Discurso durante a 196ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o Fundo de Universalização das Telecomunicações - FUST e as exigências burocráticas para a liberação de seus recursos.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (S/PARTIDO - Sem Partido/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • Considerações sobre o Fundo de Universalização das Telecomunicações - FUST e as exigências burocráticas para a liberação de seus recursos.
Publicação
Publicação no DSF de 08/11/2005 - Página 38368
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, OPINIÃO, PROFESSOR, UNIVERSIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, CRITICA, MODELO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, EXCESSO, NORMAS, DESUSO.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, BUROCRACIA, FALTA, APLICAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, FUNDO DE UNIVERSALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES (FUST), AUSENCIA, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, TELECOMUNICAÇÃO.
  • COMPARAÇÃO, SITUAÇÃO, FUNDO DE UNIVERSALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES (FUST), FUNDO NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES, AUSENCIA, INCENTIVO, INFRAESTRUTURA, REDE DE TELECOMUNICAÇÕES, PERIODO, REGIME MILITAR.
  • DEFESA, NECESSIDADE, CRIAÇÃO, OPORTUNIDADE, POPULAÇÃO CARENTE, ACESSO, TELEFONIA, REGISTRO, EMPENHO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DAS COMUNICAÇÕES (MC), REDUÇÃO, TARIFAS, REDE TELEFONICA.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Sem Partido - AC. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, referindo-se às Constituições contemporâneas, que chamou de meramente “nominais”, o professor e cientista italiano Giovanni Sartori, da Universidade de Florença, diz que “seu ponto delicado não diz respeito à circunstância de algumas de suas disposições caírem em desuso, devido a seu anacronismo, senão àquelas normas que nunca são postas em vigor, por falta de vontade ou pela inércia dos poderes legislativo ou executivo”. Ele se refere às Constituições de pós-guerra, que, no seu severo julgamento, “em geral são más Constituições, tecnicamente falando. Encontram-se nelas deslumbrantes profissões de fé por um lado e um excesso de detalhes supérfluos por outro”. E completa o seu pensamento afirmando que “algumas delas são já tão democráticas, que já não são Constituições”.

Utilizei-me dessa dura condenação para aludir ao que se passa entre nós com o sistema telefônico, algo que em breve será anacrônico pela vertiginosa velocidade do desenvolvimento tecnológico nessa área. No Regime Militar, foi criado o Fundo Nacional de Telecomunicações, uma sobretarifa de 30% paga pelos usuários sobre o valor de todos os serviços de telecomunicações e recolhida por mais de vinte anos a partir de 1967. Foram bilhões de cruzeiros, cruzados, cruzados novos e novamente cruzeiros recolhidos às arcas sem fundo do Tesouro Nacional. Embora tais recursos devessem ser aplicados na infra-estrutura de telecomunicações, terminaram consumidos no buraco chamado entre nós de déficit público. Trata-se, como denominou o professor Sartori, de uma “daquelas normas que nunca são postas em vigor, pela falta de vontade ou pela inércia dos poderes legislativo ou executivo”.

A falta de imaginação de um lado e a inoperância de outro levaram o País a reeditar esse mesmo instrumento, mudando apenas o nome. Em vez de Fundo Nacional de Telecomunicações, a Lei nº 9.998, de 17 de agosto de 2000, criou o seu êmulo, o Fundo de Universalização das Telecomunicações, o Fust. Ele é constituído, entre outros recursos, pela contribuição de 1% sobre as receitas brutas das operadoras de telecomunicações e canaliza anualmente, segundo informa artigo do consultor Etevaldo Siqueira, publicado no jornal O Estado de S. Paulo de 30 de outubro, cerca de R$800 milhões anualmente às mesmas arcas do Tesouro por onde sumiu o Fundo Nacional de Telecomunicações. Segundo esse mesmo especialista, cujos comentários me despertaram para o assunto, os recursos acumulados nesses cinco anos somaram R$4 bilhões. O consultor lembra que “o Fust nunca foi aplicado em suas finalidades legais”, para logo em seguida lembrar:

E dificilmente o será, embora ministros e dirigentes de empresas concessionárias anunciem, com muita freqüência, a possibilidade de recorrer aos seus recursos para levar telefones às áreas mais pobres e às famílias mais carentes do País, ou para implementar projetos de alto interesse social, visando à democratização do acesso à Internet, à informatização do ensino ou da saúde.

            Reproduzo ainda as palavras do mesmo autor:

Puro sonho ou ilusão. Até porque, segundo a opinião de especialistas do próprio Ministério da Fazenda, o fundo não é cumulativo e tudo que não foi empenhado ou utilizado dentro dos exercícios anteriores caiu em exercício findo. Logo, não existem os R$4 bilhões recolhidos pelas operadoras de telecomunicações nos últimos cinco anos.

Também é do mesmo consultor a conclusão de que “o Fust parece ter sido criado para que ninguém possa utilizá-lo, tal o emaranhado de exigências burocráticas que impõe para liberar seus recursos”. Pior ainda - acrescenta ele -, “há juristas que o consideram inconstitucional já que ele deveria ser destinado exclusivamente para a universalização da telefonia, como indica a Lei Geral de Telecomunicações, a de nº 9.472, com o objetivo central de levar a telefonia a áreas pobres e a populações de baixa renda. O Congresso, no entanto, conclui o articulista, incorporou à lei que criou o Fust dezenas de emendas, desfigurando o fundo de tal forma, que ele hoje contempla mais de uma dúzia de serviços”. Para ser mais preciso, o artigo lista os treze objetivos definidos pela lei em que devem ser aplicados os recursos que, tal como os do Fundo Nacional de Telecomunicações, parecem não mais existir, para a alegria de todos os ministros da Fazenda.

Sr. Presidente, parece que cabe razão ao Prof. Sartori. Mais do que isso, os exemplos servem para comprovar que os métodos singulares da democracia brasileira são exatamente os utilizados pelas ditaduras sob as quais vivemos e das quais já nos libertamos. Afinal, que diferença existe entre os governos militares, que criaram o fundo para prover a expansão da telecomunicação e o utilizaram para amenizar as agruras do nosso déficit público, e os governos democráticos que estão se valendo do mesmo expediente com o mesmo fim?

O panorama que tínhamos antes da privatização era caracterizado pelo fato de que a oferta de telefones fixos não atendia à demanda porque as tarifas dos telefones fixos eram muito baratas, e isso tornava os ágios inacessíveis à maioria da população. Hoje sobram treze milhões de linhas de telefones fixos, e a maior parte da população continua sem acesso a eles, porque suas altas tarifas não cabem no bolso dos que deles necessitam. Tenho observado que nosso eminente colega, o Ministro Hélio Costa, tem se esforçado e tem anunciado medidas tendentes a instituir a tarifa reduzida para a população de menor poder aquisitivo, que é a maioria do nosso povo. Mas também é verdade, como ele mesmo já admitiu, que se trata de um diálogo difícil o que ele trava com as concessionárias, razão por que parece cada vez mais distante a luz que todos esperam ver no final do túnel. O túnel das telecomunicações no Brasil, contudo, parece ser como o buraco do déficit público - um não tem fim, o outro não tem fundo.

A razão que despertou meu interesse para o assunto não é só a circunstância de representar um Estado cheio de carências, com uma população de baixo poder aquisitivo em razão da baixa renda per capita. É, também, o fracasso das tentativas de se promover a inclusão digital no País, assunto tão desolador quanto o do Fust, mas ao qual voltarei em breve para não ultrapassar o tempo de que dispomos nesta fase de nossas sessões nem abusar da paciência de V. Exªs e da tolerância da Presidência.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/11/2005 - Página 38368