Discurso durante a 214ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Sucateamento da Marinha do Brasil.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS.:
  • Sucateamento da Marinha do Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/2005 - Página 42413
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • REGISTRO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, MARINHA, DEFESA, IMPORTANCIA, MODERNIZAÇÃO, EQUIPAMENTOS, ARMAMENTO, BENEFICIO, SOBERANIA NACIONAL, CRITICA, INFERIORIDADE, LIBERAÇÃO, RECURSOS, ORÇAMENTO.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, depois de tanta turbulência política, tratemos também de fatos que deveriam ser outros, mas que não têm envolvimento de natureza política.

Estou preocupado com o que vem acontecendo ao Poder Naval brasileiro. Vislumbro para esse setor militar, a continuar o tratamento que lhe é dispensado pelo Governo, um breve futuro pessimista. As coisas não apenas param na Marinha, mas recuam. Iniciativas e serviços são desativados, em que pese a importância deles para o nosso País.

E a singularidade desses acontecimentos, Sr. Presidente, está no fato de que a Marinha, em virtude dos royalties que lhe são legalmente destinados por lei, teria recursos, se os recebesse, para alterar substancialmente o quadro de praticamente insolvência que a envolve.

Tais agruras financeiras, na verdade, vêm comprometendo não somente a Marinha, mas todas as nossas Forças Armadas. Hoje, porém, vou-me deter na Marinha, calcado nas recentes informações que chegaram às minhas mãos.

Nosso País não pode prescindir de um Poder Naval aprestado e balanceado, que inspire credibilidade, que respalde as ações diplomáticas da política externa brasileira e que participe, quando e onde for necessário, das operações internacionais para manutenção da paz e cumpra, com eficiência e com eficácia, as tarefas subsidiárias que lhe compete executar: hidrografia, oceanografia, segurança à navegação e assistência às populações ribeirinhas, sobretudo na Amazônia brasileira.

No entanto, os armamentos e equipamentos da nossa Marinha encontram-se em situação de sucateamento que não tem precedentes na história deste País. De fato, o quadro é alarmante!

Entre outros exemplos, cito o do Tikuna, um submarino que, há sete anos, vem sendo construído. Trata-se de versão maior e mais rápida que os quatro submarinos da classe Tupi, já bastante ultrapassados tecnologicamente. A construção tem-se “arrastado” por todo esse tempo devido à falta de verbas para o projeto. O navio corre o risco de já nascer obsoleto. As obras demoram tanto, que os planos para a construção de um segundo submarino do mesmo tipo foram abortados, pois o Tikuna já se mostrará ultrapassado quando estiver pronto.

Em vez de prosseguir com o projeto, planeja-se partir logo para o chamado Submarino Médio Brasileiro (SMB), com oito metros de diâmetro, dois a mais que a classe Tupi, e 67 metros de comprimento. Será feito com casco duplo, exigência fundamental para a futura construção de um submarino nuclear.

Esse Submarino Médio Brasileiro já deveria estar em construção no Arsenal da Marinha, e cada ano de atraso complica ainda mais a situação do projeto.

Enquanto perdemos esse precioso tempo, a Venezuela, por exemplo, que já tem submarinos semelhantes aos nossos Tupis, planeja trocá-los pelos franco-espanhóis Scorpène, do mesmo tamanho e tecnologia esperados no SMB. O Chile, por sua vez, já comprou dois, enquanto a Índia vai construir nada mais que seis. Ou seja, enquanto nos atrasamos, enquanto recuamos, esses países, com menor PIB do que o Brasil, avançam e submetem suas Forças Armadas a um tratamento digno da defesa dos interesses da pátria.

Em relação aos navios de superfície, temos seis fragatas da classe Niterói, que, embora construídas na década de 70 - portanto, com um desenho considerado antigo para os padrões atuais -, foram reequipadas com armamentos e equipamentos eletrônicos modernos. No entanto, as fragatas da classe Greenhalgh estão começando a sentir os efeitos da falta de recursos. Uma delas precisou ser desativada no ano passado, transformando-se em uma espécie de depósito de peças de reposição para as três restantes. Ou seja, pratica-se o canibalismo entre as unidades da Marinha, para que pelo menos algumas dessas unidades possam continuar navegando, Senador Mão Santa.

As quatro corvetas da classe Inhaúma deveriam ter sido acompanhadas por um número igual ao das da classe Barroso, que é um modelo um pouco mais avançado. No entanto, apenas uma está sendo construída, e, ao que indica a falta de recursos, a “classe Barroso” será formada por apenas essa representante.

Dos contratorpedeiros da classe Pará, sobrou apenas um. Faltam também pelo menos dez navios-patrulha da classe Grajaú para fazer o patrulhamento diário da costa brasileira e dos campos de petróleo.

Em relação ao estratégico e extremamente operacional porta-aviões São Paulo, há urgente necessidade de modernização dos jatos A-4 Skyhawk ou de sua troca pelos Rafale franceses ou pelos Sukhoi-30 russos. Os veteranos helicópteros de ataque Sea King devem ser trocados ou passar por ampla modernização.

A Marinha ainda não dispõe de aviões-radar ou de helicópteros com essa função, para ter uma arma decisiva no caso de guerra, a detecção do inimigo - especialmente de aviões equipados com mísseis.

Sr. Presidente, torna-se imperativa a substituição dos equipamentos náuticos com vida útil já ultrapassada e a modernização dos que já se tornaram obsoletos e cuja manutenção é antieconômica. Sabemos que não se estrutura um Poder Naval de um momento para o outro. Apenas para citar um exemplo, o tempo que decorre entre a fase de um projeto de um único navio fragata e a sua prontificação operacional varia entre seis e dez anos. Por causa disso, em 2002, foram elaborados e aprovados o Programa Emergencial de Recuperação do Poder Naval e o Programa de Reaparelhamento da Marinha.

Estava prevista a liberação de US$7 bilhões, ao longo de 18 anos, a contar de 2002. No entanto, o que vem ocorrendo é um contingenciamento muito grande da verba destinada à manutenção, à modernização e à recuperação dos equipamentos da Força do Mar.

Até agora, não foi iniciado nenhum dos principais pontos dos programas. São fundamentais para colocar a Força Naval em condições de realmente defender o litoral brasileiro, bem como os 4,5 milhões de quilômetros quadrados da Zona Econômica Exclusiva dos nossos mares e do prolongamento da Plataforma Continental (a chamada Amazônia Azul).

De uma maneira geral, segundo os dados do meu conhecimento, toda a esquadra precisa de modernização nos próximos anos, o que está previsto nos dois programas. O programa se torna inviável, dado o contingenciamento das verbas merecidas pela Marinha de Guerra.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o valor previsto para a Marinha na proposta de Orçamento para 2006, encaminhada pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional, é menor do que o do Orçamento deste ano, que já foi muito aquém do mínimo necessário para manter as atividades da Força. Com isso, seus serviços e atividades, que já estavam seriamente comprometidos, serão gradualmente interrompidos.

A Marinha solicitou cerca de R$2,5 bilhões para a execução de suas atividades em 2006, mas conseguiu que apenas um pouco mais de R$1,1 bilhão fossem alocados no Projeto de Lei Orçamentária Anual a seu favor. A diferença - cerca de R$1,4 bilhão - terá de ser buscada junto ao Congresso por meio de emendas.

O mais perverso de toda essa situação talvez seja o fato de que a Marinha possui recursos razoavelmente suficientes para reverter esse quadro, os quais, no entanto, encontram-se contingenciados pelo Governo. Trata-se de quase R$1 bilhão, oriundos da cobrança de royalties referentes à exploração de petróleo ou gás natural, o que é direito da Marinha Brasileira por força das Leis nºs 7.990/89 e 9.478/97. O dinheiro é vinculado ao comando da Marinha e não pode ser utilizado em despesas de outros setores. Apesar disso, como já disse, encontra-se bloqueado. Uma quantia que cabe exclusivamente à Força Militar, nem essa é liberada pelo Governo para atender às necessidades urgentes da Marinha de Guerra do Brasil.

Outro dado interessante é o seguinte: no Orçamento de 2006, a “fatia” devida à Marinha corresponde a 0,55% do total, ou seja, menos de 1%. No entanto, sua contribuição para a meta de superávit primário - por meio do contingenciamento de seus recursos - será de 1,80%, ou seja, três vezes maior, o que representa um sacrifício desproporcional e injusto.

É absolutamente imprescindível a reversão desse quadro orçamentário calamitoso pelo qual passa a nossa Força do Mar. Sem isso, corremos o risco até mesmo da extinção de seu patrimônio, o que colocará o nosso País em situação jamais vista em relação à defesa de suas áreas marítimas e fluviais.

Por fim, Sr. Presidente, quero lembrar que, para que a Marinha brasileira possa cumprir as determinações legais de fiscalizar e proteger as áreas de produção de petróleo situadas na plataforma continental, é necessário que o Governo também cumpra as determinações legais aprovadas pelo Congresso Nacional, possibilitando a imprescindível implementação do Programa Emergencial de Recuperação do Poder Naval e do Programa de Reaparelhamento da Marinha. É o que se espera da responsabilidade de nosso Governo.

Sr. Presidente, concluo dizendo que o Brasil, hoje, já se orgulha de ser um País auto-suficiente em petróleo. Oitenta por cento das nossas reservas se encontram na plataforma marítima e a Marinha de Guerra é a responsável pela fiscalização de toda essa área. Todavia, não recebe sequer os recursos que estão previstos nos tributos que se destinam exclusivamente a essa função. A Marinha não os recebe. Amanhã, se houver um acidente com uma dessas plataformas, isso custará infinitamente mais do que custariam os implementos necessários à Marinha para que faça a devida, correta e eficiente fiscalização de toda essa área.

O Exército tem hoje, Presidente Mão Santa, 230 mil soldados nas suas fileiras, mas vai perder 50 mil porque eles não têm sequer como almoçar nos quartéis. Os recursos previstos para o Exército Brasileiro darão para responder às suas despesas somente até julho do próximo ano. E, a partir de julho, o que ocorrerá com o Exército? Assim também está ocorrendo com a Força Aérea Brasileira.

Uma de duas: ou o Governo toma a decisão no sentido de olhar para as suas Forças Armadas, ou vamos ter uma situação trágica de sucateamento de todas elas.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/2005 - Página 42413