Questão de Ordem durante a 187ª Sessão Especial, no Senado Federal

Questão de ordem referente a decretação da perda do mandato do Senador João Capiberibe.

Autor
Magno Malta (PL - Partido Liberal/ES)
Nome completo: Magno Pereira Malta
Casa
Senado Federal
Tipo
Questão de Ordem
Resumo por assunto
REGIMENTO INTERNO.:
  • Questão de ordem referente a decretação da perda do mandato do Senador João Capiberibe.
Publicação
Publicação no DSF de 26/10/2005 - Página 36186
Assunto
Outros > REGIMENTO INTERNO.
Indexação
  • DEBATE, LIMITAÇÃO, JUSTIÇA, APREENSÃO, CRIAÇÃO, JURISPRUDENCIA, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, FAVORECIMENTO, CRIME ORGANIZADO, DESRESPEITO, DECISÃO, ELEITOR.
  • QUESTIONAMENTO, PRESIDENTE, SENADO, POSSIBILIDADE, DECISÃO, SEMELHANÇA, CAMARA DOS DEPUTADOS, GARANTIA, DIREITO DE DEFESA, SENADOR.

O SR. MAGNO MALTA (Bloco/PL - ES) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, este é um momento difícil de um debate acalorado e um momento também eminentemente emocional. E não diria um emocional que conduz as pessoas a tomar decisões ou fazer falas incisivas em função de descontrole emocional. Já falaram os melhores juristas que detêm mandato nesta Casa, conhecedores da Constituição Federal, aqueles que já militaram no Direito antes de vir para esta Casa. Prestei muita atenção ao depoimento, à palavra de cada um deles e, de uma forma significativa, ao depoimento do Senador Aloizio Mercadante, que fez uma fala, do meu ponto de vista, perfeita.

Lá no cafezinho, ouvi um Senador dizendo a outro: “Todos os oradores começam elogiando o Renan e, depois, pau nas costas dele”. Eu não quero fazer isso, mas posso fazer, porque sou amigo de V. Exª e sei da maneira como V. Exª tem se conduzido e se portado aqui.

Dizia o Senador Mercadante, Senador Mão Santa, que o mandato eletivo se conquista nas urnas, nas ruas, discutindo idéias e falando com o povo, principalmente um mandato de Senador da República, em uma disputa majoritária. Chega-se ao Senado da República com o voto popular. É preciso que isso seja considerado. Por isso, o debate se faz extremamente importante, como ocorre nesta tarde. É necessário que nós, que disputamos esse mandato eletivo também, Sr. Presidente, que fomos às ruas, sejamos cautelosos ao avaliar a situação do Senador Capiberibe, que conheci mais profundamente quando presidi a CPI do narcotráfico - fui socorrê-lo quando fez um embate com o crime organizado do seu Estado. Imagine que S. Exª, que perseguido e cassado uma vez já foi, vai pagar o preço de ser cassado pela segunda vez.

Senador Sibá, faço questão de me pronunciar, embora me considere juridicamente indouto e incapaz de fazer as mesmas considerações que fez Pedro Simon, Jefferson Péres e outros militantes do Direito, pessoas que estudam o Direito, que são acadêmicos, como o Senador Antero Paes de Barros, que fez considerações acerca do texto constitucional. Como essas falas todas já foram feitas, ainda que eu tivesse conhecimento, não seria necessário que eu me manifestasse neste momento. Tenho, porém, uma história para contar, Sr. Presidente, e, no final dessa história, quero lhe fazer uma pergunta.

Quando eu era menino, minha mãe, Dona Dada, me contou a história de um encontro entre a Graça e a Lei. Depois do Supremo só tem Deus? O que será dos mortais se nós não conhecermos o limite da tolerância evocando a Graça num momento como este?

Minha mãe me ensinou a seguinte história. A Graça marcou um encontro com a Lei, Senador Arthur Virgílio, e o encontro era às oito horas da manhã. A Lei chegou primeiro - legalista, chegou às cinco para as oito. Oito horas, e a Graça não chegou. Oito e meia, e a Graça não chegou. A Lei começou a esbravejar. Dez horas: a Graça não chegou. A Lei estava se descabelando. Cinco horas da tarde, nada; um dia, nada; dois dias, e a Graça não aparece. No terceiro dia, cheia de raiva, a Lei, que é o limite de tudo e, a partir dela, nada, a Graça aparece, andando devagar, com o semblante cansado. Ela se aproximou da Lei, que, então, lhe disse: “Você é irresponsável. Não cumpriu o horário. Não cumpriu o combinado. Estou aqui há três dias e você não apareceu!”.

A Graça disse: “Eu saí de casa cedo, mas quando estava vindo para cá, encontrei uma mulher viúva, com dois filhos órfãos, a quem tive de socorrer. Passei um tempo com ela, tentando arrumar alimento para as crianças. Depois que deixei a família alimentada, saí correndo. Mas na estrada por onde passei havia um acidente: um automóvel tombado e algumas pessoas mortas. Eu fiquei para chorar os mortos e acudir aqueles que estavam ensangüentados. Precisei gastar mais um tempo. Ao passar pela primeira cidade, vi um tumulto na porta de um fórum. Alguém estava sendo injustiçado, quase apedrejado. Tomei as dores do injustiçado e gastei muito tempo para não morrer, para não apanhar junto. Tirei o injustiçado, clamei por justiça, até que o juiz a fez. Perdi muito tempo. Perdoe-me, foi por isso que eu me atrasei.”.

O que a minha mãe me ensinou, Sr. Presidente, é que há momentos na vida em que a Graça é maior do que a Lei. Este é um momento em que a Graça tem de ser maior do que a Lei. Se não conhecermos o limite do tolerável com a Graça, não há sentido em nossa vida.

Se essa prática pega, estamos todos nós sujeitos ao ódio dos nossos adversários, que descobriram o caminho fácil para tirar alguém daqui quando assim o quiserem.

Sabemos que o crime organizado, no alto da sua ousadia, colocou seus tentáculos desde as Câmaras de Vereadores aos grandes Parlamentos e até dentro do Judiciário, dentro das polícias, para criar para si um Estado-bandido, para fazer a sua própria vontade.

Sr. Presidente, encerro fazendo uma pergunta a V. Exª, com toda a amizade, com todo o respeito que lhe tenho, e V. Exª pode testemunhar isso. Imagino que o Presidente Aldo Rebelo exerceu a Graça em um momento de confronto da Graça com a Lei. E, no exercício da Graça, o Presidente da Câmara deu à esposa do nobre Senador João Capiberibe um tempo para ela pudesse exercer a sua defesa. Não quero, Sr. Presidente, evocar aqui se o acórdão foi publicado ou não. Outros já o fizeram e fizeram muito brilhantemente; eu não faria da mesma forma que eles fizeram, com tanto brilhantismo. Mas macularia esta Casa se V. Exª tomasse a mesma atitude do Deputado Aldo Rebelo? Em algum momento isso diminuiria V. Exª? Abalaria sua autoridade? Se essa atitude fosse tomada, em algum momento isso abalaria a relação entre os três ou os dois Poderes? Imagino que não.

Algumas vezes, reservadamente, V. Exª me fala sobre a sua mãe e diz que ela lhe faz algumas perguntas porque conhece o seu coração. Aqui, do alto da minha ignorância, até porque me julgo o mais indouto de todos os Senadores, quero apelar ao seu coração. Imagino que dando ao Senador João Capiberibe duas, três ou quatro sessões para que, conforme o texto da Constituição Federal, ele exerça a sua defesa, ao invés de diminuí-lo, fá-lo-á maior ainda; ao invés de arranhar esta Casa, mostrará à sociedade brasileira que o nosso senso de justiça é mais apurado do que o dos adversários daqueles que detêm mandato público; imagino que o Supremo Tribunal Federal, diante do seu gesto, vai entender que, antes de tomar uma próxima decisão, é preciso - e o que é combinado não é caro - se conversar, porque se o Presidente do Supremo tivesse conversado com o Presidente do Senado, quem sabe não estaríamos vivendo este momento aqui no Parlamento.

Encerro, Sr. Presidente, pedindo a V. Exª que, da maneira simplória como fiz as minhas perguntas, responda-as, pois sei que V. Exª pode fazê-lo. Sei que V. Exª se levantou contra atitude da Câmara, quando Severino Cavalcanti quis aumentar os salários. V. Exª disse: “Aumente sozinho, porque aqui não faço.”. Com isso, ficou maior. Foi uma atitude de gente grande, de homem que quer o bem do País. Acredito, assim, que se V. Exª acompanhar a atitude do Deputado Aldo Rebelo, ficará maior ainda.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/10/2005 - Página 36186