Discurso durante a 186ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise do resultado do referendo sobre a comercialização de arma de fogo e munição.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. ELEIÇÕES.:
  • Análise do resultado do referendo sobre a comercialização de arma de fogo e munição.
Publicação
Publicação no DSF de 25/10/2005 - Página 36004
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. ELEIÇÕES.
Indexação
  • APOIO, RESULTADO, REFERENDO, DESARMAMENTO, DEMONSTRAÇÃO, NECESSIDADE, PRIORIDADE, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA, EMPREGO, RENDA, POSSIBILIDADE, REDUÇÃO, VIOLENCIA.
  • JUSTIFICAÇÃO, RESULTADO, REFERENDO, PROIBIÇÃO, COMERCIALIZAÇÃO, ARMA DE FOGO, ESPECIFICAÇÃO, DIFICULDADE, NATUREZA FINANCEIRA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, DETERMINAÇÃO, PLEBISCITO, REFERENDO, COINCIDENCIA, DATA, ELEIÇÕES, REDUÇÃO, DESPESA, CONHECIMENTO, POSIÇÃO, NATUREZA POLITICA, CANDIDATO.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Tião Viana, eu não poderia deixar de vir à tribuna no dia de hoje e não falar do referendo. Ontem, 23 de outubro, o País foi às urnas e deu o seu recado em um momento muito importante para a democracia brasileira. Na maior consulta popular do mundo, milhões de brasileiros disseram “não” ao referendo sobre o desarmamento. O “sim” perdeu em todos os Estados e também no Distrito Federal.

O que chama a atenção é a vantagem que o “não” teve em relação ao “sim”. No meu Rio Grande do Sul, por exemplo, 85,07% da população optaram pelo “Não”. Um resultado que nos faz pensar: o brasileiro não admite perder um direito? A campanha do “Sim” foi mal feita, não foi eficiente? A campanha do “Não”, com certeza, foi eficiente. A do “Sim” falhou? Há uma resposta, inclusive, em relação ao Governo? O povo está a cobrar mais políticas eficazes no campo da segurança pública? São perguntas que ficam, Srª Presidente.

Muitos dizem que o “Sim” errou no eixo da campanha. Srª Presidente, acreditamos que a segurança pública está em debate. Acreditamos que essa questão é a mais adequada. E, por isso, seja qual for a resposta, precisamos analisar todos os fatos, pois todos têm, no fundo, a sua verdade. Acreditamos que, ao votar “Não” no referendo, o brasileiro não quis dizer que é a favor da violência. Ao contrário, ele mostra, isto sim, para mim, que está descontente com os rumos que o País está tomando nessa área. Como citamos, o Rio Grande do Sul é o Estado em que o “Não” obteve resultados mais expressivos. E devemos ressaltar, é o Estado, Senadoras Serys, em que o percentual de armas por habitante é o maior do País e é o Estado, também, que tem o menor número de mortes por arma de fogo.

Já prevíamos que o resultado seria esse. Também já havíamos anunciado o nosso voto desta tribuna e que foi reproduzido pelo jornal Zero Hora há mais ou menos trinta dias. Queria votar “Não”, como aqui também declarou - e não está aqui presente - o Senador Sérgio Zambiasi.

Respeitamos e, na teoria, concordamos com aqueles que optaram pelo “Sim”, dizendo que buscam a paz. Todos nós buscamos a paz. Mas destacamos que não fomos favoráveis ao desarmamento porque as condições da vida da população no mundo real não permitiram. Podemos mesmo acreditar que o simples fato de proibir a venda de armas iria acabar com a violência? Claro que não. A violência, a nosso ver, só terá fim quando a nossa gente tiver melhores condições de vida.

O Brasil precisa, isso sim, investir mais em educação, em segurança pública, em política de geração de emprego, em saneamento básico, em habitação, na valorização da renda, principalmente do salário mínimo. Aí, sim, sem sombra de dúvida, veremos uma diminuição nos índices de violência.

Países de Primeiro Mundo optaram pelo desarmamento, mas vejam as condições de vida! Vejam a qualidade de vida! Poderíamos falar do Canadá, que tem uma população, na sua maioria, armada. Mas lá também não ocorre o problema de morte por arma de fogo, porque a qualidade de vida é outra. Medidas que beneficiem a população, sim, mesmo porque muitas das medidas anunciadas, infelizmente, não diminuíram a violência nem aumentaram a qualidade de vida do nosso povo.

E voltamos a citar o exemplo do Rio Grande do Sul. Algumas medidas anunciadas por setores da sociedade estão tendo um impacto negativo na economia gaúcha. Senadora Serys Slhessarenko, V. Exª conhece bem o Rio Grande. E vou além, a Convenção-Quadro é um exemplo. Se aprovada da maneira como está, gerará desemprego. Serão milhares as famílias prejudicadas.

Queiram ou não, o próprio resultado do referendo é também uma resposta ao desemprego: as quatro maiores empresas fabricantes de armas estão no Rio Grande do Sul. Mesmo sabendo que grande parte da produção das armas é exportada - 90% para os Estados Unidos - teríamos assim mesmo uma legião de desempregados. Pois a legislação diz que os países que proibirem o comércio de armas internamente também - até por coerência - são proibidos de exportá-las.

Então, a nossa produção que é praticamente toda exportada não poderia mais acontecer. E, aí, os Estados Unidos diriam muito obrigado ao desemprego no Brasil.

A queda do dólar, queiramos ou não, é um outro fator que castiga a economia gaúcha e a população do nosso Estado. O Rio Grande do Sul é um Estado exportador e a queda do dólar está afetando e muito esse setor. Um dos mais prejudicados é o setor calçadista no Vale dos Sinos. A não devolução do Fundo de Exportação aos exportadores também já gera desemprego no Rio Grande.

Temos um outro problema hoje, que V. Exª aqui atacou: a febre aftosa. Embora os focos tenham aparecido no Mato Grosso do Sul, afetou as exportações do Brasil e, naturalmente, as exportações gaúchas. Eu via hoje que mesmo para a soja e para as máquinas agrícolas está havendo boicote nas exportações, porque pensam que o vírus poderia acompanhar, o que não tem nada a ver. Mas isso também acaba prejudicando e muito o Estado do Rio Grande.

Há um outro dado que levanto agora: tenho que comentar a campanha feita, infelizmente, com um certo entendimento com o Inmetro, fazendo com que os disjuntores que são fabricados no Rio do Sul, da chamada linha preta, seja, substituídos pelos disjuntores da chamada linha branca, produzidos na Europa.

Isso também vai gerar desemprego no Rio Grande do Sul - uma lástima. Poderia lembrar aqui o Mercosul. O Rio Grande do Sul tem tido problemas com a falta de vistoria nas fronteiras e com as baixas alíquotas de impostos aos produtos importados, dificultando e prejudicando aqueles que trabalham na produção de vinho, no plantio do arroz, do trigo, e em outras áreas, Srª Presidente.

Tenho certeza de que todos os Senadores que percebessem as dificuldades do seu Estado, como essa série de exemplos, fariam desta tribuna o mesmo discurso, como V. Ex ª fez aqui com relação à febre aftosa e às estradas.

Srª Presidente, a situação financeira do Rio Grande é delicadíssima. E todos esses componentes contribuem, sem sombra de dúvidas, para que os gaúchos protestem e contribuíram para que nas urnas eles votassem, de forma maciça, contra o desarmamento. Lá tivemos o menor índice de abstenção e o maior índice de rejeição em todo o País.

Após esses resultados, acreditamos que o Congresso dará mais ênfase aos debates do Estatuto do Desarmamento. Uma iniciativa muito boa que, aliada a outras políticas que visem à melhoria da qualidade de vida da população, terá impactos positivos na batalha contra a violência e o desemprego.

Uma Nação como a nossa não pode continuar com a sua população amedrontada. Sim, porque nos grandes centros o medo da violência é uma constante. O resultado do referendo é reflexo disso. Foi a forma encontrada por brasileiros e brasileiras de dizer “não” à violência, de protestar e mostrar sua insatisfação em relação à maneira como o País vem enfrentando o debate sobre a violência.

Digo mais, Srª Presidente: seria falso acreditar-se que a violência acabaria apenas com a proibição da venda de armas. Também não acredito que o resultado seria, como alguns disseram, uma reação contra o Governo Lula. Nossa população não age de forma vingativa ou por via indireta. Ao contrário, demonstrou, com muita firmeza, que o seu protesto foi contra a violência e que ela se sente insegura.

Os altos índices de violência - e aqui me refiro a toda forma de violência, não apenas àquela ligada às armas de fogo - foram os responsáveis por esse resultado. Precisamos, agora, atentar para esse dado. É preciso mais investimento na área da segurança pública. Como? Como eu disse anteriormente, com políticas que possibilitem a melhoria da qualidade de vida de todo o povo brasileiro.

Para concluir, Srª Presidente, no mesmo tema, quero também dizer que apresentei ao Senado, na semana passada, um projeto de lei para que todo plebiscito ou referendo coincida com a disputa eleitoral.

No Brasil, ela acontece de dois em dois anos. Num primeiro momento, não importa a seqüência, há disputa para os cargos de Vereador e Prefeito. Após dois anos, para Deputado Estadual e Federal, Governador e Presidente da República. Se o meu projeto for aprovado, será feita uma economia, entre o dinheiro público e o privado, de algo em torno de R$600 milhões, que poderiam ser usados, se depender de mim, no campo e na área social. Além disso, a população, quando fosse votar para Prefeito, Vereador, Deputado Federal, Estadual, Senador e Presidente da República, já conheceria também a posição dos candidatos a respeito do tema do referendo. Naturalmente, isso influenciaria na votação.

Parece-me que, nesse último referendo, o seu Estado ficou em segundo lugar, de forma positiva: o Rio Grande do Sul ficou em primeiro e o Acre em segundo lugar. Sei da sua força e liderança naquele Estado, que teve um dos maiores índices de “não”. Ora, a população vai saber: “Esse governador que vou eleger ou esse presidente, a respeito de tal tema - o aborto, por exemplo -, pensa assim.”. Isso pode ajudar, inclusive, na sua decisão na hora de eleger alguém.

Por isso, Senador Tião Viana, apresentei, na semana passada, um projeto para que a data das eleições, realizadas de dois em dois anos, coincidam com a do plebiscito. Isso ajudaria, inclusive, a se conhecerem os candidatos e haveria uma economia, como eu dizia, de R$600 milhões, além de se ganhar tempo e, naturalmente, realizar-se um processo bem mais organizado. Aquele período de propaganda livre, as pessoas usariam também para explicitar sua posição em relação ao tema em debate, pois todos os assuntos interessam ao conjunto da população, seja o desarmamento, o desemprego, a saúde ou a segurança.

Espero que esse projeto seja aprovado com rapidez. Entre a sua aprovação e a efetiva votação haveria, no mínimo, o prazo de um ano para que se fizesse o debate com a sociedade, assim a coincidência da votação desse projeto com as eleições seria boa para todos.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/10/2005 - Página 36004