Discurso durante a 218ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre os pronunciamentos do presidente Lula, que insiste em dizer desconhecer a corrupção em seu governo. (como Líder)

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Considerações sobre os pronunciamentos do presidente Lula, que insiste em dizer desconhecer a corrupção em seu governo. (como Líder)
Aparteantes
Almeida Lima, Antero Paes de Barros, Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 08/12/2005 - Página 43119
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ALEGAÇÕES, DESCONHECIMENTO, CORRUPÇÃO, ENTREVISTA, EMISSORA, RADIO, DENUNCIA, CLASSE POLITICA, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, ORADOR, CRIME DE RESPONSABILIDADE, CHEFE DE ESTADO, OMISSÃO, CONGRESSO NACIONAL, ABERTURA, PROCESSO.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há pouco ouvimos aqui vários Senadores falando, e, no pronunciamento do Senador Romeu Tuma, os Senadores Edison Lobão e Sibá Machado brincavam sobre não terem conhecimento dos fatos.

Sr. Presidente João Alberto Souza, eu gostaria muito de estar entre aqueles que, por ignorância, por inocência ou até por vigarice política, típica de quem se omite por ser parte de camarilhas, não sabem o que está acontecendo. Acho que há duas possibilidades de se estar tranqüilo diante de uma situação: a pessoa ser tão ignorante que não consegue saber o que está acontecendo, pela análise técnica, pelo cruzamento dos sigilos, pela análise dos documentos comprobatórios dos crimes contra a Administração Pública. E a ignorância a gente perdoa, porque não são todos obrigados a terem conhecimento de tudo. Senador Mão Santa, V. Exª diz que sou sua assessora para assuntos de computador. Eu não sabia nada de computador, sei pouquíssimo a respeito de alta tecnologia; meu filho pequeno foi quem me ensinou. Então, ninguém tem obrigação de saber de tudo.

Contudo, nestas circunstâncias, nesta conjuntura nacional, só existem três alternativas para não se indignar diante do pronunciamento do Presidente da República ou da sua base bajulatória: os que pela ignorância não conhecem os procedimentos investigatórios, não têm as condições técnicas e objetivas necessárias para analisar e fazer o cruzamento dos sigilos bancário, fiscal e telefônico; aquele que, pela profunda inocência, é mais absolutamente perdoável. Ou aquele que é parte da camarilha política e que, portanto, por usufruir dos cargos, de prestígio e de poder, fica omisso, fazendo de conta que não está acontecendo nada.

Assim fica aqui esse dilema cada vez que o Presidente da República dá uma entrevista: uma banda vai elogiar, outra banda vai criticar.

Eu queria muito estar não na camarilha política, porque nem temperamento para ser parte dessa gentalha eu tenho; mas, pela ignorância ou pela inocência, gostaria de não saber exatamente o que está acontecendo no Brasil.

É fato que o povo brasileiro tem todo o direito de reeleger o Presidente Lula. O povo brasileiro tem o direito de tornar o Presidente Lula imperador do Brasil, de fazer um movimento nacional para voltar a monarquia, para ele ser imperador do Brasil. O povo brasileiro pode até, caso um dia ele morra - Deus nos livre disso! -, mandar mumificá-lo para prestar-lhe, solenemente, todos os dias, uma homenagem. O povo tem todo o direito de fazê-lo. Agora, a elite política e econômica, a não ser aquela que é cínica, vigarista e dissimulada, não tem o direito de mentir ao povo brasileiro, de fazer de conta que o Presidente Lula não sabia. Isso é que é o pior para mim. Quem tem do Presidente Lula uma visão elitista e preconceituosa pode dizer que ele não sabia de nada, que é um ignorante, um pau mandado, um acovardado, um qualquer que não sabe de nada. Mas não o é.

Tenho uma visão diferente do Presidente. O Presidente Lula é um homem brilhante. Ninguém chega à condição de maior liderança popular da América Latina sem ser brilhante. Profundo conhecedor das relações partidárias, era de dar gritos no Ministro José Dirceu. Então militante do Diretório Nacional, era de dar gritos em José Dirceu. Por isso, quando algumas pessoas dizem: “O Lula disse que vai levar o Ministro José Dirceu para o palanque”, penso que tem de levar mesmo. Claro!

Senador Jefferson Péres, por que o Congresso Nacional, embora saiba... Volto a repetir: só não sabe a responsabilidade do Presidente Lula nesse processo quem é ignorante, quem é inocente ou quem é da camarilha política do Presidente da República. Todos os outros sabem exatamente o que está acontecendo. Alguns falam, outros fingem, outros são cínicos e dissimulados, certamente para não cometer o gesto de má educação de comer e falar ao mesmo tempo. Porque estão comendo e se lambuzando no banquete do Palácio do Planalto, não querem fazê-lo.

Por que o Congresso Nacional não instaura um processo de crime de responsabilidade? Porque é desmoralizado; por isso. Não é porque não tem pressão popular. Realmente não há pressão popular, até porque muitos que eram militantes dos movimentos sociais hoje foram comprados e estatizados pelos cargos comissionados. Hoje são dirigentes importantes das estruturas governamentais. Isso é fato.

            Agora, se o Congresso Nacional não fosse uma instituição desmoralizada perante a opinião pública, tivesse autoridade perante a opinião pública, teria obrigação de, à luz da Constituição do País, Senador João Alberto Souza, abrir um processo de crime de responsabilidade. A não ser que não acredite em mensalão. Porque, olhe só o dilema...

(Interrupção do som.)

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Para concluir, Sr. Presidente, gostaria de conceder um breve aparte aos Senadores Jefferson Péres e Almeida Lima.

A Constituição - e isso não tem nada a ver com o Estatuto da esquerda nem do P-SOL - diz que várias coisas são passíveis de abertura de crime de responsabilidade, como o desrespeito à Lei Orçamentária. O governo faz o que quer, numa safadeza explícita: improbidade administrativa, desrespeito à legislação vigente e impedimento do livre exercício do Congresso Nacional. Porque, se havia mensalão... A não ser quem não acredita em mensalão, porque criança acredita em Papai Noel, e vigarista faz de conta que não acredita em mensalão. Ponto.

Concedo um aparte ao Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senadora Heloísa Helena, V. Exª tem toda a razão. Infelizmente, o Congresso Nacional se agacha diante do Executivo. O Executivo usurpou a função de legislar, legisla por meio de medidas provisórias, e o Congresso não faz nada. Nada! O Congresso é um subpoder. Estão discutindo na CPI dos Bingos se convocam ou não o Ministro Palocci. Quinta-feira, tentei convocar o Ministro da Defesa, que, desde agosto, Senadora Heloísa Helena, promete vir à Comissão de Relações Exteriores e não aparece. Tentei convocar, mas não deixaram. É feio convocar o Ministro! Isso é o Congresso Nacional, Senadora Heloísa Helena. Na semana passada, o governo do Canadá caiu porque foi descoberto financiamento ilícito de campanha. O governo desabou, e foram convocadas novas eleições. No presidencialismo, infelizmente, o Congresso Nacional é um subpoder. Por quê? Porque os congressistas - não falo de todos, mas de muitos - não se fazem respeitar.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Sr. Presidente, sei que V. Exª está sendo condescendente. Concedo um aparte ao Senador Almeida Lima e, em seguida, ao Senador Antero Paes de Barros.

O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Senadora Heloísa Helena, congratulo-me com V. Exª e solidarizo-me com seu pronunciamento. V. Exª está com a razão. Na verdade, estão faltando lideranças políticas, sobretudo, evidentemente, da Oposição, para organizar a ida do povo às ruas. Mas o povo está preparado para isso. O Senador Antero Paes de Barros, que vai me suceder no aparte a V. Exª, é testemunha de que, no ano passado, depois do episódio Waldomiro Diniz/José Dirceu e daquele meu pronunciamento do dia 2 de março de 2004, em Aracaju, conseguimos mobilizar e levar às ruas 10 mil pessoas, numa manifestação pela ética e pela moral pública, com fundamento naquele fato. E o povo foi. O nobre Senador Antero Paes de Barros e o Deputado Alceu Collares, além de Eduardo Gomes, que lá estiveram, impressionaram-se por ver, com tanta antecedência a um processo de eleições, o povo mobilizado nas ruas para contestar a imoralidade do governo. Portanto, o que falta mesmo são lideranças com crédito na Oposição para fazer isso. Evidentemente que não são todas. Muito obrigado e minha solidariedade ao pronunciamento de V. Exª.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Agradeço a V. Exª.

Concedo aparte ao Senador Antero Paes de Barros.

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - Senadora Heloísa Helena, quero só pedir uma autorização a V. Exª. Talvez V. Exª não tenha percebido, mas pronunciou hoje uma das frases mais geniais que já ouvi no Congresso Nacional. Eu gostaria de pedir autorização de V. Exª para usar sua frase no meu cartão de Natal: “Criança acredita em Papai Noel; vigarista faz de conta que não acredita em mensalão”. Parabéns a V. Exª.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Está autorizado.

Senador João Alberto Souza, sabendo da delicadeza de V. Exª e agradecendo todos os apartes, eu sei que, cada vez que fazemos um pronunciamento como este, muitas vezes geramos tristeza, sentimento de desolação e de desesperança em muita gente também. As pessoas começam a pensar que realmente não tem jeito, que há uma desgraça geral mesmo. Então, só para não terminar com muita desesperança, falarei de Santo Agostinho, Senador Mão Santa, que disse uma frase linda. Ele dizia que a esperança tem duas filhinhas lindas, uma é a indignação e outra, a coragem. A indignação de não aceitar a injustiça e a coragem de mover montanhas para modificá-la.

O povo brasileiro - volto a repetir - tem todo o direito de reeleger o Presidente Lula, transformá-lo em imperador, mumificá-lo. Tem todo o direito. Eu gostaria muito que, na época da eleição, pensassem como na parábola dos porcos. Quando um dos discípulos foi se queixar com Jesus, dizendo “não tem jeito, fico tentando passar sua mensagem, mas todo mundo fica zoando de mim, mangando, dizendo isso e aquilo”, Jesus disse: “Não dê pérolas aos porcos, porque eles não saberão o que fazer com elas”. Então, espero que o povo brasileiro, no processo eleitoral, faça o que Jesus Cristo disse aos discípulos.

Portanto, espero que, do mesmo jeito que Jesus Cristo disse: “Não dê pérolas aos porcos, porque eles não saberão o que fazer com elas”, também que o povo brasileiro não dê votos aos porcos da política, porque, certamente, eles vão chafurdar alegremente na pocilga da corrupção às custas da dor, da miséria e do sofrimento da grande maioria do povo brasileiro.

Obrigada, Senador João Alberto, pela clara delicadeza em conceder maior tempo.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/12/2005 - Página 43119