Discurso durante a 203ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Possibilidade de crise no setor de produção de energia elétrica no Brasil.

Autor
Valdir Raupp (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Valdir Raupp de Matos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • Possibilidade de crise no setor de produção de energia elétrica no Brasil.
Aparteantes
Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 19/11/2005 - Página 40253
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • APREENSÃO, POSSIBILIDADE, CRISE, SETOR, ENERGIA ELETRICA, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DECLARAÇÃO, EX PRESIDENTE, CENTRAIS ELETRICAS BRASILEIRAS S/A (ELETROBRAS), SECRETARIO, ENERGIA, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME).
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA (ANEEL), PREVISÃO, INVESTIMENTO, PRODUÇÃO, ENERGIA ELETRICA, FUNCIONAMENTO, USINA HIDROELETRICA, REALIZAÇÃO, LEILÃO, LICITAÇÃO.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, PRODUÇÃO, ENERGIA ELETRICA, EFEITO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, SETOR.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, INICIO, OBRA PUBLICA, USINA HIDROELETRICA, ESTADO DE RONDONIA (RO), COMENTARIO, EXISTENCIA, PROJETO, AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA (ANEEL), REGISTRO, APROVAÇÃO, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA).
  • DEFESA, CONSTRUÇÃO, GASODUTO, ESTADO DE RONDONIA (RO), NECESSIDADE, LICENÇA, MEIO AMBIENTE, INICIO, OBRAS, COMENTARIO, INEFICACIA, SOLUÇÃO, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), POSSIBILIDADE, INSUFICIENCIA, ABASTECIMENTO, GAS, USINA TERMOELETRICA, NECESSIDADE, PROVIDENCIA, GOVERNO FEDERAL.
  • ELOGIO, GOVERNO FEDERAL, EFICACIA, LICITAÇÃO, CONSTRUÇÃO, LINHA DE TRANSMISSÃO, ENERGIA ELETRICA.

O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, alertas têm sido feitos com freqüência por especialistas e instituições diversas do setor elétrico sobre os riscos de uma crise de abastecimento de energia elétrica em nosso País. Há dúvidas apenas quanto ao momento em que isso poderia ocorrer, o que depende de fatores tão incertos como o regime de chuvas e o ritmo de crescimento da economia.

O primeiro presidente da Eletrobrás, no Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o físico Luís Pinguelli Rosa, em entrevista à Agência Estado, em 31 de outubro último, declarou que está entre os especialistas que pensam que o País terá problemas de energia já a partir de 2008. Sem extremismos, é certo admitir que não há certeza sobre a situação do abastecimento de energia elétrica na virada da década.

O Secretário de Energia do Ministério de Minas e Energia, Ronaldo Schuk, veio a público, recentemente, argumentar em contrário. Segundo matéria publicada pela Agência Estado, no mesmo dia 31 de outubro, o Secretário assegurou que o abastecimento de energia elétrica está garantido até 2009 - vejam bem: até 2009 -, mas que o suprimento para 2010 já dependerá dos leilões a serem realizados ainda este ano. Ainda de acordo com a mesma matéria, o Secretário teria afirmado que o sistema receberá, nos próximos cinco anos, cerca de 13 mil megawatts (MW) adicionais. Pelas suas previsões, no próximo ano já está assegurada a entrada de 5.345 MW, seguidos de 2.976 MW em 2007, 816 MW em 2008 e 869 em 2009.

Infelizmente, os números encontrados no Boletim Energia, editado pela Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel), no qual são publicados dados atualizados mensalmente pela fiscalização da Agência a respeito da expectativa firme de entrada em operação de novos empreendimentos, não são tão otimistas assim.

A Agência oferece dados precisos sobre a previsão de entrada em operação, nos próximos anos, dos empreendimentos de geração em construção, já que lhe cabe fiscalizar o andamento das obras dessas usinas. Vejamos os dados da Aneel, disponíveis no Boletim Energia nº 195, publicado na página da Agência na Internet.

Os empreendimentos sem restrições para entrada em operação ainda em 2005 chegam a 1.578,9 MW, que, se somados aos 1.870,2 MW já agregados ao sistema este ano, perfazem 3.449,1 MW. Para 2006, está prevista, com boa margem de segurança, a entrada em funcionamento de usinas que totalizam 4.965 MW. Mas já em 2007 está prevista a entrada de apenas 183 MW novos! E não há previsão de entrada em funcionamento de nenhuma nova usina em 2008 e 2009!

Tudo somado, o que está na mão mesmo é um acréscimo de 8.597,6 MW, número bastante diferente dos 13 mil MW anunciados pelo Secretário. Fora isso, tudo mais são obras que enfrentam dificuldades de licenciamento ambiental, entre outras, para as quais não há qualquer garantia de entrada em operação.

É importante notar que, em 2007, haverá uma queda da média anual de entrada em operação, de 3.224 MW novos, mantida no período de dez anos, entre 1996 e 2005, para ínfimos 183 MW! Esses números, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, exigem reflexão e, sobretudo, ação imediata por parte do Governo Federal.

Todos sabem que o Brasil é um país cuja vocação natural é de produção de energia de fontes hidráulicas, mercê das imensas bacias hidrográficas com que fomos agraciados. Sabe-se, também, que a energia dessas fontes é a mais barata atualmente disponível no País.

Ainda assim, o último leilão de hidrelétricas foi realizado em julho de 2002, há três anos e três meses portanto. De lá para cá, o Governo não conseguiu realizar nenhum novo leilão, em que pese haver anunciado que iria licitar 17 novos empreendimentos, com uma capacidade total de aproximadamente 2.780 MW.

Pois já foi lançado o edital para a realização, em 16 de dezembro próximo, do leilão de novos empreendimentos de geração. Apenas 13 aproveitamentos hidrelétricos novos foram relacionados para licitação. Desses, apenas cinco, que somam cerca de 640 MW, já têm licença ambiental. Outros oito, que perfazem cerca de 1.430 MW, ainda dependem de licenciamento e somente poderão ir a leilão se obtiverem as respectivas licenças ambientais. Tem-se, portanto, no máximo, um total de 2.070 MW a serem licitados dos 2.780 MW inicialmente previstos.

Ainda assim, é importante notar que, mesmo que se conseguisse conceder todos os 2.780 MW a serem gerados por esses anunciados 17 empreendimentos, eles não atenderiam sequer à demanda nacional de energia elétrica de um único ano, hoje estimada em cerca de 3.000 MW.

O resultado é que, como está previsto no edital, também participarão do leilão usinas térmicas, cujos custos de geração são sabidamente maiores.

Dessa forma, ficará prejudicada a modicidade tarifária, tão cara ao Governo Federal, a ponto de ter sido um dos argumentos centrais para a alteração da legislação que vigorava até o início do Governo Lula e que promovia uma expansão da oferta de mais de 3.000 MW novos por ano.

Mas o Governo resolveu complicar ainda mais as coisas e, conforme noticiado pela imprensa, retirou do edital a possibilidade, admitida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), de revisão tarifária extraordinária no caso de haver custos extras para a obtenção da licença ambiental de instalação, imprescindível à entrada em funcionamento das usinas.

A tendência é a de que, com isso, haja sobrepreço nas propostas dos interessados, o que também vai encarecer as tarifas ao consumidor. Alternativa pior que essa será a falta de investidores interessados em arrematar essas usinas, já que, na nova modalidade de leilão, eles ainda serão levados a competir em uma segunda fase do processo, com base no critério de menor tarifa.

Assim, de um jeito ou de outro, ainda que o modelo proposto para o leilão se baseie nas menores tarifas ofertadas, o resultado global em matéria de redução tarifária é duvidoso. Entretanto, mesmo preços mais elevados seriam ainda menos ruins que a falta de energia. Como ninguém ignora, a energia mais cara é aquela que falta.

Assim, ironia das ironias, o Governo fez importantes mudanças na legislação do setor elétrico, com o objetivo de reduzir as tarifas, por ele consideradas insuportáveis para a população mais carente. Está, agora, obrigado a adotar alternativas mais caras de produção de energia diante do risco de possível crise de abastecimento, devida justamente às alterações que promoveu.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero, mais uma vez, desta tribuna, fazer um alerta ao Governo Federal, à Eletrobrás, tão bem dirigida neste momento pelo eminente Presidente Aloisio Marcos Vasconcelos Novais, que a assumiu recentemente e a está dinamizando. Aquela empresa também foi bem administrada anteriormente pelo atual Ministro das Minas e Energia, Silas Rondeau Cavalcante Silva, Ministro dinâmico, competente, profundo conhecedor do setor. Com esta equipe - o Ministro Silas, o Presidente da Eletrobrás, Aloisio Vasconcelos, o novo Presidente da Eletronorte e todos os representantes de seus escritórios regionais -, esse processo de construção de novas usinas poderá ser acelerado, Sr. Presidente.

Cito aqui o caso de Rondônia, que tem grande potencial hídrico no rio Madeira, podendo imediatamente ser construídas duas grandes usinas para gerar em torno de 7.000 MW de energia elétrica. É uma meia Itaipu, que abasteceria todo o Brasil. É claro que essa energia não será gasta só em Rondônia ou no Acre. São duas usinas: as usinas de Girau e de Santo Antônio no rio Madeira, podendo ser construída uma terceira na cachoeira Esperanza, próxima de Guajará-Mirim, fronteira com a Bolívia.

Só essa energia de Rondônia gerará emprego e renda para o povo de Rondônia e do Brasil, além da usina de Belo Monte no Pará. Sei que existem defensores, nesta Casa, da construção da usina de Belo Monte no Pará. Esse projeto já existe há 11 anos. O projeto do Madeira é mais novo, mas foi construído em um modelo mais inovador, mais moderno, que gerará energia com pouca alagação e, portanto, com pouco impacto ambiental.

O que peço ao Governo Federal, ao Ministro Silas Rondeau, é que coloque em prática imediatamente - visto que está havendo dificuldade em leilões de outras usinas - as usinas do Madeira, que já contam com a aprovação da Aneel. Os projetos estão prontos na Aneel, e a primeira fase já foi aprovada pelo Ministério do Meio Ambiente. É só acelerar a aprovação desse projeto do meio ambiente e colocá-las logo a leilão, pois já teríamos, dentro de três anos aproximadamente, 7.000 MW de energia nova para abastecer e sustentar o crescimento do País.

Ainda nessa área de geração de energia, quero falar do gasoduto Urucu-Porto Velho. Há exatamente três anos, nobre Líder, Senador Ney Suassuna, estamos batalhando, lutando pela licença ambiental desse empreendimento. É um gasoduto que vai escoar gás da bacia do Urucu. Parte desse gás está sendo queimada na atmosfera há vários anos; a outra parte está sendo reinjetada no solo, para se tirar posteriormente. E o Ibama não resolve essa situação. Agora, licenciou as duas pontas do gasoduto. É como se tivesse conseguido uma licença para construir um prédio, em que fossem licenciados o quinto e o sexto pisos e em que não fossem licenciados o terceiro e o quarto pisos. Como se constrói um prédio fazendo os primeiros andares, deixando alguns no meio e fazendo os outros andares para cima? É impossível. A lei da física ainda não conseguiu resolver essa equação, essa situação. Assim fizeram com o gasoduto: licenciaram a parte próxima da jazida de gás, licenciaram a outra parte próxima da usina, após Porto Velho, e deixaram o meio, porque foi criada, neste ano, uma reserva florestal atingindo 70 quilômetros do traçado do gasoduto. Não posso aceitar isso.

Conversei ontem com os técnicos do Ibama que disseram que a única solução seria fazer um plano de manejo no Parque Nacional ou fazer a mudança do traçado, fazer um novo projeto. Se levamos três anos para conseguir que se aprovassem esses dois pedaços da licença, demorará mais dois ou três anos a aprovação desse restante que foi impedido pelo parque. Não dá mais para agüentar essa situação!

Concedo um aparte ao nobre Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Permita-me, nobre Senador, lamentar que essa situação se estenda a outros projetos. Temos de preservar o meio ambiente, sim, mas tudo o que é demais é veneno. Todos nós, na nossa juventude, lembramos da intrepidez com que se fez a Transamazônica, que chegou a ser transitada de fora a fora. Agora, vários ambientalistas estão falando que, como o meio da estrada não foi preservado e a floresta terminou tomando conta, não se pode, então, continuá-la. Por conta disso, não querem dar licença para restaurar uma estrada que já existia. Que o diga o nosso companheiro, Senador Gilberto Mestrinho, que andou de carro de um canto para outro e agora não pode mais andar porque a floresta tomou conta. É algo que chega a ser inusitado. O mesmo acontece com as populações que estão na expectativa da construção do gasoduto, que, pura e simplesmente, por “pirraça” do meio ambiente, não poderá ser construído. Assim, vamos voltar ao ano de 1500: se uma folha de árvore cair, vamos ter de colá-la, para que volte ao seu estado anterior. A população tem prioridade! É claro que temos de preservar o meio ambiente, mas estou firme com a posição de V. Exª: tudo que é demais, todo exagero é venenoso.

O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO) - Muito obrigado, grande Líder Ney Suassuna.

Quero dizer que fiz essa viagem de carro. Em 1984, fui em um Fiat 147 de Porto Velho a Manaus por essa estrada. A estrada existia, e por ela eram transportadas mercadorias. É claro que havia um limite de quatro toneladas, porque já era uma estrada frágil devido à topografia do terreno, que era um tanto alagadiço. Mas a estrada existiu por muito tempo, e é claro que foi concedida a licença. Por que, então, é preciso uma nova licença para restaurar uma estrada que já existiu? Acho que o Ministro Alfredo Nascimento e o Senador Gilberto Mestrinho, assim como os demais políticos da Amazônia, têm todo direito de reclamar dessa situação.

Para concluir, Sr. Presidente, quero dizer que, além disso, também há alertas sobre a escassez de gás e os problemas de sempre, gerados pelo domínio absoluto da Petrobras sobre o setor.

Em matéria recente da Folha de S.Paulo, o consultor Adriano Pires alertou para o fato de que o Governo, se não tiver uma política para reduzir o mercado, correrá o risco de não ter gás suficiente para as usinas térmicas, caso elas tenham que entrar no sistema em 2009 ou 2010.

Para nossa sorte, os reservatórios das usinas existentes estão cheios, como há muito tempo não estavam nesta época do ano, de início das chuvas. Isso é quase um milagre, muito bom para o Brasil. Também foram acrescidos mais de 20 mil quilômetros de linhas à Rede Básica de Transmissão, construídas entre 1995 e 2004, graças aos investimentos privados, ao esforço do Governo e aos leilões realizados pela Aneel, o que aumenta a confiabilidade e a flexibilidade do sistema. Felizmente, nesse campo, o Governo Lula conseguiu agir, tendo mantido o ritmo das licitações para a construção de novas linhas de transmissão.

Assim, é preciso que haja um esforço redobrado do Governo no sentido de que se retomem os leilões de usinas hidrelétricas, aproveitando-se os extraordinários recursos naturais de que dispõe o Brasil. Não é possível que os entraves ambientais sejam tão insuperáveis assim, que possam comprometer a sustentabilidade da economia e do crescimento econômico do nosso País. Precisamos licitar novas hidrelétricas, sem prejuízo de outras soluções, porque essa é a melhor saída para que não tenhamos, em futuro muito breve, novo racionamento de energia elétrica no Brasil, porque estamos amargando até hoje as conseqüências do apagão de anos atrás.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado pela generosidade em me conceder alguns minutos para que eu pudesse concluir meu pronunciamento.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/11/2005 - Página 40253