Discurso durante a 208ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca do sucateamento do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PROPRIEDADE INDUSTRIAL.:
  • Considerações acerca do sucateamento do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2005 - Página 41224
Assunto
Outros > PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
Indexação
  • REGISTRO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL (INPI), PREJUIZO, INDUSTRIA, SOBERANIA NACIONAL, CRESCIMENTO, BRASIL, SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, URGENCIA, REAPARELHAMENTO, ENTIDADE.

            O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o Brasil vive um dos momentos mais importantes de sua história. Após mais de quinhentos anos, desde seu descobrimento pelos portugueses, parece que o País chegou a um ponto em que terá de fazer a opção entre avançar decisivamente rumo ao progresso e à modernidade, ou condenar ao atraso e ao empobrecimento a presente e as futuras gerações. Digo isso porque a evolução da tecnologia, nos mais diversos segmentos, avança a passos largos, aumentando o fosso que separa as nações ricas das pobres; e a tendência é de que sua velocidade aumente ainda mais nos próximos anos.

            Até mesmo os governos militares, na década de 70, pareciam antever esse vertiginoso e importante fenômeno, que é a produção de tecnologia como fonte geradora de riquezas. Foi pensando nisso que, por intermédio da Lei nº 5.648, de 11 de dezembro de 1970, criaram o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).

            Atualmente vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o INPI é o órgão responsável pela execução das normas que regulam a propriedade industrial no Brasil. A ele compete conceder marcas e patentes, averbar contratos de transferência de tecnologia, registrar programas de computador e contratos de franquia empresarial, além de processar o registro do desenho industrial e das indicações geográficas. Segundo o Presidente do Conselho da Câmara Americana de Comércio em São Paulo, Dr. Sérgio Habersfeld, “o INPI é um agente essencial para promover a capacitação tecnológica das empresas e dos centros de pesquisa, a difusão do conhecimento e a otimização dos investimentos em atividades de pesquisa e desenvolvimento”.

            Mas, apesar dessas importantes atribuições, o INPI não tem recebido a merecida atenção por parte do Governo Federal; e aqui não me refiro apenas ao governo do Presidente Lula, mas também ao governo FHC. Lamentavelmente, é um órgão que tem sido desprestigiado pelas sucessivas administrações que passaram pelo Palácio do Planalto. Mais do que isso, para usar um termo mais condizente com a realidade, diria que o INPI está sendo “sucateado”.

            Sr. Presidente, é esse o objetivo de minha vinda hoje a esta tribuna: chamar a atenção do Plenário e daqueles que nos ouvem, por intermédio da Rádio e da TV Senado, para esse quadro de abandono por que vem passando um órgão do calibre do Instituto Nacional de Propriedade Industrial.

            E por que digo que o INPI está sofrendo um processo de sucateamento?

            Por diversos motivos. O primeiro deles é a lentidão com que aquele órgão processa as solicitações de registros que lhe são encaminhadas. Calcula-se que haja cerca de quinhentos mil pedidos de marcas e aproximadamente sessenta mil pedidos de patentes aguardando exame em suas prateleiras. Esse é o resultado de uma política de recursos humanos totalmente equivocada: apesar do concurso público realizado, em 2004, para preencher 108 vagas naquele Instituto, sua estrutura de pessoal ainda é deficiente, pois conta com pouco mais de 600 servidores, sendo 80 técnicos, para analisarem cerca de 16.000 novos pedidos de patente por ano. Se compararmos esses números com os de outros países, veremos que, no Brasil, cada examinador analisa cerca de 200 processos/ano, contra 79 na Europa, 92 nos Estados Unidos e 117 no Japão. Segundo os estudiosos da matéria, o INPI precisaria duplicar, de imediato, seu contingente de especialistas, contratando, por concurso público específico, técnicos de nível superior com formação em diferentes áreas tecnológicas, que deveriam ser treinados por um período mínimo de dois anos.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesse contexto, é interessante notar que, há apenas 10 anos, o INPI contava com 860 funcionários, que processavam 10.000 pedidos de patente/ano. Ou seja, nesse período, enquanto as demandas aumentavam, o que fazia o Governo? Reduzia o quadro de pessoal do Instituto!

            Um outro motivo que me leva a falar do “sucateamento” do INPI é o corte de verbas que aquela autarquia vem sofrendo. Apesar de ser uma determinação legal que aquele órgão seja custeado com sua própria arrecadação, o Tesouro Nacional retém grande parte desses recursos, com evidentes propósitos políticos. Isso sem falar que estamos bem distantes dos principais países do mundo quando o assunto é dotação orçamentária para o funcionamento de institutos de proteção à propriedade industrial. Enquanto os Estados Unidos destinam US$860 milhões anuais para essa finalidade, o Japão, 844 milhões, a Rússia, 143 milhões e a Coréia do Sul, 130 milhões, o Brasil reserva, anualmente, apenas US$42 milhões para financiar o INPI e, mesmo assim, não lhe repassa a integralidade dos recursos consignados no Orçamento! Então, se um órgão público carece de pessoal e de recursos financeiros suficientes, é lógico que ele não tem condições de responder, à altura, aos desafios impostos por uma economia globalizada.

            Sr. Presidente, a quem interessa tudo isso?

            É claro que ao Brasil não pode interessar. Todos os países desenvolvidos possuem sólidas instituições para registrar e proteger sua propriedade intelectual, mas não querem permitir que países emergentes, como o Brasil, façam o mesmo. Tanto é assim, que está em estudos, na Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI), um projeto que poderá solapar de vez as chances de desenvolvimento tecnológico dos países emergentes. Refiro-me à tentativa de agrupar os centros nacionais de decisão de patentes em três grandes entidades, sob domínio, respectivamente, dos Estados Unidos, da União Européia e do Japão. A primeira e mais grave conseqüência disso seria a perda da autonomia dos países em desenvolvimento quanto à deliberação sobre questões de mérito em patentes.

            E por que eles, os países ricos, adotam essa atitude? Porque os titulares de 96% das patentes registradas no mundo são residentes nos países desenvolvidos. Há, ainda, outros dados que nos ajudam a compreender melhor essa questão: no ranking mundial de registro de patentes pelo PCT (Tratado de Cooperação sobre Patentes), os Estados Unidos ocupavam, em 2003, o primeiro lugar, com 35% do total de pedidos de registro, seguidos de perto pelo Japão, com 15%, e pela Alemanha, com 12%. Entre os países emergentes, a Coréia do Sul é o mais bem colocado, com 2,7% dos registros, e o Brasil responde apenas por 0,2% do total, atrás da China, da Índia e de Cingapura.

            É preciso que as autoridades brasileiras compreendam, de uma vez por todas, o que a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) vem afirmando desde 1996: “a proteção à propriedade intelectual se apresenta como uma área sensível e importante para apoiar o processo de desenvolvimento de um país”. Isso porque o reconhecimento e as recompensas associados à proteção da propriedade de invenções e de trabalhos criativos estimulam nova atividade criativa, gerando mais invenções que, por sua vez, irão estimular a atividade econômica. Além disso, segundo os estudiosos, uma adequada proteção à propriedade intelectual é um elemento-chave para encorajar o investimento estrangeiro direto, o que tem inquestionáveis efeitos benéficos sobre a economia.

            Sr. Presidente, quero, neste momento, citar apenas um dado que resume a relevância desse assunto no mundo de hoje. Segundo a Price Waterhouse, em 1999 o mercado global de licenciamento de propriedade intelectual totalizou mais de US$100 bilhões, contra apenas 10 bilhões em 1990. Somente a IBM, no ano 2000, recebeu mais de US$1,5 bilhão em receitas pelo licenciamento de patentes!

            Diante desses números, não há como negar as nefastas conseqüências que o sucateamento do INPI tem trazido, e irá trazer, para o País. Apenas no caso da biopirataria, por exemplo, cálculos do IBAMA indicam que o Brasil amarga um prejuízo de US$16 milhões por dia, em razão da impossibilidade de se registrar, aqui dentro, plantas, frutos e óleos, o que é permitido em outros países. Até o pau-brasil, símbolo de nossa pátria, possui patente internacional!

            Além disso, há um evidente desestímulo à atividade empresarial. O INPI é, sobretudo, um prestador de serviços à comunidade e, mais especificamente, aos empresários, que pagam caro por seus serviços. Contudo, em função da demora para efetuar o registro de marcas e patentes, que pode levar até 8 anos, segundo alguns estudos, quando o empresário finalmente obtém o tão esperado registro, diversos concorrentes já exploraram o objeto da patente e auferiram benefícios indevidos. Ao empresário resta apenas a frustração ante a impossibilidade de punir os falsificadores. Essa insegurança jurídica afeta não somente as empresas estrangeiras, como muitos poderiam pensar, mas também, de modo particular, o pequeno empresário nacional que não tem como suportar os custos de licenciamento de suas marcas e inventos no exterior e, muito menos, transferir seus investimentos para outros países, em busca de uma estrutura mais sólida que lhe ofereça melhores condições para enfrentar os desafios e as incertezas que a atividade produtiva oferece.

            Num País como o nosso, invadido pela pirataria, que causa prejuízos à indústria da ordem de R$2 bilhões por ano, como esperar que haja um dinamismo empreendedor e a atração de novos investimentos diretos de longo prazo, de que o Brasil tanto necessita?

            Sr. Presidente, ao concluir este pronunciamento, e por tudo que foi dito, renovo meu apelo para o Governo Federal, no sentido de que promova o urgente reaparelhamento do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).

            Se não tomarmos, corajosamente, em nossas mãos, as rédeas do destino, haverá outros que as tomem, e conduzam nosso amado Brasil por caminhos certamente não desejados pela maioria do povo brasileiro! Há recursos, mas é preciso também que haja vontade política.

            Era o que tinha a dizer.

            Muito Obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2005 - Página 41224