Fala da Presidência durante a 223ª Sessão Especial, no Senado Federal

Balanço da atuação do Congresso Nacional na proximidade do encerramento da presente sessão legislativa.

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Fala da Presidência
Resumo por assunto
CONGRESSO NACIONAL. SENADO.:
  • Balanço da atuação do Congresso Nacional na proximidade do encerramento da presente sessão legislativa.
Publicação
Publicação no DSF de 15/12/2005 - Página 44799
Assunto
Outros > CONGRESSO NACIONAL. SENADO.
Indexação
  • AVALIAÇÃO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, INVESTIGAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, GRAVIDADE, CRISE, POLITICA NACIONAL, COMPROMISSO, COMBATE, CORRUPÇÃO, AUSENCIA, PARALISAÇÃO, PROCESSO LEGISLATIVO, REGISTRO, DADOS, VOTAÇÃO, MATERIA, SENADO, SIMULTANEIDADE, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), COMPROVAÇÃO, AUTONOMIA, LEGISLATIVO.
  • BALANÇO, GESTÃO, ORADOR, PRESIDENCIA, SENADO, DEFESA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), APERFEIÇOAMENTO, REGIMENTO INTERNO, BUSCA, MELHORIA, TRAMITAÇÃO, EXECUÇÃO, ORÇAMENTO, REDUÇÃO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
  • ANUNCIO, ATUAÇÃO, SENADO, REDUÇÃO, BUROCRACIA, COMISSÃO, RECUPERAÇÃO, PODER AQUISITIVO, SALARIO MINIMO, DEBATE, REFORMA POLITICA, AUMENTO, ETICA, CAMPANHA ELEITORAL, MELHORIA, CONTROLE, FISCALIZAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, REFORÇO, DEMOCRACIA, IMPORTANCIA, COMBATE, CRIME ORGANIZADO, LAVAGEM DE DINHEIRO, EVASÃO DE DIVISAS.
  • DEFESA, CONVOCAÇÃO EXTRAORDINARIA, CONGRESSO NACIONAL, COMPROMISSO, CONTINUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO.

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. PMDB - AL) - Srªs e Srs. Senadores, na história recente não tivemos um período tão intenso de investigações com potencialidades insondáveis. Em virtude da maturidade, equilíbrio e da responsabilidade do Congresso, a investigação desse turbilhão de denúncias está sendo séria e absolutamente transparente.

Fruto da exigência social e da vontade da maioria do Parlamento, o Congresso não se furtou à convocação da sociedade para combater a corrupção dentro e fora de seu corpo. Estamos fiscalizando e sustentando as votações no Senado graças ao bom senso e ao espírito público.

São tempos difíceis. Exatos 200 dias de crise, onde dezenas de pessoas foram afastadas de postos na administração, da vida partidária e do Parlamento. É, Srªs e Srs. Senadores, o começo de uma assepsia que prossegue. Como Presidente do Congresso Nacional, continuarei dando apoio irrestrito às investigações.

Este processo desconstruiu um mito. Não houve paralisia das votações como se apregoava. Desde o estopim da crise, apreciamos, no Senado Federal, 700 matérias; desde o início do ano, 1.725. Número eloqüente que revela a consciência dos Senadores e a preocupação de mostrar ao País que é possível, sim, a coexistência entre investigação e trabalho legislativo.

Trabalho e respostas rápidas fortalecem a instituição. Diversionismos e hesitações aniquilam biografias, maculam as instituições e adensam o horizonte da crise. Quando há investigação profunda, a instituição se revigora, readquire confiabilidade, renova sua credibilidade. O Congresso tem obrigação moral e dever constitucional de investigar tudo e punir todos os responsáveis.

Toda crise tem como sintoma inicial o destempero. Felizmente, verificamos que as impropriedades não passaram de subprodutos de retóricas isoladas. No conjunto, Srªs e Srs. Senadores, preponderou a prudência e o exame criterioso dos fatos em busca da verdade.

Falou-se que não haveria Comissão Parlamentar de Inquérito porque o Governo não queria. Injustamente, tentaram desqualificar a investigação, rotulando-a de “Chapa Branca”. Especulou-se sobre “acordão” e “pizza”. A resposta do Congresso foi a instalação das Comissões Parlamentares de Inquérito, apuração isenta e um relatório conjunto de duas Comissões propondo um vigoroso corte na carne. O dia-a-dia, Srªs e Srs. Senadores, demonstrou que não há vassalagem e que o Legislativo não é uma possessão do Executivo. Genuflexão, definitivamente, não é a nossa vocação. Quem aposta no triunfo da impunidade seguirá perdendo.

Paralelamente, grassou o terrorismo retórico. Muitos evocaram fantasmas inexistentes, teses desestabilizadoras, crises institucionais, e outras insinuações sinistras. A paranóia inventou até um “golpismo midiático”. A imprensa livre mostrou que não é domesticável, porque isto, em última instância, implica tentar domar a sociedade. Em nome da democracia, assim a imprensa também seguirá.

Tudo transcorreu dentro da legalidade, dentro das regras democráticas. Demonstração inequívoca de que o País amadurece e gera anticorpos naturais contra as crises e indiferenças aos arroubos da oratória. Àqueles que sugeriram conspirações e maquinações antidemocráticas, está aí o mais expressivo exemplo de que as instituições estão sólidas e exercendo suas funções com independência.

Fui eleito para exercer o cargo de Presidente do Senado Federal, e não para ser Líder do Governo ou porta-voz da Oposição. Desde o primeiro momento, comprometi-me instalar quantas CPIs tivessem amparo regimental. Reiterei que nada, nada mesmo, substituiria a investigação e que a governabilidade teria em mim um defensor sempre atento e sempre assumido.

Procurei me pautar pelo equilíbrio, isenção e transparência. Em todos os instantes compartilhei as ações e decisões com os líderes partidários. Nada foi feito à socapa. Os líderes demonstraram que têm dimensão da estatura dos cargos e se comportaram dignamente, divisando os limites entre os ríspidos embates políticos e os interesses superiores da Nação.

As crises, por maior desconforto que gerem, são pedagógicas. A partir delas, aprimoramos nossos diplomas legais e aperfeiçoamos nossos modelos de controle e fiscalização. Como Presidente, posso reafirmar que o Congresso sairá dessa crise de cabeça erguida, melhor do que entrou.

Internamente foi sensata a oposição do Senado a um intempestivo reajuste nos vencimentos dos Parlamentares. Também reduzimos em R$30 milhões as despesas com o custeio do Senado em 2005 e soubemos reagir com altivez quando um direito desta Casa estava ameaçado e quando insidiosos investiram contra a imagem do Legislativo.

Iniciamos a montagem de um novo Regimento para imprimir celeridade aos trabalhos internos. Não devemos criticar a lentidão alheia se não modernizamos nossos procedimentos. Nesse aspecto inclui-se ainda a medieval tramitação e execução do Orçamento Público. Se não chegarmos à peça impositiva, que se vede o contingenciamento para investimentos em obras estratégicas previamente definidas.

Todos têm consciência de que o orçamento não é elástico. Ninguém, responsável, advoga a gastança. Por isso, é preciso aprimorar a qualidade dos gastos sem comprometer o equilíbrio fiscal, para o qual estamos pagando muito caro. Ninguém quer, e este Senado muito menos, a imprevidência fiscal.

Vivemos espremidos entre Federalismo Fiscal e ilusão orçamentária. Causa indignação ver os Parlamentares, ao invés de se debruçarem no trabalho legislativo, se transformarem em mendigos orçamentários, esmolando aqui e ali a liberação de uma emenda que representa a real necessidade de uma comunidade.

Amadurecemos a discussão para um novo rito que combata a banalização das medidas provisórias. Instrumento concebido para dar agilidade ao Executivo em situações excepcionais, acabou, em sua vulgarização, por usurpar a competência legislativa do Congresso Nacional.

Não podemos tolerar essa atrofia. Os pressupostos de urgência e relevância foram, ao longo dos anos, sendo desprezados. Tudo isso, Srªs e Srs. Senadores, Srs. Líderes Partidários, tudo isso a constranger o Parlamento a uma inaceitável abstinência legislativa.

Em 2006, devemos também enfrentar pontualmente o império da burocracia. Além dos prejuízos para as empresas e para a sociedade, a burocracia deixou de ser um método de sistematização. Ela já pode ser contabilizada como mais um tributo pesado e indigesto. A burocracia é mais um custo que pode e será reduzido pelo Senado Federal. Além dos prejuízos, serve de manto para os incompetentes e de biombo para os maus intencionados. Essa onipotência dos gabinetes não pode, sinceramente, prosperar.

Constituímos, há pouco, a Comissão para apontar uma política permanente de recuperação do poder de compra do salário mínimo. É um resgate inadiável de uma hipoteca social que não pode seguir subordinada aos balancetes da ortodoxia econômica.

Errou o Executivo - permitam-me dizer - ao reagir à crise política apenas com retórica, abandonando as reformas reclamadas. Na bacia das almas rifaram-se duas: a reforma tributária que extermine o atual modelo de expropriação tributária, e a imperiosa reforma política. São temas que padecem da síndrome da maioria estática e não andam na Câmara dos Deputados. São vítimas da falta de um dínamo político que as concretize. Igualmente órfãos ficaram a regulamentação das PPPs, a lei das pequenas e microempresas e as agências reguladoras. O que chegou ao Senado Federal, não é preciso dizer, foi votado.

As investigações das CPIs vão impor mudanças na vida político-institucional do País no aprimoramento da transparência e da ética. Esse mutirão deve ser enfrentado rapidamente e a gênese da promiscuidade está no ultrapassado modelo de financiamento de campanhas.

As campanhas não podem ser mais megaespetáculos e pirotecnias múltiplas. Por isso sempre defendi, junto com outros Parlamentares, a redução dos custos, do tempo na televisão e da enxurrada de camisetas e brindes. Isso não guarda relação com as teses a serem defendidas no mandato.

A fidelidade afugenta a suspeita de mandatos de aluguel. Partidos não podem ser quitandas de conveniências. Ninguém deve usar um partido como táxi, que você pega e deixa quando e onde quer.

A verticalização, talvez, venha a ser oportuna adiante, quando alcançarmos a civilidade partidária e eleitoral.

Sempre defendi o financiamento público e exclusivo. Claro que como conseqüência da reforma e não como seu primeiro passo. Se esse modelo já vigorasse, a sociedade não estaria assistindo, perplexa, a esse volume de denúncias em torno do caixa dois e seus operadores que entraram para a galeria de horrores da história brasileira.

Não mudar o modelo de financiamento, Srªs e Srs. Senadores, é criar a modalidade de CPI pré-datada. Em breve teremos outras e mais outras, com novas faces, mas com os mesmos métodos reprováveis.

De outro lado, penso que devemos universalizar o acesso aos mecanismos de controle e fiscalização, como os do Siafi. Na democracia não há segredos absolutos. A alma da democracia é e continuará sendo a busca pela total transparência. De igual forma se impõe uma revisão na Lei de Licitações, de forma a tapar as brechas por onde é desviado o dinheiro do contribuinte.

Das idéias que irão surgir, considero sensato que o Congresso estude a conveniência de criar uma comissão permanente de combate ao crime que mais cresce na globalização: a lavagem de dinheiro e a evasão de divisas, que é a modalidade para ocultar dinheiro drenado dos cofres públicos. Temos essa missão constitucional, devemos exercitá-la.

As instâncias governamentais para combater esse tipo de crime são múltiplas e não se comunicam com a freqüência que a sofisticação do crime demanda. Se há um fórum legítimo para que essas informações sejam sistematizadas, esse fórum é o Legislativo. Para cá devem vir os relatórios do Coaf, as investigações tributárias, as operações suspeitas na rede bancária e nas bolsas, enfim, todas as informações vitais para aperfeiçoar o combate a esse delito.

Se ainda há quem pense que a sociedade padece de amnésia crônica, está muito enganado. Ela está nos olhando com um telescópio gigante e esperando outubro do próximo ano para dizer se chancela ou não o que aqui foi feito.

Muitos comungam da tese de que a democracia não é um sistema perfeito. Aí reside sua maior virtude e sua maior força: se não é perfeita precisa ser refeita diariamente. É nessa restauração permanente que ela se torna não acabada, mas perfeita. Perfeita porque é a sociedade que cobra e participa de seus aprimoramentos sistemáticos.

Não poderia deixar de abordar, Srªs. e Srs. Senadores, a economia brasileira, rapidamente. Muito embora de atribuição do Executivo, a economia não é uma propriedade impenetrável. O que lá se decide tem reflexos em toda sociedade e, por isso, é lícito expormos nossas apreensões.

A overdose dos juros, associada a um superávit primário severo, foi um equívoco. É necessário repensar a velocidade da queda para evitar a expectativa de crescimentos anêmicos. As taxas de juros não podem ser tratadas como uma febre alta, que só debilita o cidadão e a economia no dia da reunião do Copom. O Governo tem os instrumentos e poderia ousar mais.

Nos últimos dias defendi a convocação extraordinária para que a interrupção dos trabalhos não fosse vista como fôlego para os culpados. O fiz por convicção, com espírito público e no intuito de preservar a imagem do Legislativo, a imagem da instituição. A história não poupa os omissos, não absolve o descuido. O Congresso não tem o direito de negligenciar, de virar as costas para o País, interrompendo as investigações da CPI ou sobrestando os processos de cassação em curso. Estamos devendo é agilidade.

Há um custo, que é uma discussão menor e não pode ser comparado ao desgaste e à frustração caso os trabalhos não prossigam. Além da punição e investigação, temos de ter a presença dos Parlamentares e uma pauta exeqüível. O próprio orçamento, sinalização emblemática para a sociedade, para o setor produtivo, não pode ser a primeira vítima da imprevidência. Para a convocação, não autorizaremos viagens aos Parlamentares, faremos o controle rigoroso da freqüência. O comparecimento mínimo será de dois terços das sessões, como manda a Constituição. E cortaremos, se for necessário, o ponto dos faltosos.

Vamos, definitivamente, reduzir o período de trabalho nos Estados, chamado impropriamente de recesso, mas que não é sinônimo de inatividade nem de ócio. Dois períodos de trinta dias, um no meio e outro no final do ano, é a garantia de que inibiremos as criticadas convocações extras.

Encerro, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, agradecendo a colaboração, o espírito público e a responsabilidade de todos. Que na retomada dos trabalhos nós possamos exibir o que ainda devemos e avançar no que o País necessita. Desejo para todos, já que amanhã haveremos de encerrar, mas, provavelmente, com a nossa pauta trancada, um bom Natal e um feliz Ano Novo às Senadoras, aos Senadores, aos Deputados, às Deputadas, aos membros da Mesa e às suas famílias, aos funcionários do Senado, da Câmara e do Congresso Nacional, aos jornalistas e àqueles que acompanham o dia-a-dia desta Casa. Que Deus continue nos iluminando e nos dando muita força em 2006. (Palmas)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/12/2005 - Página 44799