Discurso durante a 198ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação em defesa das crianças e adolescentes, por ocasião da elaboração do Orçamento da União.

Autor
Patrícia Saboya (PSB - Partido Socialista Brasileiro/CE)
Nome completo: Patrícia Lúcia Saboya Ferreira Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO. POLITICA SOCIAL.:
  • Manifestação em defesa das crianças e adolescentes, por ocasião da elaboração do Orçamento da União.
Aparteantes
Heloísa Helena, Lúcia Vânia, Ramez Tebet, Reginaldo Duarte, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 10/11/2005 - Página 38695
Assunto
Outros > ORÇAMENTO. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • PROTESTO, INFERIORIDADE, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, EXERCICIO FINANCEIRO, ESPECIFICAÇÃO, RECURSOS, DESTINAÇÃO, ASSISTENCIA SOCIAL, CRIANÇA, ADOLESCENTE, APRESENTAÇÃO, DADOS, DIVULGAÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF).
  • CRITICA, MODELO ECONOMICO, BRASIL, PRIVILEGIO, SUPERAVIT, JUROS, DIVIDA EXTERNA, PREJUIZO, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, SAUDE, SANEAMENTO.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, INVESTIMENTO, POLITICA SOCIAL, OBJETIVO, ERRADICAÇÃO, MISERIA, BRASIL.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente. Boa-tarde, Srªs e Srs. Senadores, cumprimento aqueles que nos assistem pela TV Senado e os que hoje vieram prestigiar o nosso pronunciamento. Agradeço ao Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Fernando da Silva, pela presença; ao Itamar Gonçalves, representante da Fundação Abrinq e do Fórum DCA, e ao Francisco Sadeck, representante do Inesc, que nos ouvem neste momento.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desde o meu primeiro dia de trabalho no Senado Federal, tenho procurado exercer, ao lado de tantos outros Parlamentares, o papel de porta-voz das necessidades, dos sonhos, desejos e angústias das nossas crianças e adolescentes.

O que falo pode até soar repetitivo aos ouvidos de muitos. Mas não pretendo abrir mão dessa defesa intransigente, enquanto persistirem no cenário nacional as tremendas injustiças e os problemas gravíssimos que afetam, de forma cruel, milhões de meninos e meninas de todo o nosso País.

Hoje ocupo esta tribuna mais uma vez, Sr. Presidente, para falar de uma questão muito importante e - por que não dizer - uma questão central para o cotidiano dos quase sessenta milhões de brasileiros entre zero e dezessete anos de idade.

Nós, que militamos na causa da infância e da adolescência, costumamos dizer que lugar de criança é no nosso coração e no Orçamento Público. Lamentavelmente, no Brasil, as crianças e os adolescentes ainda não conquistaram o lugar que merecem no Orçamento. Em muitos corações certamente, mas, no Orçamento Público da União, dos Estados e dos Municípios, ainda não. E esse triste quadro tem se agravado ao longo dos últimos anos.

Não sou uma adepta fervorosa das estatísticas porque acho que, muitas vezes, o que mais nos falta é olhar com carinho, determinação e vontade política para as pessoas que estão por trás desses indicadores. No entanto, quando vamos discutir o Orçamento, é fundamental analisarmos esses números para que possamos corrigir algumas sérias distorções.

Uma análise profunda e detalhada realizada pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) no Orçamento da União de 2005, a partir de dados do Siafi, permite-nos chegar a conclusões bastante preocupantes. Nos 9 primeiros meses do ano, o Governo Federal só executou 40,8% do Orçamento-Geral autorizado para 2005, Senador Mão Santa, o que significa cerca de R$ 657,7 bilhões.

É importante ressaltar que, dentro desse universo de 40,8% executados até setembro, ínfimos 2,3% foram aplicados em programas e ações que atendem, direta ou indiretamente, todas as crianças e adolescentes do nosso País.

Isso significa, Srªs e Srs. Senadores, que apenas R$ 15,2 bilhões foram destinados, até o final de setembro, aos quase 60 milhões de brasileiros na faixa etária, Senador Romeu Tuma, entre 0 e 17 anos para as ações nas mais diversas áreas, tais como educação, saúde, cultura, lazer, esporte, habitação, saneamento básico, assistência social e proteção de direitos. De acordo com os cálculos do Inesc, o gasto per capita foi de apenas R$ 260,36 nesse período.

Senador José Jorge, que é um grande especialista, cuidadoso na defesa dos direitos da criança e do adolescente, principalmente na educação, eu falava agora há pouco do Orçamento da União para as crianças e os adolescentes, dos cortes que já estamos prevendo, do que foi de Orçamento para 2005 e de como isso é insignificante, diante da enorme demanda que exigem as crianças e adolescentes do nosso País e da vontade que temos de resgatar essa dívida enorme que nós temos para com todos os adolescentes e crianças do nosso País.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Senadora, peço um aparte, na hora em que V. Exª puder me conceder.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Pois não.

Srªs e Srs. Senadores, esse valor de R$ 260,36 me assusta, me entristece. Isso é revoltante! Como podemos investir, durante longos 9 meses, somente R$ 260,36 em cada criança e adolescente deste País? Isso significa, Senador Romeu Tuma, uma média de R$ 28,90 por mês para cada menina e menino do Brasil, menos de R$ 1,00 por dia. Portanto, não podemos nos conformar diante de situação tão absurda. Temos a obrigação de sair desse estado de letargia que parece ter contaminado todo o Brasil.

Esses números não foram inventados. São números que hoje o Correio Braziliense coloca em destaque: menos de R$ 1,00 por dia é o que o Governo brasileiro destina a 60 milhões de crianças, de brasileiros entre 0 e 17 anos de idade.

Com prazer, Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Desculpe-me, Senadora, por interromper este importante discurso, mas é V. Exª a maior defensora dos direitos da criança. Sinto de perto, desde o início do seu mandato, que V. Exª tem uma dedicação quase que exclusiva, além dos interesses do seu Estado, à defesa das crianças, haja vista seu excelente trabalho na CPI do abuso e violência contra o menor. Mas é interessante como, às vezes, Deus põe na nossa cabeça as mesmas coisas que as pessoas de bem colocam e conseguem transmitir. Hoje, pela manhã, tive uma reunião com o Ministro Nelson Jobim sobre o problema de um processo que tem que ser desenvolvido pela CAS. Na ante-sala havia prefeitos, parlamentares e juízes e, na porta, uma manifestação de ex-funcionários demitidos da Febem de São Paulo que estavam em greve de fome, reivindicando o retorno ao trabalho. É difícil o controle sobre um menor infrator. Digo sinceramente, Senador Mão Santa, Senadora Patrícia, é difícil esse controle. V. Exªs sabem qual é o grande problema? Custa mais de R$ 1 mil por mês uma criança na Febem. V. Exª fala em R$ 1,00 por dia para uma criança que pode ser tratada a fim de não ir parar na Febem, quando na Febem ela custa R$ 1 mil por mês. Então eu dizia da dificuldade de se impor qualquer idéia - e acho que a sua voz é mais forte que a minha. A criança tem que ser tratada, principalmente essas de família de origem pobre, desde o berço, Senadora. É desde o berço que ela tem que ser cuidada; tem-se que investir na creche, investir no primeiro grau, no segundo grau, para a criança saber que está sendo observada e que vai ter um futuro. Porque ela cai na rua, é abandonada - primeiro passo -, depois entra na criminalidade, e ninguém segura mais. Essas casas de custódia - eu diria casa de custódia -, onde os menores infratores vão cumprir pena que o Juizado de Menores impõe ou a segregação, em razão da virulência com que eles agem, não têm nada de recuperação, não têm nada de formação para o futuro. Senadora, pelo amor de Deus, continue a gritar! A sua voz é mais forte que a nossa.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Muito obrigada, Senador Romeu Tuma. V. Exª tem sempre sido muito atencioso e tem acompanhado os nossos trabalhos desde a época de nossa CPMI, que investigou essas redes de exploração sexual de crianças e adolescentes. V. Exª tem sido uma voz muito forte também na defesa dos direitos das crianças de nosso País, e eu diria que V. Exª tem toda a razão. Aqui o nosso trabalho tem sido sempre uma voz permanente. Talvez algumas vezes, como eu disse no começo de meu pronunciamento, até muito repetitiva, e alguns até me alertaram: “Senadora Patrícia, está na hora de abraçar outras causas”. Porque esta causa não é tão nobre como outras.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Senadora, dá licença.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Pois não.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Uma vez eu tive uma questão relacionada a um crime de imprensa e vi que, na defesa que o advogado fez, a representação era repetitiva. Eu falei: “Mas o senhor está repetindo cinco vezes”. Ele respondeu: “Às vezes o juiz lê só um trecho. Enquanto eu repito, ele vai ler um deles e vai saber o que eu quero dizer”. Então, se V. Exª, Senadora Patrícia Saboya, repetir duzentas vezes, alguém vai ouvir uma vez e procurar cumprir.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Muito obrigada, Senador Romeu Tuma. Agradeço muito a sua solidariedade.

Mesmo se analisarmos, Srs. Senadores, o Orçamento autorizado para 2005, no que se refere à área da criança e do adolescente, chegaremos à conclusão de que os recursos para os nossos meninos e meninas são irrisórios, aviltantes, inaceitáveis, Senadora Heloísa Helena. Como V. Exª, ontem, tratou da questão do Orçamento para a segurança, hoje trago também aqui a questão do Orçamento das nossas crianças e dos nossos adolescentes. Eu mostrava há pouco às Srªs. Senadoras e aos Srs. Senadores que o jornal Correio Braziliense hoje publica que é apenas R$ 1,00 por dia o que se gasta com as crianças e os jovens do nosso País.

A fatia destinada à infância e à adolescência para este ano é de cerca de R$ 28 bilhões, o que representa apenas 1,75% do total do Orçamento da União - 1,75%! Portanto, aqui não se trata apenas de fazer uma crítica à conhecida lentidão no ritmo de liberação dos recursos orçamentárias, que é a mesma ladainha todos os anos. Isso porque, dos R$ 28 bilhões destinados às crianças e adolescentes, R$ 15,2 bilhões foram aplicados até setembro - o que significa uma execução de apenas 54% no período. O mais grave, a meu ver, é o montante irrisório que está reservado para a infância e a adolescência no contexto do Orçamento Geral da União.

Não é preciso, Srªs e Srs. Senadores, ser especialista em economia para perceber que há algo de muito errado nisso. Sabemos que, ao longo dos últimos anos, conseguimos uma conquista importantíssima, que foi o controle da inflação. No entanto, o modelo econômico adotado pelo País nos colocou em uma encruzilhada: a encruzilhada dos juros altos, da dívida pública, do tal do superávit primário.

Na semana passada, vimos em todos os jornais a notícia de que o Brasil também nos nove primeiros meses do ano, ultrapassou a meta do superávit primário estabelecida para 2005, chegando a uma economia de 6,1% do PIB, ou seja, R$86,5 bilhões, quando a meta era apenas de 4,25%.

Essa diferença, Senador Reginaldo Duarte, entre a meta do FMI e a poupança que fizemos a mais deveria, sim, ter sido empregada em investimentos. Para que ser mais realista do que o próprio rei? Por que deixar de investir em educação, saúde, saneamento, se dispomos dos recursos? Como podemos poupar mais do que o necessário, se isso se dá em detrimento do investimento, do aporte de recursos para estruturar o País, o que dará condições para que ele volte a crescer de verdade?

Para termos uma idéia, Sr. Presidente, essa poupança feita pelo País até setembro é simplesmente 10 vezes, pasmem, o Orçamento previsto para o Bolsa Família em 2006, fixado em R$8,5 bilhões para o atendimento de 11 milhões de famílias.

Não quero aqui, Senadora Heloísa Helena, de forma alguma, parecer irresponsável. Sei que o Brasil precisa honrar seus compromissos, porque, se não o fizer, quem perde é a maioria do nosso povo. Mas temos de lutar, a partir de agora, pelo estabelecimento de novos paradigmas nas negociações externas. Precisamos voltar a investir pesado e urgentemente na área social! Não me canso de dizer: chega de fazer políticas pobres para os pobres deste País...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - ...porque isso nunca lhes vai dar a oportunidade de enfrentar uma vida no futuro com condições e com dignidade, para que possam ter uma vida melhor que a de seus pais. Pois, cada dia que se passa sem que priorizemos as nossas crianças e os nossos adolescentes significa mais um inexorável passo na corrida de milhões de brasileiros rumo à pobreza, rumo à exclusão social.

Temos, Srªs e Srs. Senadores, a obrigação de inverter essa rota.

Concedo um aparte à Senadora Heloísa Helena.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos. PSDB - TO) - Senadora Patrícia Saboya Gomes, mesmo depois de o Presidente que me antecedeu ter prorrogado o tempo de V. Exª, esta Presidência, em atenção a V. Exª e aos Srs. Senadores que pedem apartes, vai lhe conceder mais dois minutos, pedindo aos companheiros que sejam breves, porque o Senador Gerson Camata já aguarda, como próximo orador inscrito.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Tenho certeza de que o Senador Gerson Camata vai adorar aguardar, porque Rita Camata, sua esposa, foi a maior defensora dos direitos da criança e do adolescente. Creio que S. Exª vai gostar de ouvir-nos.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Certamente.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Obrigada, Senador Camata.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Também o Senador Eduardo Siqueira Campos já falou várias vezes sobre a criança. Com certeza, vou falar também pelos Senadores Ramez Tebet, Mão Santa e Papaléo Paes. Já tive a oportunidade de dizer, várias vezes, Senadora Patrícia Saboya Gomes, o quanto foi e é essencial a presença de V. Exª nesta Casa ao trazer esse debate. Evidentemente, todos podem dizer que esse tema já era conhecido, que já tinham instalado CPIs em vários Estados e que já havia alternativas concretas e eficazes para isso. Porém, se não estiver ou no Parlamento ou no Executivo uma pessoa como V. Exª, definitivamente comprometida com a causa da criança e do adolescente, nada se resolve. Comprometer-se com a causa da criança e do adolescente é também estar comprometido com o futuro e com o presente do País e minimizar as dores do passado, das injustiças que muitas dessas crianças e adolescentes trazem na sua alma e no seu pequeno coração. Portanto, quero saudar V. Exª, que tem uma gigantesca preocupação com esse tema. Ontem, quando eu tratava de um assunto relativo à criança especialmente, na área de segurança pública, tudo aquilo pelo que V. Exª tantas vezes já lutou na Casa, tanto em relação aos programas contra a exploração sexual como aos programas de atendimento socioeducativo do adolescente em conflito com a lei, eu verifiquei que o que foi disponibilizado para o Nordeste é praticamente zero.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Vergonha.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - É uma das piores rotas e inclusive foi muito bem identificada por V. Exª durante a CPI. Em relação à prevenção da violência, do crime organizado para o Brasil todo, estavam previstos 54 milhões para o combate ao tráfico de drogas e à exploração de crianças e adolescentes, que são tragados pela marginalidade e pelo narcotráfico como último refúgio. Desses 54 milhões que estavam previstos, uma quantia insignificante, se comparada com o que V. Exª disse que se guarda para os serviços da dívida, para o superávit, zero foi liberado, nenhum real. Então, isso é realmente muito triste; é uma indignidade, mas é especialmente muito triste. Portanto, quero abraçar, saudar, parabenizar o pronunciamento de V. Exª.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Obrigada, Senadora Heloísa Helena. Nós já estivemos aqui, em diversas ocasiões, juntas na luta em defesa dos direitos da criança e do adolescente, quando da aprovação da proposta de V. Exª. Apesar de bastante polêmica, conseguimos convencer a Casa da necessidade, da importância de cuidarmos das crianças principalmente na primeira idade, que é aquela em que elas são mais vulneráveis, mais frágeis, e precisam, sim, de nós mães, de nós adultos, de nós pais, do Governo, da sociedade, da própria família, para que possam ter uma infância pelo menos feliz. Agradeço o aparte de V. Exª e passo a palavra à Senadora Lúcia Vânia, que tem sido também ardorosa na luta da causa das crianças.

A Srª Lúcia Vânia (PSDB - GO) - Srª Senadora Patrícia Saboya, quero parabenizá-la por levar a essa tribuna um tema de extrema importância como é este do Orçamento voltado para a criança. E quero também, neste momento, Senadora Patrícia, alertá-la para um fato que acontece no Orçamento em relação à erradicação do trabalho infantil. Esse é um programa de sucesso, por meio do qual o Brasil se comprometeu junto à Organização do Trabalho de combater, de forma efetiva, o trabalho infantil. Levamos o nosso modelo para Oslo, para a Bélgica, e essa formatação de projeto foi homenageada em todos os fóruns em que tivemos oportunidade de trabalhar. Este ano, o Orçamento faz uma coisa que considero extremamente séria e grave: tira novecentos mil reais do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e coloca no Bolsa Família. Tenho buscado alertar o Governo no sentido de prestar atenção na questão do Bolsa Família e do Peti. O Peti tem objetivos diferentes, e um deles é tirar a criança do trabalho penoso e insalubre, garantindo o acesso, a permanência e o sucesso da criança na escola. A centralidade do projeto não está na bolsa que recebe, e sim na Jornada Ampliada. A bolsa é um estímulo para que freqüente a Jornada Ampliada, que é o reforço escolar e as atividades que visam ao desenvolvimento das suas habilidades. À medida que essa bolsa vai para o Bolsa Família, deixa de ser um direito individual da criança na faixa etária de 7 a 14 anos, e se mistura a um programa muito mais amplo. Isso vai ser um desestímulo para que a criança volte a estudar e deixe o trabalho. Portanto, quero parabenizar e me solidarizar com V. Exª. Juntas eu tenho certeza de que na Comissão de Orçamento vamos romper com esse novo modelo que estão querendo implantar no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Muito obrigada, Senadora Lúcia Vânia. V. Exª tem tido uma grande atuação como Presidente da Comissão de Assuntos Sociais, principalmente com o trabalho que implementou o Programa Peti, motivo de orgulho e satisfação para todos nós brasileiros.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - Senadora, me desculpe, mas já foi feita mais uma prorrogação de três minutos. Peço encarecidamente que, atendidos os apartes, V. Exª encerre o seu pronunciamento, porque as reclamações já começaram.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Agradeço e passo a palavra ao Senador Reginaldo Duarte, ao Senador Ramez Tebet e, em seguida, concluo o pronunciamento.

O Sr. Reginaldo Duarte (PSDB - CE) - Senadora Patrícia Gomes, discordo de V. Exª quando diz em seu pronunciamento que está sendo bastante repetitiva em tocar na tecla objeto do seu discurso, mas V. Exª fique certa de que o seu pronunciamento é de grande importância para todas as crianças, para todos os adolescentes de nosso País. Nunca é repetitivo V. Exª falar sobre o assunto. Nós tivemos a oportunidade de ver a sua performance na CPI em que presidiu com muita propriedade, com muita serenidade e com muita justiça. Quero parabenizá-la pelo belo pronunciamento que está fazendo em prol das crianças de nosso País.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (PSB - CE) - Obrigada, Senador Reginaldo Duarte, meu conterrâneo, cearense, que sempre nos apoiou nesse trabalho pela infância e juventude.

Com prazer, ouço o Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senadora Patrícia Saboya, um dos meus filhos está presente nesta Casa, meu filho Rodrigo, visitando o Senado. Quando V. Exª esteve em Mato Grosso do Sul, eu pensei em recepcioná-la. Ele me questionou... Mas, em verdade, eu não pude recebê-la porque V. Exª não parou de trabalhar! V. Exª chegou ao meu Estado e foi varando madrugada nesse trabalho incansável e meritório que faz em favor das crianças, principalmente das crianças desassistidas. Ao vê-la, nesta tribuna, reclamando por recursos para as crianças, eu vejo que V. Exª está no caminho certo e, por isso, V. Exª recebe a solidariedade de toda a Casa. Não é possível cortar verbas das nossas crianças! Tenham paciência! Isso já é demais! Fala-se de tantos programas sociais, dê-se o nome que se der, mas não se pode tirar das crianças para aplicar em nenhum outro programa, Senadora Patrícia. Por isso, saúdo a sua presença nessa tribuna.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (PSB - CE) - Obrigada, Senador Ramez Tebet. Não pude estar na sua residência, mas V. Exª nos acompanhou e nos deu a chance, nos deu...

O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB - MA) - Senadora Patrícia, peço a V. Exª que conclua.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (PSB - CE) - Vou concluir...

Eu só queria agradecer, também, ao Senador Ramez Tebet e aos Senadores e Senadoras da Casa. É uma matéria que poderia ser muito debatida. Peço, então, à Mesa que, por favor, publique o resto do meu pronunciamento.

Agradeço, dizendo a frase que costumamos repetir: criança deve estar, Senador Arthur Virgílio, no coração e no Orçamento. Repito a frase que V. Exª citou aqui que eu tinha dito: não adianta políticos beijarem criancinhas às vésperas de campanha, a população não agüenta mais ver isso porque, na hora do Orçamento, não há um tostão para elas.

Muito obrigada.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DA SRª SENADORA PATRÍCIA SABOYA GOMES.

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            A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desde o meu primeiro dia de trabalho aqui no Senado Federal, tenho procurado exercer, ao lado de tantos outros parlamentares, o papel de porta-voz das necessidades, sonhos, desejos e angústias das nossas crianças e adolescentes.

O que falo pode até soar repetitivo aos ouvidos de muitos. Mas não pretendo abrir mão dessa defesa intransigente, repetitiva, sim, dos direitos infanto-juvenis enquanto persistirem no cenário nacional as tremendas injustiças e os problemas gravíssimos que afetam, de forma cruel, milhões de meninos e meninas do nosso País.

Hoje, ocupo mais uma vez esta tribuna para falar de uma questão importante e - por que não dizer, central!!! - para o cotidiano dos quase 60 milhões de brasileiros entre zero e 17 anos. Nós, militantes da causa da infância e da adolescência, costumamos dizer que lugar de criança é no nosso coração e no Orçamento Público. Lamentavelmente, no Brasil, as crianças e os adolescentes ainda não conquistaram o lugar que merecem no Orçamento. E esse triste quadro tem se agravado ao longo dos últimos anos.

Não sou uma adepta fervorosa das estatísticas porque acho que, muitas vezes, o que mais nos falta é olhar, com carinho, determinação e vontade política, para as pessoas que estão por trás dos indicadores. No entanto, quando vamos discutir o Orçamento, é fundamental analisarmos esses números para que possamos corrigir algumas sérias distorções.

Uma análise profunda e detalhada realizada pelo Inesc (Instituto de Estudos Sócio-Econômicos) no Orçamento da União de 2005, a partir de dados do Siafi, permite-nos chegar a conclusões preocupantes. Nos nove primeiros meses do ano, o governo federal só executou 40,8% do Orçamento Geral autorizado para 2005 - o que significa cerca de 657,7 bilhões de reais. É importante ressaltar que, dentro desse universo de 40,8% executados até setembro, ínfimos 2,3% foram aplicados em programas e ações que atendem, direta ou indiretamente, todas as crianças e adolescentes do nosso País.

Isso significa, Srªs e Srs. Senadores, que apenas 15,2 bilhões de reais foram destinados, até o final de setembro, aos quase 60 milhões de brasileiros na faixa etária entre zero e 17 anos para ações nas mais diversas áreas, tais como educação, saúde, cultura, lazer, esporte, habitação, saneamento básico, assistência social e proteção de direitos. De acordo com cálculos do Inesc, o gasto per capita foi de apenas 260,36 reais nesse período.

            Srªs e Srs. Senadores, esse valor me assusta, me entristece, me revolta!. Como podemos investir, durante longos nove meses, somente 260,36 reais em cada criança e adolescente deste País? Isso significa uma média de 28,9 reais por mês para cada menino e menina do Brasil, menos de um real por dia!. Não podemos nos conformar diante de situação tão absurda. Temos a obrigação de sair desse estado de letargia que parece ter contaminado todo o Brasil.

            Mesmo se analisarmos o Orçamento autorizado para 2005 no que se refere à área da criança e do adolescente, chegaremos à conclusão de que os recursos para nossos meninos e meninas são irrisórios, aviltantes, inaceitáveis. A fatia destinada à infância e à adolescência para este ano é de cerca de 28 bilhões de reais, o que representa apenas 1,75% do total do Orçamento da União.

Portanto, aqui não se trata apenas de fazer uma crítica à conhecida lentidão no ritmo de liberação dos recursos orçamentários. Isso porque, dos 28 bilhões destinados às crianças e adolescentes, 15,2 bilhões foram aplicados até setembro - o que significa uma execução de 54% no período. O mais grave, a meu ver, é o montante irrisório que está reservado para a infância e a adolescência no contexto do Orçamento Geral da União.

Não é preciso ser especialista em economia para perceber que há algo de muito errado nisso. Sabemos que, ao longo dos últimos anos, conseguimos uma conquista importantíssima, que foi o controle da inflação. No entanto, o modelo econômico adotado pelo País nos colocou em uma encruzilhada. A encruzilhada dos juros altos, da dívida pública, do superávit primário.

Na semana passada, vimos, em todos os jornais, a notícia de que o Brasil, também nos nove primeiros meses do ano, ultrapassou a meta de superávit primário estabelecida para 2005, chegando a uma economia de 6,1% do PIB, ou R$86,5 bilhões, quando a meta era de 4,25%.

Essa diferença entre a meta do FMI e a poupança que fizemos a mais deveria ter sido empregada em investimento. Pra quê ser mais realista do que o rei? Por que deixar de investir em educação, saúde, saneamento, se dispomos dos recursos? Como podemos poupar mais do que o necessário se isso se dá em detrimento do investimento, do aporte de recursos para estruturar o País, o que dará condições para que ele volte a crescer de verdade?

Para termos uma idéia, essa poupança feita pelo País até setembro é simplesmente 10 vezes o Orçamento previsto para o Bolsa-Família em 2006, fixado em R$8,5 bilhões para o atendimento de 11 milhões de famílias.

Não quero parecer irresponsável. Sei que o Brasil precisa honrar seus compromissos porque se não o fizer quem mais perde é o povo. Mas temos que lutar, a partir de agora, pelo estabelecimento de novos paradigmas nas negociações externas. Precisamos voltar a investir pesada e urgentemente na área social! Pois, cada dia que passa sem que nós priorizemos as nossas crianças e os nossos adolescentes, significa mais um inexorável passo na corrida de milhões de brasileiros rumo à pobreza e à exclusão social. Temos, Srªs e Srs. Senadores, a obrigação de inverter essa rota.

Reconheço, sim, o esforço que o governo do presidente Lula tem feito na área social, sobretudo ao priorizar um programa fundamental para o combate à pobreza, que é o Bolsa-Família. Ao contrário do que muita gente pensa, o Bolsa-Família não é uma estratégia assistencialista. Ele está movimentando a economia das pequenas cidades brasileiras e vem conseguindo fazer com que as crianças efetivamente freqüentem as escolas e sejam acompanhadas nos postos de saúde. É evidente, porém, que temos de tomar todo o cuidado para não transformar esse importante instrumento em uma ação assistencialista. Por isso, é essencial oferecermos a essas famílias as ferramentas necessárias para que elas se libertem, paulatinamente, da ajuda oficial. Vale ressaltar aqui que o Orçamento do Bolsa-Família aumentará em 27,4% de 2005 para 2006.

Outro programa que também será ampliado é o Sentinela, que presta assistência psicossocial às crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. A previsão de aumento dos recursos de 2005 para 2006 é de 36%. Isso porque, o Sentinela, que hoje funciona em 314 municípios, a partir do próximo ano, estará presente em 1.104 cidades. Trata-se de um significativo avanço. Sem dúvida, uma vitória de todos os parlamentares que trabalharam duro na CPMI da Exploração Sexual durante mais de um ano e, sobretudo, dos movimentos sociais que lutam, heroicamente, contra esses crimes tão bárbaros em todo o País.

            Apesar dessas conquistas, detectamos, em um trabalho conjunto com o Conanda (Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente), o Inesc, o Fórum DCA e tantas outras organizações da área da infância, que muitos programas sociais estão ameaçados por conta dos cortes previstos para o próximo ano.

E é por esse motivo que nós, integrantes da Frente Parlamentar pela Criança e pelo Adolescente no Senado e na Câmara, vamos apresentar uma série de emendas ao Orçamento de 2006, que totalizam cerca de 1,6 bilhão de reais. São aportes em setores fundamentais, tais como o apoio ao desenvolvimento da Educação Infantil, ao combate ao trabalho infantil, as ações de recuperação dos adolescentes infratores, as estratégias de proteção às vítimas de exploração sexual e os programas na área de esportes.

Srªs e Srs. Senadores, para terminar, eu gostaria de propor um desafio. Está na hora de sermos coerentes com o sentimento de proteção, amor e carinho que, tenho certeza, todos temos em relação às crianças e aos adolescentes. Precisamos transformar esse sentimento, essa emoção, em ações concretas. Precisamos priorizar cada menino e cada menina do Brasil na hora de elaborar e implementar o Orçamento Público. Porque será somente assim que vamos conseguir transformar este País cheio de possibilidades e potencialidades em uma Nação verdadeiramente justa, verdadeiramente tranqüila, verdadeiramente rica!

            Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/11/2005 - Página 38695