Discurso durante a 210ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comemoração dos trinta e três anos da Associação dos Juízes Federais do Brasil - AJUFE.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração dos trinta e três anos da Associação dos Juízes Federais do Brasil - AJUFE.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/2005 - Página 41364
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, ASSOCIAÇÃO NACIONAL, JUIZ FEDERAL, COMENTARIO, DESENVOLVIMENTO, JUSTIÇA FEDERAL, MINISTERIO DA SAUDE (MS), IMPORTANCIA, EQUIVALENCIA, PODERES CONSTITUCIONAIS, ANALISE, COMPETENCIA, JUDICIARIO, LEGISLATIVO, QUESTIONAMENTO, REFORMA JUDICIARIA, EXPECTATIVA, EMPENHO, MELHORIA, ATUAÇÃO, JUSTIÇA, BRASIL.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Tião Viana, Sr. Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça Federal, ilustríssima senhora que ornamenta a nossa Mesa, Senador Demóstenes, eu o estou saudando porque acho uma audácia o meu comparecimento a esta Tribuna.

Eu não tive a oportunidade de ouvir o seu pronunciamento, mas, com toda a certeza, o pronunciamento de V. Exª foi no mesmo ritmo, eu percebo, ou no mesmo tom, do discurso pronunciado pelo Senador Geraldo Mesquita, refletindo a realidade nacional no instante em que nos reunimos aqui para prestar uma homenagem à Justiça Federal.

Eu me abalanço a esta audácia de falar até de improviso.

Venho do Mato Grosso do Sul. O meu Estado pertence à Justiça Federal da 3ª Região. Sei aquilatar a responsabilidade da Justiça Federal, avaliar os avanços, constatar e prestar um depoimento sobre os avanços da Justiça Federal, pelo menos no Mato Grosso do Sul, Estado que eu modestamente represento nesta Casa, composto de somente 78 municípios, mas que possui a Justiça Federal de 1ª Instância representada na capital do Estado.

Mas não é somente ali. Está também na segunda cidade do Estado, Dourados. E não está somente em Dourados. Estendeu a sua competência e jurisdição a outros municípios, como Três Lagoas, minha cidade-berço, meu torrão natal. Foi para a capital do Pantanal, Corumbá, cidade fronteiriça com a Bolívia, que representa a capital ambiental do Pantanal. E por isso mesmo a Justiça Federal da 3ª Região ali instalou uma vara de defesa ambiental, de preservação da nossa luta pelo meio ambiente. E está também em Ponta Porã, fronteira com o Paraguai, com os seus magistrados às vezes correndo risco de vida naquela região fronteiriça, caminho - por que não afirmar isto com tristeza? - do tráfico, do comércio ilegal, clandestino, de drogas, armas de fogo. Está ali a Justiça Federal presente no Estado de Mato Grosso do Sul.

Como poderia eu deixar de comparecer aqui para tributar minha homenagem à Justiça Federal do Brasil, com os meus olhos voltados para a Justiça Federal que abrange o meu Estado, que abrange Mato Grosso do Sul? E que palavra posso dar depois da V. Exª, que veio do Ministério Público, marcadamente do Ministério Público que V. Exª tanto respeita e ama - posso assim afirmar -, depois que o Senador Geraldo Mesquita falou?

Tenho que dizer algumas palavras que têm que ultrapassar os limites do significado de uma simples homenagem, homenagem que é justa, como disse Geraldo Mesquita, que é merecida e que é oportuna, mas que nos leva a uma reflexão, sobretudo a uma reflexão democrática, Srs. Magistrados que aqui se encontram. Não conheço mais bela construção jurídica e democrática que o princípio constitucional da independência e da harmonia dos Poderes. E é difícil exercitar essa independência e essa harmonia dos Poderes. Nós estamos vivendo de uns anos para cá uma verdadeira transformação na sociedade brasileira, e sociedade ainda precisa entender. Para isso o Congresso Nacional tem que colaborar, para isso o Ministério Público tem que dar a sua parcela de responsabilidade, para isso a Justiça, também, tem que ter consciência dos seus atos e tem que bem refletir.

Eu venho do Ministério Público passageiramente, porque no Ministério Público, Senador Geraldo Mesquita, Srs. Magistrados, Srªs Magistradas, fiquei apenas três anos, quando recém-formado. Naquele tempo, não existia o que existe hoje, porque estamos num mundo em transformação, e a nossa sociedade está em transformação. O Ministério Público não ousava; ficava estritamente adstrito ao inquérito policial, àquilo que recebia: a denúncias, às suas alegações finais, aos seus recursos como movimentador da ação penal. Mas não ousava entrar na seara do Poder Executivo. Muito menos a Magistratura. A Magistratura era silente naquela ocasião, ficava adstrita aos processos judiciais, não ia mais longe do que isso, não se movimentava. Não havia canais de televisão. Os juízes eram mais retraídos. Não estou aqui fazendo considerações comportamentais.

Estou mostrando a evolução da sociedade democrática no mundo e no Brasil. Para uns, com algum desencanto, entendendo uma atitude que se queria ou se quer ainda ultraconservadora. Para outros, como nós, que entendemos o que é a interdependência dos Poderes, o que é a harmonia dos Poderes, o que é a evolução da democracia, pode haver excessos, mas isso é bom.

Nunca na minha vida de Promotor Público, Sr. Presidente, presenciei a impugnação de uma licitação pública. A apreciação disso pelo Poder Judiciário era muito difícil, era raro ocorrer. Hoje, às vezes, está difícil construir uma obra. Por quê? Porque quem perde se socorre imediatamente do Judiciário, que logo dá a sua decisão; vai ao Ministério Público, que imediatamente procede. Pergunto: isso está errado ou certo? Eu acho que está certo desde que procedamos como se quer na antiga doutrina. Aí sim vamos ficar com os ensinamentos dos clássicos. Vamos respeitar isto, mas não vamos exagerar na nossa conduta, não vamos ficar no tecnicismo jurídico, em um país que precisa caminhar, que está à espera de respostas que não vêm.

A sociedade precisa compreender que talvez seja normal dormir-se com uma liminar e acordar-se com outra, dormir-se com alguém no poder e depois de duas horas a faixa presidencial ou os nossos mandatos legislativos terem sido passados para outras pessoas. Mas isso não existia, e é o que quero afirmar aqui.

Não estou condenando a ação do Ministério Público e da Justiça, mas dizendo que precisamos prestar atenção em nossas responsabilidades e levá-las ao conhecimento da sociedade.

Senador Tião Viana, permita-me dizer-lhe algo que também é uma reflexão sobre o papel do Congresso Nacional: se continuarmos assim, pode saber que a sociedade vai tomar a dianteira por algum de seus órgãos. Se nós aqui do Congresso Nacional, diante de tanta conturbação moral e política que o País atravessa, não agirmos dentro das nossas competências, não assumirmos a responsabilidade imediata pelos nossos atos de atendermos aos reclamos da sociedade, as instituições sociais, a própria sociedade vai reagir a isso e, aí, o Congresso Nacional vai a reboque. Não é o que convém a ninguém. O que convém a todos nós, nesta hora, neste momento, é que se faça isso.

Por exemplo, a sociedade reclama uma reforma do Judiciário. Será que a reforma está na lei ou está em dotar o Judiciário de mais estrutura humana e material? O que é verdadeiramente a reforma do Judiciário? Será que essa reforma do Judiciário que fizemos aqui foi a esperada pela sociedade? Só o será, Sr. Presidente, Srs. Magistrados, se a sociedade verificar isso concretamente. Se os processos continuarem a ter uma demora interminável - não estou aqui culpando nem o Judiciário, nem o Ministério Público, nem ninguém -, com os cidadãos aguardando uma resposta do Poder Judiciário, será um desastre para a sociedade. Como será e é um desastre para a sociedade quando ela espera que o Congresso Nacional proceda à reforma nas suas estruturas, decidindo, por exemplo, sobre a reforma política.

Que os juízes não achem que estou aqui a criticar. Não, o meu objetivo não é esse. O meu objetivo é fazer um chamamento à Nação, um chamamento à responsabilidade de todos os Poderes da República, de todos nós: vamos logo responder aos anseios da sociedade.

Por isso comecei o meu discurso, Sr. Presidente da Associação dos Magistrados, fazendo referência à Justiça Federal, àquela que conheço mais de perto, que é a do meu Estado. Não é bom, então, haver uma Justiça Federal, num Estado com 78 Municípios, algumas comarcas estaduais, e haver a Justiça Federal na fronteira, ali perto, por onde entra aquilo que todos nós não desejamos, as drogas? Não é bom ter a Justiça Federal em Corumbá, em Dourados? Não é bom ter a Justiça Federal numa cidade como a minha, que faz fronteira com São Paulo? É sim! Por isso é que digo que precisamos de melhor estrutura, temos que atender a isso. E entendo que estamos avançando.

Vejo jovens juízes atentos. A maioria dos membros da Justiça Federal é composta, Sr. Presidente, de gente que não precisa ter 35 anos. Nós, Senadores, precisamos ter 35 anos. E, às vezes, não temos a reflexão e a ponderação do magistrado de 25 anos, de 26 anos, com o seu entusiasmo, com a sua mocidade, com o seu idealismo, arriscando, como se disse aqui, a própria vida para distribuir justiça aos cidadãos.

Portanto, é justo sim que aqui compareçamos e prestemos essa homenagem à Justiça Federal, tão jovem no nosso País, mas depositária das esperanças de todos nós, porque alguém disse aqui que a Justiça é imprescindível para o exercício da democracia.

Faço algumas confissões, como fiz sexta-feira, desta tribuna. Dizem que decisão do Judiciário não se discute, cumpre-se. Fico com a última, penso que se cumpre, mas discute-se sim, porque numa democracia tudo pode ser discutido, tudo pode ser falado abertamente. E longe de mim, Sr. Presidente, que as minhas palavras possam ser interpretadas aqui como qualquer crítica ao Poder Judiciário do nosso País. Minhas palavras devem ser interpretadas com aquele sentimento que demonstro. Estou falando com o meu coração, Sr. Presidente. Estou falando aquilo que a sociedade pensa. A sociedade não pode dormir de um jeito e acordar de outro. É preciso haver uma solução para esses fatos. Não se pode interromper uma obra sem a sociedade receber uma explicação. Para a sociedade, não pode haver obras superfaturadas, não pode haver cambalacho. A Justiça deve colaborar com isso, conforme está colaborando, mas é necessário haver razões suficientes para fazê-lo, porque não é possível a intromissão de um Poder em outro. Noto isso no próprio Poder Executivo.

Estou fazendo uma crítica - assim a considerem - à transformação do processo democrático que estamos vivendo. Para não dizerem que estou falando apenas no Judiciário, embora esteja com os olhos voltados para o Judiciário com os meus aplausos, ressalto que, no próprio Poder Executivo, existe inconformismo.

Srs. Senadores, conheço várias obras do nosso País. Há obras que já funcionam no Brasil na barranca do rio Paraná ou no rio Paraná. Há duas usinas que compõem o Complexo de Urubupungá, com 4,6 milhões quilowatts. Sr. Presidente, quando essas obras foram concluídas, eu não era Senador da República; eu trabalhava no Estado, ainda como advogado. Fui Prefeito na década de 1970, e as obras já estavam concluídas. Vou fazer uma confissão a V. Exªs. Ainda não existe licença ambiental para as usinas que estão funcionando. Sr. Presidente, isso é um absurdo. O próprio Executivo paralisa suas obras. Portanto, não estou criticando o Poder Judiciário. Estou apenas fazendo uma reflexão por ser sincero e por acreditar nos senhores, na Justiça do meu País e, principalmente, na Justiça Federal. Foi onde eu menos atuei. Talvez, por isso, seja, das Justiças - se é que se podem separar Justiças -, aquela em que mais deposito esperanças. Fui poucas vezes, como advogado, bater às portas de um Juiz Federal. Não existia nem Justiça Federal no então Estado de Mato Grosso - nem no Estado de Mato Grosso, na época em que comecei a advogar.

Portanto, entendam assim as minhas palavras. Venho aqui, com essa satisfação e esse orgulho, dizer aos senhores parabéns. Não se intimidem. Democracia é isso mesmo. Ninguém constrói uma democracia bacana da noite para o dia, mas trabalhando e sobretudo não tendo medo de decidir contra os poderosos, julgando principalmente as causas que mais interessam àqueles que mais necessitam.

Nesse sentido, a Justiça Federal também está levando vantagem, porque tem, igualmente, o Juizado de Pequenas Causas, como existe na Justiça comum. Mas, nesta e talvez na Justiça Federal, também teremos que caminhar mais, porque, às vezes, se marca audiência para seis meses depois, Sr. Presidente. Está na lei a reforma ou a questão está numa reforma das estruturas ou na necessidade de mais Juízes e mais agentes públicos no Poder Judiciário? Fazer só leis não adianta.

E, para concluir o meu raciocínio, Sr. Presidente, quero dizer que a lei será muito estreita para conter a imensidão da realidade humana, principalmente quando essa imensidão se refere à alma, à vida, à liberdade, às garantias e aos direitos individuais do ser humano. Aí, Sr. Presidente, a lei será sempre pequenina. E será preciso o talento de quem? O talento dos juízes que, hoje, homenageamos no Senado da República. Fez bem quem requereu isso, e penso que tenha sido, V. Exª, Senador Demóstenes, para que pudéssemos manifestar nossa esperança, nossa vontade de transmitir a cada um dos senhores o nosso afeto e o nosso carinho, porque, quando disse que a lei é muito pequena para conter a imensidade humana, a imensidade da realidade e dos fatos, estou querendo dizer que, acima da lei, tem de estar a justiça. Esta nunca deve prevalecer àquela, não deve chegar a esse ponto, mas a lei tem de fazer um casamento, que não pode ter divórcio. A decisão há de ser uma decisão de direito, e não existe direito se este não for aplicado com justiça. E isso não está na lei, mas em nossa vocação, dentro de nós, em nosso sentimento, em nosso bom senso.

Por isso, mais uma vez, Senador Tião Viana, V. Exª que tem presidido grandes sessões aqui no Senado da República, inscreva esta no currículo da sua vida. V. Exª está presidindo uma sessão de homenagem ao Poder Judiciário, no qual o Brasil confia. O Brasil haverá, por meio do Congresso Nacional, apesar de nossos índices estarem baixos, de dar um avanço, sim. Vamos caminhar e, agora, desculpe, alcançar um “ibope” um pouco melhor do que o que já temos. Para isso, em relação àquilo que conversamos, Senador Tião Viana, há a necessidade de o nosso Congresso, ao invés de falar, fazer, atribuindo-se a sua competência.

Pergunto - estamos no fim do mês de novembro -: cadê a reforma política para conter essas mazelas? Está parecendo novela mexicana. Estou com vontade de falar mesmo: está parecendo novela mexicana! Há de tudo nas CPIs. Há de tudo nas CPIs. Há averiguação de crimes. Elas não acabaram seus trabalhos. E não vai aqui crítica alguma: mas, senhores, se há muita coisa ligada à política, por que não fazer? Fizemos aqui uma reforma do Judiciário. Comungo com a opinião do Senador Geraldo Mesquita. Não votei contra, porque tenho uma opinião diferente da dele. O que é para melhorar um pouquinho já voto a favor. Sou mais generoso. Mas, pelo menos, fizemos a reforma do Judiciário e podemos melhorá-la cada vez mais. Mas e a reforma política?

Termino, assim, para não dizer que critiquei o Judiciário, deixando bem claro que confio na Justiça do meu País, confio na Justiça Federal. E V. Exª, Sr. Presidente, é testemunha disso. Quantas vezes não estivemos juntos? E quantas vezes não estudamos os assuntos, recebendo, até com um certo orgulho para mim, as opiniões que V. Exª, em nome da Justiça Federal, nos procurava trazer, quando discutíamos a reforma do Poder Judiciário? Reforma significa costurar, consertar etc. E isso não está só na lei, não. Vamos fazer alguma coisa para melhorar ainda mais.

Minhas palavras, portanto, feitas de improviso, podem gerar interpretação. Será que preciso repetir que estou falando do fundo do meu coração e que estou aplaudindo o Poder Judiciário, aqui, no caso, a Justiça Federal, e apenas pedindo que tenhamos os ouvidos colados à realidade da vida? Porque outro dia fiz uma abordagem na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e diziam que eu estava pedindo que determinado órgão do Governo julgasse contra a sociedade. Não! Quando eu pedia para ouvir a sociedade, para prestar atenção à sociedade, eu estava pedindo para julgar de acordo com os interesses da sociedade. Todos nós, agentes públicos, não somos apenas aqueles que detêm mandatos. Somos nós, do Judiciário, do Executivo, do Legislativo, do Ministério Público, do oficial administrativo, todos nós que temos a responsabilidade de construir um Brasil que precisa de projeto, sim.

Daí, quando falamos, em uma homenagem como esta, desculpem-me, mas não vou cantar parabéns, não é preciso, para dizer que estou homenageando os senhores.

Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/2005 - Página 41364