Discurso durante a 205ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise do relatório final da CPMI da Terra, elaborado pelo Deputado João Alfredo.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FUNDIARIA. REFORMA AGRARIA.:
  • Análise do relatório final da CPMI da Terra, elaborado pelo Deputado João Alfredo.
Publicação
Publicação no DSF de 24/11/2005 - Página 40892
Assunto
Outros > POLITICA FUNDIARIA. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • REGISTRO, CRISE, ZONA RURAL, FALTA, POLITICA AGRARIA, ORGANIZAÇÃO FUNDIARIA, RESULTADO, SUPERIORIDADE, VIOLENCIA, CAMPO, ACUSAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RESPONSABILIDADE, SITUAÇÃO, AUSENCIA, INTERVENÇÃO, ESTADOS, DESRESPEITO, DETERMINAÇÃO, JUDICIARIO, POSSIBILIDADE, COMPROMETIMENTO, DESENVOLVIMENTO AGRICOLA.
  • ANALISE, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, APOIO, ORGÃO PUBLICO, RESPONSABILIDADE, EXECUÇÃO, REFORMA AGRARIA, CRITICA, PREFERENCIA, MANUTENÇÃO, PRIVILEGIO, INTERESSE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), RELAÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA.
  • EXPECTATIVA, REMESSA, RELATORIO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, TERRAS, MINISTERIO PUBLICO, INDICIAMENTO, PARTICIPANTE, ILICITUDE, VIOLENCIA, DESVIO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, BENEFICIO, AGILIZAÇÃO, PROCEDIMENTO, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA, REFORMA AGRARIA.

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DISCURSO PROFERIDO PELO SR. SENADOR ALVARO DIAS NA SESSÃO DO DIA 22 DE NOVEMBRO, DE 2005, QUE, RETIRADO PARA REVISÃO PELO ORADOR, ORA SE PUBLICA.

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O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, após mais de dois anos de trabalho, a CPMI da Terra está chegando às conclusões, e deve, na próxima quinta-feira, a partir das 11 horas, debater e deliberar sobre o seu relatório.

Durante os últimos meses, visitamos nove Estados brasileiros, aqueles de maior conflagração na área rural, sendo que o Estado do Pará, onde se encontra o maior índice de violência no campo, foi visitado duas vezes pela Comissão. Ouvimos cerca de 125 pessoas em depoimentos que contribuem com subsídios importantíssimos para a mudança de rumos em matéria de política agrária no País.

Senador Mão Santa, a constatação é de uma situação deplorável na estrutura fundiária brasileira, é de dramaticidade. A desorganização é incrível. Necessitaremos, sem dúvida, de várias gestões competentes de Governo para a reorganização compatível da estrutura fundiária brasileira.

O que encontramos? Desrespeito à lei, afronta constante ao Judiciário. Não há respeito à lei, e as decisões, as ordens judiciais não são respeitadas pelos Governantes nos Estados nem pelo próprio Presidente da República, que, em inúmeras oportunidades, deixou de atender determinação de intervenção em unidades da Federação como conseqüência da afronta de governantes estaduais a ordens emanadas do Poder Judiciário. É evidente que esta situação de anarquia rural pode comprometer o processo de evolução da agricultura brasileira, que avança tecnologicamente, que aumenta sua produtividade e exporta cada vez mais.

O Governo Lula é um retrocesso em matéria de reforma agrária. Aliás, o Presidente foi o que mais prometeu. Durante a campanha eleitoral, afirmava que só ele teria condições de executar um programa de reforma agrária com paz no campo porque saberia se entender com os Líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra*.

As metas anunciadas não são alcançadas, e o que resta é frustração, caminho para indignação, para revolta que leva à violência, que se exacerba estimulada pela impunidade que prevalece, já que autoridade não há, o que há, em muitas situações, é verdadeiramente a lei da selva. Assassinatos impunes, inquéritos policiais não instalados, procedimentos judiciais não instaurados, não há julgamento e, portanto, não há condenação.

Esse é o cenário que pudemos vislumbrar com as incursões a Estados em desenvolvimento através do trabalho dessa Comissão Parlamentar de Inquérito. O Governo não instrumentalizou os órgãos públicos responsáveis pela execução do programa de reforma agrária. Estão absolutamente desestruturados. Priorizou a partidarização ao invés de qualificar tecnicamente esses instrumentos de produção da política agrária no País; preferiu privilegiar os interesses partidários, mantendo a relação anterior do Partido dos Trabalhadores com o MST.

O MST surgiu como grande esperança de luta pela reforma agrária no Brasil. Mereceu aplausos no País e no exterior. Caminhou bem durante algum tempo, depois foi instrumentalizado politicamente. Aconteceu também a sua partidarização e algumas lideranças “mais espertas” determinaram o desvirtuamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. E aqueles, os chamados excluídos, os trabalhadores sem oportunidades, aqueles que sonham em possuir um pedaço de chão para viver com qualidade passaram a ser usados como massa de manobra por aqueles que buscavam objetivos diferentes dos que determinaram a organização deste movimento.

E essa relação existente entre órgãos do Governo e lideranças deste movimento levou o Governo a perder autoridade. O Presidente da República não impôs autoridade no ato de exigir cumprimento da lei, respeito às normas estabelecidas, e, evidentemente, isso estimulou a conflagração.

A violência é um capítulo à parte. Nós devemos condená-la. Obviamente, não resolve buscar os responsáveis pela violência. Há aqueles que acusam proprietários rurais. Outros acusam trabalhadores sem terra. Eu, Senador Mão Santa, dessa tribuna, cumprindo o meu dever de Senador, acuso o Governo, o Poder Público. É, sim, o Poder Público o principal responsável pela violência no campo, porque não cumpre o dever com competência, não gerencia com eficiência esse setor que, num país agrícola como o nosso, é fundamental para que se alcancem os índices de desenvolvimento econômico e social que todos nós almejamos. Portanto, o principal responsável é o Poder Público.

No relatório final, a ser discutido na próxima quinta-feira, vai se revelar, mais uma vez, o confronto ideológico, pois há duas correntes distintas atuando. Aliás, a CPI repercute o que há na sociedade, Senador Mão Santa. Há divergência ideológica na sociedade brasileira, carreada para o seio da CPI. Há aqueles que, ideologicamente, defendem a propriedade rural radicalmente, afastando-se dos movimentos sociais que postulam uma reforma agrária capaz de contribuir para um processo de distribuição eqüitativa de renda no País e evidentemente aqueles que, numa porção diametralmente oposta, defendem a reforma agrária a qualquer preço, mesmo que à margem da lei vigente no País.

Não é fácil o entendimento entre duas correntes ideologicamente definidas e que se confrontam de maneira exacerbada. Administrou-se esse confronto até aqui e, certamente, ele será administrado na próxima quinta-feira, para que um relatório seja aprovado com as recomendações necessárias ao Ministério Público, tais como indiciamento de pessoas que praticaram ilícitos, praticaram a violência, ou contribuíram para a malversação do dinheiro público por meio de convênios celebrados pelos Ministérios do Governo Lula com cooperativas vinculadas ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, com organizações que representam os proprietários do setor rural, uma vez que auditorias do Tribunal de Contas foram realizadas tanto em relação às cooperativas que representam o MST, quanto em relação a entidades representativas do setor patronal. A CPI determinou a quebra de sigilo bancário fiscal e telefônico desses braços financeiros do MST, identificou irregularidades, desvio de finalidade, aplicação incorreta de recursos públicos oriundos desses convênios.

O Governo liberava recursos do Erário com muita facilidade, sem levar em conta a necessidade de projetos técnicos qualificados, o que possibilitou irregularidades, apuradas pela CPI. O Tribunal de Contas em relatório preliminar, parcial, não aprovado definitivamente, mas um relatório competente, definitivamente exemplar sob o ponto de vista da correção, aponta irregularidades e recomenda antecipadamente - é claro oferecendo ampla oportunidade de contestação dos interessados - a devolução de cerca de R$18 milhões, que envolveram três entidades: a Anca, a Concrab e o Iterra. Três milhões de reais do Iterra; quinze milhões de reais das duas cooperativas.

Portanto, as recomendações do plano administrativo...

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - V. Exª dispõe de mais três minutos, para que chegue à conclusão...

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Vou concluir agora, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - ...ao tempo em que recebe os nossos aplausos pelo pronunciamento e pelo trabalho dessa CPI que está pacificando o Brasil.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

As recomendações, repito, dirigidas ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas da União, ao Poder Legislativo com sugestões para alteração da legislação vigente, ao Poder Executivo com ações administrativas que possibilitem a agilização dos procedimentos para implementação do Programa de Reforma Agrária, também para os Executivos Estaduais e Municipais.

Sr. Presidente, o Brasil é um país continente, com diferenças regionais que não podem ser desconsideradas. Modelo uno é incompatível com a realidade brasileira. O modelo de reforma agrária que se deve discutir e implementar tem de atender às peculiaridades regionais e considerar as diferenças regionais flagrantes. Há, sim, uma concentração exagerada em poder de poucos proprietários. Isso, certamente, estimula a cobiça. Em Estados como o Pará, Mato Grosso, Rondônia e tantos outros, há imensas áreas de terras ainda improdutivas, boa parte de propriedade do Estado brasileiro e que não foram aproveitadas no Programa de Reforma Agrária. Mas é bom finalizar dizendo que não basta distribuir a terra, é preciso oferecer condições para o seu cultivo. O que ocorre normalmente é que distribuem a terra e abandonam o lavrador à sua própria sorte, sem nenhuma possibilidade de torná-la sustentável economicamente.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Senador Alvaro Dias, V. Exª me concede um aparte?

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Com prazer, concedo o aparte à Senadora Heloísa Helena, embora esteja no meu final.

A SRª HELOISA HELENA (P-SOL - AL) - Agradeço ao Presidente, Senador Mão Santa, e a V. Exª, Senador Alvaro Dias, a oportunidade de entrar neste debate. Claro, temos visões distintas em relação ao processo da reforma agrária. Respeitamo-nos porque temos a clareza de explicitar as nossas posições, mas há algo que compartilho com V. Exª: reforma agrária não é distribuição de terra; é distribuição de terra, renda e poder. Distribuição de terra sem assistência técnica, sem os investimentos, sem a infra-estrutura, sem o zoneamento agrícola, sem uma política de preços, não funciona porque as pessoas abandonam seus lotes. Desafio qualquer Senador a ficar, Senador Ney Suassuna, no meio da caatinga, no meio da capoeira, sem ter sequer o que esmolar, embaixo de um barraco de lona que, durante o dia, com o sol tão quente, parece levar até a nossa alma, e durante a noite, o frio parece quebrar os nossos ossos, um a um. Então, sabemos que se trata de ocupação de terra, que se dá pela irresponsabilidade do Governo em cumprir a lei e fazer a reforma agrária. E essa ocupação de terra só se dá porque, infelizmente, o Governo não tem a competência, a sensibilidade e a coragem de fazer a reforma agrária de fato e acaba correndo atrás em relação aos casos de violência no campo. Do mesmo jeito, o Governo não respeita o pequeno e o médio produtor rural porque é isso, de fato, que acontece. O último censo agropecuário - o Senador Osmar Dias e vários Senadores já falaram nisso - mostra claramente uma situação objetiva. O número de famílias assentadas consegue ser menor do que o número de famílias de pequenos e médios produtores que estão perdendo suas terras em função da ausência de crédito, de subsídio e da possibilidade de repactuação das suas dívidas em relação às instituições de crédito. O caso de Alagoas é gravíssimo. Lutamos aqui muitas vezes para conseguirmos a correção das distorções do saldo devedor, a repactuação e uma política clara para os sem-terra e para os pequenos e médios produtores, que têm terra, mas não conseguem condições objetivas de trabalho. Portanto, compartilho o seu pronunciamento com V. Exª trazendo esses dados fundamentais, porque um País de dimensões continentais como o Brasil tem a possibilidade concreta de aproveitamento da agricultura familiar e do pequeno e médio produtor para a produção de alimentos para o gigantesco mercado interno de massas. Não é possível um País como o Brasil simplesmente capacitar-se, do ponto de vista da agricultura, apenas para exportar o que acaba sendo matéria-prima para os grandes países, para viabilizar os interesses das grandes nações, que acabam industrializando o que nós temos de importar. É claro que existe espaço para os dois setores. Não se pode simplesmente fazer a propaganda do “agroshow” sem viabilizar mecanismos concretos, inclusive para a produção do alimento para as populações pobres brasileiras.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senadora Heloísa Helena. O aparte de V. Exª vale como um programa de Governo. É a filosofia adequada para a correta distribuição de renda por meio da reforma agrária.

            O Governo não pode continuar...

(Interrupção do som.)

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Concluirei, Senador Mão Santa.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Alvaro Dias, peço a V. Exª que conclua o seu pronunciamento, porque o irmão de V. Exª, Líder da família, está pacientemente esperando usar da palavra.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Pois não, Senador Mão Santa. Nada como um Dias depois do outro.

A Senadora Heloísa Helena disse que o Senador Osmar Dias é mais velho.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Aliás, Sr. Presidente, é um fato inusitado um irmão bloqueando o outro.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Eu disse que o Senador Osmar Dias é mais novo.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Está certo. O Senador Osmar Dias é mais novo.

Concluo, Sr. Presidente, afirmando que não pode o Governo continuar transferindo os favelados urbanos para favelas rurais. É a síntese do aparte da Senadora Heloísa Helena. Infelizmente, constatamos, na peregrinação que realizamos pelo País afora, que o Governo tem divulgado ao País que realiza um programa de reforma agrária, mas, na verdade, está plantando favelas rurais.

Muito obrigado, Senador Mão Santa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/11/2005 - Página 40892