Pronunciamento de Íris de Araújo em 30/11/2005
Discurso durante a 212ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Manifestação contra a política de juros praticada pelo governo e apelo no sentido de haja mais ousadia no corte dessas taxas.
- Autor
- Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
- Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
- Manifestação contra a política de juros praticada pelo governo e apelo no sentido de haja mais ousadia no corte dessas taxas.
- Aparteantes
- Almeida Lima.
- Publicação
- Publicação no DSF de 01/12/2005 - Página 41968
- Assunto
- Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
- Indexação
-
- COMENTARIO, DECLARAÇÃO, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, REITERAÇÃO, OPOSIÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, SUPERIORIDADE, JUROS, OCORRENCIA, DIVERGENCIA, AUTORIDADE, GOVERNO FEDERAL, PERDA, CRESCIMENTO ECONOMICO, PRODUÇÃO, EMPREGO, FAVORECIMENTO, BANCOS, FRUSTRAÇÃO, CLASSE PRODUTORA, PARALISAÇÃO, POLITICA SOCIAL.
A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao participar, anteontem, de um seminário promovido pela Federação das Indústrias de São Paulo, o Vice-Presidente da República, José Alencar, foi veemente ao criticar as altas taxas de juros no Brasil. Ao comentar a atual política econômica brasileira, ele se posicionou firmemente contra as decisões do Comitê de Política Monetária - o Copom -, que, na semana passada, até decidiu reduzir a chamada Selic, mas em apenas meio ponto percentual.
“Juros altos elevam a dívida pública. São uma irresponsabilidade fiscal” - protestou incisivamente o Vice-Presidente, completando: “Temos construído um déficit que faz crescer a nossa dívida, hoje, em 50% do PIB”. Não foi a primeira vez que José Alencar se posicionou claramente contra os juros. Muito menos foi a primeira crítica feita por um membro da própria equipe que hoje ocupa o Palácio do Planalto.
Hoje mesmo o Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, ao chegar em Porto Iguaçu para o encontro dos Presidentes da Argentina e do Brasil vão se encontrar, disse que o resultado do PIB no terceiro trimestre - palavras do Ministro Furlan - “é preocupante, porque mostra que a economia está reagindo ao aperto financeiro das taxas de juros e contenção de investimentos”. Também hoje, ouvi, por meio da Rádio Senado, que o Presidente desta Casa, Senador Renan Calheiros, criticou os juros altos, culpando-os pela maior queda do PIB em dois anos e meio.
Sabemos que as rugas causadas pela política são antigas e inúmeras, como exemplificou recentemente, o embate entre o Ministro Antonio Palocci, da Fazenda, e a Ministra Dilma Roussef, do Gabinete Civil.
A despeito de toda a crise e tiroteio que continua a castigar o Governo do Presidente Lula, o Copom preferiu seguir firme e inabalável na trajetória, que é histórica, de apostar nos juros mais altos do mundo como suposto mecanismo de combate à inflação. O problema é que a inflação já caiu desde o Plano Real de Fernando Henrique Cardoso, mas os juros nossos de cada dia permanecem lá no patamar mais elevado, provocam desaquecimento econômico e impõem um freio no consumo. Isso significa menos crescimento, menos produção, menos emprego.
Por mais que nos expliquem, nós que não possuímos formação em teoria econômica, continuamos a ver navios, porque o agricultor só fala em perdas na atividade; o industrial reclama da falta de mercado, e o trabalhador, além do desemprego, tem nos R$300 o menor salário mínimo do mundo.
Só os banqueiros não reclamam, é lógico.
Os que entendem do assunto falam que o Copom teria margem para fazer algo mais ousado por meio do corte de um ponto percentual. Dizem que isso não afetaria a inflação futura e daria mais vigor à economia, em especial às vendas de fim de ano, que se aproximam, pois, já estamos no final do ano, o que significaria mais trabalho e mais renda para o povo.
Mas, os técnicos do Banco Central fazem ouvidos moucos, já que eles não costumam ouvir a voz de quem está na lida diária da economia. O que vale é o gráfico e a projeção tendo em vista uma meta de inflação já estabelecida. Enquanto isso, de acordo com o IBGE, a produção da indústria fechou o terceiro trimestre deste ano com uma queda de 0,7%.
Não seria, Sr. Presidente, culpa dos juros agressivos?
No ritmo da análise crua, vamos ser mais diretos e concluir que esse corte de meio ponto foi, na verdade, decepcionante.
Para manter o equilíbrio, vamos analisar as duas faces da moeda. Seguindo os argumentos do Banco Central, que mal faria um corte um pouquinho maior se os efeitos da política de juros sobre os preços demoram até seis meses para serem percebidos? Ou seja, uma mudança mais profunda nos juros teria influência somente na inflação de 2006. Seguindo os argumentos do setor produtivo, podemos concluir que as expectativas foram frustradas, e o segmento tem toda razão em se chatear, porque o Brasil necessita, como nunca, de investimentos internos para gerar crescimento econômico e distribuição da renda nacional, que, sempre é bom destacar, permanece uma das mais concentradas do mundo.
O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - V. Exª permite-me um aparte?
A SRª ÍRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Ouço V. Exª com o maior prazer.
O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Senadora Íris de Araújo, solidarizo-me com o pronunciamento de V. Exª. Mas o engraçado - e é engraçado mesmo - é que vivemos, hoje, em dois brasis - não aqueles que os economistas e sociólogos do passado falavam -: o brasil real, que é o Brasil da pobreza, da concentração de renda, da miséria que presenciamos por onde andamos no interior do País, e o outro Brasil, o Brasil da ficção, dos números bonitos, o Brasil da Senadora Ideli Salvatti e do Senador Aloizio Mercadante, o Brasil deste Governo, que defende esta política que não deixa de ser uma política miserável para o nosso País. Essa política representa exatamente a lógica do absurdo, que é a vontade deliberada de frear a economia, o crescimento. Isso importa em geração de renda e diminuição de pobreza. Mas há uma vontade deliberada de frear, na busca desse superávit primário cada vez maior para pagar os juros da dívida. Ou seja, essa política é resultante de uma vontade perversa, assentada exatamente no que chamam de ortodoxia liberal, que busca o crescimento apenas daqueles que trabalham com o capital, exclusivamente; aqueles que não têm a preocupação de gerar riquezas efetivas, de produzir, de abrir uma indústria, de ampliá-la, de gerar empregos. Para esses, que não são os empresários do capital, que são os empresários que produzem efetivamente a riqueza, evidentemente que esse tipo de economia não serve. Esse modelo de macroeconomia - porque dizem eles que o problema da economia brasileira é de microeconomia; mas, não, o problema é da macroeconomia mesmo - serve a quem tem capital, a quem ganha sem suar, sem trabalhar, sem contratar, sem gerenciar, sem colocar o seu dinheiro em risco no empreendimento. Mas aqueles que labutam diariamente, que têm de estar na fábrica de manhã cedo, para esses a economia não serve, muito menos para os trabalhadores brasileiros. Portanto, presto solidariedade ao pronunciamento de V. Exª.
A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB-GO) - Sr. Presidente, peço a V. Exª uns minutos a mais, por favor.
Agradeço-lhe pelo aparte, Senador. V. Exª tem toda a razão. Realmente este aparte acrescenta.
Há tantas coisas erradas neste País que levam à exaustão.
Creio que os juros altos viraram unanimidade nacional. Ninguém agüenta mais! Será que o Brasil inteiro está errado e somente a equipe econômica do Governo está certa? Devem ser mais inteligentes que todos os brasileiros, não é? Porque, somente uma estratégia acima da compreensão das pessoas comuns pode explicar essa obsessão por taxas tão magníficas e tão espetaculares.
A inflação já não é mais aquele dragão assustador. O monstro perdeu muito de sua fúria. Mas, vira e mexe, ela serve de bode expiatório para manter os juros na estratosfera. Enquanto isso, os indicadores sociais batem com força na nossa alma, e vem ano, passa ano e não se percebe nada de novo na educação, na saúde etc.
Tudo estagnado!
E vêm as estatísticas que confirmam aquilo que sentimos no dia-a-dia: o sofrimento de nosso povo continua de doer o coração, mas as mãos dos governantes estão atadas, porque os técnicos acham que o tal superávit primário é mais importante do que o leite e o pão na mesa das nossas crianças.
Esse tipo de técnica, esse tipo de inteligência é de uma dureza atroz. Ao final da estratégia, gostaria muito de saber quem vai contar as vidas perdidas pela fome e quem vai se responsabilizar pelos jovens e adolescentes apartados das salas de aula que acorreram às ruas para roubar e matar.
Esperávamos que os atuais governantes fossem ter a atitude revolucionária de marchar contra a maré e modificar o malfeito, mas, nada... Vamos ter que esperar mais...
Mas já não estamos cansados de esperar?
Li outro dia que a produção nacional é pouco competitiva quando disputa uma fatia maior do mercado internacional. Dizem que nosso comércio exterior é irrelevante e equivale a apenas 10% do PIB. Informam que o México, cuja economia equivale à do Estado de São Paulo, exporta duas vezes mais do que o Brasil. E explicam que tudo isso acontece porque quem produz não suporta estes juros amargos, muito menos a pesada carga de impostos e mais os tributos incidentes em cascata. É o que chamam de custo Brasil.
Pois bem, taxas de juros altas serviriam apenas para ajustes de emergência em situações muito especiais. Mas, no Brasil, virou prática permanente, e ninguém desgruda dela. Desse jeito, como competir se o nosso vizinho México trabalha com créditos a 5,5% ao ano, a União Européia a 3,5% e os Estados Unidos a 1,25% ao ano?
Desse jeito, podemos muito bem concluir que os juros altos estão aí porque são o instrumento que mantém os privilégios e os ganhos astronômicos de uma elite muito poderosa, que financia campanhas eleitorais, que indica pessoas-chave para os cargos importantes, que se eterniza nas estruturas de poder independentemente de quem vença os pleitos.
Temos taxas recordes de desemprego, de analfabetismo, de mortalidade infantil, de pobreza, mas é estranho porque ao mesmo tempo os bancos arrancam os maiores lucros de toda a nossa história.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB - MA) - Senadora, eu gostaria que V. Exª concluísse, por gentileza. Vou dar-lhe mais um minuto.
A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Obrigada.
Quanto mais os bancos ganham, mais perdem a produção e a renda dos trabalhadores. Não seria, então, o caso de diminuir os gastos com a dívida pública porque a produção continua sacrificada com impostos e com juros altos, enquanto o capital especulativo está protegido e, às vezes, tem até o socorro direto da União quando passa dos limites e quebra?
De janeiro a setembro deste ano, somente duas das maiores instituições financeiras do País tiveram lucro de R$7,878 bilhões, porque nunca se experimentou um período tão longo de juros elevadíssimos como nesta fase da vida nacional.
Tenho mais algumas observações a fazer sobre os juros, que estão a todos enforcando. Todos estão sentindo essa ansiedade, essa angústia. Às vezes, venho ao microfone e extrapolo o tempo, como fiz agora.
Peço a compreensão de V. Exª, Sr. Presidente. Gostaria que meu discurso fosse dado como lido.
Obrigada.
*********************************************************************************
SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SRª SENADORA IRIS DE ARAÚJO.
‘********************************************************************************