Discurso durante a 202ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Réplica ao pronunciamento do Senador Arthur Virgílio.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EXPLICAÇÃO PESSOAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Réplica ao pronunciamento do Senador Arthur Virgílio.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Tasso Jereissati.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/2005 - Página 39962
Assunto
Outros > EXPLICAÇÃO PESSOAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • CONTINUAÇÃO, DEBATE, ECONOMIA NACIONAL.
  • ANALISE, HISTORIA, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL, AVALIAÇÃO, PLANO, REAL, ERRO, POLITICA CAMBIAL.
  • DEFESA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, AMBITO, POLITICA CAMBIAL, COMERCIO EXTERIOR, AMPLIAÇÃO, MERCADO EXTERNO, SUPERAVIT, REDUÇÃO, DIVIDA PUBLICA.
  • REITERAÇÃO, CRITICA, DECLARAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESCONHECIMENTO, RESULTADO, ECONOMIA NACIONAL.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Para uma explicação pessoal. Sem revisão do orador.) - Primeiramente, quero dizer que fazia tempo que não tínhamos um debate mais aprofundado. Como eu vinha fazer uma crítica ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, se não viesse com o semblante um pouco severo, eu teria medo de que o Senador Arthur Virgílio tivesse um novo ataque de Mike Tyson. Outro dia o Mike Tyson teve um ataque de Arthur Virgílio, e a gente nunca sabe como termina a sessão. Mas como hoje estamos numa fase de descontração e o Senador Tasso também está totalmente descontraído, proponho que o PSDB marque uma posse para o Presidente pelo menos uma vez por semana para S. Exª chegar aqui dessa forma destensionada como a que estamos discutindo.

Quero mencionar alguns pontos. Primeiro, é evidente que o País viveu, ao longo da história recente, muito anterior, inclusive, ao Governo Fernando Henrique Cardoso, uma armadilha do crescimento. Se olharmos para a história econômica, o País foi o que mais cresceu durante um século, de 1880 a 1980. Se tivermos em conta que se manteve uma taxa de crescimento do PIB de 7% ao ano em todo o século XX, no período do pós-guerra até 1980, as últimas duas décadas tiveram taxas de crescimento absolutamente modestas para o potencial do Brasil. Então, é verdade que tínhamos problemas de crescimento.

Agora, o que não posso aceitar é mencionar a taxa de câmbio como parte dessa armadilha. O grande equívoco foi a âncora cambial no governo anterior, a gestão de Gustavo Franco à frente do Banco Central. Isso agravou a vulnerabilidade externa do Brasil, destruiu o saldo comercial do País, comprometeu as reservas cambiais, impôs um déficit de transações correntes. Não precisa ir longe: se olharmos, este aqui é o período do Governo anterior, com déficit; e isto aqui são os últimos três anos. Tivemos um superávit de US$98,5 bilhões, em três anos, e um superávit, em oito anos, de 500 milhões. Por que isso? Foi a âncora cambial. Esse equívoco da taxa de câmbio na armadilha do crescimento foi, basicamente, no primeiro governo. Depois do câmbio flutuante, há uma melhora, começa a diminuir o déficit, equilibra e, no último ano, já há um pequeno superávit, que é igual ao do ano anterior ao da posse.

Mas o êxito da política de comércio exterior... Senador Arthur Virgílio, passar de US$60 para US$100 bilhões em exportação é produto também de uma política externa que diversificou o nosso comércio.

Aqueles que criticavam a integração regional têm que reconhecer hoje o que representa a Venezuela para a nossa pauta de exportações. Têm que reconhecer a relação com outros países da América do Sul, o que representou a abertura em relação ao mundo árabe, o que representou o olhar para a Índia, para a China, para a Rússia, para esses países que têm uma problemática semelhante e que estão no G-22, a articulação com os países em desenvolvimento. Temos que reconhecer que o Presidente Lula teve um papel fundamental na disputa com os países ricos pelas regras de comércio exterior na OMC. Esse é um resultado exitoso. Diversificamos o comércio.

Se ainda olhamos o balanço de pagamento, isto aqui é o déficit de transações correntes. Chegamos a um déficit de US$33 bilhões; em dois anos, US$70 bilhões de déficit. Isso é um passivo externo que fomos construindo. Está aqui: três anos de superávit. Isso significa que fomos desendividando o Brasil, diminuindo a nossa vulnerabilidade externa e permitindo, com isso, que o País possa crescer sem ser vulnerável às turbulências. Não é preciso ir longe. Basta olhar as exportações. A média de crescimento das exportações, de 2003 e 2004, é de 26,5%; este ano, de 22%. No Governo anterior, de 4,1% e 4,2%. Quem não olhou para o mercado externo, quem não impulsionou as exportações foi a política de câmbio externo e a falta de uma estratégia de intervenção e de inserção soberana na economia internacional, que o Brasil ajudou a construir.

E o resultado é inquestionável. Olhem as reservas cambiais, olhem a relação dívida externa/PIB, que é um indicador de vulnerabilidade externa extremamente importante. Está aqui: a dívida externa era de 40% do PIB em 2002; hoje, é de 17%. Significa que o peso da dívida em relação à economia vem diminuindo vertiginosamente, diminuindo a possibilidade de ataque especulativo contra o Brasil ou de estarmos vulneráveis às turbulências internacionais.

Mas, Sr. Presidente, o que gera, eu diria, dificuldade no debate? Ele diz assim: “Devemos alertar a sociedade para a crise fiscal que está sendo semeada pelo atual Governo”. Por favor! Quando o Presidente Fernando Henrique Cardoso assumiu - não vamos trabalhar com dados absolutos da dívida pública -, a dívida pública era de 28% do PIB; quando ele saiu, ela era de 58% do PIB. Ele dobrou o peso da dívida em relação à economia vendendo US$87 bilhões por meio do processo de privatização - 76% do patrimônio público - e aumentando a carga tributária de 26% para 35% do PIB. Quer dizer: aumento da carga tributária, venda do patrimônio, com um endividamento brutal.

Esse é o maior obstáculo ao crescimento sustentável; esse é o principal elemento da armadilha para o crescimento que temos hoje; esse é o maior responsável pelos juros elevados.

(Interrupção do som.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Por isso, não é possível aceitar a afirmação de que superávit primário é para impressionar mercado. Mesmo com superávit primário elevado, o Brasil tem déficit nominal. A dívida continua crescendo, Senador Tasso Jereissati. A dívida pública, neste Governo, caiu em relação ao PIB. Essa é a questão central. Significa que nós estamos desendividando o País.

Falamos do gasto corrente. Onde cresceu? Não foi com pessoal porque houve queda de gasto com pessoal. Eu tenho os dados e voltarei à tribuna depois de ouvir os demais Senadores. Onde cresceu? O gasto social. Onde cresceu? O Programa Bolsa-Família. Ou seja: cresceu onde deve crescer a presença do Estado, porque são oito milhões de famílias pobres e famintas estão tendo a chance de manter o filho na escola. É verdade que havia o Bolsa-Escola antes, mas esse programa foi ampliado, unificado, integrado e melhorado. Então, aí é que houve o aumento do gasto social.

Faltam, realmente, melhores investimentos, sobretudo em infra-estrutura. Evidentemente, o constrangimento do setor público exige isso. Agora, o que eu considero o lado mais importante da intervenção de V. Exª? Considero infeliz o pronunciamento e acho que deveria haver um espírito de autocrítica que dissesse: “eu não consegui, no meu governo, resolver o problema do crescimento. Cresce mais hoje, nos últimos dois anos, do que em oito anos. Não consegui resolver o problema do desemprego. Errei na taxa de câmbio”.

Acho que existe um debate que devemos fazer com franqueza. E acho mais, Senador Tasso, que nós deveríamos fazer um debate. Conseguimos construir aqui um pacto de todos os Senadores em torno da política educacional. Seguramente, não conseguiremos um pacto em torno de uma política econômica, mas, sob alguns aspectos fundamentais, deveríamos tentar. Quer dizer, há elementos de uma política econômica no Brasil hoje que não são de uma política de governo, mas de uma política de Estado, de uma política da sociedade.

Combater o populismo fiscal, defender a necessidade do superávit primário para desendividar o Estado brasileiro não é mais problema de governo ou de partido; é um problema de concepção de sociedade. Não há outro caminho. O Ministro Antonio Palocci citou o exemplo da Irlanda, da Coréia e de tantos outros. Se não fizermos um esforço de rigor fiscal, não sairemos da armadilha da qual estamos prisioneiros.

Ouço o aparte do Senador Tasso Jereissati.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Tranqüilize-se, que V. Exª fará uso da palavra até às 19 horas e 42 minutos, para igualar com os 30 minutos do Senador Arthur Virgílio.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Sr. Presidente, mas, somando com o dele, dá mais. Pela regra, são quatro vezes: duas dele e duas minhas.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Tasso Jereissati, concedo um aparte a V. Exª.

Sr. Presidente, só desconte o aparte porque é fala dele.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Sr. Presidente, quero falar pelo art. 14, em seguida.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Dê aparte para o seu time. Não há aqui ninguém do PT. Que pena!

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Fui citado. Quero fazer uso da palavra em seguida, pelo art. 14, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - São 19 horas e 42 minutos. Senador Aloizio Mercadante, V. Exª iguala o seu tempo ao de Arthur Virgílio.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT -SP) - Está bom. Então, vou concluir meu argumento.

Considero esta uma discussão substantiva. Pergunto a V. Exª: há algum caminho para reduzir a taxa de juros sustentavelmente que não passe pela austeridade fiscal? Não há! Há algum caminho para resolver o problema da crise das finanças públicas sem superávit primário? Não há! Não há! A história econômica mostra que os atalhos que o Brasil já tentou, como o mecanismo de confisco de poupança e outros, não têm resultado sustentável, não permitem o crescimento, não mantêm o emprego, não asseguram a qualidade do crédito público.

Então, esta discussão não é para o mercado ver. Esse não é o discurso de um ex-presidente; não é um discurso reflexivo de quem tem a experiência vivida, sabe dos desafios, que não podemos repetir o populismo fiscal do passado. Então, essas afirmações não são condizentes com a vivência de um ex-Presidente da República.

Diz mais: “Devemos alertar que este Governo está semeando a crise fiscal”. Mas se está diminuindo a relação dívida-PIB!? O Governo anterior só aumentou essa dívida. Não é verdadeiro esse pronunciamento.

Alertar para o problema da Previdência Social, isto sim, é um debate significativo, porque temos ainda uma crise na Previdência. Precisamos melhorar a estrutura de arrecadação na Previdência Social. Este, sim, é um debate que devemos fazer. Mas, dizer que está sendo semeada uma crise fiscal, não. Não é possível dizer que o superávit é para o mercado e que estamos semeando... Não. É uma coisa ou outra. Não vamos manipular as palavras; vamos fazer um debate aprofundado. Esse desafio, sim, eu aceito, Senador Arthur Virgílio.

Vamos abrir um seminário de discussão sobre uma política econômica de Estado, uma política econômica de longo prazo, uma política econômica sustentável, que não enverede pelo populismo fiscal, uma política econômica que nunca mais repita a vulnerabilidade cambial que vem do artificialismo da política de câmbio; uma política fiscal que preserve o nosso saldo comercial, que preserve as nossas reservas cambiais; enfim, uma política econômica voltada para o crescimento econômico.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, contribuições são bem-vindas, sobretudo da experiência vivida, mas não análises simplistas de quem parece que não foi Presidente. Como acadêmico, tem direito de fazer o pronunciamento que quiser. Mas como quem governou o Brasil e deixou as dificuldades que nós herdamos, devia ter um pouco mais de humildade e reconhecer os erros que praticou e cometeu, buscando superá-los, aí sim, identificar os problemas que temos hoje.

O menos importante aqui é a fala. Creio que relevante é o debate que iniciamos hoje. Proponho que organizemos esse seminário; que façamos o ciclo de debates, e continuemos,...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Aloizio Mercadante, V. Exª acabou de empatar o tempo com o Senador Arthur Virgílio.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Queria falar pelo art. 14, Sr. Presidente, pois fui citado.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - ...com profundidade, essa discussão, para construir uma economia de transição.

Concedo um aparte ao Senador Tasso Jereissati.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Aloizio Mercadante, V. Exª acabou de empatar o tempo com o Senador Arthur Virgílio. Está parecendo aquela música: “Esse jogo não pode ser 1 X 1”.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Sr. Presidente, eu fui citado. É uma questão regimental, pois fui citado numa comparação super desfavorável a mim. Ele me comparou com Mike Tyson, portanto, eu tenho que falar. (Risos.)

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - V. Exª encerrou o pronunciamento?

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Não existe ofensa maior do que essa.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Não. Eu concedo um aparte, evidentemente se ele não tiver uma recaída de Mike Tyson. (Risos.)

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Não, não. Não quero aparte. Desejo falar nos termos do art. 14. Podemos prorrogar a sessão à vontade, Sr. Presidente. Não tem por que não.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Antes, concedo um aparte ao Senador Tasso Jereissati.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Está concedido um aparte ao Senador Tasso Jereissati.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Senador Aloizio Mercadante, o problema da política econômica seguida pelo Ministro Antonio Palocci, e aqui criticada pelo ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, diz respeito à falta de análise histórica mais profunda das verdadeiras heranças. Em 1994, o País vinha enfrentando um verdadeiro desafio: a inflação, que parecia imbatível. A inflação inviabilizava o crescimento econômico sustentável e qualquer política pública realmente consistente, frustrando assim todos os teóricos da economia brasileira que já tinham tentado esse bom combate anteriormente e não tinham conseguido vencê-lo. O Ministro Fernando Henrique Cardoso e o PSDB se prepararam para enfrentar esse desafio. E, usando uma política às bases da teoria econômica, lastreada pelos melhores economistas do País, sem renegar nenhuma das verdades da ciência econômica, sem querer inventar a roda, mas usando de muita criatividade e de muita audácia, saiu do lugar-comum, criou a URV, fez o Plano Real, fez um plano de estabilidade de longo prazo e venceu a inflação. Aí é que está a grande herança que o Governo Fernando Henrique Cardoso deixou para o Governo do PT, para o Governo Lula, para nós todos. O resto é detalhe, porque a luta contra a inflação e contra a cultura inflacionária não se vence com uma legislação ou de um golpe só. Tivemos que acabar com a correção monetária, que todos tínhamos na cabeça. Não se imaginava entender qualquer mecanismo que não envolvesse correção monetária seja nos preços, seja no dia-a-dia da dona-de-casa, seja no banco, seja nos contratos. Isso durou quatro ou cinco anos. De lá para cá, mantivemos, em cima disso, com altos e baixos, uma política econômica necessariamente ortodoxa, mas uma ortodoxia advinda de um plano de estabilidade da moeda mais criativo dos últimos tempos e exemplo internacional de enfrentamento da inflação. Ele foi extremamente bem-sucedido e raro, Presidente Mão Santa. Raro por quê? Foi um dos primeiros programas de combate à hiperinflação - hiperinflação que vinha de longo tempo - sem causar recessão. Normalmente, os planos de combate à inflação - com algumas exceções - causam recessão e dores profundas ao País. Portanto, o Professor-Senador Aloizio Mercadante sabe que um período de crescimento lento, depois de um combate à inflação como fizemos, é uma vitória, porque o normal, depois de uma vitória sobre a inflação, é uma recessão. O Professor sabe disso. O que acontece com a política do PT é que, de lá para cá, o Brasil mudou; o nosso desafio não é mais a inflação, pois vencemos a inflação, mas temos de mantê-la constantemente sob controle; o mundo mudou. Naquela época, vivíamos sob o entusiasmo do Consenso de Washington, em que uma porção de verdades foi estabelecida e embarcamos naquelas verdades também. O mundo mudou, o Brasil mudou e os desafios do Brasil mudaram. Os problemas que temos de enfrentar na economia não são mais os mesmos. O que aconteceu? O PT assumiu o Governo com a mesma política ultra-ortodoxa - graças a Deus! -, porque o que se propunha, e de vez em quando ainda se ameaça, era uma política que desafiava as verdades da política da ciência econômica, que V. Exª conhece até muito melhor que eu. Aí, sim, seria um desastre. Concordamos inteiramente com V. Exª. Deus me livre que venha alguém, como propõe o PT, de vez em quando, e faça uma gastança fiscal que cause o desequilíbrio fiscal, que faça uma política de baixa de juros extremamente irresponsável, sem prestar atenção a todas as conseqüências. Respeitando as verdades da ciência econômica, não existe nenhuma variação, nenhuma criatividade, nenhuma ousadia, nenhuma audácia na política econômica do PT, porque não pode haver. É preciso, em razão das dificuldades internas do próprio Governo, provar todo o dia ao mercado que não é irresponsável.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Tasso Jereissati...

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Já concluirei. Daí essa frase muito feliz do Presidente Fernando Henrique. De vez em quando, José Dirceu acusa o Ministro Palocci. Sai José Dirceu, entra o Vice-Presidente José Alencar. Sai José Alencar, entra a Ministra Dilma Rousseff, acusando. O Ministro Palocci, coitado - nesse aspecto defendo S. Exª -, é obrigado, todo dia, a ser mais ortodoxo que o mais ortodoxo dos ortodoxos, para provar ao mercado que não é irresponsável. Então, S. Exª precisa fazer, sim, na opinião de todos, um jogo para impressionar o mercado financeiro, para mostrar que está firme e que não é aquilo que eles pensam que o Governo pode ser. Falta à política econômica do Governo entender e é isso que estamos preparando agora. Vou, à frente do PSDB, Senador Arthur Virgílio, propor que façamos agora o que fizemos no passado. Preparamo-nos para o desafio da inflação e agora propomos uma política econômica conforme a teoria econômica e que esteja preparada para enfrentar os novos desafios, que é o crescimento econômico segundo a responsabilidade fiscal, prevendo também a visão nacional do País com distribuição de renda mais igualitária.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Tasso Jereissati, primeiramente, em relação à interpretação histórica, escrevi muitas vezes, publiquei e considero que o Plano Real, no que se refere à forma de desindexação da economia com a URV, que era um trabalho dos Srs. André Lara Rezende e Pérsio Arida em 1982, em 1986, em vez de tratar a idéia de duas moedas - criar o mecanismo de variação da inflação todo dia; tudo variando conforme a URV, nada varia, mas, quando se tira a URV, estabiliza-se a economia -, optou pelo congelamento várias vezes. O Plano Real, o Plano Bresser, os Planos Collor I e II e o Plano Verão foram todos opção pelo congelamento, que é um instrumento totalmente desgastado. Foi um instrumento criativo e muito importante na concepção do combate à inflação, mas havia um equívoco.

O Sr. Tasso Jereisatti (PSDB - CE) - Sem recessão.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Sem recessão.

Dois elementos ajudaram a viabilidade. Não foi apenas a criatividade na desindexação. Foi o Plano Brady, no fim de 1982, que repactuou a dívida externa e reabriu as linhas de financiamento, pois, na conjuntura anterior, havia uma crise no balanço de pagamento e não havia financiamento. O País entrou em moratória em 1987 e ficou até 1991.

Houve, então, a repactuação da dívida externa no Plano Brady. Em segundo lugar, houve um equivoco que particularmente tentei demonstrar desde o primeiro momento e que fiquei quatro anos tentando advertir, com outros economistas, como a Professora Maria da Conceição Tavares, o Deputado Delfim Netto, Paulo Nogueira Batista e outros. Tentamos alertar para o problema da âncora cambial porque, além da euforia neoliberal, da idéia do Estado mínimo, da desregulamentação, que também advertíamos que ia vulnerabilizar as contas externas, a abertura comercial radical com âncora cambial ia desestabilizar o balanço de pagamentos, como de fato ocorreu. Esse debate ficou relativamente interditado no Partido de V. Exª, porque havia vozes discordantes, que tentaram se manifestar e foram abafadas, e na imprensa em geral, que procurava diminuir aqueles que eram chamados de “os velhos economistas”.

            Gustavo Franco apresentou uma teoria do déficit bicicleta. Não teria importância o déficit comercial de oito bilhões e meio porque o problema é a conta de capitais. Basta financiar a conta de capitais e temos como conduzir o balanço de pagamentos, e a história foi o que foi: o País sofreu um ataque especulativo. Como a dívida pública estava indexada à taxa de câmbio, explodiu naquele ataque, houve uma vulnerabilidade estrutural, tivemos que voltar ao Fundo Monetário Internacional e o segundo Governo entregou o País...

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Aloizio Mercadante, o tempo...

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Foram seis minutos o aparte. Vou concluir.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - O problema é o seguinte: estou vendo que o debate é qualificado, mas está desigual.

O PSDB está com dois e V. Exª é um só, e não vem ninguém - é como pingue-pongue, que deve ser em dupla ou individual. Mas não vem ninguém aqui do PT. Daí, o PSDB está em vantagem. Então, acho que só o rei Salomão podia ser tão rápido.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Vou só concluir.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Está dois contra um, Senador Mercadante. Estou comparando e advertindo V. Exª para encerrar este jogo, porque está desigual.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Não tem problema.

A força dos dados...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Até o Suplicy, que é um cirineu e, de quando em quando, vem ajudar a levar a cruz, desapareceu. (Risos.)

Vou pedir ao Senador Alberto Silva, que é conselheiro da República, que presida a sessão.

Vamos encerrar.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Deixe-me concluir, para o Senador Alberto Silva...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - O Senador Alberto Silva e o Senador José Maranhão estão inscritos.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Quero, evidentemente, respeitar a inscrição.

No meu ponto de vista esse erro da âncora cambial foi um dos erros fundamentais, tanto da desestabilização do balanço de pagamentos quanto da desestabilização das contas fiscais.

Hoje, Senador Tasso Jereissati, temos uma apreciação do câmbio com uma diferença fundamental; lá, tínhamos déficit comercial, déficit de transações correntes e financiávamos o balanço de pagamentos com juros elevados - chegou a 45% a taxa nominal de juros para atrair o capital e as privatizações, que atraiu investimento externo e a desnacionalização da economia.

Hoje, não. Hoje entram pelo saldo comercial US$ 3,5 bilhões por mês. Hoje entram dos investimentos diretos US$ 1,5 bilhão por mês. Então, são mais ou menos US$ 5 bilhões que estão entrando pelo comercial e pelo investimento, e não se trata de privatização nem desnacionalização, mas de aumento de capacidade produtiva.

O saldo comercial está acima de US$ 40 bilhões. Então, o dinheiro que está vindo para o Brasil é o dinheiro que fica; é o dinheiro que vem do trabalho das fábricas, da agricultura, das exportações, do salário, do emprego, do aumento de impostos; é o do produto da criatividade, da competitividade e da eficiência da economia brasileira. Então, é diferente a natureza da apreciação cambial. Ela preocupa. Por isso a discussão sobre meta de inflação, a calibragem da política monetária, a sintonia fina são muito importantes para não sobrecarregar a política fiscal e não sobrecarregar a apreciação do câmbio.

Então, devemos ter este debate e precisamos fazê-lo. V. Exª diz: “Graças a Deus, temos superávit primário”. Este tem sido o discurso do PSDB nesta Casa: é preciso austeridade fiscal, é preciso superávit primário. O Senador Arthur Virgílio diz assim: “Precisamos de superávit primário para os próximos 10 anos”. Esse é um discurso em que me reconheço, e me reconheço em 2 anos e 10 meses de debate nesta Casa. Precisamos de austeridade, Lei de Responsabilidade Fiscal, superávit primário para desendividar o Estado, para melhorar a capacidade de investimento.

O que não reconheço? É o ex-Presidente chegar e dizer: “Por baixo dos superávits primários, para impressionar o mercado ou este Governo”... Se é ultra-ortodoxo, como é que este Governo está patrocinando a fragilização das finanças públicas? Ou uma coisa ou outra. Isso aqui não fecha e, principalmente, não fecha com quem governou oito anos; não fecha.

Então, prefiro que enfrentemos este debate agora, comecem a construir valores e parâmetros como é o câmbio livre flutuante, como é a meta inflacionária, como é o superávit primário, como é a necessidade de melhorar a relação dívida pública/PIB, para poder baixar os juros e a carga tributária, como é a necessidade da reforma tributária. Que este debate se consolide no Brasil, seja Governo ou Oposição; que haja um pacto histórico neste País em torno de alguns valores, sem o que não haverá crescimento com estabilidade, não haverá crescimento sustentável no Brasil. E que o palanque eleitoral não amorteça essa responsabilidade pública e histórica.

Por último, quero dizer, Senador Tasso Jereissati, Senador Arthur Virgílio, é indiferente se é um, se são dois ou se são três. Este é o debate de que o País precisa. Este é o debate que engrandece o Senado.

Portanto, Senador Arthur Virgílio, devolvi a ironia que V. Exª me fez. Sei que V. Exª é um diplomata formado, tem uma belíssima formação em uma das mais importantes escolas, que é o Instituto Rio Branco, do Itamaraty, mas V. Exª, muitas vezes, na defesa dos seus ideais, das suas convicções, se excede ou é muito agressivo, mas nunca perde o espírito público. E, nas coisas fundamentais da República, tem tido muita responsabilidade.

Então, quero aqui expressar o respeito que tenho por V. Exª, mas afirmo que prefiro o diplomata ao lutador de jiu-jítsu. As duas personalidades convivem com V. Exª, mas nunca tiram o brilho e a competência das intervenções.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/2005 - Página 39962