Discurso durante a 202ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a importância do Projeto de Lei do Senado 384, de 2005, que dispõe sobre o acesso dos portadores de deficiências visuais ao conteúdo de livros propostos pelos programas governamentais.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Considerações sobre a importância do Projeto de Lei do Senado 384, de 2005, que dispõe sobre o acesso dos portadores de deficiências visuais ao conteúdo de livros propostos pelos programas governamentais.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/2005 - Página 39914
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, ACESSO, CEGO, ARQUIVO, INTERNET, GARANTIA, PROGRAMA NACIONAL, GOVERNO FEDERAL, EDUCAÇÃO, CULTURA, LAZER, TRABALHO, PESSOA COM DEFICIENCIA.
  • IMPORTANCIA, UTILIZAÇÃO, INFORMATICA, ATENDIMENTO, PESSOA DEFICIENTE, REGISTRO, PROVIDENCIA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), DISTRIBUIÇÃO, LIVRO DIDATICO, CODIGO BRAILLE, ESCOLA PUBLICA, CONVENIO, FUNDAÇÃO.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srª s Srs. Senadores, subo a esta tribuna para submeter à apreciação desta Casa uma iniciativa que julgo de extrema importância para um segmento muito especial de nossa sociedade.

Trata-se do Projeto de Lei do Senado nº 384, de 2005, que dispõe sobre o acesso dos portadores de necessidades visuais ao conteúdo de livros adquiridos pelos programas governamentais.

Por meio da proposta, o Poder Público manterá, na Internet, portal com arquivos digitais dos livros adquiridos pelos Programas Nacionais do Livro Didático para o Ensino Médio, Biblioteca da Escola, Plano Nacional do Livro e Leitura, além de outros de propósitos idênticos.

Além das publicações citadas, farão parte do acervo do portal obras autorizadas pelos detentores dos direitos autorais e de domínio público. Os arquivos digitais deverão ser conversíveis em áudio ou para reprodução pelo sistema braile e devem ser colocados à disposição de bibliotecas públicas, de entidades de educação de deficientes visuais e de usuários com deficiência visual.

Esta proposição tem como objetivo permitir a acessibilidade dos portadores de deficiência visual ao conteúdo de livros didáticos, técnicos, científicos e literários comumente editados para o público em geral. Essa possibilidade se oferece graças às tecnologias de informação hoje disponíveis no mercado.

Até recentemente, o portador de deficiência visual só dispunha de dois recursos para ter acesso a livros: os volumes editados em braile e aqueles que tivessem ganho versão em áudio. O meio tradicional, obviamente, era o da leitura por outra pessoa.

Esse acesso, então, se revelava muito reduzido, uma vez que os livros disponíveis em braile se concentram em títulos didáticos de referência, não se estendendo a obras técnicas e literárias acessíveis aos leitores não-portadores de deficiência visual. Essa escassez acabava por negar um dos direitos básicos - que é o da acessibilidade.

Na verdade, Sr. Presidente, a Lei nº 10.098, de 2000, preconiza a eliminação de barreiras para o acesso à informação. São consideradas como sendo barreiras nas comunicações quaisquer obstáculos que dificultem ou impossibilitem a expressão ou o recebimento de mensagens por intermédio dos meios ou sistemas de comunicação. O objetivo claro é o de garantir a essas pessoas o direito de acesso ao trabalho, à educação, à cultura e ao lazer.

Nunca é demais relembrar que a dificuldade de acesso à formação educacional e à cultura acaba, por sua vez, por criar barreiras aos portadores de necessidades visuais: impossibilitados de atualizarem conhecimentos, vêem-se cada vez mais distantes das oportunidades de mercado de trabalho ou de ascensão nas carreiras de que porventura façam parte.

Hoje, no Brasil, existem cerca de 2,5 milhões de cegos, a grande maioria ainda excluída do acesso aos avanços que a tecnologia da informação pode lhes prover para se qualificarem profissionalmente ou simplesmente desfrutarem dos bens culturais disponíveis.

Entretanto, já existem programas que permitem ao portador de deficiência visual utilizar recursos de um computador sem a ajuda de terceiros: esse programa dispõe de um sintetizador de voz que lê textos e sítios da Internet, planilhas, correio eletrônico e todo conteúdo disponível na tela do computador pessoal.

Srªs. e Srs. Senadores, o que temos no Brasil é o direito subjetivo dos portadores de deficiência receberem as informações necessárias para sua educação, cultura e lazer. Mas, para isso, é necessário que o Poder Público disponibilize esses serviços.

Segundo informa o Ministério da Educação (MEC), está sendo universalizada a distribuição de livros didáticos para alunos deficientes visuais. Em 2005, pela primeira vez, todos os alunos com deficiência visual do ensino fundamental, matriculados na rede pública ou em escolas especializadas, sem fins lucrativos, estariam recebendo livros didáticos em braile.

Tal providência teria se tornado possível graças a um convênio entre o MEC e a Fundação Dorina Nowill para Cegos, com um investimento de R$2,6 milhões para a produção de 70 mil exemplares em braile, com títulos de Matemática, Português, História, Geografia e Ciências - beneficiando cerca de 5 mil alunos até o final do ano.

Na sociedade organizada, existem muitas iniciativas destinadas a prover os deficientes visuais de materiais para leitura. Uma dessas instituições é justamente a Fundação Dorina Nowill, fundada em 1946, que imprime e distribui livros em braile para mais de 700 instituições.

No que se refere à deficiência visual, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que nos países em desenvolvimento, como no Brasil, 1,5% da população apresenta essa necessidade.

Sucede que falta praticamente tudo para que tenhamos uma sociedade inclusiva. A construção de uma sociedade de plena participação tem como um de seus princípios a interação efetiva de todos os cidadãos. São fundamentais políticas de inclusão para desencadear uma revolução conceitual que, de fato, promova a igualdade.

Na perspectiva da inclusão, a informática é uma grande aliada dos “diferentes”: atravessa barreiras e quebra obstáculos, amenizando a discriminação social.

A visão é o mais sofisticado sentido do ser humano. É ela que nos permite o reconhecimento do mundo externo e fornece o relato minucioso que registra simultaneamente posição, forma, cor, tamanho e distância. O déficit visual, portanto, não pode ser encarado isoladamente. A cegueira está intimamente relacionada com a organização psicomotora do indivíduo como um todo, além de causar-lhe uma série de transtornos sociais.

Através do presente projeto de lei, pretende-se propiciar aos portadores de deficiência o desenvolvimento de seu potencial, criando oportunidades para que participem do mercado de trabalho, podendo, portanto, evoluir.

Um país que se proponha a executar uma política de inclusão precisa se empenhar para que todos tenham oportunidades iguais no sentido de exercerem a mais plena cidadania. O Senado Federal pode e deve fazer a sua parte! A aprovação da presente proposição insere-se nesta perspectiva que pode parecer simples para nós, mas que terá um alcance imenso para todos os portadores de necessidades especiais.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigada.

 

O SR. PRESIDENTE (Flexa Ribeiro. PSDB - PA) - Agradeço à nobre...

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Gostaria de acrescentar algumas palavras ao seu pronunciamento, Senadora.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Posso conceder um aparte, Sr. Presidente?

O SR. PRESIDENTE (Flexa Ribeiro. PSDB - PA) - Pois não, Senadora, com o maior prazer.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Não poderia deixar de fazer um aparte a V. Exª. E assim é em razão do tema que V. Exª aborda com tanta sensibilidade, como, aliás, já fez tantas outras vezes em relação a outros temas. Ao parabenizar V. Exª por trazer o assunto à Casa, gostaria de, mais uma vez, fazer um apelo à Mesa, e tenho certeza de que V. Exª, o Senador Flexa e outros Senadores da Casa poderão me ajudar em relação ao que vou pedir, que é algo que tento há bastante tempo. Sei que tanto a Direção da Mesa passada como a da atual têm se esforçado no sentido de possibilitar o aumento da publicação em braile. Eu tenho, sabem todos, uma filha de leite que é cega, tive a honra de amamentá-la quando amamentava o meu filho mais novo. Fabrícia vê muito mais do que todos nós juntos. A lindinha passou, inclusive, no vestibular para Jornalismo. Eu produzo o meu material em braile. Para V. Exª ter uma idéia, Senador Flexa Ribeiro, para eu produzir cem livros em braile, tenho de abrir mão de produzir trinta mil exemplares regulares aqui. Eu já apelei inúmeras vezes para a Mesa - espero que V. Exªs consigam o que eu não consegui - para que o Parlamentar tenha uma cota de publicação em braile, cota essa que não poderá ser transformada em publicação comum. Pode ser que alguém queira usar o montante financeiro da cota em braile para material comum. Que ele não possa transferir, mas que ele tenha a possibilidade de publicar em braile. Não é justa a situação como está. Senadora Iris, para que V. Exª tenha uma idéia: impresso nos moldes tradicionais, um pequeno livro, Senador Sibá - basta pensar na Bíblia, que são dezenas de fascículos -, em braile, tem muito aumentado o seu tamanho. Para mandarmos pelo Correio já é mais difícil, porque não se podem achatar as protuberâncias do braile. Então, é muito mais difícil para a gente fazer. Imagine que eu tenho de abrir mão de trinta mil livros comuns para fazer cem exemplares em braile. Então, realmente, não é justo. Seria ótimo se nós, Senadores e Deputados, pudéssemos ter uma cota de material em braile; quem puder usá-la, use. Outra luta que travo diz respeito às nossas transmissões. Não são todos os televisores que fazem a transmissão automática, com legendas. A linguagem do surdo-mudo é diferente da nossa, a pontuação é diferente. Tenho um projeto, e o Senador Aelton, como relator, se esforçou muito para aprová-lo, mas não conseguimos fazê-lo andar na Comissão. A idéia proposta no projeto é a seguinte: V. Exª está falando e eu também; teríamos um pequeno quadro no canto da tela, como em um dos programas da TV Senado, onde apareceria uma pessoa fazendo a transmissão em Libras. Eu realmente não poderia deixar de aproveitar o como sempre maravilhoso pronunciamento de V. Exª. Aliás, hoje estivemos numa tarefa culinária, a Senadora Iris de Araújo, o Senador Ney Suassuna e eu, o que foi um risco para o Senador Ney Suassuna - eu, com uma faca na mão, cortando tomate. Fizemos uma programação maravilhosa e agradeço muito a V. Exª pela delicadeza de ter me levado também. Não poderia deixar de saudar o pronunciamento de V. Exª e fazer esses dois apelos. Às vezes, a gente vê de longe as coisas e não consegue perceber o quanto são essenciais. A meninada que é cega quer acompanhar os acontecimentos, mas muitas vezes não consegue; não são todos que têm computador. Uma máquina para produzir textos em braile é algo dificílimo. Os funcionários da gráfica do Senado fazem com o maior carinho, com a maior dedicação, mas é uma trabalheira danada publicar em braile. Deveríamos incentivar os Parlamentares a publicar em braile - o Senador Tião Viana já publicou, eu já publiquei, mas são poucos os que publicam. Realmente, é extremamente difícil fazê-lo. A propósito, lembro que me emocionei muito quando o então Presidente José Sarney fez a primeira Ordem do Dia em braile e a mandou de lembrancinha para mim porque eu vivia brigando em relação a isso. Continuo brigando e espero que V. Exªs possam nos auxiliar para que os Parlamentares tenham a oportunidade disponibilizar o seu material em braile. Imagine os pronunciamentos de V. Exª e outras publicações em braile! Desculpe-me por me ter alongado. Saúdo V. Exª mais uma vez por seu pronunciamento e agradeço a oportunidade.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Eu é que agradeço, Senadora Heloísa Helena, até porque sei de sua luta nesse sentido. Quero dizer também que V. Exª, que foi uma excelente parceira num programa de cozinha - com faca e tudo! -, pode me colocar como sua parceira nessa luta e nesse trabalho.

Termino o meu pronunciamento agradecendo a oportunidade e a paciência de V. Exª em nos conceder esse tempo extra. Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/2005 - Página 39914