Discurso durante a 214ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Greve dos funcionários do Partido dos Trabalhadores por não receberem seus salários. Processo de cassação do ex-Deputado José Dirceu.

Autor
Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Greve dos funcionários do Partido dos Trabalhadores por não receberem seus salários. Processo de cassação do ex-Deputado José Dirceu.
Aparteantes
Jefferson Peres, José Jorge, Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/2005 - Página 42397
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GREVE, FUNCIONARIOS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), MOTIVO, AUSENCIA, PAGAMENTO, CRITICA, ORADOR, INEFICACIA, ADMINISTRAÇÃO, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA.
  • ANALISE, CONDUTA, JOSE DIRCEU, EX-DEPUTADO, PROCESSO, CASSAÇÃO, ELOGIO, HISTORIA, NATUREZA POLITICA, CRITICA, VINCULAÇÃO, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, REPUDIO, FALTA, SOLIDARIEDADE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dois assuntos me trazem hoje à tribuna deste Senado. Vou escolher, Senador Tião Viana, para falar, em primeiro lugar, de um tema sobre o qual eu já provoquei V. Exª e o Senador Paulo Paim.

Senador Jefferson Péres, se aqui estivesse o Senador Mão Santa, diria: “Atentai bem!” Mas sou eu que aqui estou.

Dos jornais que circulam hoje pelo País, destaco o Estadão, que traz uma matéria dizendo que os funcionários do Partido dos Trabalhadores estão em greve por falta de pagamento.

Senador Jefferson Péres, nós ainda vamos ver, nesse Governo, boi voar!

O Partido dos Trabalhadores que, durante vinte anos, de maneira impiedosa, fustigou Prefeituras de pequenas cidades do interior deste País, fustigou Governos; o Partido dos Trabalhadores, Senador Cristovam Buarque, que colocou na porta do Ministério da Educação, em várias administrações, inclusive na de V. Exª, piquetes reivindicando não apenas salários mais altos como que fossem pagos em dia; esse Partido dá hoje um mau exemplo ao País todo, motivando a greve dos seus servidores.

O Senador Paulo Paim, homem de pureza de espírito, disse que o Partido é um Partido pobre. Sabe o Senador Paulo Paim que a história não é bem essa. Talvez o dinheiro do Partido tenha sumido, mas o Partido, só de recursos legais, arrecadou, no ano passado, mais de 40 milhões.

No início do mandato - e os Anais da Casa estão aí para comprovar -, quando vi aquela volúpia, aquela sofreguidão do PT em arrecadar dinheiro, eu dizia que o Partido dos Trabalhadores, ao final do mandato do Lula, seria o Partido mais rico do ocidente - e, quem sabe, depois, o Partido mais rico do mundo. Isso não foi, Senador Paim, porque as intenções de arrecadação não eram sinceras. E, se aqui estivesse Roberto Jefferson, diria: “Não eram republicanas”. Mas V. Exª sabe muito bem o quanto este Partido arrecadou.

As histórias dos empresários sobre as colaborações que deram para o Partido dos Trabalhadores não é motivo para que, primeiro, se corte o número de servidores do Partido; e, segundo, que atrasem os pagamentos. Agora, resta saber se as estrelas, se os medalhões também tiveram os seus salários cortados.

Concedo um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Heráclito, V. Exª, com uma inteligência acima do normal, está demonstrando o óbvio, mas eu queria só dar uma colaboração, por V. Exª ser internacional. Um dos maiores roubos que a humanidade conheceu foi o assalto ao trem pagador, realizado por Ronald Biggs. Ninguém desconhece que houve muito roubo com Ronald Biggs, o mundo todo sabe disso. Depois, ele veio para o Brasil para gastar tudo e, na sua velhice, pediu para ser preso na Inglaterra, porque não tinha mais nada. Foi o caso do PT. Roubaram muito, muito mais do que Ronald Biggs. Agora, gastaram o dinheiro. O roubo foi demais!

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Agradeço a colaboração de V. Exª.

Faço este registro com muita tristeza, Senador Tião Viana!

Em Eclesiastes, lê-se que o homem é dono da palavra guardada e é escravo da palavra anunciada. O PT está engolindo tudo aquilo que assacou contra os outros.

Que coisa triste passar pela porta do Partido, em São Paulo, aquela sede que foi comprada - uns dizem que com o dinheiro do Porcão; outros, que com outras arrecadações -, e ver os servidores na porta. Será que vão usar a bandeira da CUT? Como será esse manifesto? Como a imprensa, hoje, Senador Paulo Paim, vai mostrar os manifestantes do PT? Talvez de luto, com bandeira vermelha, com a CUT, com aqueles refrões de antigamente? Será que se farão ecoar na porta da sede do poderoso Partido dos Trabalhadores?

            Senador Paulo Paim, concedo a V. Exª um aparte.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Heráclito Fortes, sempre digo que tenho muito orgulho de ter vindo do movimento sindical e lhe confesso que, outras vezes, no passado, mediei discussões e negociações de greve, inclusive para os funcionários do sindicato, pelo fato de o sindicato não estar em dia. E foram negociações positivas, que deram um resultado que atendeu as duas partes. Também já houve o caso de inúmeros Partidos se encontrarem em situação financeira grave, mas entendo, Senador Heráclito Fortes, que o pagamento dos funcionários tem de ser prioridade um. Por isso que, na conversa que tive com o atual Tesoureiro, o Gaúcho Ferreira, conversamos muito sobre a situação do Partido. Ele me mostrou, naturalmente, dificuldades.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - O Gaúcho é o mesmo Paulo Ferreira, Secretário de Finanças?

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - É o Secretário de Finanças, exatamente. Conversamos bastante sobre a situação e me coloquei inclusive à disposição, Senador Heráclito Fortes, para que, quem sabe, eu possa ajudar, como ex-sindicalista, também nessa mediação. E acho legítimo que a CUT também participe, ou outra central sindical, se assim entender, no processo de negociação, de entendimento. Hoje, eu falava de uma negociação de que participei, de um fato que envolvia inclusive empresas multinacionais e uma empresa nacional, que é a Soprano, do Rio Grande do Sul. Nessa mediação, construímos um grande entendimento em que todos ficaram tranqüilos. Por isso, trata-se de um fato real. Sou daqueles que sempre disse, ao longo da minha vida - não é hoje que estou dizendo isto - que, quem pensa que, no PT, ou no PCdoB, ou no PSB, ou no PFL, ou no PMDB ou no PDT todos são anjos e santos, isso não é real. E comecei a falar do PT. Venho falando isso durante anos e anos e, por isso, muitos dizem que tenho uma porção de rebeldia. Somos humanos. Existe uma agremiação, existe um número de funcionários - nem sei se são 100, 200, 300, 400 ou 500 - que, no momento, entende que tinha de fazer greve para que lhes fosse pago o que eles tinham de direito. Estou solidário aos funcionários e entendo que o Partido deve, rapidamente, estabelecer a negociação e pagar o direito de todos os funcionários. É nessa linha que eu queria fazer um aparte a V. Exª, não me contrapondo a sua crítica, porque a crítica é legítima, e nós a fazemos no momento em que entendemos mais adequado. Estou seguindo uma linha propositiva, é a forma pela qual tenho atuado aqui, no Parlamento. Por isso, entendo que, neste momento, é fundamental estabelecer-se a negociação, e os funcionários do Partido receberem o que têm de direito.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Senador Paim, não sou eu quem compreende, mas o País inteiro compreende a posição de V. Exª e sabe o quanto V. Exª foi massacrado este ano, aqui, pelo seu Partido em relação a compromissos assumidos. V. Exª sofreu muito para que fosse honrado aquilo que tinha sido assumido. O Sr. Paulo Ferreira diz hoje, Senador Jefferson Péres: “Não estamos na ilegalidade”. Vejam bem o que diz o PT hoje, Senador Tião Viana. “Não estamos na ilegalidade. Os salários podem ser pagos até o 5º dia útil do mês”.

Senador Cristovam Buarque, num passado bem recente, ai do prefeito, do governador, do administrador público que não pagasse os salários no mês corrente e que atrasasse um dia sequer, porque a fúria, as picadas, as barricadas invadiam os gabinetes.

O Sr. Paulo Ferreira - Gaúcho Ferreira, como disse o Senador Paim - usa exatamente aquilo que o seu Partido tanto condenou: o empreguismo. E, aqui, ele reconhece que havia excesso de funcionários na sede do PT, em São Paulo. Dos 145, foram reduzidos, Senador Mão Santa, para 87.

Triste fim, triste fim este Governo começa a ter!

Quero dizer aqui, mais uma vez, que lamento a cassação do Deputado José Dirceu, como lamento a cassação de qualquer homem público. Penso que o País perdeu, mas tenho a convicção de que o Deputado José Dirceu foi também vítima dos seus próprios erros. Não tenho dúvida com relação a isso.

Nunca vi nada tão cruel como o que o seu próprio Partido fez com o José Dirceu nos últimos dias. Vi, Senador Tião Viana, vários correligionários de V. Exª fazerem a defesa de José Dirceu da seguinte maneira: “Não podemos cassar o José Dirceu, mas, se ele não for cassado, a crise vai continuar, e quem vai pagar o preço é o PT”. Ouvi isso diversas vezes, Senador Paulo Paim. Defesa desse jeito é dispensável!

Senador Tião Viana, outro dia, eu o comparei ao Lima. Toda crise, todo rolo em que entra, no plenário principalmente, o PT o convoca para resolver. O Lima - Senador Mão Santa, V. Exª não estava aqui naquele dia - era do Santos Futebol Clube e jogava, a não ser como goleiro, em todas as posições. Imagine: até quando faltava o Pelé, o Lima ia para o lugar dele e se saia bem.

O PT, Senador Tião Viana, criou esse emaranhado do qual não consegue sair. O Ministro José Dirceu, anteontem, culpou a Oposição, mas V. Exª se lembra muito bem de que, se não fosse a Oposição que ele criticou, principalmente o PFL, essa crise teria começado exatamente com o episódio do Sr. Waldomiro Diniz. Foi graças a quatro votos, entre os quais incluo o meu, que a CPI não foi instalada àquela época. Talvez tivesse sido muito melhor para o País. Se tivesse havido um exemplo, um freio, as coisas não aconteceriam como aconteceram.

O que me deixa triste nisso tudo, Senador Jefferson Péres, é que o José Dirceu - que enfrentou a clandestinidade, a ditadura, que conviveu com Che Guevara e foi hóspede de Fidel Castro - foi cassado não por ter seu envolvimento em ligações com nenhum deles, mas com Waldomiro, com Delúbio Soares e aí afora, o que é ruim para a biografia de um homem como o Dr. Dirceu.

Não quero dizer que ele tem culpa, não sou eu que vou julgá-lo, mas é impossível que não sobre para um homem que assumiu e que trouxe para si tantos poderes. Ele, ontem, disse que vai percorrer o Brasil defendendo a reeleição do Presidente Lula. Será que consultou o Presidente Lula? Será que o Presidente Lula vai querer a sua companhia? Ora, o Presidente Lula, Senador Jefferson Péres, não a quis há três meses, quando pediu que ele saísse e disse: “Volta para a Câmara e vai-se defender. O seu lugar é lá!”. Vai querer agora? E essa companhia fará bem a uma possível tentativa do Presidente da República de reeleição?

Faltou humildade ao ex-Ministro José Dirceu na hora da saída. A sandália da humildade que aqueles rapazes da televisão andam espalhando por aí, criando o Pânico na TV, faltou num momento como esse ao Sr. José Dirceu.

Senador Jefferson Péres, com a maior alegria, concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador Heráclito Fortes, tal como V. Exª, lamento que um homem público como José Dirceu termine melancolicamente dessa forma, com seu mandato e seus direitos políticos cassados, mas, como bem disse V. Exª, ele é vítima dos seus próprios erros. Ele não é vítima dos outros, da Oposição; ele não é perseguido politicamente. Ele errou gravemente, intencionalmente, e mereceu a punição que levou. Quanto à afirmativa dele de ontem, de que vai ser cabo eleitoral do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, há duas leituras possíveis, Senador Heráclito Fortes: ou ele é, realmente, excessivamente vaidoso, como V. Exª diz, está cego e pensa que pode ajudar o Presidente Lula, ou, então, ele é maquiavélico. Ele está magoado, porque o Planalto não se empenhou como deveria na defesa do seu mandato, sabe que é o anticabo eleitoral e que seu apoio será negativo. Quem sabe se não será uma forma inteligente de se vingar do Presidente Lula? É uma hipótese também.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Agradeço a V. Exª o aparte. É um raciocínio lógico e, como diria Stanislaw Ponte Preta, é o óbvio ululante. Vamos aguardar os fatos.

Concedo o aparte ao Senador José Jorge.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Senador Heráclito Fortes, eu também gostaria de acrescentar algo em relação à entrevista do Deputado José Dirceu. Em primeiro lugar, acredito que será este o último dia em que falaremos desse tema, porque, realmente, ele já ocupou muito espaço na mídia e no nosso trabalho no Congresso. Ele diz sempre que é uma espécie de cassado político e culpa a Oposição e a mídia, mas, verificando os números, ele foi cassado por seu próprio grupo, porque a Oposição não tinha, na Câmara dos Deputados, os votos necessários para sua cassação.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Era preciso 150 votos. Segundo alguns, aproximadamente 20 Parlamentares da Oposição votaram em solidariedade a ele por vários motivos. São 130 votos. Onde arrumaram os outros?

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Exatamente. Outra coisa: no Conselho de Ética, em que Oposição é minoritária, ele perdeu por 13 votos a um. Somente a Deputada Angela Guadagnin votou nele. Então, na realidade, ele foi cassado porque há um amplo consenso na sociedade, o qual foi repassado para a Câmara dos Deputados, de que o Ministério José Dirceu era o líder, o chefe do chamado “mensalão”. Então, ficou provado que o “mensalão” existe e que a Câmara e a sociedade acham que ele era o chefe desse processo. Muito obrigado.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Agradeço a V. Exª, Senador José Jorge. O que me deixa ansioso é o silêncio do Senador Cristovam Buarque sobre o episódio todo. Quando o Senador Cristovam Buarque abrir a chaleira, terá muita coisa a contar do que viu e do que ouviu. Tenho certeza de que o seu silêncio é estratégico, mas S. Exª é uma das melhores testemunhas oculares de todo esse episódio - não só S. Exª, mas vários outros. Mas a vida é assim mesmo.

Ontem, estive em um restaurante de Brasília freqüentado por políticos, e o que se comentava, Senador Paulo Paim, é que os três Ministros mais importantes do Governo - confesso que não sei quais são, hoje, os três Ministros mais importantes - já estavam jantando em um lugar de Brasília, após sorver o primeiro cálice comemorativo pelo episódio encerrado, e projetando o Brasil pela ótica petista, sem a interferência do José Dirceu. Que sentimento!

A solidariedade humana, Senador Jefferson Péres, expressa-se de várias maneiras: há aquele amigo de todas as horas, há aquele das ocasiões de dor, há os indiferentes, mas o pior tipo de solidariedade é a daquele que só chega à porta na missa de sétimo dia e, assim mesmo, não entra na igreja, fica do lado de fora, com medo de o morto ter saído do mundo por doença infecto-contagiosa.

O PT não sabe ainda como se portar diante desse episódio, mas, com certeza, Senador Tião Viana, salvo raríssimas exceções, tristeza não habita nessa casa petista. Tudo aquilo que o Sr. José Dirceu fez pelo Partido é página virada. Era a hora de Carlos Drummond de Andrade perguntar: “E agora, José?”.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/2005 - Página 42397