Discurso durante a 186ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Crítica à morosidade no andamento das indenizações nos processos de anistia, em curso no Ministério da Justiça.

Autor
Garibaldi Alves Filho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RN)
Nome completo: Garibaldi Alves Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS.:
  • Crítica à morosidade no andamento das indenizações nos processos de anistia, em curso no Ministério da Justiça.
Publicação
Publicação no DSF de 25/10/2005 - Página 36042
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • REGISTRO, SUPERIORIDADE, CIDADÃO, LEGITIMIDADE, REIVINDICAÇÃO, DIREITOS, INDENIZAÇÃO, TORTURA, REGIME MILITAR, ESPECIFICAÇÃO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO (PCB), BUSCA, INFORMAÇÃO, ANDAMENTO, OBSTACULO, TRAMITAÇÃO, PROCESSO, COMISSÃO, ANISTIA.
  • PROTESTO, FALTA, INTERESSE, GOVERNO FEDERAL, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), SOLUÇÃO, SITUAÇÃO.
  • REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), PUBLICAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, PRESIDENTE, COMISSÃO, ANISTIA, EXPECTATIVA, ANALISE, PROCESSO, INDENIZAÇÃO, SUGESTÃO, ADITIVO, LEI DE ANISTIA.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Estado brasileiro precisa resgatar uma dívida ainda não saldada com os cidadãos e suas famílias que foram perseguidos, torturados e até mortos por motivações político-ideológicas. Só assim poderemos virar uma página triste de nossa história e afirmar, sem medo, que vivemos sob a égide de um Estado democrático de direito.

Faço essa afirmação, Sr. Presidente, amparado em centenas de cidadãos que procuram o meu gabinete em busca de informações sobre os seus processos de anistia política que correm na Comissão de Anistia, órgão subordinado ao Ministério da Justiça. Vejam, Srªs e Srs. Senadores, que se trata apenas de uma amostragem do que está ocorrendo em nosso país, pois acredito que ocorra o mesmo com V. Exªs. Na verdade, trata-se de trinta e três mil processos que estão tramitando nessa Comissão de Anistia. E não creio que o Ministro Márcio Thomaz Bastos esteja absolutamente inteirado do que está acontecendo, apesar de, depois da elaboração deste discurso, depois de ter recebido essas informações, ter lido ontem, no Correio Braziliense, esclarecimentos que foram prestados pelo presidente da comissão, o advogado Marcelo Lavenère, que foi, inclusive, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil.

Quero, Sr. Presidente, dizer que não pode deixar de causar estranheza a forma como vem sendo tratada essa questão no Governo Lula, que possui toda legitimidade para dar celeridade a esses processos, que nada mais representam do que o resgate de algo que já foi, inclusive, perdido. O Estado brasileiro tem a obrigação de compensar essas pessoas e suas famílias.

Recebi várias cartas que relatam o andamento desses processos. Uma delas sintetiza a aflição e a preocupação daqueles que estão perdendo a esperança de ver os seus legítimos direitos efetivados. Uma delas, inclusive, fala desse direito líquido e certo e é acompanhada de observações da advogada de seu autor aqui em Brasília. Adianta que a comissão se reúne apenas uma vez por mês; que os conselheiros não residem em Brasília, o que favorece que eles não compareçam às reuniões; que o volume de processos, como eu já falei, é imenso - são trinta e três mil processos.

Sugiro, diante do exposto, que formemos uma comissão de Senadores que possam buscar, junto ao Ministro Thomaz Bastos e ao Dr. Marcelo Lavenère, explicações sobre essa procrastinação que impede que se possa promover justiça.

Relativamente a essa questão, um caso em meu Estado é absolutamente emblemático. Demonstra que, ao contrário do ditado que diz “a justiça tarda, mas não falha”, o que vale é o ditado que prega que “justiça tardia é uma forma de injustiça”.

O Sr. Pretextato José da Cruz foi líder do Sindicato dos Estivadores de Natal no início da década de 60, militante do PCB, candidato a vereador em Natal na década de 50 e figura ligada ao então Prefeito Djalma Maranhão, que faleceu no exílio no Uruguai. O Sr. Pretextato foi impedido de exercer os seus direitos políticos e teve de sair do Estado no ano de 1964, só podendo retornar no ano de 1976. Portanto, houve prejuízos para esse senhor, que esteve durante doze anos longe de sua terra, mesmo havendo julgamento militar em 1969 “inocentando-o” das denúncias que motivaram a cassação de seus direitos políticos. Ele está hoje com 82 anos de idade e indaga, diante da evidente procrastinação em ver o seu caso julgado, o seu pleito justo atendido, se vai estar vivo para receber o que lhe é direito.

Espero, diante desse exemplo de um idealista que ajudou a construir a nossa história, como tantos outros, poder sensibilizar o Governo Federal para que dê a devida prioridade ao julgamento desse processo.

Sr. Presidente, muitos outros me procuraram - como já disse, milhares de pessoas, são 33 mil processos. Agora, o Correio Braziliense traz, na sua edição de ontem, esclarecimentos do advogado alagoano Marcelo Lavenère, que ficou conhecido nacionalmente quando liderou, junto com o jornalista Barbosa Lima Sobrinho, o pedido de impeachment do Presidente, seu conterrâneo, Fernando Collor de Melo.

Antigo militante em favor dos direitos humanos, ele é o presidente dessa comissão. Juntamente com 17 conselheiros, ele tem pela frente essa montanha de 33 mil processos. Ele diz, procurando explicar a situação, que é uma comissão muito polêmica, e a sua atuação provoca divergências, porque há quem considere ser um dever do Estado reparar com indenizações quem foi perseguido, torturado ou morto, mas há quem discorde disso, como os militares e segmentos conservadores da sociedade.

Sr. Presidente, entendo, com todo o respeito, apreço e admiração ao ex-presidente da OAB, que isso já está devidamente superado. O que há hoje é que o Estado precisa ter diante dele uma visão de urgência desse processo.

Diz mais o Presidente da Comissão de Anistia: “Não podemos considerar que a anistia vale para os dois lados. Entendo que anistia é para quem estava lutando contra o regime autoritário. Apenas não são processos fáceis, porque as ocorrências são do início da repressão militar, no início de 1964. Estamos há mais de quarenta anos desses episódios, diz o Presidente da Comissão. Os presos daquela época não puderam guardar a documentação exigida. A coleta de provas não é fácil para o anistiado nem para a Comissão. Não basta apenas que alguém apareça e diga que foi perseguido ou torturado. Em muitos casos, estamos sendo flexíveis dispensando a documentação no limite da prudência, mas é muito difícil”.

Sr. Presidente, ainda diz mais o Presidente da Comissão em relação à pergunta “Como evitar que a Comissão de Anistia fique eternamente com casos antigos e inconclusos?”, pergunta o repórter do Correio Braziliense. “Até o final do próximo ano, diz o Dr. Marcelo Lavenère, vamos julgar de 80% a 90% dos processos”. Será? Do jeito que a Comissão vai, será que o Sr. Marcelo Lavenère não está sendo por demais otimista? São 33 mil processos, e a Comissão não tem apresentado um ritmo que nos leve a crer - e nem ele promete, nessa entrevista, nenhum fato novo - que esses processos sejam julgados assim.

Ele acredita, entretanto, que a própria Comissão ou Governo deve sugerir um aditivo à Lei da Anistia para estabelecer um prazo de apresentação dos requerimentos de solicitação da anistia, que poderia ser de seis meses.

Sr. Presidente, fiz aqui um contraponto. Trouxe aqui o meu apelo, a minha crítica à morosidade dos trabalhos da Comissão, mas também não deixei de trazer a explicação, os esclarecimentos do Presidente da Comissão de Anistia.

No meio disso tudo, Sr. Presidente, tanto para mim como para o Presidente é muito fácil polemizar. Assim, não se trata propriamente de uma polêmica, mas é muito fácil cada um dar as suas razões, difícil é para quem fica esperando essa anistia. Difícil é para um Pretextato José da Cruz, que foi tão perseguido pelo regime autoritário e que perdeu tanto na sua vida sob o ponto de vista afetivo, sob o ponto de vista financeiro e sob o ponto de vista político, aceitar a morosidade do trabalho que vem a lhe fazer justiça aos 82 anos...

Quantos pretextatos não existirão por aí afora? Afinal, já faz 40 anos da repressão de 1964. Quarenta anos levaram essas pessoas ao envelhecimento, levaram essas pessoas a esse cansaço, a esse medo, a essa sensação de que, afinal, não se fará justiça à luta que eles travaram, política e ideológica. O que eles querem é a democracia que o Brasil vive e convive hoje.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/10/2005 - Página 36042