Discurso durante a 210ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Transcrição da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2004, realizada pelo IBGE. Comentários a artigo de autoria do jornalista Ricardo Westin intitulado "Brecha na lei tira R$ 9 bilhões da saúde", publicado no jornal O Estado de S.Paulo.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. SAUDE.:
  • Transcrição da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2004, realizada pelo IBGE. Comentários a artigo de autoria do jornalista Ricardo Westin intitulado "Brecha na lei tira R$ 9 bilhões da saúde", publicado no jornal O Estado de S.Paulo.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/2005 - Página 41475
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. SAUDE.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, PESQUISA SOCIO ECONOMICA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), AVALIAÇÃO, DADOS, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, BRASIL, POSSIBILIDADE, REVERSÃO, DESIGUALDADE SOCIAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, CRISE, SAUDE PUBLICA, DENUNCIA, DESVIO, RECURSOS, FRAUDE, LEGISLAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFERENCIA, INCLUSÃO, PROGRAMA, ASSISTENCIA SOCIAL, GASTOS PUBLICOS, OBRIGATORIEDADE, PERCENTAGEM, APLICAÇÃO, SETOR, ESTADOS, MUNICIPIOS.
  • CRITICA, DEMORA, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR (PLP), AUTORIA, ORADOR, APROVAÇÃO, SENADO, REGULAMENTAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, SAUDE.

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente minha intenção era me reportar ao trabalho desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no que diz respeito à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2004, que traz dados extremamente confortantes para a sociedade brasileira, para aqueles que analisam as políticas sociais, e traz a esperança de que possamos, de fato, reverter a curva das desigualdades e a curva da concentração de renda no Brasil.

            Esta matéria foi tão bem debatida pela Senadora Ideli Salvatti que não me sinto em condições de trazê-la ao debate. Apenas solicito, quanto a esses aspectos, que a Mesa acolha, como anexo ao meu pronunciamento de hoje, a pesquisa feita com 400 mil pessoas em cerca de 139 mil domicílios no Brasil, que interpreta toda a evolução da inclusão social brasileira, indiretamente da qualidade de vida do povo brasileiro. Mostra, de fato, uma tendência de rompimento com as desigualdades sociais tão cruéis, tão impiedosas, que temos testemunhado e diante das quais temos nos sentido tão impotentes ao longo dos anos.

            Solicito à Mesa que publique na íntegra esse material como anexo ao meu pronunciamento.

Aproveito para cumprimentar hoje o jornal O Estado de S. Paulo por uma matéria também muito lúcida, extremamente atual e sensibilizada com a grave crise que se abate ao longo de todos esses anos na saúde pública do Brasil, feita pelo jornalista Ricardo Westin, cujo título é “Brecha na lei tira nove bilhões da saúde”.

Temos testemunhado, Senador Mão Santa, todos os parlamentares, em algum momento, apresentarem sua indignação, sua crítica, sua intolerância com a crise que se abate sobre a rede hospitalar, sobre os indicadores de saúde pública no Brasil.

Temos, ao mesmo tempo, um belíssimo arcabouço jurídico-institucional, um desenho de gestão pronto para ser muito bem executado, que diz respeito à concepção e à execução legal do Sistema Único de Saúde e, por outro lado, um vetor do funcionamento do Sistema Único de Saúde, que foi a Emenda Constitucional nº 29, aprovada ainda no ano de 2000, cujo autor foi o Deputado Eduardo Jorge. Foi uma luta travada por toda a chamada comunidade de sanitaristas do Brasil, das diversas áreas da saúde pública.

Lamentavelmente, temos esta realidade apontada por estudos de jornalistas e por alguns estudiosos da área de saúde pública, um desvio da ordem de R$9 bilhões da saúde pública brasileira por artimanhas entre gestores municipais, estaduais e federais com os recursos da saúde.

Ora, se temos um Orçamento da ordem de trinta e poucos bilhões de reais, como se pode imaginar os gastos com saúde tendo uma retração da ordem de R$9 bilhões? Aí, o que vamos observar dentro de um hospital, na fila de um hospital, dentro de um centro de saúde, na fila de um laboratório, na hora da transferência de um doente, por um caso de necessidade, para uma unidade de melhor complexidade em saúde pública? Vamos ver a dificuldade instalada. Vamos ver o momento da desatenção, muitas vezes o momento do abandono, em razão desses recursos subtraídos da atividade do Poder Público nas suas obrigações.

A Emenda nº 29 estabeleceu regras claras sobre o percentual da receita que deve ser gasto pelos Municípios e pelos Estados com a saúde pública.

Infelizmente, a subtração ocorre. Vejam o exemplo do Rio de Janeiro, onde, conforme se diz aqui, o Governo contabiliza programas assistenciais, como o Cheque-Cidadão, restaurante popular e até programa de despoluição da Baía de Guanabara. O Rio Grande do Sul inclui servidores inativos da saúde, uma coisa lamentável, algo que nos assusta. Quando nós olhamos os números, quando vemos restaurante popular sendo incluído, Senador Cristovam!...

Há um debate em torno da MP nº 261, em que os Deputados entraram num confronto direto com a União, dizendo que não aceitariam que transferência para o Fome Zero pudesse ser incluída. É o único item que eu tenho dúvida. Esse debate tem que ser travado.

Na minha opinião, o combate direto à fome é um recurso diretamente vinculado à saúde pública, sim. Os outros não. Os outros são indiretos, são distantes o suficiente e podem ferir uma concepção de saúde pública. Esse não. Agora, o que deve ser observado de maneira muito concreta é a precária presença do investimento necessário em saúde.

Os irmãos do Uruguai gastam US$600 per capita por ano em saúde; os irmãos argentinos, US$450; o Brasil, em torno de US$200. Então, há uma dívida de financiamento, sim, e somada a essa dívida está a crueldade de alguns gestores, que subtraem recursos por magia na justificativa orçamentária, driblando o Tribunal de Contas da União, Tribunais de Contas dos Estados e Tribunais de Contas dos municípios. Os argumentos são os mais diversos: é saneamento básico, é isso e aquilo, e o recurso da saúde desaparece.

Temos uma subtração formal de 12% dos municípios brasileiros. Nós estamos falando de quase 600 municípios que não cumprem a Emenda Constitucional nº 29. Quatro dos 27 Estados da Federação não estão cumprindo a Emenda Constitucional nº 29. Quatro!

Quando nós analisamos de maneira mais atual, dos 17 Estados que enviaram seus balanços de 2004 para o Ministério da Saúde, 13 ficaram acima dos 12% mínimos. Então, somente 13 ficaram acima. Os outros não mandaram. Vinte e dois por cento dos municípios brasileiros não informaram, ainda, ao Ministério da Saúde quais foram seus gastos reais com saúde pública no ano de 2004.

Vivemos um verdadeiro drama. E o que poderia corrigir isso, que é a regulamentação, por meio de uma lei complementar à Emenda Constitucional nº 29, não é aprovada no Congresso Nacional, que é outra prerrogativa única e exclusivamente colocada em nossas mãos.

Sou autor do Projeto de Lei Complementar do Senado nº 35, apresentado em 2002, aprovado unanimemente nesta Casa e enviado à Câmara dos Deputados, mas aquela Casa não o aprova. O que poderia ser a obrigatoriedade dos gastos aplicados com saúde e o que é gasto com saúde e saúde pública, quais os limites mínimos que têm que ser cumpridos, isso não pode ser feito porque a lei complementar não foi aprovada. Daí a subtração de nove bilhões para um País com tão pouco financiamento em saúde.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Pois não.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Quis Deus que agora estivesse na Presidência da sessão o ex-Governador Cristovam Buarque. E V. Exª tem um irmão extraordinário que é Governador de Estado. Mas atentai bem para esta reflexão: deveria haver hierarquização. Jamais se poderia ser Presidente da República sem ser prefeitinho. É preciso uma lei nesse sentido. Atentai bem: para ser Papa, é preciso uma seqüência. V. Exª representa a mais importante hierarquia: o magistério. V. Exª foi estudante, residente, pós-graduado, fez mestrado e agora é professor concursado. Existe hierarquia. E para entender isso - atentai bem! - quis Deus estivesse na Presidência o Prof. Cristovam Buarque, que vai me entender. Arrecadação: 50%, no mínimo, é gasto com o funcionário público. Existe a Lei Camata, que alguns extrapolam. A educação merece os 25%. Nessa lei, há os 15%. Existem também as obrigações de um Governador de Estado; o Poder Legislativo, suas Assembléias, em torno de 5% a 6%; o Poder Judiciário, em torno de 5% a 6%. É isso que o Presidente Lula tem de saber. Há também o Ministério Público, que é caro. E tem uma dívida externa - é a única que se pode mudar. Ninguém pode governar acabando a educação, acabando a saúde - que V. Exª defende - acabando o Poder Legislativo, o Poder Judiciário, o Ministério Público. Só, a única coisa que pode ser mutável é uma renegociação das dívidas, porque os Governadores do Estado estão todos eles submetidos a quase 20%. E isso não se fala. Isso não se fala porque ofende o senhor, o deus do governo brasileiro, que são os banqueiros. Então, o erro está aí. Nós temos que defender esse orçamento da saúde, da educação, mas só podemos mexer - no meu entender, que é muito, porque eu fui prefeitinho e governei um Estado brasileiro - é na renegociação da dívida externa. Nessa não se fala porque é o deus, é o deus do Palocci, do Meirelles e do Lula, que acompanha a ladainha que eles rezam.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço, Senador Mão Santa.

Sr. Presidente, o que confirma a minha preocupação nisso tudo é a certeza de que nós temos uma regra de financiamento para a saúde que não é clara. Os Estados não têm clareza da progressão que devem ter no financiamento para a saúde pública; os Municípios não têm. Vivem essa fase de engessamento, em razão de dívidas herdadas, de incorreções praticadas em gestões anteriores e da enorme carga de vinculação financeira que tem suas obrigações por normas constitucionais e do fato de que o País não entende saúde pública como deveria entender.

            A verdade é que o financiamento é precário, o cumprimento dos Estados e dos Municípios é muito precário, a omissão dos órgãos fiscalizadores é grande. E aquilo que poderia ser um marco regulatório definitivo no financiamento público para a saúde no Brasil não é feito, porque a lei complementar, de minha autoria, está tramitando nesta Casa há vários anos. No Senado, já foi aprovada, mas e está parada na Câmara dos Deputados.

Então, fica aqui o registro e os cumprimentos ao jornal Estado de S. Paulo, ao jornalista Ricardo Westin, por extraordinária matéria, atual, completa em termos de dados e análise. Que isso possa servir como estímulo ao Parlamento para ele vote! O Deputado Rafael Guerra, que é do PSDB, tem travado essa batalha na Câmara dos Deputados, na Frente Parlamentar da Saúde, e tem tido o meu apoio e espero que possamos ter êxito na aprovação dessa matéria na Câmara dos Deputados. O tempo urge, a crise do setor deixa aflitos todos os que têm compreensão justa com a saúde pública e espero que a Câmara dos Deputados cumpra a sua parte.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR TIÃO VIANA EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Brecha na lei tira R$9 bi da saúde;

“Pesquisa nacional por amostra de domicílio 2004;”

“IBGE.”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/2005 - Página 41475