Discurso durante a 212ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com o descaso com que o Governo Lula vem tratando a gestão dos recursos hidroviários de nosso País

Autor
Efraim Morais (PFL - Partido da Frente Liberal/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Preocupação com o descaso com que o Governo Lula vem tratando a gestão dos recursos hidroviários de nosso País
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/2005 - Página 42066
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • APREENSÃO, ABANDONO, GOVERNO FEDERAL, TRANSPORTE AQUATICO, DESCONHECIMENTO, VANTAGENS, REDUÇÃO, CUSTO, TRANSPORTE DE CARGA, EXPORTAÇÃO, CAPACIDADE, EXPLORAÇÃO, TURISMO, INFERIORIDADE, IMPACTO AMBIENTAL, REGISTRO, DADOS, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), SISTEMA INTEGRADO DE ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA (SIAFI), UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), SITUAÇÃO, HIDROVIA, FALTA, INVESTIMENTO PUBLICO, SETOR, EXISTENCIA, CONFLITO, ORGÃO PUBLICO, TRANSPORTE, MEIO AMBIENTE, DEFICIENCIA, DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DOS TRANSPORTES (DNIT), ADMINISTRAÇÃO, TRANSPORTE FLUVIAL, QUALIFICAÇÃO, TREINAMENTO, RECURSOS HUMANOS.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr Presidente, Srªs e Srs Senadores, o motivo d manifestação hoje é a preocupação que temos com o descaso com que o Governo Lula vem tratando a gestão dos recursos hidroviários de nosso País.

Todos os estudos demonstram que as hidrovias constituem-se no melhor modal de transporte pesado, com a melhor relação custo-benefício possível para grandes quantidades de carga. Seu emprego maciço contribui significativamente para a redução dos preços finais das mercadorias comercializadas por um país, em especial, no que se refere às suas exportações. Se um país dispõe de malha hidroviária substancial, seu uso adequado impõe-se como verdadeira obrigação para seu governo e para seus nacionais, sob pena de prejudicar irremediavelmente o próprio futuro. A hidrovia, entre os meios disponíveis na matriz de transportes de um país, é o que dispõe do mais evidente caráter de polivalência, com evidente efeito sinérgico. Não somente permite a obtenção de excelente relação custo-benefício para o transporte de grandes cargas, como é, por suas naturais características de penetração interior e de apelo paisagístico, inegável fator de estímulo ao implemento de outras atividades ancilares, tanto industriais quanto comerciais e turísticas. Até mesmo do ponto de vista estratégico-militar a hidrovia tem indiscutível relevância, uma vez que permite a mobilização de grandes quantidades de material e efetivos de tropas, não expõe embarcações ao riscos de ataque e não é tão suscetível a sabotagens como uma rodovia ou uma linha férrea.

Em que pese sabermos disso, o potencial brasileiro para o transporte hidroviário encontra-se subutilizado. De acordo com informações fornecidas pela Administração da Hidrovia do Paraná, dos 40.000 quilômetros de vias navegáveis disponíveis, 28.000 quilômetros são aproveitáveis comercialmente em condições praticamente naturais. No entanto, desse total, apenas 10.000 quilômetros são utilizados efetivamente e, mesmo assim, refletem um uso bastante aquém de sua capacidade. Com isso, perde-se o referenciado efeito sinérgico das hidrovias e transporta-se carga pesada por via rodoviária, o que aumenta significativamente o chamado “Custo Brasil”. Haja vista que há estimativa de perda de até 30% da produção, quando da utilização do transporte rodoviário.

A economicidade das hidrovias é notável. Por meio delas pode-se transportar cargas maiores por distâncias maiores, a custo significativamente inferior em relação aos demais modais. No relatório do Tribunal de Contas da União, objeto do processo 005.178/2002-8, a equipe de auditoria consignou que um comboio hidroviário de soja conseguia transportar de Porto Velho, Estado de Rondônia, a Manaus, Estado do Amazonas, o equivalente em carga a 900 caminhões de 20 toneladas. No Rio Paraguai, registra-se a ocorrência de comboios ainda maiores para o transporte das chamadas cargas tipicamente hidroviárias: aquelas de baixo valor agregado, que, em grandes quantidades, devam ser transportadas a longa distância.

Pesquisa econômica realizada em 2000 pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (USP/ESALQ), e coletada junto à Administração da Hidrovia do Paraná indica que o custo de frete médio no transporte interior de granéis, no Brasil, tomando-se como distância média 1200 quilômetros, por modal hidroviário corresponde a R$ 0,014 tkm (toneladas por quilômetro), enquanto o mesmo custo, nos modais ferroviário e rodoviário, monta a R$ 0,037 tkm e R$ 0,019 tkm, respectivamente.

A excelente relação custo-benefício para o transporte de cargas pesadas que caracteriza o transporte hidroviário não passa despercebida dos órgãos de Controle Externo dos países industrializados. Por meio de relatório apresentado em novembro de 1995 ao Congresso dos Estados Unidos da América, o United States General Accounting Office (GAO), órgão de Controle Externo, fez ver aos congressistas a importância do assunto. Ressaltou, na ocasião, que ao longo de 25 anos (1970 a 1995), a tonelagem nacional de carga transportada ao longo das hidrovias interiores dos Estados Unidos havia dobrado e a relação toneladas transportadas/milhas percorridas havia crescido mais de cinco vezes. O GAO deixou claro que os benefícios conseguidos eram resultantes da competitividade ímpar do transporte hidroviário quando utilizado para deslocar grandes volumes de carga, sobretudo as de baixo valor agregado, como minérios em estado bruto.

Ademais, estudos técnicos reconhecem que, entre os modais de transporte de carga pesada, a hidrovia constitui-se não somente no de melhor relação custo-benefício, mas, também, no que acarreta menor nível de alteração ambiental. Isso porque o caminho a percorrer já se encontra definido em sua maior parte, sendo o próprio leito do rio. Uma rodovia, ao contrário, exige enorme interferência ambiental, caracterizada, entre outras, pelas atividades de desmatamento e nivelamento de solo, envolvendo grandes movimentos de terra.

As intervenções necessárias à manutenção de uma hidrovia são de caráter pontual e de baixa intrusividade. Não prescinde, como a rodovia, da realização de obras extensas e de grande envergadura, como seria o caso, por exemplo, de uma pista dupla de algumas centenas de quilômetros. A área de influência principal da hidrovia é o próprio leito do rio. A sinalização de margem, o balizamento e mesmo as dragagens, são realizadas em pontos específicos, sem efeitos mais graves em termos de alteração ambiental.

Sr Presidente, Srªs e Srs Senadores, a análise, contudo, do quadro atual da gestão de todo esse potencial nos revela motivos para intranqüilidade.

Em recente trabalho acerca do tema em foco, o Tribunal de Contas da União apresentou algumas conclusões que nos preocupam e que queremos compartilhar com os Nobres Colegas.

A primeira e mais importante conclusão reportada pela Egrégia Corte de Contas da União, obtida a partir de levantamento de auditoria, é que o setor de transporte hidroviário no Brasil encontra-se enfraquecido e subutilizado. Vítima, inicialmente, de uma política de transportes que se orientou francamente para o desenvolvimento do modal rodoviário, o setor convive, ainda, com a falta de empenho do atual Governo em resolver problemas estruturais. O desequilíbrio flagrante da matriz de transportes do País constitui evidência quase irrefutável do virtual abandono do transporte pelos rios pelo atual governo.

Levantamento que realizamos no SIAFI comprovou tal situação apontada pelo TCU. A média de gastos na subfunção 784 - transporte hidroviário, entre 1993 e 2002, foi, em valores atualizados para o ano corrente, pelo IGP-DI, de R$1.135.000.000,00 (Um bilhão cento e trinta e cinco milhões de reais). Já no Governo Lula a média anual de gastos tem sido de apenas 380 milhões de reais, quase quatro vezes menos.

Outra conclusão de grande importância para o entendimento do setor hidroviário a que chegou o TCU diz respeito à sua multiplicidade organizacional e normativa. Fruto da necessária convivência de interesses variados, essa multiplicidade não seria em si perniciosa se as evidências não apontassem para a falta de cooperação e articulação entre os diversos órgãos e entidades que compõem o setor diretamente ou sobre ele exercem decisiva influência. O caso mais marcante diz respeito ao choque entre órgãos da política de transportes e da política ambiental, bem como órgãos essenciais à justiça, os quais vêm agindo de maneira quase adversarial, o que indica uma coordenação de esforços deficiente.

Nesse aspecto, existe atualmente uma questão crítica no âmbito do DNIT que diz respeito à situação das Administrações de Hidrovias. Estas se constituem nas entidades executoras do setor hidroviário, a ponta-de-lança do setor, e, de acordo com as informações obtidas pelo Tribunal de Contas da União. vêm sendo tratadas muito mais como problemas administrativos do que como instrumentos de ação de governo. A situação atual evidencia a deficiente estrutura de pessoal, associadas a uma falta de empenho no sentido de se chegar a uma solução adequada.

Outra deficiência identificada diz respeito à absoluta ausência de programas de qualificação e treinamento voltados para o setor hidroviário. A equipe confirmou que, nos últimos três anos, o pessoal do setor hidroviário ficou alijado de qualquer iniciativa nesse sentido. Com isso, vê-se comprometida a oportunidade de o setor entregar seu produto à sociedade de maneira aperfeiçoada e mais eficiente.

Por fim, o setor hidroviário mostra-se mal administrado em sua gestão de recursos humanos e carece de pessoal especializado. As informações obtidas na Administração da Hidrovia do Rio Paraná dão conta que, de um quadro de lotação que contempla 13 (treze) funcionários, apenas 8 (oito) encontram-se em atividade na Administração, estando os demais disponibilizados a outros órgãos e entidades. Um dos oito funcionários da Administração é o próprio superintendente e outros três são chefes de núcleos. Há somente um técnico de vias navegáveis e apenas um eletricista para fiscalizar e realizar manutenção em mais de mil quilômetros de hidrovia. A situação repete-se nas demais Administrações Hidroviárias do País.

Desta sorte, podemos afirmar claramente que também no setor hidroviário as marcas do Governo Lula estão presentes, quais sejam elas a falta de visão estratégica, a descontinuidade das ações empreendidas no passado, o baixíssimo nível de investimentos e a má gestão.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/2005 - Página 42066