Discurso durante a 208ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre matéria jornalística televisiva divulgada no último final de semana, sobre a situação do rio São Francisco.

Autor
Teotonio Vilela Filho (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AL)
Nome completo: Teotonio Brandão Vilela Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Comentários sobre matéria jornalística televisiva divulgada no último final de semana, sobre a situação do rio São Francisco.
Aparteantes
Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2005 - Página 41064
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, AUTORIA, JEFFERSON PERES, SENADOR, REFERENCIA, DECISÃO, CONGRESSISTA, RENUNCIA, ATIVIDADE POLITICA.
  • COMENTARIO, PROGRAMA, EMISSORA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), SITUAÇÃO, DESTRUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, EXTINÇÃO, AGUAS FLUVIAIS, ATERRO, DIVERSIDADE, AFLUENTE, RIO SÃO FRANCISCO, CONTESTAÇÃO, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, AGUA, RIO.
  • COMENTARIO, FALSIDADE, NEGLIGENCIA, CONDUTA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PARECER CONTRARIO, ECOLOGISTA, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, OBJETIVO, OBTENÇÃO, VANTAGENS, REELEIÇÃO, COMPARAÇÃO, SIMILARIDADE, DECISÃO, REGIME MILITAR, INCENTIVO, SUBSTITUIÇÃO, FLORESTA, BACIA HIDROGRAFICA, REFLORESTAMENTO, EUCALIPTO.
  • NECESSIDADE, RECUPERAÇÃO, BACIA, RIO SÃO FRANCISCO, ANTERIORIDADE, IMPLANTAÇÃO, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, AGUAS FLUVIAIS.

O SR. TEOTONIO VILELA FILHO (PSDB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, meu caro Senador Jefferson Péres, eu ia apartear V. Exª, mas, de súbito, num rompante, V. Exª abandonou a tribuna. Compreendo o desapontamento de V. Exª diante do momento e do papel da política em face da conjuntura, mas quero lhe dizer, como seu colega há vários anos, que talvez para V. Exª não valha a pena - repito que essa expressão foi dita num momento de frustração diante disso tudo - mas para o Brasil vale muito a pena a presença de V. Exª neste plenário, no Senado Federal e na política brasileira. Sei que o povo do Amazonas pensa dessa forma, já por duas vezes o elegeu muito bem para o Senado da República e o fará tantas vezes quantas forem necessárias. Atenda a este apelo que, tenho certeza, é da grande maioria dos brasileiros. Não deixe a política, fique conosco aqui.

Srª Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, a televisão exibiu, no final de semana, extensa reportagem sobre o rio São Francisco e seus afluentes. O que se viu foi alarmante: dezenas de afluentes do São Francisco já mortos. Ao vivo e em cores, para todo o Brasil, os rios mortos na sua sinuosidade chocante. Dezenas de afluentes do São Francisco, incontáveis lagos já assoreados, palmeiras soterradas pelo assoreamento porque não conseguem crescer mais que a camada de areia trazida pelas enchentes.

Mais ainda: vimos rios de águas profundas e antigamente claras que se transformaram em filetes de água barrenta. Vimos muitos outros sinais que deveriam deixar a todos atentos e atônitos.

Em vez disso, o Governo cultiva a sua idéia fixa de transposição.

Os personagens ouvidos na reportagem eram unânimes em afirmar o que tantos Senadores desta tribuna têm dito para esta Casa entre tantas outras questões graves que impediriam uma obra tão absurda da forma como está posto o Projeto de Transposição pelo Governo.

Mas, os personagens ouvidos - cada um ao seu modo, com a sua linguagem - repetiam que o São Francisco é um doente quase terminal, que precisa de transfusão e não de doação de sangue. O próprio Ministro da integração Nacional confirmou a situação vexatória do São Francisco, embora ressalvando paradoxalmente que a grande chance de revitalização do rio é o projeto da transposição.

Eu não consigo entender como um rio que está morrendo consegue se salvar quando lhe tiram mais água.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador Teotonio Vilela, permita-me?

O SR. TEOTONIO VILELA FILHO (PSDB - AL) - Com prazer, nobre Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Em primeiro lugar, obrigado pela referência que fez em relação a mim. Senador Teotonio Vilela, é uma questão nordestina e mineira essa do São Francisco, na qual não vou me envolver, embora compreenda perfeitamente aqueles que, como V. Exª, defendem primeiro a revitalização de um rio doente para depois se estudar ou se fazer a transposição. Mas o Presidente da República Federativa do Brasil, anteontem, mais uma vez, num dos seus lamentáveis pronunciamentos, - ele fala sem pensar - revelando enorme desrespeito a quem pensa diferente, inclusive aos seus correligionários de Alagoas e de Sergipe, disse simplesmente o seguinte: “Todos aqueles que se opõem à transposição do São Francisco se beneficiam da miséria dos nordestinos”.

É isso, Senador Teotonio Vilela.

O SR. TEOTONIO VILELA FILHO (PSDB - AL) - Meu Deus!

Eu, inicialmente, Senador Jefferson Péres, imaginava que o Presidente da República estava mal-informado a respeito dessa obra; daí essas posições que ele vinha tomando e o apoio que tem dado à obra.

Hoje, eu tenho a convicção de que o Presidente sabe exatamente que a obra é um engodo, está fadada a ser um elefante branco caatinga adentro, é inservível, e mesmo assim persiste, porque enxerga nisso um proveito eleitoral, um gesto simpático com o Nordeste. Hoje, sobretudo, a minha convicção é a de que o Presidente sabe que a obra é um engodo e mente descaradamente, como faz em relação a tantos outros temas.

Ele sabe que não está dizendo a verdade quando afirma que a obra vai levar água de beber para doze milhões de nordestinos. Ele sabe que não é assim. Ele sabe que os beneficiados não passam de 3 milhões após a obra ser concluída e se o projeto priorizar aquele mínimo necessário para o consumo humano.

Enfim, são muitas mistificações em torno da obra, e ele sabe disso. Infelizmente é o Presidente que temos e nos cabe, como Parlamentares, manifestar diante desta tribuna o nosso pensamento, alertar o Brasil para impedir que essa obra, repito, tão absurda agrida o Nordeste. Entendo essa obra como uma agressão ao Nordeste e um desrespeito aos nordestinos.

Pergunto, Srª Presidente: - Não seria mais fácil apenas recuperar o rio, para, num segundo momento, quem sabe, pensar em transposição? Não seria mais lógico tirar o São Francisco da UTI em que se encontra, do estado comatoso em que hoje está para ver, depois, o que e quando fazer com suas águas de novo multiplicadas? Não seria mais sensato primeiro revitalizar para depois pensar em transpor?

            Fica claro na reportagem que o Governo Federal - e aí o Governo Federal, ao longo do tempo, sobretudo na época da ditadura militar - teve grande responsabilidade pela atual desgraça do rio com a sua política maluca de incentivar a devastação de milhões de hectares para a plantação de florestas de eucalipto ainda nos idos de 70, com incentivos fiscais, a cargo do famoso Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal, o IBDF. O eucalipto não deu certo, a vegetação nativa acabou e o solo arenoso ficou à mercê das enxurradas, que desceram, aterrando lagoas, várzeas, riachos e o próprio rio São Francisco.

Estamos pagando hoje as conseqüências desses erros de 30 anos atrás. Com incentivos fiscais, trocamos florestas nativas e naturalmente diversificadas por florestas contínuas de eucalipto. Desnudamos o solo e expusemos suas fragilidades: os incentivos fiscais não pouparam sequer as matas ciliares, de preservação obrigatória. Mas o Governo, Srs. Senadores, não aprendeu com essa dolorosa lição. Com o projeto da transposição, que é altamente polêmico, para dizer o menos, o Governo ensaia mais uma dessas medidas que os ambientalistas e os órgãos independentes são quase unânimes em condenar. A teimosia oficial hoje, infelizmente, é a mesma de há 30 anos, quando os ambientalistas também condenavam a troca da mata nativa, com toda sua diversidade, pela floresta contínua de uma espécie exótica. Ontem, como hoje, há críticas ao projeto maluco e equivocado de reflorestamento com eucalipto na bacia do São Francisco. À falta de visão de um Brasil grande, quem se levantasse contra esse tipo perigoso e apressado de reflorestamento era tachado de antipatriótico. Hoje só nos resta entoar o réquiem para dezenas de afluentes do São Francisco e, em alguma medida para o próprio rio.

Já concluo, Srª Presidente.

Mas temos diante de nós a obrigação de aprender com os nossos erros passado e evitar a tentação de fazer obras às pressas sem estudos e cuidados para ver o que acontece depois. Os efeitos do reflorestamento equivocado demoram décadas; os efeitos da transposição talvez nem demorem tanto. A situação do rio hoje é pior do que há trinta anos e o Brasil depende muito mais do São Francisco hoje do que há trinta anos.

Há os projetos de irrigação, há o abastecimento ribeirinho, mas sobretudo há energia elétrica, que no Nordeste é praticamente toda gerada pelo São Francisco. Comprometendo-se o rio, compromete-se quase todo o abastecimento elétrico da região.

A reportagem da televisão dá razão aos que somos contra o projeto da transposição como foi posto pelo Governo.

A SRª PRESIDENTE (Iris de Araújo. PMDB - GO) - V. Exª ainda tem um minuto de prorrogação.

O SR. TEOTONIO VILELA FILHO (PSDB - AL) - Já estou concluindo. Mas, ver aquela reportagem, Presidente, em rede nacional, com toda a crueza de riachos que viraram caminhos de areia e lagos que se transformaram em areias desérticas não nos traz nem mesmo a gratificação moral de ver que estamos certos e que fazemos a nossa parte ao alertar para o risco e denunciar as políticas de destruição do rio.

Tudo isso só nos traz angústia e inquietação. Esse réquiem do São Francisco e de seus afluentes não pode tranqüilizar ninguém.

Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2005 - Página 41064