Magalhães, perde entre 3% e 5% do seu PIB com a corrupção - dados que me deixaram estarrecida -, valor superior a R$72 bilhões! Para dar a V. Exªs uma idéia da dimensão desse valor, a previsão de recursos para o Fundeb - no qual aqui tanto lutamos para incluir as crianças de zero a três anos -, em seu primeiro ano de vigência, caso ele venha a ser instituído, é de R$60,8 bilhões, incluindo as contribuições de União, Estados e Municípios. Ou seja, menor que a estimativa de corrupção no País. O valor perdido com a corrupção daria ainda para se construir 2.000.571 casas populares.

Precisamos mostrar que temos vontade política para dar o pontapé inicial em direção à reversão de tudo isso.

            Não podemos fazer jus às acusações de que Deputados e Senadores são casuísticos também quando o assunto é uma reforma política de fundo. Discutimos, há mais de dez anos, modificações no sistema político-partidário, mas somos acusados de só voltar a discuti-las nas vésperas das eleições e de engavetar as propostas depois que somos reeleitos. Convido todos a quebrar esse ciclo vicioso.

            Não é justo que a sociedade brasileira, sedenta por justiça, continue a ver o papel que alguns Parlamentares têm desempenhado, ao subirem a esta tribuna e prometerem uma reforma política justa, que pudesse coibir esses atos de corrupção.

Hoje estamos assistindo, mais uma vez, infelizmente, a essa reforma sendo engavetada por interesses pessoais de Parlamentares que não concordam, que não conseguem chegar a um acordo sequer na reforma emergencial, votada nesta Casa e encaminhada à Câmara dos Deputados.

Enfim, temos também de enfrentar o complexo tema de financiamento público das campanhas eleitorais no Brasil. Essa parte, Srªs e Srs. Senadores, nós já fizemos. Esse passo já foi dado aqui no Senado. Falta que aconteça o mesmo na Câmara. Vamos adiante na busca pelo respeito à nossa instituição e, o mais importante, na busca por um sistema político que permita ao nosso Governo atual e aos próximos realizar reformas profundas no Brasil. Refiro-me às esperadas reformas na educação, na saúde e na segurança pública, com que, há tantas décadas, sonhamos. São esses os investimentos de fundo que mudarão o destino das nossas crianças, dos nossos jovens e, conseqüentemente, do nosso País.

Sr. Presidente, quero agradecer a gentileza de V. Exª por ter me concedido um pouco mais de tempo e, ao mesmo tempo, aproveitar essa oportunidade, nesses 52 segundos que nos restam, para talvez esclarecer uma notícia, uma matéria que saiu no jornal O Globo, de que eu estaria desiludida com a política. Fui Vereadora, fui Deputada Estadual, fui candidata à Prefeita da minha terra, Fortaleza - infelizmente, não ganhei as eleições, mas ganhou uma mulher de luta, Luizianne Lins, nossa Prefeita, que está lutando para construir uma cidade melhor e mais justa -, e hoje sou Senadora da República, a primeira Senadora pelo Estado do Ceará, e não pretendo, de forma alguma, abandonar a vida pública. Mas também tenho o direito, como a população, de algumas vezes me decepcionar, de algumas vezes ficar triste com alguns políticos que assumem um compromisso do qual recuam, infelizmente, quando as coisas começam a se acalmar. Acho que não é disso que o Brasil precisa. A sociedade brasileira está com sede, sim, com sede de corrigir essas injustiças, essas distorções que acontecem em nosso País. E nós, Senadores e Senadoras, não podemos nos furtar, não podemos fugir desse debate, dessa discussão. Ainda é tempo de se aprovar a reforma política. Se aprovada para a próxima eleição ou para as seguintes, o importante é que ela seja aprovada, que ela seja discutida, que ela seja debatida na Câmara, para que possamos dar uma resposta firme e concreta a toda a sociedade brasileira.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Permite-me V. Exª um aparte, Senadora Patrícia Saboya?

A SRª PATRICÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Com prazer, se o Presidente permitir.

Ouço o Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Serei breve. Aqui ao lado está o Deputado João Herrmann, que até gostaria de aparteá-la. Quero transmitir a V. Exª a minha solidariedade diante desse impulso de dizer da sua vontade de lutar por aquilo em que sempre acreditou, nessa batalha pela justiça, na batalha pela erradicação da pobreza, na batalha pelos jovens e adolescentes e, inclusive, pelo direito mais adequado e digno de as crianças serem adotadas. V. Exª tem tido um cuidado muito grande com essas questões e teve, ainda hoje, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, aprovado um projeto de sua autoria. Então, quero cumprimentá-la por sua trajetória, estimulando-a, portanto, a permanecer, com muita fibra, na vida política brasileira.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Muito obrigada, Senador Eduardo Suplicy. V. Exª é, certamente, uma referência para todo o Congresso pelas causas a que vem se dedicando, pela luta que vem travando pelo Brasil afora, não só no seu Estado.

Muito obrigada.

Concedo um aparte, com muito prazer, ao Senador Antonio Carlos Magalhães.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª estava fazendo falta. Não entendo mais este Senado sem a sua presença, sobretudo por sua coragem e por sua maneira de abordar temas importantes para a vida desta Nação. V. Exª coloca com muita propriedade essa posição da reforma política. Não acredito muito que ela possa ser realizada; temo que não possa. Entretanto, creio que não deveremos, de jeito nenhum, abrir mão dessa luta para que, até o final do ano, tenhamos aprovado pelo menos o Projeto Bornhausen, ou algo parecido com ele, para baratear as eleições e evitar muitas das imoralidades perpetradas durante as eleições, fruto da falta de uma legislação clara e precisa. V. Exª, mais uma vez, chega a esta Casa com o brilho de sua inteligência e, sobretudo, com a capacidade e o civismo com que representa o Estado do Ceará.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Muito obrigada, Senador Antonio Carlos Magalhães, pelo seu aparte. Afinal de contas, foi V. Exª que, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, fez com que todos nós pudéssemos participar, da forma mais democrática e transparente possível, desse debate sobre a reforma política.

Sr. Presidente, muito obrigada pelo tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/10/2005 - Página 35484