Discurso durante a 222ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Sentimento de pesar pelo falecimento do Deputado Ricardo Fiúza. Considerações a respeito do crédito consignado aos aposentados e pensionista do INSS.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. BANCOS.:
  • Sentimento de pesar pelo falecimento do Deputado Ricardo Fiúza. Considerações a respeito do crédito consignado aos aposentados e pensionista do INSS.
Publicação
Publicação no DSF de 14/12/2005 - Página 44160
Assunto
Outros > HOMENAGEM. BANCOS.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, RICARDO FIUZA, DEPUTADO FEDERAL, ELOGIO, HISTORIA, ATUAÇÃO, VIDA PUBLICA, CONTRIBUIÇÃO, ELABORAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CODIGO CIVIL.
  • DENUNCIA, ALICIAMENTO, BANCOS, PREJUIZO, APOSENTADO, PENSIONISTA, BAIXA RENDA, PAGAMENTO, EMPRESTIMO, MEDIAÇÃO, CONSIGNAÇÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO, CRITICA, DESRESPEITO, FALTA, INFORMAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, RESULTADO, COMPROMETIMENTO, SALARIO MINIMO.
  • SUGESTÃO, CRIAÇÃO, PROJETO DE LEI, REVOGAÇÃO, LEGISLAÇÃO, CONSIGNAÇÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO, APOSENTADO, PENSIONISTA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS).
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, PREJUIZO, APOSENTADO, PENSIONISTA, BAIXA RENDA, UTILIZAÇÃO, CONSIGNAÇÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobre Senador Jefferson Péres; Srªs Senadoras e Srs. Senadores, desejo iniciar minha oração registrando meu sentimento de pesar pelo falecimento do Deputado Ricardo Fiúza, ocorrido ontem. Encontrava-me fora de Brasília, por isso não pude, na ocasião, manifestar-me durante a homenagem que o Senado lhe prestou.

Eu era amigo do Deputado Ricardo Fiúza, fomos colegas de turma na faculdade de Direito, concluímos o curso na turma de 1963, intitulada “João XXIII”, que foi o Papa do grande aggiornamento da Igreja, e eu diria que Fiúza foi a um só tempo empresário e político, mas, na realidade, sua alma era apaixonada pela política.

Ao longo de oito mandatos como Deputado Federal e de duas vezes Ministro, S. Exª pensava o País, seus problemas, fórmulas de resolvê-los e de alguma forma deixou uma contribuição que não será esquecida.

Sem querer me alongar em considerações sobre sua vida pública, gostaria de me referir a duas contribuições do Deputado Ricardo Fiúza ao Congresso Nacional: a primeira foi a criação do chamado Centrão por ocasião da Constituinte. Não fora a sua criação, do qual S. Exª foi um dos coordenadores, certamente a Constituição não teria sido concluída em tempo hábil e não teria tido as correções de rumo que recebeu.

A outra contribuição que S. Exª deu ao País, mais recentemente, foi à aprovação do novo Código Civil. S. Exª foi o Relator da matéria, na Câmara dos Deputados. Recebeu um projeto que já havia sido examinado no Senado e que contara com a colaboração excepcional do sempre lembrado Senador Josaphat Marinho.

Fiúza fez um trabalho que teve reconhecimento público, tanto é que o Código foi sancionado, e é compatível com a semântica dos novos tempos, ou seja, atualizou o Código Civil de 1917, que teve grandes autores, entre os quais, Clóvis Bevilacqua e Teixeira de Freitas, que tanto contribuíram para a sua edificação.

Certa feita, Bobbio disse que tudo que tem princípio tem fim. Isso se aplica aos humanos, daí por que somos chamados de mortais. É lógico que essa passagem pelo mundo, peregrinos que somos, para alguns é mais longa; para outros, mais curta. Eu diria que Fiúza fez uma viagem mais curta. Ele ainda tinha muito que dar ao País, às suas instituições.

Penso, todavia, que, quando as viagens são menos longas, isso não quer dizer que a pessoa não tenha deixado de dar sua contribuição, porque penso que a vida não é um mero passar dos dias, um passar anos. O importante não é saber quanto se vive, mas como se vive. O fato de sua viagem haver sido mais curta, não quer dizer que ele não tenha dado a sua contribuição ao País, às suas instituições e, de modo particular, ao nosso Estado de Pernambuco.

Deixou uma família bem constituída, era um excelente filho, pai, esposo e avô.

Quero aproveitar esta ocasião para, da Tribuna do Senado, apresentar meus sentimentos de pesar à viúva, Ilse - Ilsinha, como é chamada - aos seus filhos e netos. E lembrar que, conforme o Evangelho de Marcos, nunca sabemos o tempo em que permanecemos aqui. A qualquer momento, podemos ser chamados. Creio que Fiúza ao ser chamado, o foi com a consciência de que combateu o bom combate, como diria São Paulo.

Sr. Presidente, o que me levou a inscrever-me na tarde de hoje foi para falar de uma questão que me preocupa e, de modo especial, preocupa a comunidade mais pobre do Nordeste. Refiro-me ao crédito consignado, que foi aprovado aqui, no Congresso Nacional, em conseqüência de uma medida provisória, convertida em lei, e sancionada no dia 17 de setembro de 2003.

Eis o que disse, dias atrás, o Correio Braziliense:

Os aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que se deleitaram com empréstimos com descontos em folha de pagamento, estão no limite do endividamento, informou ontem o Banco Central. O mais dramático, segundo Eduardo Rodrigues, técnico da instituição, é que a maior taxa de comprometimento dos beneficiários com o pagamento de operações de crédito está entre os que recebem os menores rendimentos. Pelas pesquisas realizadas pelo BC [Banco Central], junto ao Ministério da Previdência, 49,89% dos segurados do INSS que ganham até um salário mínimo por mês estão devendo aos bancos. Se forem levados em conta aqueles que recebem até três salários mínimos, o índice chega a 76%.

Por aí vejam o nível de comprometimento dos aposentados e pensionistas do INSS.

A medida provisória que se converteu na Lei nº 10.820, a que já aludi, resultante da famigerada medida provisória encaminhada pelo Presidente da República, diz que os empregados regidos pela CLT etc. poderão autorizar, de forma irretratável e irrevogável, o desconto em folha de pagamento, mas muitos assumem esses compromissos e ignoram, infelizmente, a intensidade do compromisso que estão assumindo.

O fato é que assistimos, nos dias de pagamento, aos aposentados e pensionistas do INSS sendo assediados nas agências dos bancos ou nas agências dos Correios, porque, em muitos Municípios do Nordeste, não há agência de banco. O aposentado vai receber nas agências dos Correios. Quando essas pessoas simples, cuja maioria ganha um salário mínimo - talvez isso ocorra até na região de V. Exª, nobre Senador Jefferson Péres, porque o Amazonas tem problemas semelhantes ao Nordeste -, chegam lá para receber sua mísera pensão ou aposentadoria são surpreendidas com desconto em folha de uma quantia que está, de alguma forma, comprometendo o seu orçamento, o qual lhe assegura uma mera subsistência.

Essas pessoas, quando contraem empréstimos, são pouco informadas e levadas a acreditar que estão fazendo uma operação a custos reduzidos e pagável a longuíssimo prazo. É natural que se trata também de um aliciamento que é feito pelos bancos e, quando nada, também por seus representantes, que ficam nas agências do INSS, nas agências bancárias e nas agências dos Correios. Não vou citar muitos exemplos, mas essa é a realidade.

O fato é que a estratégia para atrair clientes obtém sucesso, pois o público alvo, como disse, pouco informado, não percebe os compromissos que está assumindo. E o negócio, a essa altura do campeonato, como se diz, Sr. Presidente, não é de pouco vulto: o total de recursos envolvidos na modalidade de empréstimo consignado alcançou, em outubro deste ano, cerca de R$31 bilhões, 2,5% mais que no mês anterior.

O que está acontecendo foi antevisto por todos nós ao votarmos a chamada MP. Sabíamos, por conhecer o nosso povo, que tal medida iria trazer conseqüências graves para os tomadores dos referidos empréstimos. É certo que o Governo Lula, ao propor a medida, teve como objetivo de sua política econômica buscar elevar o consumo e ativar a economia, concorrendo, assim, para o crescimento do PIB, ainda que comprometendo o minguado orçamento dos mais pobres e necessitados, que deveriam merecer maior cuidado por parte do Governo Federal, sobretudo nas regiões igualmente menos desenvolvidas, especialmente o Norte e o Nordeste do País.

Não vejo, Sr. Presidente, diante do grave problema que está gerado, especialmente para os aposentados e pensionistas, outra saída a não ser a proposição de um projeto de lei revogando a lei em vigor, pois ela, somente ela, pode tirar os aposentados e pensionistas do difícil quadro em que se encontram. Somente por meio de novo projeto poderemos evitar que novas pessoas de alguma forma sejam levadas ao comprometimento do seu orçamento, desconhecendo, naturalmente, as obrigações que estão assumindo.

Aliás, Sr. Presidente, não deixa de ser pitoresco - e eu fiz esse levantamento - que um dos itens da exposição de motivos do Presidente da República que acompanhou o texto da medida provisória diga:

12 - entendemos que o alcance social da providência em questão, bem assim os esperados impactos positivos sobre a economia e a sociedade, atesta o preenchimento dos requisitos de relevância e urgência previstos no art. 62 da Constituição (que é justamente o dispositivo que regula o instituto da medida provisória) para a edição de medida provisória.

Sr. Presidente, sem querer me alongar em considerações, há uma outra questão que se abre, que é a que diz respeito à utilização das medidas provisórias às vezes em questões em que não estão caracterizados os pressupostos da urgência e da relevância, como é o caso dessa medida provisória, ao final convertida em lei depois de apreciada na Câmara e aprovada no Senado.

Ninguém pode deixar de reconhecer, quanto ao comprometimento do orçamento doméstico dessas famílias pobres, que se de um lado esses empréstimos estimulam a economia, eles induzem as pessoas simples ao comprometimento dos seus rendimentos mensais, sem contar, também, que algumas são vítimas de verdadeiras fraudes facilitadas pela falta de segurança nos procedimentos em uso, como foi registrado, de maneira muito clara, na matéria “Um caso de polícia”, publicada na edição de 29 de novembro de O Estado de S. Paulo, da qual destaco o seguinte trecho:

O que está ocorrendo com os aposentados é muito grave. Na prática, eles têm sido bombardeados por propaganda maciça e por telefonemas de operadores de telemarketing que falam em nome de várias instituições bancárias oferecendo facilidades de crédito.

Cito, também, uma instituição extremamente reputada, a Serasa. Dados recentes por ela publicados mostram que o nível de inadimplência tem crescido anormalmente após o início da vigência do chamado crédito consignado, que, nos primeiros nove meses deste ano, cresceu mais de 60%. Esse tipo de crédito é oferecido de forma a “atender” os segurados da Previdência Social, mas, na realidade, importa em descontos obrigatórios que fazem com que não haja outro caminho para o tomador do empréstimo senão o seu pleno cumprimento, com juros e todos os adicionais devidos, de acordo com a legislação e as normas do Banco Central, no instante em que os juros, no Brasil, ainda se encontram também extremamente elevados.

Sr. Presidente, antes de concluir, eu quero mais uma vez chamar a atenção para a importância de revermos, também, o instituto da medida provisória.

Temos discutido muito, nesta Casa, a maneira como o Governo Federal exercita o poder que lhe é conferido pelo art. 62 da Constituição Federal, que trata da adoção de medidas provisórias. Nessas discussões, tem-se dado mais importância aos aspectos de relevância e urgência, que dizem respeito ao objeto da medida, do que à forma como tramitam no Congresso e às conseqüências sobre as pautas de ambas as Casas.

Além dessas circunstâncias - estou encerrando, Sr. Presidente -, desejo trazer à consideração de meus Pares a questão das conseqüências dessas medidas provisórias, nem sempre perfeitamente avaliadas por causa do afogadilho com que, geralmente, são discutidas e aprovadas no Senado Federal. Como a Câmara dos Deputados se alonga na análise da matéria, e é natural que assim o faça, quando chega ao Senado tem seu prazo já extremamente reduzido, o que nos põe, muitas vezes, diante ou da pura e simples revogação da medida ou, da aprovação com todas as suas incorreções e suas imperfeições. Foi o caso, por exemplo, da Medida Provisória nº 130, convertida na Lei nº 10.820, a que já me reportei.

Sr. Presidente, creio que a gravidade da situação está perfeitamente caracterizada. Concluo, Sr. Presidente, solicitando que o Governo Federal se sensibilize com o problema e adote as providências necessárias, considerando a experiência vivenciada nesses dois anos da existência da medida provisória. Nós, no entanto, no Congresso Nacional, temos como alternativa - e acredito que seja o que devemos fazer - elaborar um projeto de lei alterando a política adotada na concessão do crédito consignado.

Finalmente, peço a V. Exª, Sr. Presidente, a transcrição, na íntegra, da matéria publicada em O Estado de S. Paulo, a que já me reportei, e que ela seja, conseqüentemente, publicada juntamente com o meu discurso.

Agradeço a V. Exª pelo tempo a mim concedido. Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MARCO MACIEL EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserida nos termos do art. 210, inciso I e §2ºdo Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Um caso de polícia”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/12/2005 - Página 44160