Discurso durante a 213ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a cassação do mandato do Deputado José Dirceu, ontem, em sessão da Câmara dos Deputados.

Autor
Almeida Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SE)
Nome completo: José Almeida Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CAMARA DOS DEPUTADOS. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA. ORÇAMENTO.:
  • Comentários sobre a cassação do mandato do Deputado José Dirceu, ontem, em sessão da Câmara dos Deputados.
Publicação
Publicação no DSF de 02/12/2005 - Página 42336
Assunto
Outros > CAMARA DOS DEPUTADOS. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA. ORÇAMENTO.
Indexação
  • ANALISE, DECISÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, CASSAÇÃO, MANDATO, JOSE DIRCEU, DEPUTADO FEDERAL, COMENTARIO, IMPORTANCIA, CONTINUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • COBRANÇA, ESCLARECIMENTOS, PRESIDENTE, RELATOR, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, MESADA, MOTIVO, EXTINÇÃO, PRAZO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), AUSENCIA, ELABORAÇÃO, RELATORIO, CONCLUSÃO.
  • SUGESTÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, PRESTAÇÃO DE CONTAS, CAMPANHA ELEITORAL, RESTAURAÇÃO, CONFIANÇA, POPULAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
  • DEFESA, APROVAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, PROTESTO, NECESSIDADE, EMENDA, CONGRESSISTA, ORÇAMENTO, OBTENÇÃO, RECURSOS, ESTADOS, MUNICIPIOS, COMENTARIO, IMPORTANCIA, GARANTIA CONSTITUCIONAL, REPASSE, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE), FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM).

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais uma vez, retornando à tribuna, faço questão de dizer a V. Exªs que não me esqueço do dia 02 de março de 2004, quando aqui, nesta mesma tribuna, quase fui apedrejado por aqueles que diziam que o Deputado José Dirceu era um homem honesto.

O tempo passa, mas devo dizer, Srªs e Srs. Senadores, que não sou revanchista. Não sou de tripudiar nem de escarnecer os derrotados. Não cultivo ressentimentos por mais que me agridam, embora não ofereça a outra face. Eu reajo. Tenho a estatura necessária para estar onde me encontro, como Senador da República. Não sou mesquinho. Mas o resgate de fatos grandiosos e o seu registro na história se tornam indispensáveis à construção de qualquer nação que pretenda fundar-se em princípios éticos que conduzam o cidadão ao sentimento de satisfação com o País onde vive.

Ontem, a maioria da Câmara dos Deputados cassou o mandato e os direitos políticos de José Dirceu. A quebra do decoro parlamentar se deu pela prática insofismável de corrupção sobejamente comprovada.

A cassação teve grande repercussão, inclusive na mídia internacional. Estamos sendo observados pelo mundo. Aqui se falou de constrangimento de parte da Oposição pelo ato de cassação. Se é verdadeira essa informação de constrangimento, trata-se de sentimento hipócrita, inoportuno, ignominioso, uma afronta, um desserviço à Nação e às boas instituições deste País, pois esse falso constrangimento significa dizer: “Já basta! Doravante escondam a corrupção, serenem os ânimos e não cassem mais ninguém”.

Falou-se também que José Dirceu, ao ser cassado, caiu de pé. Hipocrisia! Quem é cassado pela prática de corrupção não cai de pé, é arrastado pela enxurrada na sarjeta.

Srªs e Srs. Senadores, constrangida quem ainda está é a Nação brasileira diante dela própria e do mundo que nos observa e nos vê sem qualquer admiração pela bandalheira, pela patifaria, pela pouca-vergonha e pelo cinismo de todos os que praticaram a corrupção, pior peste que devasta milhões e milhões de pessoas no Brasil e em todo o mundo, levando-as à morte prematuramente por falta de assistência social.

A cassação de José Dirceu não é um objetivo que se encerra em si próprio. A decisão da Câmara atende a uma velha pretensão do povo brasileiro, ainda não conquistada, que é a de sermos uma verdadeira República, que vem a ser a coisa pública, de todos. A decisão atende aos ideários democráticos que devem persistir, e o contrário, a não-cassação, seria ferir de morte a democracia, pois este é, ou era, o desejo da turma do José Dirceu, que pretendia transformar o Brasil num estado totalitário.

Portanto, a obra, com a cassação, não acabou. Hoje não é dia de comemoração, de brindes, nem de autógrafos. A obra ainda está por ser concluída. Escreveu-se apenas um capítulo, e ela não poderá jamais ser encerrada com a cassação dos demais envolvidos, que deve acontecer o mais rápido possível.

As investigações precisam continuar. A sociedade brasileira, para o seu próprio bem, precisa manifestar-se em apoio e em cobrança a posições mais firmes na condução dos trabalhos das CPIs, na condução das investigações pela Polícia Federal, sem que o Executivo imponha dificuldades na apuração dos fatos. Que o Ministério Público seja mais diligente e que o Poder Judiciário não interfira em prejuízo do trabalho que as CPIs podem e devem realizar e que foram obstaculizados por liminares e habeas corpus a criminosos confessos que passaram a se comportar cinicamente diante de seus inquisidores, em flagrante desrespeito a um dos Poderes da República.

A obra não acabou. Por exemplo, o Presidente e o Relator da sepultada CPI do Mensalão precisam dar explicações convincentes, porque deixaram esgotar o prazo de vigência da própria CPI sem sequer deliberarem um relatório parcial que pudesse dar conseqüência às provas até então apuradas. O Presidente, o então Vice-Presidente e o Relator foram muito exigentes com os seus pares na condução dos trabalhos de investigação e deixaram o prazo se esgotar sem qualquer decisão, transformando tudo em uma grande pizza. Os senhores realizaram despesas, gastou-se tempo de servidores e dos próprios Congressistas. E os senhores não dão nenhuma satisfação à sociedade?

A obra não acabou. O Ministro Antonio Palocci, acusado por seus ex-assessores, não foi convocado a depor. O irmão do Presidente Lula, da mesma forma. O filho do Presidente, idem, assim como o homem do dinheiro na cueca. A empresa GDK, aquela que deu uma de Papai Noel ao presentear o Sílvio Pereira com o Land Hover para intermediar entendimentos com a Petrobas, também não foi convocada. E há muitos outros depoimentos que devem ser feitos e sigilos que devem ser quebrados e que ainda não o foram, a exemplo dos cartões corporativos e dos fundos de pensão. Por que estão blindando toda essa gente?

Sr. Presidente, Srs. Senadores, de blindagem, de proteção, quem precisa é o povo, para se livrar desse bando de corruptos!

Mas a obra não acabou. Precisamos, urgentemente, instalar a CPI do Caixa Dois, até mesmo para fazermos aquilo que não foi feito pela CPI do Mensalão, ou seja, uma investigação ampla e profunda em todas as campanhas eleitorais. Nada deve ser levado para debaixo do tapete. A vida pública deve ser bem transparente, e a sociedade precisa acreditar na classe política, mas, para tanto, devemos fazer por onde.

Como poderemos afirmar que estamos satisfeitos se a reforma política, o Governo nem o Congresso desejaram fazê-la, embora tivessem todo o tempo necessário para sua elaboração? Como poderemos nos apresentar para o próximo pleito com a mesma legislação que aí está, embora não se possa atribuir a ela a culpa pela corrupção daqueles que a praticaram, pois assim agiram em decorrência do desvio de caráter?

Portanto, a obra não está completa com a cassação de José Dirceu. Se não aprovarmos o orçamento impositivo, acabando a possibilidade de Senadores e Deputados apresentarem emendas ao Orçamento da União em benefício de Estados e Municípios, não estaremos contribuindo para acabar com a corrupção no País ou para diminuí-la. Recursos para Estados e Municípios não devem ser objeto de emenda ao Orçamento da União. Recursos para Estados e Municípios devem ser decorrência de aumento dos percentuais do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), para que os repasses sejam constitucionais e obrigatórios, não como uma dádiva do Governo Federal, porque, a partir daí, a barganha campeia, a compra de parlamentares entra em vigor. E é assim que estamos aí a comprovar toda essa fraude, toda essa corrupção.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, repasses precisam ser constitucionais, obrigatórios e não uma dádiva do Governo. Se fizermos um orçamento impositivo, aquilo que se transfere a Estados e Municípios por liberalidade terá que ser transferido por obrigação constitucional. Senadores e Deputados estão neste Congresso para apresentar emendas ao Orçamento da União para despesas que venham a ser executadas pelo Governo Federal em projetos, como a revitalização do rio São Francisco, executada diretamente pelo Governo Federal, como a Transnordestina, como as hidrelétricas, projetos regionais e projetos de interesse nacional. No entanto, para a construção de uma escola ou de um posto de saúde num povoado de um Município do meu querido Estado de Sergipe não há necessidade de que o prefeito venha buscar um intermediário - que é o Senador ou o Deputado - para barganhar uma emenda no Orçamento da União. Ao contrário, o prefeito deve receber os recursos por uma determinação constitucional, porque, a partir daí, ele não deverá favores nem a Deputado nem a Senador; nem Deputado ou Senador precisará se vender ou vender a sua consciência, o seu voto, o seu apoio para aprovar projetos do Executivo em detrimento dos interesses da sociedade.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, concluo, dizendo que a cassação no dia de ontem do Deputado José Dirceu não completou a obra. A obra está inacabada. É preciso continuar com a fiscalização e dar a este País - a classe política tem condições de fazê-lo e, se não o fizer, é porque a sua maioria assim não o deseja - as normas legais necessárias e indispensáveis para o fortalecimento de nossas instituições democráticas.

Esse é o nosso dever. Esse é o dever da classe política brasileira. É o dever daqueles que compõem este segmento social; se não for feito, com toda a certeza, a população brasileira poderá cobrar de todos nós e poderá continuar com o conceito que tem da classe política, que, em última instância, é a responsável por tudo que aqui se encontra.

Quando me refiro à classe política, devo ressaltar, Sr. Presidente, que não generalizo, pois há inúmeras e brilhantes exceções. Mas a classe política só fala pelo seu conjunto majoritário, e a minoria sempre, com certeza, é derrotada.

Por essa razão, venho à tribuna dizer a V. Exªs, repetindo, que a obra não está encerrada. Não é dia de festa, de comemorações. É preciso seguir em frente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/12/2005 - Página 42336