Discurso durante a 212ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do assassinato de Jaelson dos Santos, dirigente do Movimento dos Sem-Terra de Alagoas, ocorrido ontem. Críticas ao governo por não enfrentar o problema da reforma agrária. (como Líder)

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. REFORMA AGRARIA.:
  • Registro do assassinato de Jaelson dos Santos, dirigente do Movimento dos Sem-Terra de Alagoas, ocorrido ontem. Críticas ao governo por não enfrentar o problema da reforma agrária. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/2005 - Página 42018
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • GRAVIDADE, HOMICIDIO, LIDER, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, ESTADO DE ALAGOAS (AL), ANTERIORIDADE, RECEBIMENTO, AMEAÇA, MORTE.
  • ANALISE, VIOLENCIA, CAMPO, VOTAÇÃO, INJUSTIÇA, RELATORIO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, TERRAS.
  • FALTA, PRIORIDADE, GOVERNO BRASILEIRO, REFORMA AGRARIA, POLITICA AGRICOLA, PEQUENO PRODUTOR RURAL, ECONOMIA FAMILIAR, DADOS, CENSO AGRICOLA, NUMERO, PERDA, PROPRIEDADE RURAL, EXECUÇÃO, CREDITO AGRICOLA, NEGLIGENCIA, GOVERNO, DESCUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, PROPRIEDADE IMPRODUTIVA, PROTESTO, OCORRENCIA, PROVIDENCIA, POSTERIORIDADE, VIOLENCIA.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem, em Alagoas - inclusive nosso querido Deputado João Alfredo, do P-SOL do Ceará, já havia anunciado isto -, foi assassinado mais um dirigente do Movimento Sem Terra de Alagoas.

Jaelson dos Santos, de 25 anos, foi morto com cinco tiros de revólver na cabeça, enquanto dirigia uma motocicleta, no Município de Atalaia, por dois pistoleiros, que fugiram em outra moto em direção à BR-316.

Horas antes, a vítima tinha participado de uma aula junto ao Movimento Sem-Terra. O Jaelson Melquíades liderava cerca de 600 famílias de seis acampamentos da região de Atalaia e acabou sendo morto praticamente a 3km do local em que havia sido assassinado, no ano passado, um outro líder do Movimento Sem-Terra - episódio que eu já havia tido a oportunidade de aqui denunciar - o José Evanilson.

A esposa do Jaelson denunciou que ele vinha sofrendo ameaças de morte. Há problemas gravíssimos em relação à violência no campo, e vou aproveitar para tratar um pouco disso.

Ontem já foi motivo de debate aqui a polêmica criada na CPI da Terra. Claro que, se eu tivesse tido a oportunidade de votar - não tive essa oportunidade porque não sou membro da CPI da Terra -, eu votaria favorável ao Relatório do meu querido companheiro, Deputado João Alfredo, do P-SOL do Ceará.

Agora, existe algo absolutamente claro no debate sobre a violência no campo. Senador Jefferson Peres, a reforma agrária nunca foi uma bandeira da Esquerda em lugar nenhum do mundo. Pelo contrário, foi ora uma bandeira da burguesia, ora uma bandeira dos capitalistas, que sempre viram a reforma agrária, especialmente em países de dimensões continentais, como um mecanismo essencial para dinamização da economia local, para geração de emprego, geração de renda, produção de alimentos, acolhimento das pequenas famílias, especialmente por intermédio da agricultura familiar.

O que acontece no Brasil? O que aconteceu tanto na época do Governo Fernando Henrique como acontece agora no Governo Lula. O Governo não tem nem política de reforma agrária nem política agrícola para o pequeno e médio produtor rural. Não é à toa que o último censo agropecuário chega quase a ser menor o número de famílias assentadas do que o número de pequenos e médios produtores que estão perdendo suas pequenas propriedades rurais para as execuções das instituições de crédito. Isso acontece em Alagoas, certamente acontece na Amazônia, acontece no Acre e em vários lugares.

E o que acontece, especialmente? Como o Governo se acovarda diante do latifúndio improdutivo e não tem a coragem política de fazer cumprir a lei segundo a qual terra improdutiva que não cumpre sua função social é destinada à reforma agrária, como o Governo não tem uma política também para o pequeno e médio produtor, cria-se uma guerra no campo, uma gigantesca violência no campo. E o atual Governo, do mesmo jeito que o Governo passado, é incapaz de fazer a reforma agrária. A reforma agrária não é só distribuição de terra. É distribuição de terra, renda e poder. Ao jogar homens e mulheres no meio da caatinga, onde não têm nem sequer a quem esmolar, elas deixam esse pedaço de terra, uma vez que ninguém fica em um pedaço de terra sem investimento, sem infra-estrutura, sem subsídio, crédito agrícola, assistência técnica, zoneamento agrícola e uma política de preços. É impossível! É uma grande farsa dizer que se faz reforma agrária desse jeito. Como é que a reforma agrária está sendo feita? O atual Governo, igual ao Governo passado, sai fazendo o debate sobre a reforma agrária atrás da violência no campo.

Assassine-se um dirigente do MST e, imediatamente, verá V. Exª que só depois da violência, do assassinato, os Governos tomarão as providências necessárias para instalar o processo de desapropriação das terras improdutivas e iniciar os assentamentos, que muitas vezes tornam-se verdadeiras favelas rurais pela incompetência, incapacidade e insensibilidade de os Governos fazerem a reforma agrária. É o que, infelizmente, está acontecendo mais uma vez no Estado de Alagoas; é o que vem acontecendo mais uma vez no Brasil.

O atual Governo, para completar, ainda tem a ambivalência, que não serve nem para a formação da personalidade individual. Aliás, os cristãos sempre diziam, bem como Jesus Cristo: ou quente ou frio, morno vomita; ninguém serve a dois senhores ao mesmo tempo, serve-se a Deus ou ao dinheiro.

Uma parte da Bancada do Governo estava lá para votar favoravelmente ao relatório do nosso querido companheiro José Alfredo; outra estava orientada, pelo Ministro da Agricultura do Governo Lula, para votar favoravelmente ao relatório do Relator do Substitutivo, Deputado Abelardo Lupion. Pode um negócio desse?

Perdeu-se a oportunidade de fazer um debate sobre a violência no campo, sobre a reforma agrária, sobre as alternativas de dinamização da economia local, sobre a geração de empregos e renda, sobre a possibilidade de criação de parques produtivos no campo, sobre a criação de milhares de novos postos de trabalho pela reforma agrária, por uma política agrícola para a agricultura familiar e para o pequeno e médio produtor rural. E aí o que nos resta? O protesto, o jus sperniandi, porque, infelizmente, nós falamos, falamos, falamos, é o parla, parla, parla, mas quem manda é o rei, ou a sua base de bajulação, ou a sua promiscuidade política.

Vimos aqui protestar, chorar as dores dos que morrem, como chora hoje a viúva do Jaelson, como choram as famílias do campo que eram lideradas por este dirigente do MST. E o Governo, na sua irresponsabilidade fiscal, social e administrativa, no mínimo, fará um discurso demagógico, mas não trará nenhuma medida concreta, nenhuma medida alternativa para garantir a reforma agrária e uma política clara de dinamização econômica, de investimentos, de crédito agrícola, de zoneamento, de política de preços para a agricultura familiar e para o pequeno e médio produtor rural.

Portanto, fica aqui o meu protesto em relação a mais um assassinato de mais um dirigente do MST pela irresponsabilidade dos Governos, que não fazem a reforma agrária nem estabelecem uma política clara de combate à violência no campo. E mais uma vez apenas se chora, apenas descerão as lágrimas, Senadora Iris de Araújo, dos filhos, da esposa e dos amigos de Jaelson, como já aconteceu em outras vezes.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/2005 - Página 42018