Discurso durante a 209ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Atuação das ONGs no Brasil. Descaso da Funasa no trato da saúde indígena.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Atuação das ONGs no Brasil. Descaso da Funasa no trato da saúde indígena.
Publicação
Publicação no DSF de 26/11/2005 - Página 41267
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • COMENTARIO, INTERESSE, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), AMBITO INTERNACIONAL, COMUNIDADE INDIGENA, MEIO AMBIENTE, EXPLORAÇÃO, RECURSOS MINERAIS, FLORESTA, REGIÃO AMAZONICA, APREENSÃO, LOBBY, AMEAÇA, SOBERANIA, GOVERNO BRASILEIRO, CRITICA, EXCESSO, AREA, DEMARCAÇÃO, RESERVA INDIGENA.
  • GRAVIDADE, SITUAÇÃO, SAUDE PUBLICA, TRIBO YANOMAMI, FRONTEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, CRITICA, ATUAÇÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAUDE, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), QUESTIONAMENTO, CONVENIO, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), AUSENCIA, ESCOLHA, UNIVERSIDADE FEDERAL, ESTADO DE RORAIMA (RR), EXERCITO, OCORRENCIA, GREVE, FALTA, ATENDIMENTO, DOENÇA GRAVE, INDIO, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, NOTICIARIO, IMPRENSA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho, freqüentemente - aliás, como é do meu dever -, ocupado esta tribuna para defender a região amazônica, à qual pertenço. Conheço a Amazônia não por ter lido, assistido a filme ou ouvido falar sobre ela, mas por ter nascido, sido criado e estudado lá. Portanto, toda a minha vida foi construída na Amazônia, no meu querido Estado de Roraima.

Srª Presidente, desde que assumi o meu mandato de Senador, em 1999, aliás, antes ainda, em 1988, como Constituinte, quando promulgamos a Constituição Federal que está em vigor, tenho observado um movimento muito forte de entidades internacionais para incluir na Constituição certos artigos que, obviamente, deveriam ser colocados, mas, talvez, não da maneira como o foram. A pressão internacional foi muito grande. Recordo-me de que, como Constituinte, recebi correspondências de várias entidades internacionais. Até o cantor Sting esteve aqui naquela época, tendo como cicerone, como guia, o cacique Raoni. As questões relacionadas com direitos indígenas, meio ambiente, exploração de recursos minerais e exploração das florestas tiveram a única e especial atenção desses grupos. O Governo brasileiro vem cedendo ao longo do tempo a essas pressões e demarcado de maneira exagerada as reservas. Gosto de pensar como médico: o remédio é bom quando está na dose certa, quando é exagerado, pode se transformar num veneno e até matar.

No caso de Roraima, o Presidente Collor, para ficar bem na foto com os gringos, demarcou uma reserva ianomâmi de nove milhões de hectares. Gostam muito de comparar o que ocorre na Amazônia, por exemplo, um desmatamento para agricultura ou para a pecuária, com campos de futebol ou com Estados pequenos, como é o caso de Sergipe, de Alagoas ou de Santa Catarina, sem dizerem nunca que a Amazônia representa 61% da área do Brasil, portanto mais da metade do Brasil, e, ao longo desses 505 anos de existência, a Amazônia não foi mexida sequer em 12% da sua área - mexida no sentido de construir cidades, construir vilas, abrir estradas, fazer assentamentos do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), enfim, com atos certos e alguns muito errados, mas não é mais do que isso.

O tema que quero abordar aqui me preocupa muito. Sempre digo: essas ONGs tentam colocar a pecha em mim de ser contra os direitos dos índios, contra os índios. Eu sou contra as ONGs que se utilizam da causa indígena para obter favores. No caso dos ianomâmis, que ocupam a fronteira do meu Estado, Roraima, com a Venezuela e também a fronteira do Estado do Amazonas com a Venezuela, há várias etnias que inclusive brigam entre si, se matam. Além disso, lá, como não poderia deixar de ser, a maternidade é muito precoce. A menina engravida logo após a primeira menstruação, e o número de mortes neonatal ou no momento do parto é muito grande.

Mais impressionante ainda é que essa população de índios é acometida de uma endemia chamada oncocercose, uma doença que maltrata as pessoas e pode levar à cegueira. A Folha de Boa Vista, do Estado de Roraima, disse que a doença atinge 15 mil ianomâmis e garimpeiros e será tema de uma conferência envolvendo os países que têm a Amazônia, como a Venezuela, a Colômbia, o Brasil e o Equador.

Na verdade, Sr. Presidente, o mais importante dessa questão que veio à tona é que a Funasa, para dar assistência àqueles índios, fez primeiramente um convênio com uma ONG chamada Urihi. E já denunciamos aqui irregularidades praticadas por essa ONG. A Funai fez convênio com outras instituições, entre elas, a Fundação Universidade de Brasília. Pergunto: por que não fez convênio com a Universidade Federal de Roraima, que está lá, conhece os problemas locais, tem curso de Medicina, já formou várias turmas? Por que não fez com a Universidade Federal de Roraima? Prefere dar o dinheiro para a UnB. No entanto, vejam bem, os funcionários que seriam pagos pela UNB estavam em greve e isso agravou o atendimento às comunidades indígenas, como também o não-pagamento dos vôos, porque a única forma de se chegar na Reserva Ianomâmi é por intermédio do avião ou por via fluvial, o que é muito difícil.

Quero, de antemão, requerer a V. Exª que essas matérias que eu vou citar sejam transcritas na íntegra, como parte do meu pronunciamento, para mostrar, Srª Presidente, como a Funasa vem conduzindo mal a questão da saúde indígena no País. Obviamente, eu não posso reclamar do atual Presidente da Funasa, que assumiu agora. É um homem que conhece - digamos assim - administração pública e reconheço que é bem-intencionado.

Mas eu quero frisar, por exemplo, que além dos Ianomâmis que estão na parte oeste de Roraima, outra ONG, o Conselho Indígena de Roraima, reclama também. Lerei somente uma parte: “Trinta e dois mil indígenas podem ficar sem assistência à saúde em Roraima.”

Isso aqui, como sempre, é um exagero, uma mentira por parte dessa ONG, porque 32 mil indígenas é o total que existe no Estado de Roraima. Inclusive, mais da metade deles mora na cidade de Boa Vista ou na sede dos municípios. Aldeados mesmo, não há sequer quinze mil indígenas. Mas a ONG que está, portanto, credenciada pela Fundação Nacional de Saúde diz que 252 aldeias estão sem atendimento médico por falta de repasses do convênio firmado entre o Conselho Indígena de Roraima (CIR) e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa).

Srª Presidente, já estive lá na região da reserva Ianomâmi, mais claramente na região de Surucucus. Existe uma aldeia indígena e existem as instalações do Exército Brasileiro. Pois bem. Por que, então, não fazer um convênio com o Exército, que sabemos, primeiro, vai cuidar da questão de maneira nacionalista, coisa que não creio que essas ONGs façam, já que até se travestem de ONGs para às vezes ter outras atividades?

Então, quero deixar aqui esta denúncia: primeiro, que os servidores querem garantia para retornar ao trabalho, pois a Funasa diz que a UnB vai descontar as faltas dos salários correspondentes. Há notícia de que há quinze mil ianomâmis infectados pela oncocercose e que, segundo informação do jornal, estão sendo tratados, mas é uma doença de difícil tratamento, de duração prolongada, e uma fundação estrangeira é que está fornecendo medicamento.

            Então, o Brasil está efetivamente “abrindo as pernas”, abrindo a guarda, para que organismos internacionais tomem conta de uma região imensa, como é a Amazônia, por esse viés da atuação nas reservas indígenas, nas reservas ecológicas, como é o caso da reserva ecológica da Ilha de Maracá, também no meu Estado.

Espero em breve ter uma audiência com o novo presidente da Funasa para levar todos esses detalhes, inclusive as denúncias que apuramos na CPI das ONGs - das “oenegês”, como querem chamar -, que indicou já a prática deletéria dessas organizações. Inclusive, no Estado de Rondônia, a Cunpir e a Paca estão sendo investigadas pelo Tribunal de Contas.

            Portanto, quero ler as manchetes. Primeiro, esta que diz que “32 mil indígenas podem ficar sem assistência à saúde em Roraima.” Não são 32 mil, mas merece ser registrado.

A empresa que faz o vôo para a Funasa diz que vai regularizar os vôos por quinze dias para a reserva Ianomâmi.

Matéria publicada no jornal Folha de S.Paulo diz que “índios ianomâmis invadem sede da Funasa em Boa Vista”.

Como que eles vieram lá da reserva Ianomâmi é que eu não sei, porque só vêm de avião.

“Saúde Ianomâmi - índios se revoltam e exigem ação da Funasa”.

E, finalmente, “Indígenas prometem fechar a sede do órgão.” Quer dizer a sede da Funasa.

Então, Srª Presidente, eu quero aqui reclamar da assistência precária prestada aos índios ianomâmis no meu Estado, dizer que, para fazer graça, demarcou-se uma reserva imensa em uma fronteira com dois países, a Venezuela e a Colômbia.

O mais importante, que é o ser humano, o índio, esse não está sendo atendido adequadamente nem na saúde, nem na educação, em nada. Quer dizer então que o índio, que é o que interessa, que é a pessoa humana, esse, nessa questão indígena no Brasil, é relegado a segundo plano. O importante é demarcar terras indígineas e não tratar de quem vive nelas, que são os índios.

Deixo essa denúncia aqui e vou solicitar uma audiência com o Presidente da Funasa, porque não entendo, primeiro, que em vez de se fazer o convênio para essa assistência com o Exército, ou com a Universidade de Roraima, ou com o Governo de Roraima, se faz com a Universidade de Brasília e com outras ONGs que atuam sem muito controle do Estado brasileiro.

Agradeço a atenção de V. Exª e peço, mais uma vez, que todo esse material seja transcrito na íntegra como parte do meu pronunciamento. 
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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno)

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Matérias referidas:

“32 mil indígenas podem ficar sem assistência à saúde em Roraima”;

“Empresa regulariza os vôos por 15 dias para reserva Ianomâmi”;

“Índios ianomâmis invadem sede da Funasa em Boa vista”;

“Saúde Ianomâmi - Índios se revoltam e exigem ação da Funasa”;

“Indígenas prometem fechar sede do órgão”;

“Reserva Yanomani.” (Folha de Boa Vista - Cidade)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/11/2005 - Página 41267