Fala da Presidência durante a 189ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem a Vladimir Herzog, por ocasião dos 30 anos de sua morte.

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Fala da Presidência
Resumo por assunto
HOMENAGEM. ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Homenagem a Vladimir Herzog, por ocasião dos 30 anos de sua morte.
Publicação
Publicação no DSF de 27/10/2005 - Página 37019
Assunto
Outros > HOMENAGEM. ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, VLADIMIR HERZOG, JORNALISTA, VITIMA, HOMICIDIO, DITADURA, REGIME MILITAR, REGISTRO, HISTORIA, PAIS.
  • HOMENAGEM, LUTA, DEFESA, DEMOCRACIA, JUSTIÇA, LIBERDADE, CONCLAMAÇÃO, SENADOR, CONSCIENTIZAÇÃO, RESPONSABILIDADE, REPRESENTAÇÃO POLITICA, GRAVIDADE, CRISE, POLITICA NACIONAL, CORRUPÇÃO, VIOLENCIA, DESIGUALDADE SOCIAL, DESIGUALDADE REGIONAL, CONTINUAÇÃO, DESRESPEITO, DIREITOS HUMANOS.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, PROCESSO, INDENIZAÇÃO, ANISTIA, VITIMA, DITADURA, REGISTRO, APOIO, SENADO, AMPLIAÇÃO, ACESSO, JORNALISMO, DOCUMENTAÇÃO, INTERESSE PUBLICO.

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. PMDB - AL) - O tempo destinado aos oradores da Hora do Expediente da presente sessão será dedicado à memória dos 30 anos de morte de Vladimir Herzog, nos termos dos Requerimentos nºs 1.088 e 1.089, de 2005, dos Senadores João Capiberibe, Eduardo Suplicy e outros Senadores.

Srªs e Srs. Senadores, senhores convidados, a sessão de hoje marca uma homenagem não apenas a Vladimir Herzog, morto nos porões da ditadura militar. Ela homenageia, em nome do jornalista, a luta pela democracia. Homenageia os ideais de justiça e de liberdade, que sempre conduziram a trajetória de Vladimir Herzog.

É justamente quando se completam 30 anos da morte de Vladimir Herzog que o País enfrenta sua pior crise política desde o fim do regime militar. Coincidência que nos leva a refletir sobre nossa História recente e sobre os rumos que sonhamos para o País.

Brasileiro de consciência política ímpar, Herzog morreu em 25 de outubro de 1975 defendendo as liberdades democráticas, então aviltadas pelo regime ditatorial. Mas seus ideais iam muito além.

O jornalista vislumbrava uma sociedade mais justa e um país de instituições sólidas comprometidas com o desenvolvimento e a ética.

Convido, pois, as Srªs e os Srs. Senadores a meditarem em torno da enorme responsabilidade que pesa sobre os ombros de todos nós, que de adversários do regime autoritário passamos a legítimos representantes de nosso povo e dirigentes do País.

Com o fim do autoritarismo, ficou em nossas mãos decidir sobre a reorganização da vida político-partidária, a melhor forma de revitalizar nossas instituições, garantir e estimular a participação popular e administrar a economia dentro de critérios de eqüidade e desenvolvimento.

Em vinte anos, fizemos um trabalho considerável rumo à consolidação de um Brasil mais justo e democrático. Mas as denúncias de corrupção e financiamento ilegal de campanhas eleitorais, a escalada da violência e os graves problemas sociais e de desigualdades regionais que o Brasil tem enfrentado mostram que há ainda muito a fazer. O sonho de Herzog e de tantos outros que lutaram ao lado dele por um país mais justo e menos desigual ainda está, sem dúvida nenhuma, longe mesmo de ser alcançado.

Senhoras e senhores, para falar mais do que representa Vladimir Herzog, quero abordar o dramático cenário de violência, desrespeito à lei e aos direitos humanos a que assistimos atualmente em nosso País.

Todos os dias, a imprensa nos apresenta um rol interminável de notícias de assaltos, seqüestros, assassinatos e outras violências contra os cidadãos.

Felizmente a Justiça reconheceu a responsabilidade da União pela morte de Vladimir Herzog, o que gerou para a família o direito de indenização. Gostaria, aqui, de abrir um parêntese para lembrar que, como Ministro da Justiça, criamos a primeira Comissão da Anistia, que analisa até hoje a concessão de benefícios aos perseguidos pelos regimes de exceção. Em 2002, pude relatar o projeto que regulamentou o pagamento dos benefícios, uma compensação mais que justa aos perseguidos pelo regime de exceção.

No ano passado, votamos uma medida provisória que ampliou a anistia, mas ainda, sem dúvida, estamos longe de concluir esse processo e acertar as contas com o passado.

Estão protocolados hoje na Comissão de Anistia mais de 50 mil pedidos de indenização. Destes, 15 mil processos ainda estão pendentes de apreciação.

Se na época da ditadura, a violência, a impunidade e o desrespeito aos direitos humanos eram mais visíveis na ação das forças da repressão, hoje eles se tornaram vícios. E se não atingem mais a quem deseja manifestar livremente suas posições políticas, essas mazelas comprometem nosso objetivo de justiça social e impedem o pleno exercício da cidadania.

O medo de 30 anos atrás era o medo das baionetas e dos agentes disfarçados, que prendiam, torturavam e até matavam, como no caso de Herzog. O medo de hoje é difuso e, talvez por isso mesmo, alimente, nas consciências mais frágeis, a fantasia de que se armar contra um inimigo que está em toda a parte pode ser a solução.

As imagens do suicídio simulado de Herzog são tão chocantes ainda hoje quanto no dia em que foram publicadas. Para que episódios como este não voltem mais a manchar a nossa História, é preciso esclarecer ao máximo o que aconteceu aos cidadãos colhidos na luta pela democracia.

O fantasma da ditadura está afastado. Mas precisamos afastar também o crime organizado, o tráfico de drogas, a lavagem de dinheiro, a miséria e a exclusão social.

Não queria terminar este meu pronunciamento, esta rápida intervenção, sem mencionar os que lutaram de maneira corajosa na busca por justiça no caso Herzog. Jornalistas, juristas, políticos, estudantes, cidadãos anônimos reunidos em atos de protesto... Todos têm, em alguma medida, mérito na manutenção da memória de Vladimir Herzog e na fixação de seu nome como emblema da liberdade democrática. Destaco, porém, a altiva figura de Clarice Herzog, viúva de Vladimir, incansável em seu esforço pela verdade dos fatos, pela liberdade e pela democracia. Destaco, também, o nome do arcebispo emérito de São Paulo, D. Paulo Evaristo Arns, um guardião dos direitos humanos, que abriu a Catedral da Sé para um ato ecumênico que mudaria para sempre a História do Brasil.

Ao protestar contra o bárbaro assassinato de Herzog, os brasileiros ali presentes deram o sinal inequívoco de que não arredariam o pé do ideal de construir um país livre e igualitário.

O livre acesso a informações públicas é um mecanismo precioso para inibir fatos como os que ocorreram com Vladimir Herzog e outras mazelas relacionadas à corrupção. Por isso, já determinei que os técnicos do Senado Federal prestem total e irrestrito apoio aos trabalhos do jornalismo investigativo, para que, em breve, possamos ter um marco legal sobre o amplo acesso às informações públicas, compatível com a democracia que hoje vivemos.

            Lembro, para finalizar, o que disse Dom Paulo Evaristo Arns: “Que a memória de Vladimir faça dessa geração a geração da esperança, que renasce todos os dias, e que as esperanças, em conjunto, formem uma corrente irresistível que nos levará a dias melhores”.

            Muito obrigado a todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/10/2005 - Página 37019