Discurso durante a 213ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Discordância do posicionamento da Senadora Ana Júlia em relação ao Deputado Xico Graziano. Considerações sobre a cassação do mandato de José Dirceu.

Autor
Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA.:
  • Discordância do posicionamento da Senadora Ana Júlia em relação ao Deputado Xico Graziano. Considerações sobre a cassação do mandato de José Dirceu.
Aparteantes
Ana Júlia Carepa.
Publicação
Publicação no DSF de 02/12/2005 - Página 42356
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • CONTESTAÇÃO, DISCURSO, SENADOR, REFERENCIA, ATUAÇÃO, DEPUTADO FEDERAL, EX PRESIDENTE, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA).
  • COMENTARIO, ALTERAÇÃO, DIRETRIZ, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), REFERENCIA, PRODUTO TRANSGENICO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, DIVERGENCIA, INVESTIMENTO PUBLICO.
  • CRITICA, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), AUSENCIA, APOIO, JOSE DIRCEU, EX-DEPUTADO, PROCESSO, CASSAÇÃO, MANDATO.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Mão Santa, obrigado pelas sempre generosas palavras de V. Exª.

Antes de entrar no assunto, Senadora Ana Júlia Carepa, eu queria ter a ousadia de discordar de V. Exª. Cabe a V. Exª todo o direito de não gostar do Deputado Xico Graziano, mas daí dizer que o Deputado não entende de reforma agrária, não entende de agricultura, vai uma diferença muito grande.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - V. Exª me dá um aparte, para esclarecer que não foi bem isso que eu falei?

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Concluirei o meu. O Deputado Xico Graziano foi Presidente do Incra.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Sei.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Foi Secretário de Agricultura do Estado de São Paulo. É um homem que tem os seus artigos acolhidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, geralmente versando sobre matérias desse tema.

            Evidentemente, não podemos - aí V. Exª passa a ter razão - querer que o Deputado Xico Graziano pense igualmente ao que pensava V. Exª ontem e pensa hoje, mas o mesmo não pode se dizer do seu Partido. O pensamento dele com relação à invasão de terra e ao MST é diferente do de V. Exª. Sabe V. Exª que ele serviu a um governo cujo Presidente teve a sua propriedade invadida de maneira totalmente descabida pelo Movimento dos Sem-terra, que foi lá não para tomar terra e torná-la produtiva, mas os bons vinhos que o Presidente da República guardava na sua adega. Evidentemente, é maneira de pensar diferente.

Quero lembrar apenas um fato. O partido de V. Exª trouxe ao Brasil há três anos o Sr. José Bové. V. Exª deve ter participado desse movimento. José Bové percorreu o Brasil desfraldando a bandeira do PT contra os transgênicos. Levou umas bordoadas aqui. Agrediu pessoas. Duvido que o PT traga o José Bové aqui novamente para combater os transgênicos, porque hoje defende. Mudou, V. Exª não. V. Exª continua rasgando papel em público. V. Exª hoje deveria ser para o PT um símbolo, porque foi das que não mudou. Até a sua ira com relação ao Ministro do seu Partido é santa, quando ataca o Palocci.

Como disse que vai sair daqui para a Casa Civil a fim de tratar de assunto dos madeireiros, junte-se à Ministra para tentar derrubar o Palocci. Junte-se, preste esse desserviço ao País. A Oposição não vai fazer isso. A Oposição é coerente, responsável. Aliás, a única coisa boa que o Partido de V. Exª fez neste Governo, sem dúvida alguma, foi ter escolhido para presidir o Banco Central um homem do partido do Presidente da República anterior, Fernando Henrique Cardoso - por que não escolheram alguém do PT? - e ter escolhido Palocci para Ministro da Fazenda. O Palocci não está sendo condenado nem criticado pelos seus erros no Ministério, mas pelos seus pecados de adolescência, pelos pecados de Ribeirão Preto. É preciso que o Partido de V. Exª, ao invés de lançá-lo às chamas do fogo amigo, dê-lhe, pelo menos, a proteção e a cobertura para que tenha tranqüilidade de continuar fazendo seu trabalho, que é o único lado positivo que o Governo de V. Exª tem alcançado. Quando se contraria o Ministro, o PIB cai, e V. Exª sabe quais serão as conseqüências disso.

Senadora Ana Júlia Carepa, com muito prazer, concedo um aparte a V. Exª.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Obrigada, Senador. Primeiramente, quero esclarecer um ponto. Se eu não me fiz entender, peço desculpas. Eu jamais atacaria o Deputado Xico Graziano, pois sei que S. Exª é um estudioso no assunto. Comentei que S. Exª foi uma pessoa ausente na CPMI. Ninguém pode deixar de concordar com isso.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Quero lembrar a V. Exª que o Deputado Xico Graziano era suplente.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Ao contrário.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - S. Exª assumiu uma vaga de titular.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Ele estava na Comissão como titular.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Mas S. Exª era suplente de um Deputado de São Paulo. Ele assumiu o cargo de titular na vaga de alguém que foi ocupar outra função.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Estranharam-me os argumentos de S. Exª ao contestar algumas questões, como a organização de cooperativas, alegando que o Relator não tinha razão. Nesse ponto, o Relator o contestou, mostrando que realmente a organização de cooperativas representa 80% dos pequenos produtores, mas a sua direção veio para cá para somar com a UDR. Era isso que o Relator estava argumentando. V. Exª já me ouviu dizer que eu também discordo, sim, dos excessos que fazem os movimentos de trabalhadores. Creio que excessos, de todos os lados, Senador, são ruins, tanto é que propus retirar várias questões do relatório do Deputado João Alfredo, para que se pudesse chegar a um consenso. Mas, infelizmente, houve uma intransigência total da Bancada Ruralista, do ex-Presidente da UDR, do Deputado Abelardo Lupion. Gostaria só de dizer isso.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Senadora Ana Júlia Carepa, eu não quis entrar no mérito da questão até porque não conheço. Apenas achei-me no direito de fazer a defesa de um homem que tem dedicado a sua vida... o Deputado Chico Graziano.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Eu quero enfatizar o meu respeito ao Deputado Chico Graziano. Só fiz esse comentário, Senador Heráclito Fortes, porque estava presente na hora e pensei que, por ser estudioso no assunto, ele não foi o mais feliz naquele momento. E talvez fosse melhor, por ele não ter acompanhado a CPMI... Se ele não concordava com o excesso que nós mesmos propusemos para retirar também do relatório que o Relator fez, o melhor que ele faria talvez fosse não votar em nenhum dos dois, porque fica feio. Agradeço-lhe o aparte. Na política econômica, quanto ao homem público e à pessoa do Ministro Palocci, tenho o maior respeito e o trato desse modo. É natural, na democracia, ter alguma divergência na política econômica.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Até essa divergência de gastar, de gastar que alguns setores do Governo pregam é relativa e subjetiva, porque o Governo não teve capacidade de gastar sequer o orçamento de dois anos atrás.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Citei o MDA, que já gastou 90% do seu orçamento.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - O Governo não teve capacidade e competência de cumprir aquele acordo do FMI, que prejudica, inclusive, uma emenda da autoria de V. Exª referente às eclusas de Tucuruí.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senadora Ana Júlia Carepa, infelizmente, o Senador Heráclito Fortes já deu o aparte à V. Exª, e a palavra está com ele.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - O Governo não teve capacidade de gastar com transparência os programas estruturantes do Brasil. Então, o que falta ao Governo não é gastar, mas saber gastar - com transparência.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senadora Ana Júlia Carepa.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Mas ele está deixando.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Gastar no momento certo e não às vésperas, antevésperas...

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - V. Exª sabe também que o problema é das eclusas, não sabe?

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PA) - ...de votações importantes nesse Governo.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Eu só queria dizer isto: o problema das eclusas V. Exª sabe que foi um pouquinho maior. O projeto cresceu quase 100% de um ano para o outro.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PA) - Pois é, mas é incapacidade do Governo.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senadora Ana Júlia, não vamos rasgar o Regimento.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PA) - É incapacidade do Governo aprovar uma eclusa na qual sabia que não podia gastar. Ainda bem que V. Exª é do Governo mas concorda com as críticas que eu faço.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Nem todas. Algumas, sim.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PA) - Acontece, Senadora Ana Júlia, que hoje nós estamos vivendo aqui a Quarta-Feira de Cinzas, na qual se está tirando o lixo do tapete. Ecoa no ouvido, não a pancada do surdo ou do bumbo que nos atormentou nos cinco dias da folia, mas o singrar pelos céus daquela bengala, com a qual não concordo. Acho que a bengala foi imprópria, num momento impróprio.

Mas o que me atemoriza nisso tudo é a leveza com que os companheiros do José Dirceu trafegam hoje nos tapetes do Congresso Nacional. Não vi tristeza em ninguém. Ao contrário, vi alívio.

            Eu sou curioso. Eu chego nesta Casa, Senador José Maranhão, às oito e meia da manhã. Sou dos primeiros que assinam e saio pulando da vassoura, me livrando do cisco. O zelador está passando a vassoura e eu pulando por cima. Ontem saí daqui amargurado e decepcionado. Os companheiros do Ministro José Dirceu que pediam voto por ele diziam: Nós devemos votar no Zé, mas se ele for absolvido, a crise não acaba.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PA) - Eu nunca vi, Senador Mão Santa - eu pediria a V. Exª um pouquinho de compreensão, porque eu dividi o meu discurso democraticamente com a Senadora Ana Júlia -, uma falta de sinceridade tão grande como no episódio de ontem.

Senadora Lúcia Vânia...

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - V. Exª vai me dar licença.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PA) - Senadora Lúcia Vânia e Senador Ana Júlia, a matemática responde muito mais ao que vimos hoje do que qualquer discurso. A Oposição unida tem, no máximo, 150 votos; o Ministro José Dirceu teve 296 contrários! E sabíamos, de antemão, que alguns setores do Governo, uns por pena, outros por gratidão, votaram a favor do Ministro José Dirceu e que, se fizesse a contabilidade, aí a Oposição cairia para 130 votos. De onde saíram os 293, senão do fogo amigo? E, no fogo amigo, é fácil de se identificarem as vertentes: os adversários de luta, porque o José Dirceu, com o poder na mão, com a caneta na mão, foi um homem distante dos amigos, dos companheiros. José Dirceu, com a caneta na mão, dialogou pouco com os companheiros, e muito menos com os adversários!

Observei uma parte, do plenário, e outra parte, já em casa. Toda vez que tinha oportunidade de ver, naquela fila, alguns Parlamentares com o envelope de votação na mão, esperando a hora de colocá-lo na urna, era muito fácil, pelos lábios, pelo semblante, observar a intenção do voto de cada um. É uma pena! O Ministro José Dirceu foi um guerreiro, um lutador, ao longo da sua história, mas é vítima do que construiu infelizmente. Jogou um cesto de pedras para cima, esqueceu-se de sair de baixo, e elas foram caindo de uma por uma na sua cabeça. Ontem e hoje, ele se lembrou de pedir desculpas ao Ricardo Fiúza, mas não se lembrou de pedir desculpas ao Eduardo Jorge, que foi um dos caluniados aqui na tribuna do Congresso, na tribuna da Câmara por ele e por seus companheiros. Esqueceu-se de pedir desculpas a Paulo Afonso Martins de Oliveira, que morreu respondendo a um processo condenado por calúnia. Paulo Afonso, que durante anos dirigiu a Câmara dos Deputados, ao ser Ministro do Tribunal de Contas e ter direito a um apartamento funcional, foi acusado por Dirceu e por seus companheiros de apropriação indevida, de ocupação indébita. 

O PT a vida inteira, Sr. Presidente, se caracterizou por aniquilar honras, destruir reputações. Quem não se lembra do Alcenir Guerra? O Brasil está cheio desses exemplos. E agora exigem da Oposição um comportamento que nunca tiveram quando ocuparam esse posto. O PT não tem autoridade para criticar a Oposição brasileira, porque é a Oposição mais responsável que este País teve nos últimos anos e, agora há pouco, tivemos o exemplo. Saem do próprio Partido do Governo os que querem derrubar o Palocci, porque o Palocci tem cuidado com o cofre, o Palocci tem cuidado com a economia nacional.

Senadora Lúcia Vânia, José Dirceu agora disse que vai continuar sua luta e que vai percorrer o Brasil defendendo a reeleição do Lula. Duvido muito que Lula queira, porque não o quis, há pouco tempo, a seu lado no Palácio e discretamente pediu que saísse, que fosse para a Câmara dos Deputados se defender das acusações. Acho que Dirceu é a primeira grande vítima nacional e simbólica da ingratidão do PT. Serviu: sem Dirceu não haveria Lula; sem Dirceu, não haveria eleição. Mas Dirceu, para conseguir isso, teve que abdicar de alguns princípios. Aliás, Duda Mendonça, que combateu por ter sido artífice das campanhas que deram vitória ao Maluf, juntou-se àqueles que combateu ao longo do tempo. Aliou-se ao capital internacional, que condenava, virou as costas para a Igreja, que foi sua grande aliada ao longo desse tempo. Rasgou a história.

            Lamento todo esse processo. Ver um companheiro, um Parlamentar cassado não alegra ninguém. Acho até que algumas vezes a dose é maior do que o necessário. Mas, infelizmente, Sr. Presidente, essa decisão está tomada. Espero que o ex-Ministro que nasceu neste Governo poderoso, senhor de todos os caminhos do Governo, avalista do destino dos que queriam alguma coisa na Nação...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Heráclito Fortes, V. Exª já usou quinze minutos e há outros oradores. E quinze é um número abençoado, é o número do PMDB, que V. Exª entrou na política, e tem na Bíblia, provérbio.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - V. Exª está me dando mais quinze minutos? Agradeço, fico muito satisfeito com a generosidade, é uma homenagem que V. Exª me presta no dia de hoje. Com certeza ocuparei muito menos tempo.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Não, é o número 15 que lembrei, que V. Exª foi do PMDB. E ninguém se perde no caminho de volta. Ali está o Senador Alberto Silva convidando a sua volta.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Era exatamente sobre isso o encerramento do meu discurso. Espero que o Dirceu não se perca no caminho de volta o da humildade, que percorra os caminhos que prometeu com as sandálias da humildade, fazendo realmente uma análise sincera dos erros, da arrogância, da prepotência. Mas que não sirva só para ele essa lição; sirva para o seu partido, seus companheiros. Lamento porque, sem o Dirceu, o PT está mais pobre. O Dirceu vai fazer muita falta ao Partido dos Trabalhadores, porque, com todos os seus defeitos, ainda era uma cabeça, um horizonte, um rumo. E o que temo, Sr. Presidente, é que a biruta enlouqueça a partir de agora. Pergunto: quais as cabeças que, a partir de hoje, vão pensar pelo Partido? Para fazer estratégia, para traçar planos, para discutir e até mesmo para errar? Ninguém acertou nos últimos anos tanto quanto o José Dirceu, mas também ninguém errou tanto quanto ele, e por isso está pagando.

Muito obrigado.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/12/2005 - Página 42356